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45. 3aL BRONISLAW MALINOWSKI 1401075321 PULAU ARGONAUTAS DO PACIFICO OCIDENTAL UM RELATO DO EMPREENDIMENTO EDA AVENTURA DOS NATIVOS NOS ARQUIPELAGOS DA NOVA GUINE MELANESIA ‘Com Prefacio de Sir James George Frazer Tradugio de Anton P, Carr (Capitulos I- XV) ¢ Ligia Aparecida Cardieri Mendonga (Capitulos XVI - XXII), revista por Eunice Ribeiro Durham. s Fe tilosofia eS ki ee BIBLIOTECA * ms co sf EDITOR: VICTOR CIVITA CAPITULO IV As canoas e a navegacio A canoa é elemento da cultura material e, como tal, pode ser descrita, fo- tografada e até mesmo fisicamente transportada para um museu. Contudo —— e esta € uma verdade freqiientemente negligenciada — a realidade etnografica da canoa nao poderia ser transmitida ao estudioso simplesmente colocando-se dian- te dele um exemplar perfeito da embarcacdo. A canoa é feita para determinado uso e com uma finalidade especifica; constitui um meio para atingir determinado fim, ¢ nds, que estudamos a vida nativa, ndo podemos inverter essa relacio, fazer do objeto em si um fetiche. No estudo das finalidades econdmicas para as quais se constréi uma canoa e dos diversos usos a que ela € submetida, encontramos os primeiros elementos para um estudo etnogréfico mais profundo. Dados sociolégicos suplementares, refe- Fentes A sua posse, a especificacdo das pessoas que a usam e a descrigdo do como 0 fazem; as informagoes referentes as ceriménias e costumes de sua cons- truco, uma espécie de histéria da vida tipica de uma embarcacdo nativa — tudo isso nos faz aproximar ainda mais da compreensao de tudo aquilo que a canoa verdadeiramente representa para 0 nativo. Nem mesmo isso, entretanto, se aproxima da realidade mais vital de uma canoa nativa, pois um barco, seja ele feito de casca de arvore ou de madeira, de ferro ou de aco, vive a vida de seus navegantes e, para 0 marinheiro, repre senta mais que um simples pedago de matéria moldada. Para o nativo, ndo me- nos do que para o marinheiro branco, 0 barco esté envolto numa atmosfera de romance, construida de tradicoes ¢ experiéncias pessoais. E um objeto de culto € admiragao, uma coisa viva que possui personalidade propria. Nés, curopeus — quer conhecamos a embarcacao nativa por experiéncia ou através de descricdes —, acostumados que estamos com os nossos meios de transporte tao extraordinariamente desenvolvidos, temos tendéncia a olhar com desdém a canoa nativa e a enxergé-la sob uma falsa perspectiva, considerando-a quase como um brinquedo infantil, como uma tentativa malograda e imperieita de solucionar 0 problema da nayegacao que nés outros ja solucionamos de ma- neira satisfatoria. Pata o nativo, entretanto, sua pesada e desajeitada canoa representa uma conquista admirdyel e quase miraculosa, um objeto de rara be- leza (veja fig. 21, 23, 40, 47 e 55). Ele a envolve de tradigdes, adorna-a com “2 Ao comparar a frégil porém tosca embarcacao nativa ao admiravel ite europeu, se ‘mosnos inclinados a consideri-la quase como uma brincadeira, Essa é a tOnica de muitos Felatos etnograficos amadores sobre a navegagio, nos quais se faz chacota barata dos cascos Tusticamente trabalhados, chamando-os de “couragados” ou “iates reais, da mesma for- ma que, numa atitude jocosa, os singelos chefes nativos séo citados como “reis”. Tal humorismo ¢, sem diivida, natural e agradével, porém, quando abordamos 0 assunto cientificamente, devemos, por um lado, abster-nos de distorcer os fatos e, por outro, pro- curar analisar as nuangas mais sutis do pensamento e sentimento nativos quanto as suas proprias criagées. i 92 MALINOWSKT seus melhores entalhes, pinta-a de cores e a embeleza. Para ele, a canoa repre- senta 0 instrumento poderoso que Ihe permite tornar-se senhor da natureza, ca paz de singrar mares perigosos em demanda a terras distantes. Est associada a viagens & vela, repletas de perigos ameacadores, de esperancas e desejos arden- tes, que ele expressa em cantigas ¢ estdrias. Em suma, na tradigao dos nativos, nos seus costumes, na sua conduta e naquilo que eles expressam diretamente por palavras, encontra-se 0 mesmo amor profundo, admiragio e apego especial que se dedicam as coisas vivas e pessoais, tio caracteristico da atitude do marinheiro em relacdo a seu barco. E nessa atitude emocional dos nativos em relagdo as suas canoas que en- contro a realidade etnografica mais profunda, a qual nos deve conduzir ao es- tudo de outros aspectos — os costumes e os pormenores técnicos da construgao e do uso; as condigdes econémicas e as crencas ¢ tradigdes associadas. A etno- logia ou antropologia, a cigncia do homem, nao deve fugir ao estudo da parte mais intima do seu ser, de sua vida instintiva e emocional. As fotografias (fig. 21, 24, 39 ¢ 47, por exemplo) nos dao uma idéia da estrutura geral das canoas nativas: o casco forma uma cavidade alongada e pro- funda, presa a um flutuador externo que se estende paralelamente ao corpo da canoa em quase toda a sua extensio (veja fig. 21 e 23), e com uma plataforma colocada no sentido transversal, ligando um lado ao outro, A leveza do material permite que a canoa fique mais imersa que qualquer embarcacio maritima eu- ropéia, e Ihe d4 também maior indice de flutuaco. Na agua, ela desliza na su- perficie, acompanhando o movimento das ondas, ora ocultando-se entre as cris tas, ora flutuando sobre elas. Apesar da sensacao de fragilidade, é muito agra- davel sentar-se no interior do casco esbelto de uma canoa enquanto ela se langa para a frente, com o flutuador levantado, a plataforma fortemente inclinada e as Aguas a se quebrarem por cima; ou, melhor ainda, empoleirar-se na platafor- ma ou no flutuador — 0 que sé € praticavel nas canoas maiores — e ser levado mar adentro por uma espécie de jangada suspensa que desliza acima das ondas de maneira quase magica. Por vezes, quando uma onda se ergue ¢ quebra por sobre a plataforma, a canoa — que & primeira vista parece uma jangada qua- drada, dificil de manejar — joga para a frente e para os lados, galgando os sulcos com graciosa agilidade. Ao icar-se a vela, suas pregas pesadas e rigidas, de esteira dourada, abrem-se farfalhando e estalando, ¢ a canoa comega a abrir caminho no mar; quando a Agua corre velozmente por baixo da canoa, num sibilar constante, e a vela dourada resplandece em meio ao intenso azul do céu e do mar — € nesse momento que a aventura da navegagio parece revelar-se numa nova perspectiva. ‘A teflexao natural sobre essa descrigao é que ela representa as impressoes do etnégrafo, mas nao as do nativo. E, na realidade, muito dificil dissociar as nossas préprias impressdes pessoais da correta interpretagdo da mente nativa no que ela tem de mais intimo, Contudo, se o pesquisador, falando a lingua dos nativos ¢ vivendo entre eles durante algum tempo, tentar partilhar de suas emo- Oes € procurar entendé-las, perceberd que as pode avaliar corretamente, Logo aprenderé a perceber se 0 comportamento dos nativos esté em harmonia com o seu ou Se, como &s vezes acontece, o seu diverge do deles. Neste caso, nao hé possibilidades de engano no que diz respeito a grande admiragao que os nativos tém por uma boa canoa, sua rapidez em apreciar di- ferencas de velocidade, flutuacao e estabilidade, ¢. sua reacdo emocional a essas diferencas. Num dia calmo, quando a brisa fresca repentinamente se levanta ¢ faz estufar a vela, e a canoa ergue sua lamina (flutuador externo) para fora da Agua e corre velozmente, borrifando agua de um lado e de outro, nao ha possi- bilidade de engano de interpretacio quanto ao prazer contagiante dos nativos. ARGONAUTAS DO PACIFICO OCIDENTAL 93 Correm todos a seus postos ¢ ficam profundamente atentos aos movimentos da canoa; alguns se poem a cantar, ¢ os mais jovens se debrucam para brincar com a agua. Jamais se cansam de discutir os pormenores referentes A qualidade de suas canoas e de analisar as diversas embarcagdes. Nas aldeias litoraneas da laguna os meninos e rapazes saem a freqiientes passeios nas canoas pequenas, apostam corrida, exploram os recantos menos conhecidos da laguna e, de ma- neira geral, sem diivida divertem-se com o passeio, como nds 0 fariamos. Vista de fora, depois que entendemos sua construcdo e, através da expe- rigncia pessoal, percebemos sua adequ s finalidades, a canoa nao é menos atracnte nem tem menos personalidade do que quando a vemos de den- tro, Quando, numa expedigio comercial ou numa visita social, uma frota de canoas surge ao largo, com suas velas triangulares assemelhando-se a asas de borboleta espalhadas por sobre a Agua (veja fig. 48), e os nativos tiram de seus bizios um toque unissono e harmonioso, o espetéculo é inesquecivel.* Quando, entdo, as canoas se aproximam da praia e se pode vé-las balancando na agua azul, no esplendor do branco, vermelho e preto de sua pintura recente, com suas tébuas de proa admiravelmente desenhadas e com suas fiadas de grandes con- chas brancas a retinir (veja fig. 49 ¢ 55) — € entéo que se compreende bem a admiracao e 0 amor que fazem com que © nativo dispense todos esses cuidados a decoragao de sua canoa. Mesmo quando nao esti sendo usada e repousa solitéria na praia de uma aldeia, a canoa é um elemento tfpico da paisagem e constitui parte integrante da vida da aldeia. As canoas muito grandes sio, em alguns casos, guardadas em enormes abrigos (veja fig. 22), que superam em tamanho quaisquet outras construgées erigidas pelos nativos das ilhas Trobriand. Em outras aldeias, onde ‘os nativos estao constantemente utilizando as embarcac6es, as canoas sAo co- bertas simplesmente com folhas de palmeira (veja fig. 1 e 53), como protecao contra © sol, ¢ 0s nativos muitas vezes vém sentar-se em sua plataforma, para conversar, mascar as nozes de bétel e contemplar o mar. As canoas menores, atracadas em carreiras paralelas, em frente ao mar, estio prontas a serem lan- cadas & Agua a qualquer momento. Com seu perfil recurvado e sea complicada armacao de varas e sarrafos, as canoas constituem um dos aspectos mais tipi- cos da aldeia nativa litoranea. att Algumas palavras devem agora ser ditas sobre as caracteristicas tecnolégi- cas fundamentais da canoa, Também neste caso, a mera enumeracao e descrigao, das diversas partes que compoem a canoa, a dissecagio de um objeto inanimado, nao nos irdo satistazer. Levando em consideracio, de um lado, seu objetivo e, do outro, as limitagdes dos recursos tecnoldgicos ¢ materiais, tentarei mostrar, em vez disso, de que maneira os construtores navais nativos solucionaram os problemas que se Ihes apresentaram. Toda embarcagio requer um casco impermedvel, imersivel e de volume considerdvel. Isto € fornecido aos nativos por um tronco escavado. Esse tronco agiienta cargas relativamente pesadas, pois a madeira é leve e 0 espago oco As velas em forma de pingas de caranguejo usadas no litoral sul, de Mailu (onde eu as via com freqiiéncia) para o oeste, onde sao usadas nas lakutoi de mastro duplo de Port Moresby, 80 ainda mais pitorescas. Com efeito, quase nio consigo imaginar algo mais estranhamente impressionante do que tima frota de canoas equipadas com esse tipo de velas. Essas velas ja apareceram em selos da Nova Guiné Britanica, como os que foram emitidos pe- lo Capitio Francis Barton, governador da colonia, jé falecido. Veja também a fig. XII do livro Melanesians, de autoria de Seligman. 4 MALINOWSKI Figura 23-A, Diagramas que mostram em segio transversal alguns prineipios da estabilidade e construgao da cano auxilia a flutuagao. Nao possui, contudo, estabilidade lateral, como facilmente se pode observar. A seco transversal de uma canoa (veja fig. 23-A, n.° 1) nos Mostra que um peso com seu centro de gravidade no meio da canoa, ou seja, imetricamente distribuido, no afeta o equilibrio, mas qualquer peso colocada de um dos lados (segundo indicam as setas A ou B), de modo a gerar um momentum de rotagao (ou seja, forga de rotacao), ira fazer com que a canoa vire ¢ fique de cabeca para baixo. Se, no entanto, como mostra a fig. 23-A (2), atarmos ao casco um tronco menor, s6lido (C), haverd maior estabilidade, embora nao simétrica, Se forcar- mos um lado (A) para baixo, a canoa gira sobre seu eixo longitudinal, de tal forma que seu outro lado (B) se ergue (fig. 23-A) (3). O tronco (C) ird levan- tar-se da agua, © seu peso produzira um momentum (forca de rotacéo) propor- cional & deslocagao, e a canoa ficard em equilibrio, Esse momentum esta repre- sentado, no diagrama, pela seta R. Dessa forma consegue-se grande estabilidade relativa & forga de pressdio sobre 0 lado A. Qualquer forca de pressiio aplicada sobre o lado B faz com que o tronco C fique submerso, mas oferece certa resisténcia devido 4 sua capacidade de flutuacio. De qualquer forma, ¢ fécil verificar-se que a ¢stabilidade deste lado é bem menor que a do outro. Essa estabilidade assimétrica“ desempenha papel de grande importincia na técnica da navegacdo. Dessa forma, como veremos, a canoa sempre viaja com o flutua- dor externo (C) voltado para o vento. A pressio exercida pela vela faz, entao, com que a canoa se incline; 0 lado A é forcado para dentro da agua, e Be C ficam erguidos: nessa posigéo eles se tornam extremamente estaveis e resistentes & forga do vento. Se, no entanto, a canoa inclinar-se para 0 outro lado, for- “* Um recurso de construgio para se conseguir estabilidade simétrica ¢ exemplificado pelo sistema mailu de construgdo de canoas: uma plataforma ¢ colocada de modo a ligar, como uma ponte, dois troncos ocos, paralelos um ao outro. Cf. 0 artigo do autor, publicado em Transactions of ihe Royal Society of South Australia, vol. XXXIX, 1915, pp. 494-706, ca- pitulo IV, 612-599. Figs. XXXV-XXXVIIL ARGONAUTAS DO PACIFICO OCIDENTAL 95 cando B e C para dentro da agua, a menor das brisas ser suficiente para fazé- la emborcar. A fig. 23-A (2) ¢ (3) também nos mostra que a estabilidade da canoa de- pende (i) do volume e, especialmente, da profundidade, do seu casco; (ii) da distancia B — C entre 0 casco e 0 flutuador; (iii) do tamanho do flutuador C. Quanto maiores essas dimens6es, maior sera a estabilidade das canoas. Uma canoa rasa, de pequeno bordo livre, pode facilmente ser forcada para dentro da Agua; além disso, se for usada em tempo tempestuoso, as ondas iréo quebrar-se por cima dela, enchendo-a de agua. (i) O volume do casco naturalmente depende do comprimento ¢ espessura do tronco utilizado. Podem-se fazer canoas razoavelmente estaveis de simples troncos escavados. Sua capacidade é, no entanto, limitada — e esse limite se atinge rapidamente. Contudo, se aumentarmos os lados da canoa com uma ou varias tébuas extras, como se vé na fig. 23-A (4), 0 volume e a profundidade aumentardo bastante, sem muito aumento de peso. A canoa assim reforgada tem maior bordo livre, ¢ isso impede a invasdo da agua. As tabuas longitudinais das canoas de Kiriwina sao fechadas nas extremidades por meio de tabuas de proa transversais, entalhadas com relativa perfeicao (veja fig. 24-C e 47). (ii) Quanto maior a distancia B — C entre 0 casco e o flutuador externo, tanto maior a estabilidade da canoa. Visto que 0 momentum de rotacio depende da distancia B — C (fig. 23-A) e do peso do flutuador externo C, é evidente, portanto, que quanto maior a distancia, tanto maior o momentum. Uma distan- cia demasiadamente grande, no entanto, prejudicaria a maneabilidade da canoa. Qualquer forga de pressdo exercida sobre o flutuador faria com que a canoa vi- rasse facilmente e, visto que, para manejar a canoa, os nativos precisam subir no flutuador, a distancia B — C nao pode ser demasiadamente grande. Nas ilhas Trobriand, a distancia B — C € aproximadamente um quarto, ou menos, do comprimento total da canoa. Nas grandes canoas maritimas, este espaco € sempre coberto por uma plataforma. Em alguns outros distritos, a distancia é bem maior, e as canoas tém um outro tipo de armagao. (iii) O tamanho do tronco (C) que jorma o flutuador externo — Esse tron- co, mas canoas maritimas, ¢ geralmente de dimensdes consideraveis. Contudo, visto que um pedaco de madeira macica fica pesado ao encharcar-se de agua, um tronco muito espesso nao seria apropriado. Sao estes os principios basicos da construgio de uma canoa, vistos sob o aspecto funcional, e que irao tornar mais claras nossas descrigdes suplementares sobre a navegacdo, sobre a construcao e uso das canoas. Pois, com efeito, em- bora eu tenha afirmado que os pormenotes técnicos sio de importancia secun- daria, é 6bvio que, sem compreendé-los, nao poderemos entender as referéncias sobre © manejo aprestamento das canoas. Os nativos de Trobriand usam suas embareagdes para trés objetivos prin- cipais, correspondentes a trés tipos de canoa. A navegacdo costeira, especial- mente a que se faz na laguna, requer canoas pequenas, leves, de facil manejo, chamadas kewo'u (veja fig. 23-B (1), 24 na parte superior do primeiro plano, ¢ 36 a dircita); para a pesca, sdo usadas canoas maiores, proprias para uso no mar, chamadas kalipoulo (veja fig. 23-B (2), 24, 36 a esquerda, 37); finalmente, para navegacéo em alto-mar, sao necessarios tipos ainda maiores, com grande capacidade de carga, maior deslocamento e construcéo mais resistente. Estas ltimas sao chamadas masawa (veja 23-B (3), 21, 23, etc.). Waga é o termo geral, designativo de todos os tipos de embarcacao. ‘Apenas algumas palavras precisam ser ditas sobre os dois primeiros tipos, de modo a fazer com que, por meio de comparagées, 0 terceiro tipo de canoas seja mais claramente entendido. A construcio das canoas menores encontra-se 96 MALINOWSKI Figura 23-B. Segdes diagraméticas dos trés tipos de canoa trobriandesa ()Kewou (2) Kalipoulo (3) Masawa suficientemente ilustrada no diagrama (1) da fig. 23-B. O diagrama mostra cla- Tamente que essas canoas menores séo apenas um simples tronco escavado, con- jugado a um flutuador. Nenhuma delas possui armacoes de madeira com que aumentar a profundidade do casco nem tbuas de prow entalhadas nem, via de regra, quaisquer plataformas. Em seu aspecto economico, pertencem sempre a um tinico individuo, e atendem as suas necessidades pessoais. Nao estao, tam- pouco, vinculadas a quaisquer mitos ou magia. Como se pode observar na fig. 23-B (2), 0 segundo tipo difere do primeiro no tocante & construcdo: seu vdo é ladeado por armacoes de madeira e tabuas de proa entalhadas. Um conjunto de seis cavernas mantém as tabuas firmemente unidas © presas & parte inferior do casco, Esse segundo tipo de canoa é usado pelas aldeias que praticam a pesca, Essas aldeias subdividem-se em varias equi- pes de pesca, cada uma delas com seu préprio lider. E ele 0 dono da canoa, € ele que executa a magia da pesca, e possui, entre outros, o privilégio de rece- ber a parte maior do produto da pesca. Entretanto, de fato, toda a tripulacao tem o direito de usar a canoa e partilhar do produto da pesca. Neste particular deparamos com o fato de que, entre os nativos a propriedade nao é uma insti- tuigdo simples, visto que implica em direitos especificos de diversas pessoas, combinadas ao direito supremo e ao titulo de propriedade de um individuo. Ha muita magia de pesca, muitos tabus e costumes referentes a construgéo e tam- bém ao uso dessas canoas que constituem tema de diversos mitos menores. De todas as embarcagdes nativas, as canoas maritimas do terceiro tipo (veja fig. 23-B) (3) slo tecnicamente as mais bem trabalhadas, as que se prestam melhor & navegacio em alto-mar, as de construgao mais cuidada. Constituem, sem dtivida, a maior realiz cca desses niativos. Tecnicamente, diferem dos tipos anteriores no que diz respeito ao tempo dispendido em sua construgéo © aos cuidados dispensados a detalhes, mas nao naquilo que tém de essencial ARGONAUTAS DO PACIFICO OCIDENTAL 97 Seu casco ¢ formado por uma armagio de pranchas, construida sobre um tronco escavado ¢ fechada, nas duas extremidades, por tébuas de proa transversais en- talhadas ¢’fixadas longitudinalmente por outras tabuas de forma oval. O madei- ramento total do casco é fixado por cavernas, como no segundo tipo de canoas (kalipoulo, as canoas de pesca), mas todas as suas pecas tem melhor acabamen- to € Sao encaixadas com muito maior perfeicao, amarradas com fibras mais for- tes, € mais bem calafetadas, As pegas de madeira entalhada, em geral bastante mediocres nas canoas de pesca, so aqui perfeitas. A propriedade dessas canoas € ainda mais complexa, ¢ sua construcio é entremeada de costumes tribais, ceri- ménias ¢ magia, esta Ultima baseada na mitologia. A magia é sempre executada em relacdo direta com as expedicdes do Kula. ur Depois de termos discutido, em primeiro lugar, a impressao geral produzida pela canoa ¢ sua importancia psicolégica e, em segundo lugar, as caracteristicas fundamentais de sua tecnologia, devemos agora passar as implicagdes sociais da ‘masawa (canoa maritima). A canoa & construida por um grupo de pessoas, é de propriedade, uti cdo e uso comunitirio — e tudo isso se processa segundo regras especificas. Ha, portanto, uma otganizacdo social subjacente & construcao, & posse e ao uso de uma canoa, Sob esses trés aspectos, apresentaremos um esboco da sociologia da canoa, tendo sempre em mente que esses esbocos devem ser completados pelo relato subseqtiente, (A) Organizacdo social do trabalho na construcdo de wma canoa. ‘Ao estudarmos a construcio de uma canoa, vemos os nativos empenhados num empreendimento econdmico de grande escala. Eles tém de enfrentar difi- culdades técnicas que exigem determinados conhecimentos, que sé podem ser superadas através de um esforco continuo e sistematico ¢ que, em certos estagios, precisam ser resolvidas através de trabalho comunitdrio. Tudo isso obviamente implica nalguma forma de organizacao social. Todos os estdgios da construcao, nos quais diversas pessoas tém de cooperar, precisam estar coordenados; ¢ ne- cessdtio que haja alguém com autoridade suficiente para tomar a iniciativa e apresentar decisdes; é necessirio, também, haver alguém com capacidade téc- nica, que oriente a construcio, Finalmente, em Kiriwina, o trabalho comunitério € os servicos prestados por especialistas precisam ser remunerados ¢, portanto, ha necessidade de alguém que tenha meios suficientes ¢ esteja disposto a fazé- Jo. Essa organizacao econdmica baseia-se em dois fatos fundamentais — (1) a diferenciacao sociolégica das funcdes e (2) a regulacao do trabalho por meio da magia. (I) A diferenciacdo sociolégica das funcdes — Antes de mais nada, ha o dono da canoa — ou seja, 0 chefe ou o lider de uma aldeia ou de alguma sub- diviséo menor — 0 qual se responsabiliza pelo empreendimento. Ele paga o trabalho, contrata especialistas, d4 ordens e comanda o trabalho comunitario. Além do proprietario, ha outra fungio de grande importincia sociolégica, ou seja, a do especialista. E ele o individuo que sabe construir 2 canoa, fazer os entalhes e, por fim — mas nao de menor importincia — executar a magia. Todas essas funcdes do especialista podem, embora nao necessariamente, ser 4 A vida tribal inteira baseia-se numa incessante permuta material; ef. 0 artigo acima men- sionado que aparece no Economic Journal de marco de 1921, ¢ as consideracées feitas sobre esse assunto no capitulo VI, secdes TV-VIL 98 MALINOWSKI atribuidas a um nico individu. O proprietério € sempre um s6, mas pode ha- ver dois, ¢ até mesmo trés especialistas. Finalmente, 0 terceiro fator sociolégico referente 4 construcéo das canoas esté representado pelos trabalhadores. Entra aqui uma nova subdivisio. Em pri meiro lugar, hé um grupo menor formado pelos parentes e pelos amigos mais préximos do proprietério ou do especialista, que prestam ajuda durante todo o processo da construgio; em segundo lugar, ha, além deles, 0 grupo constituido pela maior parte dos nativos da aldeia, que participa dos trabalhos nos estigios em que se faz necessdrio o trabalho comunitario. (2) A regulacao do trabalho por meio da magia — A crenca na eficdcia da magia ocupa posicio de suprema importincia entre os nativos de Boyowa, que a associam a todos os seus interesses vitais. Com efeito, iremos verificar que a magia est4 vinculada a todos os trabalhos e atividades comunitarias a serem des- critas oportunamente; esti vinculada, também, a todo empreendimento do qual fazem parte 0 perigo ou 0 acaso. Teremos de descrever, além da magia referente a construcdo das canoas, a magia propicia & navegacao, a referente ao naufrdgio © salvamento, a0 Kula ¢ ao comércio, & pesca, a obtencio do spondylus © da concha do Conus, ¢ & protecdo contra ataques em terras estranhas. E imperioso que entendamos perfeitamente o que a magia representa para os nativos e que papel desempenha em todos os seus interesses vitais; devotaremos um capitulo especial as idéias e praticas magicas existentes em Kiriwina. No presente capitulo, entretanto, 6 necessiirio que se faca um esboco de suas principais caracteristicas, pelo menos no que se refere 4 magia da canoa. Antes de mais nada, deve-se compreender que os nativos firmemente acre- ditam no poder da magia e que esta conviccdo quando testada em suas acdes, é realmente inabalavel, mesmo nos dias atuais, quando tantos costumes € crencas nativas j4 se encontram debilitadas. Podemos falar da importancia sociolégica da tradigao, ou seja, do grau em que o comportamento de uma comunidade € afe- tado pelos ditames tradicionais das leis e costumes tribais. Nas ilhas Trobriand, 9 preceito geral de que as canoas devem ser sempre construidas sob orientagao magica ¢ obedecido sem quaisquer compromissos, pois neste particular é enor- me a forca da tradigao, Com efeito, até o presente nao se construiu uma tinica canoa masawa sem magia, sem total observancia de todos os ritos ¢ ceriménias. As forcas que mantém os nativos no seu padrao tradicional de comportamento so, em primeiro lugar, a inércia social especifica que caracteriza toda sociedade humana e constitui a base de todas as tencléncias conservadoras e, em segundo lugar, a crenga inabalavel de que, se os padroes impostos pela tradigao nao fo- rem observados, as conseqiiéncias serdo funestas. No caso das canoas, os nati- vos de Trobriand esto de tal forma persuadidos de que as canoas construidas sem magia sao pouco resistentes, vagarosas ¢ nao tem sorte no Kida, que nenhum deles sequer sonharia omitir os rituais magicos Nos mitos que se acham relatados no capitulo XII veremos claramente a forga que é atribuida 4 magia no sentido de fazer com que uma canoa seja veloz ¢ possua outras qualidades, Segundo a mitologia nativa, que é literalmente aceita e firmemente reconhecida como verdadeira, poder-se-ia até mesmo fazer com que as canoas voassem, se as necessfrias férmulas migicas nao tivessem caido em esquecimento E também importante que as idéias dos nativos sobre a relacio existente entre a eficacia mégica e os resultados da capacidade técnica sejam entendidos corretamente, Sao ambas consideradas imprescindiveis; entende-se, porém, que ajam independentemente. Em outras palavras, os nativos entendem que a magia. por mais eficiente que seja, no compensa uma construgao defeituosa. Cada uma das duas tem a sua propria funcdo; 0 artesao, através de sua habilidade ¢ ARGONAUTAS DO PACIFICO OCIDENTAL 99 conhecimentos, constréi a canoa de modo que ela seja estivel e veloz; a magia Ihe dé estabilidade ¢ velocidade adicionais, Se a canoa é visivelmente mal cons- truida, os nativos saberdo por que ela navega vagarosamente e ¢ dificil de ma nejar. No entanto, se duas canoas parecem estar igualmente bem construidas mas uma supera & outra em algum aspecto, o fato ser atribuido 2 magia. Finalmente, qual é, do ponto de vista sociolégico, a funcéo econémica da magia no processo de construgéo das canoas? E simplesmente uma acao extrin- seca, que nada tem a ver com o trabalho em si ou com sua organizagio? E a magia, do ponto de vista econémico, uma simples perda de tempo? De ma- neira nenhuma, Ao lermos o relato que se segue, iremos claramente verificar que a magia impde ordem e seqiiéncia as diversas atividades ¢ que tanto a magia quanto o cerimonial a ela associado constituem um meio de garantir-se a coope- racao da comunidade e a organizagao do trabalho comunitario. Como j4 disse- mos anteriormente, a magia instila nos trabalhadores maior confianga na eficdcia de seu esforco, disposicao_ mental imprescindivel a qualquer empreendimento de carater complicado e dificil. A crenga de que o feiticeiro é homem dotado de poderes especiais que controlam a canoa, faz dele o lider natural cujas ordens sdo obedecidas, que pode fixer datas, distribuir os servicos e averiguar se 0 tra~ balhador est4 produzindo satisfatoriamente. ‘A magia, longe de representar um aditamento indtil, ou até mesmo um embaraco ao trabalho, exerce influéncia psicolégica de modo a fazer com que os nativos confiem no éxito do seu esforgo e Ihes da uma espécie de lider na- tural. Portanto, a organizagio do trabalho na construg&o de canoas tem por base, de um lado, a divisto de fungdes — ou seja, as do proprietario, do espe- cialista e dos ajudantes — e, de outro, a mitua colaboragdo entre trabalho ¢ magia. Vv (B) Sociologia da propriedade da canoa. A propriedade, no sentido mais amplo da palavra, ¢ a relacio, em geral muito complexa, existente entre um objeto ¢ a comunidade social em que cle se encontra, Na etnologia, & extremamente importante que ndo se dé a essa palavra uma significagdo mais restrita do que a que acabamos de definir, pois que 05 tipos de propriedade variam muito de regiao para regiao. Constitui erro especialmente grave usar-se a palavra propriedade com o significado muito de- finido a ela atribuido em nossa propria sociedade, E dbvio que esse significado pressupoe 2 existéncia de condicdes econdmicas ¢ legais altamente desenvolvi- das, (ais como as que encontramos em nosso préprio meio; portanto, 0 termo “possuir”, tal qual o usamos, ndo tem sentido quando aplicado a sociedade va. Ou, entio, © que é bem pior, sua aplicacao introduz na nossa descricao varias idéias preconcebidas e, antes mesmo que tenhamos comecado a relatar as condigdes nativas, ja teremos distorcido a perspectiva do leitor. ‘A propriedade tem, naturalmente, um sentido espectfico diferente em cada tipo de sociedade nativa, visto que em cada uma delas os costumes e as tradi- goes vinculam a palavra uma série diferente de fungdes, rituais e privilégios. Além disso, é varidvel a gama social daqueles que desfrutam desses privilégios. Entre a propriedade puramente individual e 0 coletivismo h4 uma escala com- pleta de misturas e combinacées. “ Esse ponto de vista encontra-se mais desenvolvido no artigo “Primitive Economics", pu Biicado no Economic Journal, margo de 1921; cf. também as observacdes feitas sobre a magia sistemitica, no capitulo XVIT, segio VIT. a aa aa aa ; 100 MALINOWSKI Nas ilhas Trobriand existe uma palavra que, pode-se dizer, denota de ma- neira aproximada a propriedade: ¢ 0 prefixo toli-, acompanhado do nome do objeto que se possui. Dessa maneira a palavra composta roli-waga (promunciada sem hiato) significa 0 “proprietario” ou “senhor” de uma canoa (waga), toli- bagula, 0 senhor de uma roga (bagula = terreno, cultivado, roca); toli-bunukwa, dono do porco; toli-megwa, proprietirio, especialista em magia, etc. Essa pala-~ vra tem de ser usada como chave para o entendimento das idéias nativas; mas, mais uma vez, é com cautela que a devemos usar. Em primeiro lugar porque, como todas as palavras nativas abstratas, ela cobre uma variedade de_significa- dos ¢ seu sentido varia conforme o seu contexto. E mesmo com referencia a um determinado objeto, virias pessoas podem reivindicar 0 direito de proprie~ dade, ou seja, alegar que sio toli- em relagao a esse objeto, Em segundo lugar. as pessoas que tém pleno direito de facto de usar determinado objeto, podem nfo estar attorizadas a dar a si mesmas 0 titulo de toli- desse objeto. Isso vai tomnar-se mais claro no exemplo concreto da canoa. ‘A palavra toli-, nesse caso, limita-se a um s6 individuo, que se denomina toli-waga. As vezes sous parentes maternos mais proximos, tais como irmaos ¢ sobrinhos maternos, podem coletivamente atribuir a si mesmos 0 nome de to waga, mas isso seria um abuso do termo. Ora, até mesmo o simples privilégio de fazer uso exclusivo desse titulo é altamente valorizado pelos nativos. Nas préximas paginas, o leitor ira familiarizar-se com essa faceta da psicologia social trobriandesa, ou seja, sua ambicdo, vaidade € desejo de conseguir renome ¢ ser elogiado, Os nativos, para os quais 0 Kula e as expedicoes maritimas séo tao importantes, associam o nome da canoa ao do seu toli; identificam seus poderes magicos & boa sorte da canoa na navegacdo e no Kula; freqiientemente usam 0 nome de uma pessoa como se fosse 0 nome da canoa, dizendo que fulano de tal navegou aqui ou acolé, comentando sobre a rapidez com que navega, etc. Passando agora & determinagao detalhada dessa relacéo, devemos notar que seu ponto mais importante € 0 fato de ela sempre ter por base a pessoa do chefe ow lider da aldeia. Como ja vimos em nosso pequeno relato sobre a so- ciologia trobriandesa, a comunidade de uma aldeia esta sempre subordinada & autoridade de um chefe ou lider, Quer sua autoridade se limite ao ambito de uma pequena aldeia, quer se estenda ao Ambito de todo um distrito, cada um deles dispoe de meios para acumular determinada quantidade dos produtos agri- colas, quantidade essa que € consideravelmente grande no caso do chefe e 1 lativamente pequens no caso de um lider, porém sempre suficiente para o custeio das despesas extras concomitantes a qualquer empreendimento comunitério, Ca- da um deles possui também riqueza nativa condensada sob a forma dos objetos de valor chamados vaygu'a. Um lider possui uma pequena quantidade deles, um chefe uma grande quantidade. Porém, todo nativo que nao seja um simples pobretéo precisa ter pelo menos algumas liminas de pedra, alguns cintos kaloma e alguns kuwa (pequenos colares). Assim sendo, em todas as modalidades de empreendimento nativo, 0 chefe ou lider tem meios para arcar com a despesa e tira também o principal proveito do negécio. No caso da canoa, o chefe, como vimos, desempenha a funcio de organizador principal no processo de constru- cdo ¢ desfruta também do titulo de toli Essa importante posi¢ao econdmica € paralela a seu poder direto, que de- riva de sua alta posigéo social ou autoridade tradicional. No caso do simples lider, ela se deve ao fato de que ele esté & testa de um grande grupo de paren- tesco (0 subcla totémico). Os dois fatos juntos Ihe permitem convocar trabalha- dores e retribuir o trabalho. Esse titulo de ‘oliwaga, aiém de outorgar distingao social em geral, implica também numa série especifica de funcdes sociais com referéncia a seu portador. 75.3ak ARGONAUTAS DO PACIFICO OCIDENTAL 101 (1) Ha, em primeiro lugar, os privilégios formais e cerimoniais. O toliwaga tem, assim, 0 privilégio de atuar como porta-voz da sua comunidade em todos ‘os assuntos referentes 4 navegacdo ou a construgio de canoas. Ele reine o conselho que, conforme o caso, pode ser informal ou formal, ¢ levanta a ques- tdo de quando a expedigaio deveré realizar-se. Esse direito de iniciativa é pura- mente formal, pois tanto no processo de construgdo quanto na navegagéo, a data do empreendimento é fixada segundo raz6es extrinsecas, tais como a teci- procidade para com as tribos do além-mar, a estacao do ano, os costumes, etc. Nao obstante, o privilégio formal restringe-se rigorosamente ao toliwaga e & altamente valorizado. A posicao de mestre ¢ lider de ceriménias, de porta-voz geral, prolonga-se pelos estagios sucessivos da construgao, ¢ do uso subseqiiente da canoa; vamos encontré-la em todas as fases cerimoniais do Kula, (2) O uso e as vantagens econdmicas derivadas da canoa nao séo exclusi- dade do toliwaga, A ele, no entanto, cabe a “parte do leao”. Em quaisquer cir- cunstancias, ele logicamente tem o privilégio de absoluta prioridade de ser in- cluido numa expedigao. E também ele que recebe, em todas as ocasides, a maior parte dos objetos valiosos do Kula e dos outros artigos. Isso, no entanto, se dé em virtude de sua posigao geral como chefe ou lider, ¢ talvez nfo devesse ser incluido nesse pardgrafo. Entretanto, uma vantagem especifica e estritamente individual € a de poder ceder a canoa em empréstimo € receber 0 pagamento correspondente. Caso nao tenha inten¢ao de navegar em determinada época, um chefe pode ceder — ¢ fregiientemente cede a canoa a um outro (via de regra pertencente a outro distrito) que vai participar de uma expedicéo. O mo- tivo disso € que o chefe ou lider que toma a canoa emprestada pode, na época, nao ter meios para mandar consertar sua prépria canoa ou para construir uma nova. O pagamento que se faz pelo empréstimo é denominado togura e con- siste de um vaygu’a. Além disso, os melhores vaygu’a obtidos no decorrer da expedi¢ao sao oferecidos como presente Kula 3 pessoa que cedeu a canoa.” (3) O toliwaga tem privilégios sociais especificos e exerce funcdes definidas no manejo de uma canoa. Assim, ele seleciona seus companheiros, aqueles que irfo navegar em sua canoa, e tem o direito formal de escolher ou rejeitar os que o podem acompanhar na expedicio. Também neste caso esse privilégio perde muito do seu valor em virtude das diversas restricdes impostas ao chefe pela natureza das coisas. Dessa forma, por um lado, os seus veyola (parentes maternos) tém, segundo todas as idéias nativas referentes a leis e direitos, direi- tos importantes em relacdo a canoa, Ademais, uma pessoa de posicio social clevada na comunidade dificilmente poderia ser excluida de uma expedicao caso desejasse participar dela e nao houvesse, contra ele, qualquer motivo espe- cial de queixa, Se houvesse, porém, um motivo assim, se a pessoa tivesse ofen- dido ao chefe ¢ com ele estivesse em més relacées, por si propria nem tentaria tomar parte na expedicio. H4 exemplos concretos disso em registro. Ha uma outra categoria de nativos que tem o direito de facto de participar das expedi- ces: sao os peritos na arte de navegar. Nas aldeias costeiras como, por exem- plo, em Sinaketa, hd muitos deles; nas do interior, como por exemplo em Oma- rakana, hé poucos. Por conseguinte, nos distritos do interior, hé homens que sempre vio numa canoa, em todas as ocasides em que ela € posta em uso; ho- mens que tém mesmo muito a dizer sobre todos os assuntos referentes & navegaco © A maneira de ceder uma masawa (canoa maritima) difere da transagdo costumeira refe- rente 4 cessio de uma canoa de pesca. Neste segundo caso, 0 pagamento consiste em for- necer uma parte do produto da pesca — 0 qual recebe © nome de 1waga. Esse mesmo termo se splica a0 pagamento feito pela cesséo de quaisquer outros objetos. Dessa forma, se fo- sem emprestadas redes de pescar, implementos de caga ou uma pequena canoa utilizada para o comércio ao longo do litoral, uma parte dos produtos obtidos sera dado como uwage. 102 MALINOWSKI © que, no entanto, jamais ousariam usar do titulo de toliwaga ¢ até mesmo deci- didamente 0 recusariam caso ele Ihes fosse atribuido. Em suma: o privilégio de escolha que, por direito, cabe ao chefe, é limitado por duas condigdes: a classe social ¢ os conhecimentos néuticos dos nativos que ele podera escolher. Como ja vimos, ele desempenha funcdes especificas no proceso de construcdo da canoa. Mais adiante veremos que ele tem fungoes especificas também na na- vegacio. (4) Uma caracteristica especial, implicita no titulo de tolivaga, 6 0 dever de executar os rituais mégicos. Iremos claramente verificar que a magia que acom- panha todo o processo de construcio de uma canoa é executada pelo especi lista; no entanto, a magia executada com referencia 4 navegacio ¢ a0 Kula é da algada do soliwaga. Por definicao, este ultimo precisa conhecer a magia da canoa. O papel que a magia desempenha nesse particular, bem como os tabus, as cerimOnias e os costumes especiais a ela referentes, itio evidenciar-se na des. crigo que em breve faremos sobre uma expedigio Kula. Vv (3) A tripulacdo da canoa — distribuigao social de fungées, Temos muito pouco a dizer sobre este particular, pois que para entendé-lo precisamos conhecer os pormenores técnicos da navegacao. Trataremos deste assunto num préximo capitulo (cap. IX, seco II), quando entio iremos mostrar a organizagio social tal como ela se verifica no ambito da canoa. O que por hora podemos dizer ¢ que as varias pessoas tém tarefas especificas a elas con- fiadas, as quais se dedicam com exclusividade. Via de regra, quando um nativo se especializa, digamos, como timoneiro, o timao estard sempre sob sua respon- sabilidade. A posigao de capitaio, que traz consigo deveres, poderes © responsa- bilidades especificas nao existe como func&o distinta da de toliwaga. O proprie- tario da canoa sempre assume a lideranga e dé ordens, desde que seja bom na- vegador. Caso contrario, cabe ao melhor dos tripulantes decidir 0 que se deve fazer em situagdes de dificuldade ou perigo. Via de regra, porém, cada um conhece sua respectiva tarefa e a executa no decurso normal dos acontecimentos. Devemos fazer aqui um pequeno resumo dos detalhes concretos referentes a distribuicao de canoas nas ilhas Trobriand. Analisando 0 mapa de Boyowa, verificamos que os varios distritos nao tém as mesmas oportunidades de nave- gac4o € nem todos possuem acesso direto a0 mar. Além disso, as aldeias pes- queiras da laguna, onde a pesca e a navegagio precisam ser constantemente praticadas, tém, € Idgico, melhores oportunidades de desenvolver as artes da navegagdo ¢ construcao de canoas. Com efeito, verificamos que as aldeias dos dois distritos do interior, Tilatula e Kuboma, nada conhecem a respeito da cons- trugdo de canoas e da navegacao, ¢ tampouco possuem canoas; cada uma das aldeias dos distritos de Kiriwina ¢ Luba, situadas na costa oriental, com acesso indireto ao mar, tem apenas uma canoa e poucos especialistas em construcdo; Por outro lado, alguns nativos das aldeias da laguna sio bons navegadores ¢ excelentes construtores. Os melhores ceniros de construgéo de canoas encon- tram-se nas ilhas de Vakuta e Kayleula; embora em menor escala, essa arte encontra-se também desenvolvida na aldeia de Sinaketa. A ilha de Kitava é 0 centro tradicional da construgao de canoas; é de 14 que, nos dias atuais, vém as melhores canoas ¢ as que possuem melhores trabalhos de entalhe em madeira. Essa ilha, que realmente pertence a ramificagao oriental dos massim do norte, € néio & sua ramificagao ocidental, precisa ser incluida em nosso relato sobre as canoas, visto que a mitologia da canoa e a arte de sua fabricagdo em Boyowa se acham associadas a Kitava. ARGONAUTAS DO PACIFICO OCIDENTAL 103 Ha atualmente cerca de 64 canoas masawa nas ilhas Trobriand ¢ em Ki- tava, Destas, aproximadamente quatro pertencem ao distrito do norte, onde nao se pratica o Kula; as restantes so todas construidas e usadas para 0 Kula, Nos capitulos anteriores, falei sobre as “comunidades do Kula’, ou seja, aldeias que praticam o Kula em conjunto, velejam juntas nas expediges ao além-mar ¢ realizam entre si um Kula interno. Agruparemos as canoas segundo a comu- nidade kula a que pertencem. Kiriwina : vevensancare con SACNRORS Luba s * Sinaketa . i: acca F * Vakuta mp wens BE Kayleula sve coe ve CREA ™ BBE, os cores oes connie veers erea de 12” Total para todas as comunidades kula: 60 canoas ‘A esse total devemos acrescentar as canoas do distrito do norte, que no entanto jamais so usadas no Kula. No passado esse ntimero era, aproximada~ mente, duas vezes maior que atualmente; primeiro porque h4 algumas aldeias que outrora possufam canoas mas agora n&o possuem nenhuma; segundo, por- que é consideravel 0 mimero de aldeias que se tornaram extintas ha algumas geragoes. H4 aproximadamente meio século, havia, s6 em Vakuta, cerca de sessenta canoas; em Sinaketa pelo menos vinte; em Kitava, trinta; em Kiriwina, vinte; e em Luba, dez. Quando todas as canoas de Sinaketa e Vakuta viajavam para o sul e outras vinte ou trinta provenientes das ilhas Amphlett e de Tewara se juntavam a clas, uma frota realmente imponente se dirigia para Dobu. Passando agora a questo da propriedade das canoas em Kiriwina: a ca- noa mais importante ¢, logicamente, a que pertence ao chefe de Omarakana. Essa canoa vai sempre 4 frente das demais; em outras palavras, ocupa, nas grandes viagens cerimonais do Kula, denominadas uvalaku, uma posic&o privi- egiada. E guardada num grande abrigo construido na praia de Kaulakuba (veja fig, 22 e 30), & distancia de aproximadamente uma milha da aldeia; € nessa praia também que se constroem as novas canoas. A canoa atual (veja fig. 21 e 41) 6 chamada Nigada Bw'a — “implorando por uma noz de areca”. Cada ca- noa tem um nome particular todo seu, as vezes uma simples expressiio adequa- da, como a que acabamos de mencionar, as vezes uma referéncia a algum inci- dente especial. Uma canoa nova freqiientemente herda o nome de sua prede- cessora, mas as vezes recebe um novo nome, A atual canoa de Omarakana foi construida por um mestre-construtor de Kitava; sua tabua de proa foi entalhada também por ele. J4 ndo hd em Omarakana ninguém capaz de construir ou enta- Ihar com perfeicdo. As formulas mégicas deveriam ter sido enunciadas pelo atual chefe, To'uluwa; visto, porém, que ele tem pouca capacidade para memorizar as formulas, a magia foi executada por um de seus parentes. ‘Todas as outras canoas de Kiriwina sio também guardadas em galpdes, cada um deles numa praia de areias brancas e limpas na costa oriental. O chefe ou lider de cada aldeia € 0 toliwaga. Em Kasana’i, a sub aldeia de Omarakana, a canoa, chamada Tokwabu (algo semelhante a “‘marinheiro de égua doce”) com pretensa modéstia, foi construida por Tbena, chefe da mesma posigio social, mas de menores poderes que To'uluwa; € ele também o foliwaga. Outros nomes tipicos das canoas sio: — Kuiyamataym — “Cuide-se”, ou seja, “pois eu pas- sarei A sua frente”; a canoa de Liluta ¢ denominada Siya’i, que € 0 nome de 104 MALINOWSKI um dos postos do governo, onde alguns nativos de Liluta certa vez ficaram presos; Topusa — um peixe voador; Yagwa'u — um espantalho; Akamia'u — “Devorarei os homens”, porque a canoa foi presente dos canibais de Dobu. No distrito de Luba hé atualmente apenas trés canoas; uma delas pertence ao chefe de mais alta posicao social na aldeia de Olivilevi. E a maior canoa existente nas ilhas Trobriand. As duas outras se encontram na aldeia de Waleia e pertencem a dois lideres, cada um deles governando uma secdo da aldeia; a fig. 27 mostra uma dessas canoas no processo de reamarragio. A grande colénia de Sinaketa, que se compée de diferentes segmentos de aldeia, também possui canoas. Ha aproximadamente quatro construtores e enta- thadores habilidosos, e quase todos os nativos de Sinaketa tem bons conheci- mentos sobre a construgio de canoas. Em Vakuta, o numero de peritos é ainda maior. O mesmo acontece em Kayleula e Kitava. CAPITULO V A construgao cerimonial de uma waga T A construgéo da canoa mar{tima (masawa) esta inextricavelmente ligada aos tramites gerais do Kula. Como j4 dissemos, em todas as aldeias onde se pratica 0 Kula as canoas masawa so construfdas ¢ restauradas apenas em co- nexdo direta com o Kula. Em outras palayras, assim que uma expedigio kula tiver sido marcada, e a data de sua realizagao estabelecida, todas as canoas da aldeia precisam passar por uma vistoria, e aquelas que estiverem velhas demais para ser consertadas devem ser substituidas por canoas noyas. Sendo que a re- novacao difere muito pouco dos estigios posteriores e cerimoniais do processo de construgio, 0 relato que apresentamos neste capitulo abrange as duas coisas. Para o nativo, a construgao da canoa é o primeiro elo da corrente formada pelos atos do Kula, Desde 0 momento em que uma 4rvore é derrubada até a volta da expedi¢ao maritima, ha um fluxo continuo de atividades, umas em sucessao as outras. Endo € s6 isso: como veremos, a construcdo é interrompida e entremeada de rituais mAgicos. Alguns destes referem-se a canoa, outros per- tencem ao Kula. Portanto, 0 processo de construgéo das canoas e o primeiro estégio do Kula acham-se sobrepostos. Além disso, 0 langamento da canoa e, de maneira especial, o kabigidoya (visita de apresentagao formal) constituem por um lado os atos finais da construgéo de canoas e, por outro, pertencem ao Kula, Ao relatarmos 0 processo de construcao das canoas, portanto, comegamos a longa série de acontecimentos que formam uma expedi¢io kula. Nenhum relato sobre o Kula estaria completo se dele omitissemos 0 processo de cons- trucao de canoas Neste capitulo, as atividades sero descritas uma apés as outras, tal como elas se processam na rotina normal da vida tribal, ou seja, obedecendo ao dita- me dos costumes e aos preceitos da crenga, estes iltimos constituindo influéncia mais rigorosa e marcante que os primeiros. E necessirio que, ao seguir este re- lato consecutivo, o leitor tenha em mente nao s6 0 mecanismo sociolégico espe- cifico subjacente as diversas atividades, mas também o sistema de idéias postas em pratica no sentido de controlar o trabalho ¢ a magia, A organizacio social j4 foi descrita no capitulo anterior. Devemos lembrar-nos de que 0 proprietario, © perito ou os especialistas, 0 pequeno grupo de ajudantes ¢ a comunidade in- teira constituem fatores sociais, cada um deles preenchendo diferentes fungdes na organizacao e realizagao dos trabalhos. Quanto as idéias magicas que gover- nam os diversos rituais, vamos analisé-las posteriormente, neste e em alguns dos préximos capftulos, e também no capitulo XVII. Por ora, basta dizer que per- tencem a diferentes sistemas de idéias. O sistema baseado no mito da canoa voadora est diretamente relacionado 2 canoa; sua finalidade € conterir 4 canoa um alto grau de exceléncia e, de maneira especial, fazer com que ela seja veloz Os rituais do outro tipo sao, na realidade, exorcismos de prevengdo contra fei- tigos maléficos (bulubwalata), dos quais os nativos tém muito medo. O terceiro sistema de magia (executada durante a construgio da canoa) é a magia do Kula, 106 MALINOWSKI que est baseada em seu proprio ciclo mitolégico e, embora executada sobre a canoa, tem por finalidade fazer com que o ‘oliwaga consiga éxito nas suas tran- sagées kula. Finalmente, no inicio das atividades, hd uma magia destinada ao tokway, 0 espitito maligno das selvas. A construgio de uma canoa se processa em dois estagios principais que diferem um do outro quanto ao carater dos trabalhos, quanto @ magia que os acompanha ¢ quanto ao cendrio sociolégico geral. No primeiro estagio prepa- ram-se as partes componentes da canoa. Derruba-se uma drvore grande, desbas- tam-se-lhe os galhos e a folhagem, ¢ 0 tronco assim obtido é escavado para servir como casco principal da canoa; preparam-se também as pranchas, tabuas, caibros e sarrafos. Tudo isso € feito através de um trabalho vagaroso, realizado com calma, ¢ executado pelo construtor da canoa com 0 auxilio da alguns aju- dantes — em geral, seus proprios parentes ou amigos, ou entdo os do foliwaga Esse estdgio geralmente se prolonga por muito tempo — de dois a seis meses — € se efetua aos arrancos, sob a dependéncia de outras ocupagées ou con- forme a disposicao dos nativos. Os encantamentos e rituais que o acompanham pertencem & magia do tokway e as do ciclo da canoa voadora. A esse primeiro estagio pertence também o trabalho de entalhe das tébuas de proa decorativas, que € executado as vezes pelo construtor ¢ as vezes por um outro técnico, caso © construtor nfo saiba entalhar. O segundo estdgio caracteriza-se por intenso trabalho comunitério. Via de regra, desenvolve-se num pequeno espaco de tempo, de talvez uma ou duas se- manas, incluindo-se os intervalos de descanso entre um servigo e outro. O tra- batho em si, do qual a comunidade inteira se ocupa com energia, leva de dois a cinco dias apenas, Consiste na montagem das pranchas e tabuas de proa, no reajustamento das mesmas caso nao se estejam encaixando bem e, a seguir, na amarragio dessas partes. A seguir faz-se a montagem e a amarragdo do flutua- dor externo, a impermeabilizacao e pintura da canoa, Simultaneamente, se pro- cessa_a confecgdo das velas que pertence, portanto, a este estigio. Via de regra, a parte principal da canoa é construida de uma vez s6, e leva aproximadamente um dia; ou seja, as tébuas de proa sio encaixadas, os suportes ¢ as tabuas sao montados, ajustados ¢ amarrados. Outro dia de trabalho é devotado 4 montagem do flutuador © & amarracao da estrutura do flutuador externo e da plataforma A calafetacao ¢ pintura si também feitas de uma vez s6, ou talvez em duas ou mais vezes, enquanto a vela € confeccionada em mais um outro dia de tra- balho. Esse céleulo de tempo € apenas aproximado, visto que o tamanho da canoa ¢ o ntimero de nativos que estao participando do trabalho comunitédrio variam consideravelmente. O segundo estégio do processo de construco da ca- noa é acompanhado pela magia do Kula e por uma série de exorcismos realiza- dos sobre a canoa; esta magia é executada pelo proprietério e nao pelo constru- tor ou pelo especialista. Este ultimo, porém, dirige os pormenores técnicos do processo, durante 0 qual € assistido e aconselhado por construtores de outras aldeias, por peritos em navegacao, pelo foliwaga e por outras pessoas de desta- que. A amarracao da canoa, que é feita com um tipo de trepadeira especialmente resistente, conhecida pelo nome de wayugo, € acompanhada de ritos e formulas mégicas talvez os mais importantes, pertencentes ao sistema de magia da canoa voadora. I Tomada a deciséo de construir-se uma waga, 0 préximo passo é a escolha de uma arvore cujo tronco possa servir como casco. Essa néo é uma tarefa muito facil nas ilhas Trobriand. Visto que a planicie inteira é usada como terra ARGONAUTAS DO PACIFICO OCIDENTAL 107 de cultivo, apenas os pequenos trechos de solo fértil na orla de coral que con- torna a ilha permanecem cobertos de selva. E nesse local que a arvore precisa ser encontrada e abatida; ¢ desse local que os nativos a transportam para a aldeia, Escolhida a érvore, o foliwaga, 0 construtor ¢ alguns ajudantes dirigem-se ao local; um rito preliminar deve realizar-se antes que a Arvore seja abatida, Um pequeno corte € feito no tronco, de modo a poder colocar-se nele uma pequena porcao de alimento ou um pedaco de noz de areca. Fazendo disso uma oferenda ao tokway (espirito da selva), o feiticeiro profere um encantamento: FEITICO VABUSI AOS TOKWAY “Descei, 6 espirito da selva, 6 tokway, moradores dos galhos, desceit Descei, moradores das forquilhas dos galhos, dos brotos dos galhos! Descei, vinde, vinde comer! Ide a vosso afloramento de coral; reuni-vos todos 14, infestai o local, fazei 14 vosso clamor, dai ali vossos gritos!” “Descei de nossa arvore, velhos espiritos! Esta é uma canoa de ma repu- taco; esta € uma canoa da qual fostes banidos por vergonha; esta é uma canoa da qual fostes expulsos! No raiar do sol, pela manhd, ajudai-nos 2 abater a canoa; esta (€) a nossa drvore, velhos espiritos, abandonai-a ¢ deixai-a cair!” Esta férmula magica, que aqui é apresentada em tradugZo livre € que, no entanto, segue muito de perto o original, palavra por palavra, é bem mais clara que os textos de magia tipicos das ilhas Trobriand. Na primeira parte, 0 tokway € invocado sob diversos nomes, instado a abandonar o local onde mora © mu- dar-se para algum outro lugar, onde se sinta a vontade. Na segunda parte, men- ciona-se a canoa sob varios epitetos; todos estes denotam uma atitude de des- cortesia ou mau agouro. Isso obviamente tem por fim obrigar o fokway @ aban- donar a arvore. Em Boyowa, 0 yoba, ou ato de expulsdo, em dadas circunstan- cias constitui um grande insulto e por vezes provoca obediéncia imediata. Isso sempre acontece quando aquele que expulsa pertence a subcla local de uma aldeia ¢ o native expulso nao pertence a ela. O yoba, porém, & sempre um ato de fortes conseqiiéncias; jamais usado sem razOes, ¢ neste encantamento traz consigo todas essas associagdes sociolégicas. Na forma antecipatéria usual que caracteriza a fala nativa, a arvore € chamada “canoa” (waga) neste encantamento. ‘A finalidade desta férmula evidencia-se plenamente em cada uma das pa- lavras que a compoem, ¢ os nativos a confirmam dizendo que é absolutamente necessdria e que, sem ela, eles nfo poderiam ver-se livres dos tokway. A tradi- cdo nao prevé de maneira muito clara 0 que poderia acontecer se os tokway nao fossem expulsos; isso também nao est expresso na formula magica ou no rito. Alguns informantes afirmam que a canoa seria pesada; outros dizem que a madeira teria muitos nés ¢ que haveria muitos furos na canoa ou, ainda, que ela apodreceria rapidamente. Mas, embora as razdes que fundamentam essa expulsdo nao estejam bem definidas, a crenca na influéncia maligna do tokway e nos perigos aliados & sua presenca ¢ bem definida. Isto est4 de acordo com a natureza geral do tokway, como 6 encontramos delineado pela crenca nativa. De um modo geral, 0 tokway € um ente maligno, muito embora o mal que causa raramente seja mais que uma brincadeira desagradavel, talvez um susto inesperado, um ataque de dores agudas, ou um furto. Os tokway moram em arvores ou em rochas € rochedos de coral, usualmente no raybwag, a selva primitiva existente na orla litoranea e cheia de afloramentos de coral ¢ rochas. Alguns nativos j4 viram 0 fokway, embora ele possa tornar-se invisivel & vontade. E de pele marrom como todo nativo de 108 MALINOWSKI Boyowa, mas tem cabelos longos e lisos e barba comprida. Ele vem geralmente & noite, ¢ assusta as pessoas. Embora o fokway raramente apareca as pessoas, pode-se freqiientemente ouvir seu gemido, vindo dos galhos de uma 4rvore gran- de; algumas arvores evidentemente abrigam maior ntimero de tokway que outras, j& que nelas se pode ouvi-los muito facilmente. Por vezes 0 encantamento © o rito que acabamos de mencionar sdo executados sobre essas drvores, onde os nativos ouvem freqiientemente os tokway se assustam. Em seu contato com os homens, os tokway mostram seu lado desagradavel; geralmente aparecem de noite para furtar alimentos. Citam-se muitos casos em que, o que parecia ser uma pessoa apanhada no ato de roubar inhame de um celeiro, subitamente desaparecia — era um tokway. Algumas formas mais leves de doenga sao causadas também pelos tokway. Dores agudas, agulhadas e ferroa- das internas séo em geral devidas a eles, pois eles podem, através de magia, inserir objetos pequenos, afiados e pontiagudos no corpo. Por sorte, alguns nati- vos conhecem férmulas magicas com as quais esses objetos podem ser extraidos. De acordo com a regra geral da feitigaria, esses mesmos nativos também podem, € claro, infligir os mesmos males. Em épocas passadas, os rokway revelaram estas férmulas magicas, tanto as benéficas quanto as maléficas, a algumas pessoas; desde entéo, essa modalidade de feiticaria e de cura concomitante vem sendo passada de uma geragao para a outra. Voltemos, porém, a canoa. Depois de executado o ritual, a arvore é abatida. Nos tempos de outrora, quando se usavam apenas implementos de pedra, esse trabalho deve ter sido penoso: enquanto varios nativos golpeavam a arvore com seus machados, outros se ocupavam de afiar as laminas gastas ou quebradas. A técnica antiga resumia-se em “mordiscar” a madeira, tirando-Ihe pequenas lascas, e devia demorar muito até que se fizesse um corte suficientemente profundo para derrubar a drvore. Abatida a arvore, faz-se um desbastamento preliminar, no proprio local, Os galhos sao retirados ¢ se corta o tronco no tamanho apropriado para se construir a canoa. Esse lenho é cortado de modo a assumir mais ou menos a forma da canoa, de modo a diminuir-lhe o peso, pois que agora ele tem de ser arrastado até a aldeia ou a praia. Nao é tarefa muito facil transportar 0 tronco, pois ele tem de ser puxado para fora do acidentado e rochoso raybwag e depois arrastado por estradas ruins. Colocam-se no chao, em espacos de poucos metros, pedagos de madeira — sobre estes, o tronco pode deslizar mais facilmente de que sobre as pedras ¢ 0 terreno acidentado. Apesar disso, e apesar do fato de que varios nativos séo convocados para ajudar, 0 trabalho de transportar o tronco é muito 4rduo. As pessoas recebem alimentos em troca de seu trabalho. Distribui-se carne de porco cozida, com inhame assado; nos intervalos do trabalho, os nativos recuperam suas energias bebendo agua de coco verde e chupando cana-de-aciicar. Esses alimentos, oferecidos durante 0 servigo em pagamento ao trabalho comunitario, séio denominados puwaya. Para indicar quéo arduo é, por vezes, o trabalho, 0 nativo costuma se expressar de maneira tipicamente figurada: “A came de porco, a égua de coco, © inhame ja acabaram e, contudo, nés puxamos — muito pesado!” ENCANTAMENTO DO KAYMOMWA’U “Descei, descei, contaminagao por contato com o excremento! Descei, contaminagéo por contato com o refugo! Descei, peso! Descei, podridao! Descei, fungo!...” e assim por diante, invocando inimeras deterioracoes para que saiam do tronco, e a seguir varias contaminagdes ¢ tabus rompi- ARGONAUTAS DO PACIFICO OCIDENTAL 109 dos. Em outras paiavras, 0 peso e a lentidao, devidos a todas essas causas mégicas, sio expulsos do tronco. Esse punhado de capim é ento jogado fora, ritualmente. E chamado mom- wa's, ou “punhado pesado”, Toma-se mais um punhado do longo capim lalang, murcho e seco — € 0 gagabile, o “punhado leve”, com o qual mais uma vez se bate na canoa. O significado desse rito é bastante evidente: o primeito punhado de capim puxa para si o peso do tronco; o segundo dé a ele Jeveza. Ambos os encantamentos também expressam esse significado de maneira evidente, A se- gunda férmula, que ¢ protetida com o punhado de grama gagabile, diz o seguinte: ENCANTAMENTO DO KAYGAGABILE “Ele nao me pode ultrapassar” (repetido varias vezes). “A canoa estre- mece com a velocidade” (varias vezes). Proferem-se, entao, algumas pala- vras intraduziveis ©, a seguir, invoca-se uma longa série de nomes ances- trais. “Eu te agoito, 6 arvore; a atvore voa; a arvore passa a ser como 0 so- pro do vento; a arvore passa a ser como uma borboleta; a rvore passa a ser como a penugem do caroco do algodéo. Um sol (i. e., tempo) por com- panheiro meu, 0 sol do meio dia, o sol poente; outro sol para mim” — (profere-se aqui o nome do recitador) —, “o sol levante, os raios do sol (le- vante), (a hora de) abrir as choupanas, (a hora em que) a estrela da ma- nha aparece!” Essa tltima parte significa 0 seguinte: “Meus companheiros chegam ao sol poente, enquanto eu chego com o sol levante” — (indi- cando, com isso, que minha canoa ultrapassa a deles em velocidade).* Estas formulas magicas sio empregadas ndo s6 para fazer com que o tronco fique mais leve ao ser puxado até a aldeia, mas também para torna-lo de ma- neira geral mais veloz ao ser transformado numa waga. Depois que o tronco foi finalmente trazido para a aldeia, os nativos 0 colo- cam no baku, a praga central, sem, no entanto, retirar imediatamente as ama ras usadas para arrasté-lo, as quais sao denominadas duku. Isso se faz. através de um cerimoniai, na manhi do dia seguinte e, por vezes, até mesmo depois de passados dois ou trés dias. Os homens da aldeia se revinem, e aquele encarre- gado de escavar 0 tronco, ou seja, 0 construtor (tota'ila waga, 0 “escavador da canoa”) executa um ritual magico. Ele apanha sua enxé (ligogu) e enrola algu- mas ervas muito leves e finas a0 redor da mina com um pedaco de folha seca de bananeira, a qual, por sua vez, também se acha relacionada A idéia de leve- za, Essa folha é enrolada apenas parcialmente, de forma a deixar uma ampla abertura, através da qual a respiragao e a voz tém livre acesso as ervas e a lami- na da enxé, Nessa abertura, 0 feiticeiro entoa o longo encantamento que se segue: ENCANTAMENTO DO KAPITUNENA NO DUKU “Acenarei para que retrocedam (i. ¢., impedirei que todas as demais ca- noas me alcancem)!”, repetido varias vezes. “No topo da Colina Si’a; mu- theres de Tokuna; minha mie (6) feiticeira, eu proprio (sou) feiticeiro. Ela (a canoa) se langa para a frente, voa a frente. O corpo da canoa é leve: os enfeites de pandano se agitam (com 0 vento); a proa roca as ondas; as tdbuas ornamentais saltam como golfinhos; 0 tabuyo (pequena tébua de “4 Neste © naiguns dos textos de encantamentos que apresentamos a seguir, as palavras que figucam entre parénteses foram adicionadas ao texto de modo a fazer com que a versio inglesa ficasse mais facil de entender. Estdo implicitas no contexte do original nativo. 110 MALINOWSKI proa) corta as ondas; o lagim, (tébua de proa transversal) corta as ondas. ‘Vés dormis na montanha, v6s dormis na ilha Kuyawa, Acenderemos uma pequena fogueira de capim lalang, queimaremos ervas aromaticas (i, e., em nosso paradeiro nas montanhas)! Jovem ou velho, vos ireis a frente. Este é 0 exdrdio da formula. A seguir vem uma parte intermediaria mui- to longa, sob uma forma bastante caracteristica da magia trobriandesa. Essa forma assemelha-se a uma ladainha, pois que ha uma palavra ou expresséo- chave que se repete varias vezes com uma série de palayras ¢ expressdes complementares. A primeira palavra-chave € entéo substituida por outra que, por sua vez, é repetida com a mesma série de expresses; a seguir, vem uma nova palavra-chave, ¢ assim por diante. Temos, pois, duas séries de palavras; cada termo da primeira é repetido varias ¢ varias vezes, com todos os termos da segunda e, desta maneira, com um ntimero limitado de palavras, a formula fica muito longa, visto que sua extensao € produto da extensdo das duas séries de palavras. Nas formulas mais curtas, pode ha- ver apenas uma palavra-chave ¢. de fato, € esse 0 tipo mais comum. Neste feitigo, a primeira série consiste de substantivos que dio nome as diversas partes componentes da canoa; a segunda compée-s¢ de verbos tais como’ cortar, voar, mover-se velozmente, cortar uma frota de canoas, desapare- cer, velejar tocando as ondas. A ladainha, entao, assim se recita: “A ponta de minha canoa se pée em movimento, a ponia de minha canoa voa, a ponta de minha canoa move-se velozmente, etc., etc.” Depois de recitada a longa ladainha, o feiticeiro repete 0 exdrdio e 0 conclui com a palavra onomatopaica convencional, saydididi — que se usa para imitar 0 véo das bruxas. Depois de recitar esse longo encantamento por sobre as ervas e a lamina da enxé, © feiticeiro enrola a folha seca de bananeira, aprisionando assim a forca magica do feitico ao redor da Kimina, com a qual cle golpeia e corta 0 duku (0 cipé usado para arrastar a canoa). O ritual magico nao termina nisso, pois, na mesma noite, quando a canoa € colocada sobre troncos transversais (nigakulu), um novo ritual precisa realizar- se, Alguns tipos de ervas so colocados nos espagos transversais entre esses troncos e 0 casco da canoa. Por sobre essas ervas, mais uma vez, tem de ser proferido um outro encantamento. A fim de nao sobrecarregar 0 presente relato com textos de magia, ndo irei descrever os detalhes desta formula magica. As palavras nela usadas indicam claramente que faz parte da magia da velocidade e consiste de uma formula curta, direta e sem repetigdo remissiva. Depois disso, durante alguns dias, os nativos trabalham na parte externa do casco. As duas extremidades do tronco precisam ser cortadas de modo a fica- rem afiladas, e a parte inferior precisa ser nivelada e aplainada. Feito isso, a canoa tem de ser virada, desta feita em sua posicao normal, com o fundo para baixo e a parte a ser escavada para cima. Antes de iniciar-se a escavagio do tronco, mais uma formula magica tem de ser recitada por sobre o kavilali, um ligogu (enx6) especial usado para este fim; esta enx6 possui um cabo com uma parte mével que permite trabalhar a superficie em diferentes Angulos. O rito se encontra intimamente ligado ao mito da canoa voadora, localizado em Kudayuri, uma localidade da ilha de Kitava, e muitas alusGes sao feitas a a esse mito, “’ Depois de um pequeno exérdio, 0 qual contém palavras magicas intraduziveis, bem como referéncias geogrificas, a formula se expressa do se- guinte modo: © Compare-se, portanto, com o capitulo XII, segiio TV. ARGONAUTAS DO PACIFICO OCIDENTAL Alt ENCANTAMENTO DO LIGOGU “Apanharei uma enx6, golpearei! Entrarei em minha canoa, farei com que voes, 6 canoa, far-te-ei saltar! Voaremos como as borboletas, como o vento; desapareceremos em névoa, desapareceremos de vista. Irés cortar os estreitos de Kadimwatu (entre as ilhas de Tewara e Uwama), iras quebrar © promontério de Saramwa (préximo de Dobu), transpassar a passagem de Loma (nos estreitos Dawson), desaparecer a distancia, desaparecer com 0 vento, sumir. Abre caminho por entre tuas algas (i. e., ao chegar a canoa junto a praia). Veste tua grinalda (provavelmente alusao as algas marinhas), faz teu leito na areia. Eu me viro, vejo os homens de Vakuta, os homens de Kitava atrés de mim; meu mar, o mar de Pilolu (i. ¢., a porgao de mar entre as ilhas Trobriand e as ilhas Amphlett); hoje os homens de Kudayuri fardo suas fogueiras (i. ¢., nas praias de Dobu). Prenda tua saia de palha, 6 canoa” — (menciona-se aqui o nome préprio da canoa), — “voa!” Nes- ta tltima frase ‘esté implicita a idéia de que a canoa partilha da natureza de uma bruxa voadora, como ocorre no mito kudayuri. Depois disso, o construtor de canoas da inicio a escavacao do tronco. Essa uma tarefa longa e dificil, que requer muita habilidade, especialmente nos esté- gios finais, quando os bordos da canoa precisam ser suficientemente afinados ¢ a madeira deve ser aplainada de maneira uniforme em toda a superficie. Embora, no inicio, o construtor seja geralmente auxiliado por algumas pessoas — seus filhos, irmos ou sobrinhos, os quais, ao ajudé-lo, vao aprendendo o oficio —, nos estagios finais ele tem de executar o trabalho sozinho. Por conseguinte, 0 estdgio final sempre leva muito tempo. Com freqiiéncia a canoa permanece intacta durante varias semanas, protegida contra o sol por folhas de palmeira, e com um pouco de Agua dentro a fim de evitar que a madeira resseque e rache (veja fig. 25). O carpinteiro entio pée-se novamente a trabalhar por alguns dias, tazendo depois nova pausa. Em quase todas as aldeias a canoa é construida na praca central, ou em frente da cabana do construtor. Nalgumas das aldeias orientais, o trabalho de escavagao é feito na praia, evitando arrastar o pesado tronco para dentro e para fora da aldeia. Paralelamente ao trabalho de escavacao, as demais partes da canoa vao sendo aprontadas para a montagem. Quatro pranchas largas e compridas para formar a amurada; pedacos de madeira em forma de L para o cavername; vigas com- jas preparadas para servir como suporte longitudinal do cavername ¢ da plataforma; vigas curtas que formam a parte transversal da plataforma e cons- tituem os suportes principais do flutuador externo; pequenas varas para amar- rar 0 flutuador as vigas transversais; finalmente, o proprio flutuador, um tronco comprido e volumoso. Essas sao as principais partes componentes da canoa, @ serem feitas pelo construtor. As quatro tébuas esculpidas também sao feitas por ele, se souber entalhar; caso contrério, algum outro especialista precisa encarre- gar-se dessa parte do trabalho (veja fig. 26). Quando todas as partes estéo prontas, um novo ritual magico precisa ser executado. Denomina-se kapitunela nanola waga: “cortar a mente da canoa”, expresso que denota wna mudanga de intengéo, uma decisdo final. Neste caso, a canoa decide navegar velozmente. A formula € breve; contém, em seu inicio, algumas palavras obscuras ¢ a seguir algumas referéncias geogrdficas a certas loca- lidades do arquipélago d’Entrecasteaux. E proferida sobre algumas gotas de dleo de coco que, entao, sao embrulhadas num pequeno pacote. O mesmo encanta- mento é novamente proferido sobre a lamina do ligogu, sobre a qual esté enro- lado um pedaco de folha de bananeira, 4 maneira jA descrita. A canoa é virada 112 MALINOWSKI de cabeca para baixo; 0 pacote contendo o dleo de coco ¢ posto sobre ela ¢ gol- peado com a enxd. Com isso, a canoa estd pronta para ser armada, ¢ completa- se 0 primeiro estagio de sua construgao. ul Como jd dissemos, os dois estégios diferem entre si no que diz respeito tanto a0 trabalho feito quanto ao cenario sociolégico e cerimonal. Até aqui vimos apenas algumas pessoas empenhadas no trabalho de cortar a arvore, escavar 0 tronco € preparar as varias partes da canoa. Laboriosamente, de maneira vaga- rosa e deliberada, com muitas interrupcdes, empenham-se em seu trabalho, sen- tadas na terra batida em frente das cabanas, ou escavando a canoa na preca central. A primeira parte da tarefa, ou seja, a derrubada da Arvore, levou-nos a selva alta e 40 mato intricado que se enrola ao redor das formas fantdsticas das rochas de coral. ‘Agora, no segundo estagio, 0 cendrio muda para a arcia limpa, branca como a neve, de uma praia de coral, onde centenas de nativos ostentando ornamentos festivos retinem-se ao redor do casco recém-raspado da canoa. As tabuas enta- Ihadas, pintadas de preto, branco e vermelho, a orla verde de arvores palmei- ras, 0 azul do mar — tudo isso empresta um colorido especial a cena vivida e movimentada. Foi assim que vi a construcao de uma canoa na praia oriental das ilhas Trobriand, e € nesse cendrio que ela me vem a lembranca. Em Sinaketa, em vez de mar azul e aberto a quebrar-se numa faixa de espuma branca atras da orla de recifes e chegando em ondas limpidas até a praia, hd 0 marrom fosco e 0 verde lodacento da laguna, que adquire tonalidade de puro verde-esmeralda no local onde comeca o fundo arenoso ¢ limpo. Devemos agora imaginar o casco da canoa sendo transportado da aldeia para um destes dois cenérios, depois de feitos todos os preparativos ¢ espalhada pelas aldeias vizinhas ¢ convocacdo do chefe ou do lider da aldeia. Quando se trata de um grande chefe, varias centenas de nativos se retinem para ajudar ou para assistir aos trabalhos. Quando uma pequena comunidade governada por um lider de classe social inferior constréi sua canoa, apenas algumas dezenas de nativos aparecem — os parentes da esposa do lider e de outros nativos de destaque, € seus amigos mais préximos. Depois que 0 corpo da canoa ¢ todos os acessérios esto devidamente pre- parados, iniciam-se as cerimOnias com um ritual magico denominado Katuliliva tabuyo. Esse ritual pertence a magia do Kula, para a qual os nativos tém uma expressiio especial: chamam-na mwasila. Est relacionada 4 insercdo das tabuas de proa ornamentais nos encaixes existentes nas duas extremidades da canoa Essas partes ornamentais sio as primeiras a serem colocadas — e isso se faz através de um cerimonial. Alguns raminhos de hortela sio colocados sob as té- buas a medida que elas vao sendo encaixadas, e 0 toliwaga (proprietirio da ca- noa) usando uma pedra especial importada de Dobu, martela as tébuas, até que estejam bem ajustadas, repetindo ritualmente a férmula da magia mwasila. A hortela (sulumwoya) desempenha papel importante no mwasila (magia kula), como também nos feiticos de amor e na magia da beleza. Sempre que uma subs- tancia € preparada magicamente para fins de atracao, seducao ou persuasao, costuma-se usar 0 stdumwoya. Essa planta figura também em diversos mitos, onde desempenha fungao semelhante: © herdi mitico sempre domina o inimigo ou con- quista uma mulher através do uso do sulumwoya. Nao irei aduzir as {6rmulas magicas no presente relato, exceto a mais im- portante delas. Mesmo um pequeno resumo de cada uma delas iria interromper a narrativa, prejudicando a seqiiéncia do relato concatenado das diversas ativi- ARGONAUTAS DO PACIFICO OCIDENTAL 113 dades. As varias complexidades do ritual mégico ¢ das férmulas serao expostas ‘no capitulo XVII. Podemos, no entanto, adiantar que nao s6 existem varios tipos de rituais magicos executados durante a constructo de uma canoa, tais como o mwasila (magia do Kula), a magia da velocidade da canoa, exorcismos contra a magia negra, e 0 exorcismo dos tokway, mas também que, dentro de cada um desses tipos, existern diferentes sistemas de magia, cada um com seus prdprios fundamentos mitol6gicos, cada um localizado num distrito diferente ¢ cada um com férmulas proprias e ritos ligeiramente diversos. * Depois que as tabuas de proa sao encaixadas ¢ antes que se execute 0 pro= ximo estagio do trabalho técnico, mais um ritual mégico precisa ser levado a efeito. O corpo da canoa, agora tesplandecente com as tabuas de trés cores, empurrado para a 4gua. Um punhado de folhas de um arbusto chamado bobi'w é encantado pelo proprietério ou pelo construtor, ¢ o corpo da canoa é lavado na Agua do mar com essas folhas. Todos os homens participam desse ritual de lava- gem, cujo objetivo € tornar a canoa veloz, removendo os vestigios de qualquer influéncia ma que, apesar da magia anterior realizada na waga, possa ainda ter permanecido. Depois de esfregada e lavada, a waga é puxada para a praia nova- mente e colocada sobre os troncos de suporte, Os nativos passam agora & parte principal e mais importante do seu traba- Iho, que consiste em montar as pranchas laterais sobre os bordos do tronco escavado, de modo a formar o vao profundo e largo da canoa assim aumentada. Essas pranchas sao fixadas por uma estrutura interna composta de doze a vinte pares de cavernas de madeira, as quais sfo amarradas com um cip6 especial de- nominado wayugo e os furs ¢ intersticios calafetados com uma substancia resinosa, Nao posso aqui entrar nos detalhes da construc&o, embora sob o ponto de vista tecnoldgico seja esta a fase mais interessante desse trabalho, que nos mostra © nativo as voltas com verdadeiros problemas técnicos. Toda uma série de partes componentes precisa ser montada com considerdvel preciso, sem o auxilio de instrumentos exatos de medigao. Fazendo calculos aproximados com base em longos anos de experiéncia e grande habilidade, o construtor prevé 0 formato ¢ © tamanho relativo das pranchas, os ngulos e as dimensdes das cavernas de ma- ceira © 0 comprimento das diversas vigas. Ao preparar essas pecas ¢ A medida que 0 trabalho se processa, 0 construtor testa e experimenta as diversas partes para verificar se se ajustam corretamente e, em geral, o resultado final € satisfa- t6rio. Agora, porém, no momento em que todas as partes finalmente tem de ser encaixadas umas as outras definitivamente, quase sempre acontece que uma ou outra no se ajusta bem as demais. Esses detalhes tm de ser retificados: ov 0 casco da canoa precisa ser escavado mais um pouquinho, ou uma determinada prancha ou viga tem de ser encurtada ou aumentada. Os nativos dispéem de um meio bastante eficiente de amarrar uma parte adicional a uma prancha curta demais ou que, devido a algum acidente, se tenha quebrado na ponta. Quando todas as pecas estdo afinal perfeitamente ajustadas, 0 cavername é colocado den- tro da canoa (veja fig. 27), e os nativos entio 0 amarram ao corpo do tronco es- cavado ¢ as duas vigas longitudinais as quais se prendem as cavernas de madeira. Precisamos agora dizer algumas palavras sobre 0 wayugo, 0 cipé utilizado na amarragdo. Apenas um tipo de cipé é usado para a amarracio das canoas © é de extrema importincia que seja seguro e forte. E unicamente ele que man- tém coesas as diversas partes da canoa e, quando o mar esta violento, quase tudo % Ha uma discussio pormenorizada sobre esse assunto no capitulo XVII, segio IV. 114 MALINOWSKI depende da resisténcia das amarras as forcas de pressio. As outras partes da canoa — as vigas externas — sao mais facilmente testaveis ¢, visto serem feitas de madeira forte e elastica, em geral oferecem boa resisténcia 4 acao do tempo. Dessa forma, o fator de perigo e instabilidade de uma canoa reside principal- mente na amarracéo, Nao é de admirar, portanto, que a magia do cipé seja considerada um dos rituais mais importantes no processo de construgao da canoa. De fato, o termo wayugo, nome dado A espécie de cipé utilizado na amar- racdo, 6 também usado como termo geral para toda a magia da canoa. Quando um nativo tem a honra de possuir ou ter construido uma canoa segura e veloz, os demais nativos geralmente explicam o fato dizendo que ele possui ou conhece “um bom wayugo”. Pois, como em qualquer outro sistema de magia, ha varios tipos de encantamento wayugo. O ritual é praticamente 0 mesmo: cinco rolos de cip6 séo colocados sobre uma grande travessa de madeira no dia anterior e tratados magicamente pelo proprietério da canoa em sua propria casa. Tsso tam bém pode ser feito pelo construtor, mas apenas excepcionalmente. No dia se- guinte, os rolos de cipé sao cerimonialmente trazidos 4 praia na travessa de madeira. Num dos sistemas de wayugo hé um ritual extra no qual o toliwaga (proprietario da canoa), apanhando um pedaco do cip6, enfia-o num dos bura- cos feitos nas bordas do tronco para a amarragao e, puxando-o de um lado para © outro, entoa mais uma vez 0 encantamento. Em vista da importincia deste tipo de magia, apresentaremos a férmula completa. Ela consiste de um exérdio (u'ula), uma parte principal dupla (tapwa- na), € uma conclusao (dogina).“' ENCANTAMENTO DO WAYUGO No w'ula primeiro se diz “Refeicao sagrada (ou ritual) de peixes, interior sagrado”, fazendo assim aluséo & crenga de que o foliwaga precisa, quando realiza este ato de magia, participar ritualmente de uma refeicdo de peixe assado. A seguir vém as palavras: “Esvoacai, ramo de bétel, deixando para tras", que se referem a idéias centrais da magia da canoa: o tremular dos galhardetes de pandano; a noz de bétel, que, em outros ritos, so efereci- dos aos espiritos dos ancestrais; a velocidade, gracas & qual todos os com- panheiros serfio deixadas para tras! ‘A seguir vem uma relacéo de nomes de ancestrais. Dois deles, provavel- mente personagens miticos, possuem nomes significativos: “Mar Tempes- tuoso” © “Espumante”. Os baloma (espiritos) desses antepassados sao entao convidados a sentar-se nos deslizadores de canoa para mascar o bétel, ¢ depois solicitados a levar o galhardete de pandano de Kudayuri — locali- dade situada em Kitava, onde teve origeni a magia da canoa voadora — ao topo de Teula ou Tewara — pequena ilha proxima da costa oriental de Fergusson. ‘A seguir, 0 feiticeiro entoa: “Irei voltar-me, irei voltar-me em vossa dire- cao, 6 homens de Kitava, ficareis para trés, na praia de To’uru (na laguna de Vakuta). A vossa frente estende-se 0 braco de mar de Pilolu. Hoje eles acendem a fogueira festiva de Kudayuri, e tu, 6 minha canoa” (0 nome pré- prio da canoa é entao proferido), “segura tuas saias ¢ voa!” Neste trecho — que é praticamente idéntico a um trecho do feitico do ligogu, acima apre- sentado — ha alusio direta ao mito kudayuri e ao costume das fogueiras festivas. Mais uma vez, 0 feiticeiro dirige-se 4 canoa como se ela fosse uma mulher que tem de segurar sua saia de palha para voar, uma referéncia a 51 E preciso estarmos bem familiarizados com a mitologia do Kula e da construgdo de ca- rnoas (capitulo XII) para que possamos entender por completo o significado deste encantamento. ARGONAUTAS DO PACIFICO OCIDENTAL is crenga de que uma bruxa voadora segura as saias ao partir para os ares, como também a tradi¢ao de que esse mito originou-se com Na’ukuwakulo. uma das irmas voadoras kudayuri. A parte principal da férmula, que se segue, continua com essa alusio mitica: Na'ukuwakula voou de Kitava a Simsim, atravessando Sinaketa e Kayleula; em Simsim ela fixou moradia ¢ transmitiu sua magia a seus descendentes. Neste feitigo, as trés localidades: Kuyawa (um regato e uma pequena colina préximos de Sinaketa), Dikutuwa (um rochedo préximo de Kayleula), e La’u (um rochedo partido, localiza- do no mar, préximo de Simsim, nas ilhas Lousancay) sio as_palavras principais do tapwana. A Ultima sentenca da primeira parte, servindo de transicdo 20 fapwana, € a seguinte: “Empunharei o cabo da enx6, agarrarei todas as paries com- ponentes da canoa” — talvez nova alusao 2 construcao mitica da canoa Kudayuri (Cf. cap. XIE, sec. TV) —, “voarei ao topo de Kuyawa, desapare- cerei; vou diluir-me em névoa, em fumaca; ficarei como um remoinho de vento, ficarei sozinho no cimo de Kuyawa”. As mesmas palavras sio entao repetidas, substituindo-se a palavra Kuyawa pelos nomes dos dois outros lo- cais acima mencionados, um apés 0 outro, © dessa forma retracando-se 0 voo de Na’ukuwakula. O feiticeiro volta, entio, ao comego e recita o feitigo novamente até a frase “segura tua saia e voa”, que desta feita 6 seguida de uma segunda tapwana: “Com 0 casco de minha canoa vou distanciar-me de todos 0s meus companheiros; com a tébua de proa de minha canoa vou distanciar-me de todos os meus companheiros, etc., etc.,” repetindo essa jactincia profética com todas as partes da canoa, como se costuma fazer na parte interme- didria dos feiticos magicos. No dogina, iiltima parte do encantamento o feiticeiro se dirige 2 waga em termos mitolégicos, com alusdes ao mito Kudayuri, ¢ acrescenta: “Ca- noa, tu és um espirito, tu és como um remoinho de vento; desaparece de vista, 6 minha canoa; voa; transpée tua passagem-de-mar de Kadimwatu, airavessa 0 promontério de Saramwa, ultrapassa Loma: desaparece aos pou- cos, desaparece, desvanece-te com um remoinho, desvanece-te com a né- voa; deixa tua marca na areia, corta teu caminho entre as algas do mar, vai, veste tua grinalda de ervas aromaticas.” °? Depois que o wayugo foi ritualmente trazido para a praia, tem inicio a amar- ragio da canoa, Primeiro si0 colocadas e amarradas as cavernas de madeira, a seguir as pranchas e com isso est4 terminado o corpo da canoa. O tempo despen- dido nesta tarefa é varidvel. dependendo do ntimero de pessoas que estfio aju- dando e do mimero de consertos ¢ ajustes a serem feitos na montagem final. Por vezes, um dia inteiro de trabalho & gasto nesse estagio, ¢ a préxima parte do trabalho, a construgao do flutuador externo, tem de ser adiada, E esse 0 estdgio seguinte, e ndo hd magia para acompanhar o curso das atividades técni- cas. O grande tronco inteirico € colocado paralelamenie & canoa ¢ diversos paus curtos pontudos fo enfiados nele. Os paus so colocados transversalmente na parte superior do flutuador (lamina). A seguir, as pontas desses paus sao amar- radas a diversas vigas horizontais, as quais tem de ser enfiadas através de um lado do corpo da canoa e fixadas no outro. Tudo isto naturalmente requer novos ajustamentos e encaixes. Quando esses paus ¢ vigas esto atados uns aos outros, 2 estrutura resultante é forte, porém eléstica, e mantém a canoa e o flutua- 5 Compare-se com a andlise lingiistica deste encantamento, feita no capitulo XVIII. 116 MALINOWSKI dor paralelos um ao outro; diversas vigas horizontais, colocadas transversalmente aos dois, mantém-nos unidos. A seguir, essas vigas sao atravessadas com nume- rosas varas longitudinais, amarradas umas as outras, e dessa forma constréi-se uma plataforma entre a borda da canoa e a extremidade superior dos paus do flutuador. Feito isso, est4 pronta a estrutura completa da canoa, e o que resta fazer 6 apenas calafetar os furos e intersticios. A massa para calafetagem € preparada na cabana do toliwaga; um encantamento € proferido sobre ela na noite anterior a0 trabalho de calafetagem. E entdo mais uma vez a comunidade inteira se retine para realizar o trabalho no espaco de um dia. ‘A canoa esta pronta para ser navegada; falta somente a pintura que é apenas ornamental. Mais trés rituais magicos, no entanto, precisam ser executados antes que a canoa seja pintada e lancada & agua. Todos esto diretamente relacionados a canoa, ¢ tém por objetivo proporcionar-lhe velocidade. Ao mesmo tempo, cada um dos trés constitui um tipo de exorcismo contra possiveis influéncias malignas resultantes de profanacdes ou quebra de tabus que poderiam ter profanado a waga. O primeiro é denominado Vakasulu, termo que significa algo como “cozi- mento ritual” da canoa. O toliwaga tem de preparar um verdadeiro caldeirao das bruxas, nele colocando uma variedade de coisas que mais tarde sio queimadas sob a canoa; supde-se que a fumaca produzida exerca influéncia no sentido de puri- ficar a canoa e torné-la veloz. S40 os seguintes os ingredientes: as asas de um morcego, 0 ninho de um passaro muito pequeno chamado posisiku, algumas folhas secas de samambaia gigante, um pouco de algodao e capim lalang. Todas essas substincias esto associadas ao véo e a leveza. Os gravetos usados para acender © fogo so de mimosa (liga), arvore de madeira leve. Os gravetos tém de ser obtidos atirando-se um pedaco de pau na arvore (nunca uma pedra); ao cairem, ‘fs galhos quebrados devem ser apanhados com as maos, para que nao toquem no solo. O segundo rito, denominado Vaguri, é apenas um exorcismo; consiste em encantar uma vareta ¢, a seguir, golpear com ela a canoa em toda a sua super- ficie. Isso serve para expulsar feitigos malignos (bulubwalaia) que, € de suspeitar. tenham sido lancados por algum rival invejoso ou por pessoas invejosas do toliwaga, Finalmente, 0 terceiro rito, 0 Kaytapena waga, consiste em encantar uma tocha de folhas de coqueiro por meio de uma férmula adequada e com cle fumegar a parte interna da canoa. Isso da velocidade @ canoa e, mais uma vez, a purifica. Depois de alguns dias de descanso, a parte externa da canoa ¢ inteiramente pintada em trés cores. Sobre cada uma dessas cores ¢ pronunciado um encan- tamento especial, sendo o mais importante sobre @ cor negra. Este ultimo jamais pode ser omitido, a0 passo que os encantamentos sobre o vermelho e o branco so opcionais. No rito da cor negra é mais uma vez usada uma mistura de substancias — uma folha seca de samambaia, capim e um ninho de posisiku —. tudo isso é queimado com uma casca de coco, é as primeiras pinceladas com a tinta preta sao dadas com essa mistura. O resto é pintado com uma mistura aquosa de casca de coco queimada. Para a pintura vermelha, usa-se uma espécie de ocre importado das ilhas d’Entrecasteaux; a tinta branca é feita de terra calcdria existente em determinadas partes da praia. ‘A vela € confeccionada num outro dia, geralmente na aldeia, através de trabalho comunitario; com muitas pessoas a ajudar, esse trabalho enfadonho ¢ complicado é feito em tempo relativamente curto. A forma triangular de vela é, antes de mais nada, marcada com pequenas estacas no chao; geraimente usa-se por modelo uma vela ja feita. Feito isso, tiras de folha seca de pandano sao ARGONAUTAS DO PACIFICO OCIDENTAL 17 estendidas no chao e fixadas ao longo das bordas da vela. A seguir, comecando no vértice superior do triangulo, os nativos colocam tiras que sao estendidas até a base, costurando-as umias 4s outras com furadores feitos de osso de morcego © usando como fio tiras finas da folha do pandano especialmente enrijecida. Duas fileiras de tiras sao costuradas umas sobre as outras, de modo a obter-se um tecido resistente. a A canoa agora esta pronta para o langamento. Antes, porém, que passemos deserigdo do lancamento cerimonial e das festividades afins, devemos fazer uma ou duas observacées retrospectivas sobre as atividades acima descritas. Todo o primeiro estagio da construgao de canoas — ou seja, a derrubada da arvore, a escavacao do tronco © o preparo das demais parte componentes, bem como toda a magia associada a essas atividades — é realizado apenas quando se constréi uma canoa nova, O segundo estagio, porém, precisa ser realizado com todas as canoas antes de qualquer grande expedicao maritima do Kula. Nessa ocasido, todas as canoas precisam ser reamarradas, recalafetadas e pintadas de novo. Isso naturalmente Tequer que todas elas sejam desmontadas e, a seguir, amarradas, calafetadas e pintadas exatamente como se faz com uma canoa nova. Toda a magia relativa a esses trés processos ¢ entdo realizada, na devida ordem, sobre a canoa refor- mada. Assim sendo, podemos dizer que 0 segundo estagio da construgao de canoas nao s6 é realizado sempre em funcao do Kula, mas que, sem ele, jamais se pode organizar qualquer grande expedicio. Jé apresentamos uma descricao dos tituais magicos e enumeramos as idéias implicitas em cada um deles. Ha, porém, mais uma ou duas caracteristicas gerais a mencionar. Em primeiro lugar, hé o que se poderia chamar de “dimensao cerimonial” dos rituais magicos. Em outras palavras: em que medida os membros da comunidade participam desses rituais? Participam ativamente ou simplesmente demonstram interesse, comportando-se como expectadores atentos? Ou, ainda, embora presentes, prestam pouca atengao e demonstram apenas um minimo de interesse no que veem? No primeiro estagio da construgo de canoas, os rituais sao executados pelo proprio feiticeiro, que tem sua disposigao apenas alguns auxiliares. Os demais habitantes da aldeia em geral ndo se sentem suficientemente interessados e moti- vados para ajudar nem sao obrigados a isso por forca do costume. O cardter geral desses rituais assemelha-se mais a uma técnica de trabalho do que a uma ceri- ménia. A preparacao ¢ © encantamento das ervas usadas na magia do ligogu, por exemplo, sao feitos de maneira prosaica e direta, tanto no comportamento do feiticeiro quanto no daqueles que se retinem casualmente ao seu redor, nada indicando que algo de especial interesse possa estar ocorrendo na rotina do trabalho. Os rituais do segundo estagio so ipso jacto assistidos por todos aqueles que auxiliam na montagem e amarracdo da canoa, mas, em geral, os presentes nao tém qualquer incumbéncia especial na realizado desses rituais. Quanto a atencéo e comportamento dos nativos durante a execugao desses rituais, muita coisa depende, é claro, da posicao social do feiticeiro, ou seja, se ele é um chefe muito importante ou nativo de baixa posigao social. Em qualquer caso, observa-se um certo decoro e siléncio durante os rituais. Muitos dos presentes podem, no entanto, sair de seu lugar e afastar-se, se quiserem. O feiticeiro ndo da a impressao de um sumo sacerdoie a oficiar uma ceriménia solene, mas sim a de um operdrio especializado a executar um trabalho particularmente importante. Devemos lem- 118 MALINOWSKI brar que todos os rituais sao simples ¢ os encantamentos recitados em piiblico so proferidos em voz baixa, rapidamente, sem qualquer impostagao de voz espe- cialmente ressonante. Os rituais da calafetagem e do wayugo sio também, pelo menos em algumas modalidades de magia, executados na cabana do feiticeiro, sem a ptesenca de qualquer outra pessoa; 0 mesmo se dé com o ritual da pin- tura negra. Outra questo de importancia geral é a que poderiamos chamar de “‘o rigor dos rituais magicos”. Na magia da canoa, por exemplo, a expulsio do tokway, © corte ritual das amarras com que se arrasta 0 tronco, 2 magia da enx6 (ligogu), do cip6 de amarracao (wayugo), da calafetagem e da pintura negra jamais podem ser omitidos, ao passo que os outros rituais séio facultativos, embora em geral pelo menos alguns sejam executados, Porém, mesmo os que sao considerados indispensdveis nao possuem todos 0 mesmo grau de importancia na mitologia e no pensamento nativo, e isso é claramente expresso no comportamento dos nati- vos e na sua maneira de referir-se aos rituais, Desse modo, o termo geral para a magia da canoa é wayugo ou ligogu; disso podemos deduzir que esses dois encantamentos sio considerados os mais importantes. O nativo refere-se a seu wayugo como sendo melhor que o de outro, ou entao diz que aprendeu seu ligogu com seu préprio pai. Além disso, como veremos, esses dois ritos sa expli citamente citados no mito da canoa. Por outro lado, o rituai de expulsio dos tokway, embora sempre realizado, é decididamente reconhecido pelos nativos como de importancia secundaria. O mesmo se dé com a magia da calafetagem e da pintura negra. Uma questo menos geral, mas de grande interesse, é a que se refere aos feiticos malignos (bulubwalata) e aos tabus violados. Tive de mencionar diversos exorcismos feitos contra essas influéncias e devo agora dizer alguma coisa a respeito delas. O termo bulubwalata abrange todas as modalidades de magia negra ou bruxaria. Ha o feitico lancado contra os porcos, para fazé-los fugir de seus donos e esconder-se na mata; ha bulubwalata para desviar a afeicao de uma esposa ou namorada; ha magia negre contra as plantacdes e — talvez a mais temida — 0 feitico contra a chuva, que produz a seca e a fome. A magia negra contra as canoas, que as torna lentas, pesadas ¢ impréprias & navegacio, ¢ também muito temida. Muitos nativos professam conhecé-la, mas ¢ muito dificil para o etndgrafo obter-Ihe a formula; eu consegui obter apenas uma. Supde-se sempre que essa frmula seja praticada pelos proprietérios de. uma canoa, contra as embarcacées que considera como perigosas rivais. dela HA muitos tabus referentes a uma canoa ja construida; iremos examina-los mais tarde, ao falarmos sobre a navegagao € o manejo da canoa. Antes que esse estagio seja atingido, porém, qualquer tipo de profanagao decorrente do contato de alguma substancia impura com o tronco escavado da canoa pode fazer com que ela se torne vagarosa e inadequada; se alguém caminhar por cima do tronco de uma canoa, ou nele ficar de pé, o resultado sera igualmente desastroso. Mais uma questio deve ser mencionada aqui. Como j4 vimos, 0 primeiro ritual magico do segundo estdgio da construg&o € realizado sobre as tabuas de proa. Pode-se portanto perguntar se os desenhos entalhados nessas tabuas tém algum significado magico. Devemos claramente entender que qualquer conjetura ou especulagao feita sobre questdes de origem deve ser rigorosamente excluida de uma pesquisa de campo etnogrifica como a nossa, Para conseguir uma res- posta sociolégica empirica, o etnégrafo precisa considerar duas categorias de fatos. Antes de mais nada, ele pode perguntar diretamente aos nativos se as tébuas de proa ou quaisquer dos desenhos que nelas aparecem sfo feitos com finalidades magicas. Quer ele dirija a pergunta ao nativo comum, quer ao ¢5 cialista em questoes de magia da canoa ou em trabalhos de entalhe, em Kiriwina ARGONAUTAS DO PACIFICO OCIDENTAL 119 a resposta serd sempre negativa. Ele pode, entao, perguntar se nas férmulas do ritual mAgico hé quaisquer referéncias as tabuas de proa ou a quaisquer de seus motivos decorativos. Também, neste caso, a evidéncia é em geral negativa. Num dos encantamentos — pertencente néo a magia da canoa, mas & magia do Kula (cf. cap. XIII, sec. II, 0 feitigo Kayikuna Tabuyo) — pode-se encontrar uma alusdo feita as tabuas de proa, mas s6 no que se refere ao termo geral que as descreve, e ndo a qualquer motivo especial de decoragéo. Desse modo, a tnica relacao entre a decoracdo da canoa ¢ a magia consiste do fato de que dois rituais magicos so associados as tabuas de proa: um deles j4 foi aqui mencionado, e o outro sera mencionado no inicio do proximo capitulo. ‘A descricio do processo de construgao de canoas e, com efeito, todos os dados apresentados neste capitulo, referem-se apenas a um dos dois tipos de canoas maritimas existentes no distrito do Kula. Os nativos do semicirculo orien- tal do Kula usam embarcagdes maiores ¢, em alguns aspectos, melhores que as masawa. A principal diferenca entre o tipo oriental e o ocidental reside no fato de que as canoas maiores tem bordos ou lados mais altos ¢, portanto, maior capacidade de carga, como também maior calado. Sua maior altura oferece maior resistencia ao desvio da rota, permitindo que essas canoas naveguem coin vento de través. Conseqiientemente, as canoas orientais oferecem maior resisténcia a0 vento, e os nativos que as conduzem nao precisam depender tanto da direco da brisa. A isso também est relacionada a posigéio do mastro, o qual, nesse tipo de canoas, esta fixado na parte central do casco, de maneira permanente, ¢ no € retirado ao fim de cada viagem. Obviamente, portanto, o mastro também nao precisa ser mudado de posi¢a’o cada vez que a canoa muda de rumo. Embora eu nao tenha observado o proceso de construcéo de uma nagega, nome pelo qual essas canoas siio conhecidas, acredito que seja uma tarefa tecni- camente muito mais dificil do que a da construgao de uma masawa. Fui infor- mado de que tanto 0s rituais magicos quanto os de construcio sao praticamente os mesmos para os dois tipos de canoa. ‘A nagega, ou seja, 0 tipo maior, de maior navegabilidade, é usada na segao do circuito do Kula que se estende de Gawa até Tubetube. E também usada em certas regides do distrito Massim que estdo fora do circuito do Kula, tais como a ilha de Sud-Est e suas vizinhas menores; é também usada pelos massim do sul que habitam o continente. Mas, embora seu uso esteja muito disseminado, sua construgao est4 confinada a alguns poucos lugares. Os centros mais importantes de construgdo de canoas nagega sio Gawa, algumas aldeias das ilhas Woodlark, a ilha de Panayati ¢ talvez uma ou duas localidades da ilha de Misima. A partir destes locais, as canoas sao trocadas ao longo de todo o distrito, constituindo uma das mais importantes formas de comércio nesta parte do mundo. As canoas masawa, por outro lado, sdo usadas e fabricadas no distrito de Dobu, nas ilhas Amphlett, no arquipélago de Trobriand, em Kitava e Iwa. Uma questo de grande importancia na relagao entre esses dois tipos de canoa é que, desde ha duas geracdes, uma delas vem se desenvolyendo as custas da outra. De acordo com informagées seguras, obtidas em varias localidades das ilhas Trobriand e Amphlett, a nagega, ou seja, 0 tipo de canoa mais pesado, mais adequado A navegacdo maritima, desapareceu ha algum tempo das ilhas Amphlett ¢ Trobriand. A masawa, em muitos aspectos inferior, porém menos dificil de se construire mais veloz, vem suplantando o tipo maior. Antigamente, ou seja, hd aproximadamente duas ou trés gerac6es, apenas a nagega era usada em Iwa, Kitava, Kiriwina, Vakuta e Sinaketa, ao passo que os habitantes das ilhas Amphlett ¢ os nativos de Kayleula usavam geralmente a nagega, embora por vezes vele- jassem na masawa. Dobu era a verdadeira sede e centro das canoas masawa. Nao consegui verificar exatamente quando a mudanca comecou a ocorrer ¢ quando 120 MALINOWSKI foi completada; mas 0 fato 6 que nos tempos atuais até mesmo as aldeias de Kitava e Iwa constroem a masawa, 0 tipo menor de canoa, Assim sendo, a canoa, um dos mais importantes objetos culturais, esta se difundindo do sul para o norte, Hé, entretanto, uma questéo sobre a qual nao consegui obter informacdes precisas, ou seja, se nas ilhas Trobriand a nagega era, em épocas passadas, Importada de Kitava, ou se era manufaturada no local por artesoes importados (como até mesmo nos dias atuais por vezes s¢ faz em Kiriwina), ou ainda se os proprios nativos de Trobriand sabiam construir grandes canoas. Nao hé divida, porém, de que antigamente os nativos de Kitava e Iwa costumavam manufaturar fuas proprias canoas nagega. O mito kudayuri (veja capitulo XII) e a magia a cle associada referem-se a esse tipo de canoa. Portanto, certamente nesse dis- trito, e provavelmente também nas ilhas Trobriand e Amphlett, nao s6 0 uso, mas também a produgao das canoas maiores vém sendo substituidos em favor das menores, as canoas masawa, agora encontradas em todas essas regides. ILUSTRACOES E MAPAS MENCIONADOS NO TEXTO* “Indicam-se entre colchetes as paginas onde as ilustragdes se localizam no texto, segundo o original inglé FIGURA DO FRONTISPICIO UM DOS ATOS CERIMONIAIS DO KULA (Ver p. 344.) 380 Eastern Neo ines 4 the AdjacentArchipele Brot Cb: Seigmon Teobnond F GERIES ey en ey font quilts peers power Meme! erg (Trt, “The Mefanesizas 07 by Rin Perso? we pe MAPA I - Os vocibulos nativos € sua grafia, tais como aparecem neste € nos demais mapas do presente volume, seguem os principios da nomenclatura cartografica tradicio- nal. Nos mapas III-V figuram os vocabulos nativos, verificados por mim, em sua trans- ctigao fonética. [P. 20, antes da Introdugio] 381 FIG. I- A TENDA DO ETNOGRAFO NA PRAIA DE NU’AGASI Esta foto ilustra 0 modo de vida entre os nativos, descrito na segao IV. Observar (com referéncia aos capitulos IV ¢ V) 0 tronco escavado de uma canoa, ao lado da tenda e, A esquerda, uma canoa masawa, protegida por folhas de palmeira. [Entre pp. 26 ¢ 27) FIG. Il - A LISIGA (CABANA PARTICULAR) DO CHFE, EM OMARAKANA To’uluwa, o chefe atual, de pé em frente & cabana (cf. capitulo II, segaio V); & esquerda, entre as palmeiras, a tenda do etnégrafo (veja seco IV) e, agachados a sua frente, um grupo de natives, [Entre pp. 26 ¢ 27] FIG. Ill - RUA DE KASANA’I (EM KIRIWINA, NAS ILHAS TROBRIAND) Cena cotidiana, mostrando grupos de nativos em suas ocupagdes didrias. (Veja segdes IV e VIII.) [Entre pp. 26 ¢ 27.) FIG. Iv CENA EM YOURAWOTU (ILHAS TROBRIAND) Um dos atos rituais, bastante complexo, mas bem definido, dos que compdem o sagali. Sob a confusio aparente, existe um sistema bem definido de principios, econémicos e cerimoniais (veja segdes IV e V). [Entre pp. 26 27.] 383 MAPA II - © diagrama mostra a area geogrifica dos massim e sua relagio com os distritos habitados pelos papua-melanésios ocidentais ¢ papuas. Reproduzido do livro Melanesians of British New Guinea, por gentil permissio do professor C. G. Seligman. [P. 38, antes do cap. 1 aero THE NORTHERN 1 THe BRANCH ASS = THE SOUTHERN MASSIM MAPA III - 0 distrito do Kula. Mapa esquematico, mostrando as subdivisées dos mas sim ¢ os locais de importancia fundamental no Kula. [P. 40.] 384 FIG.V - CENAS DA PRAIA DE SILOSILO (DISTRITO MASSIM MERIDIONAL) Estas cenas representam fases do so’, o grande festejo anual. (Veja segao III; cf. também © capitulo XXL) Note-se o pape! proeminente das mulheres nesses rituais; 0 uso dos cabos de machado cerimoniais; 0 modo como se carregam os porcos; as canoas encalha- das na praia. [Figuas Ve VI, entre pp. 42 € 43.] FIG. VI- CENAS DA ALDEIA NO DECORRER DO FESTEJO SOT Estas fotos mostram varios tipos de massim meridionais com seus enfeites. Observar novamente o papel predominante das mulheres nos atos cerimoniais (veja segao II). 386 FIG. VII- NAS ILHAS AMPHLETT Frente maritima da aldeia principal, em Gumasila (ou Gumawana). (Veja segao V.) [Entre pp. 50¢ 51] e > wag a a ¢ . 3 ie ae Tyi|\\s ee, ar ROS: VOS NA ALDEIA DE TUKWA'UKWA ‘a, com os nativos agachados aqui e acola, para egao I. [Entre pp. 52.e 531 FIG. VIII- GRUPO Esta foto ilustra o tipo de al ilu i FIG. IX - “ARISTOCRATAS” DE KIRIWINA Tokulubakiki, filho do chefe, Towese’i ¢ Yobukwa’u, que pertencem, respectivamente, & categoria de status mais elevado ¢ A ligeiramente inferior. Note-se a beleza de seus tracos e expressio inteligente; estdo os trés entre meus melhores informantes. (Veja se- ges Ie V.) [Entre pp. 50¢ $1.] FIG. X - PESCADORES DE TEYAVA Tipos de plebeus de uma aldeia na laguna. (Veja segao 1.) [Entre pp. 50 ¢ 51.] 389 The Trobnand lands OPEN SEA (walum) > ape) yen, ny BOYOWA TROBRIAND LAGOON (wanpoM) Nanoucaitp eninge Phiage 098 Bent, SEA-ARM OF PILOLU MAPA IV - O arquipélago de Trobriand, também chamado Boyowa ou Kiriwina. [P.54.] 390 FIG. XI- UMA TIPICA NAKUBUK WABUYA (MULHER SOLTEIRA) Esta foto ilustra o tipo rude, embora formoso, de mulher plebéia (veja segao I). [Entre pp. $4 ¢ 55] FIG. XII-JOVENS DE BOYOWA Este tipo de pintura do rosto e de enfeites é usado pelas jovens de uma expedigao ka- tuyausi (veja segao IL). [Entre pp. $4 ¢ 55.] FIG. XIIl- DANGA KAYDEBU Os nativos se dispdem em circulo para dangar no baku de Omarakana, carregando seus escudos de madeira talhada. (Veja seo IIL.) Observar os cocares, feitos com penas de cacatua, singelos, mas pitorescos. {Entre pp. 58 e 59] FIG. XIV - OS DANGARINOS OSTENTAM ORNAMENTACAO COMPLETA ‘A foto mostra um dos segmentos do circulo de dangarinos a executar o kaydebu. Aldeia de Yalaka. (Veja segao III.) [Entre pp. $8 ¢ 59.) FIG. XV- UMA FAMILIA NATIVA Tokulubakiki, nativo de Omarakana, junto & sua mae, esposa e filhos. (Veja segao VI.) Observe-se 0 celeiro, com os inhames visiveis através dos intersticios. [Entre pp. 62 53] FIG. XVI- BRACELETES A foto mostra diferentes tipos, em diversos tamanhos ¢ tipos de acabamento. [Entre pp. 74 75.] 394 soulava FIG. XVII - DOIS HOMENS EXIBEM OS BRACELETES A foto ilustra o modo como os braceletes so comumente enfeitados com contas, pingen- tes e tiras feitas do pandano seco. Nao me lembro de ter visto homens usando os bracele- tes, a ndo ser uma ou duas vezes — e nessas ocasides ostentavam a ornamentagao completa de danga. [Entre pp. 74¢ 751 395 FIG. XVIII -DOIS COLARES FEITOS DE DISCOS DO SPONDYLUS VERMELHO A esquerda, 0 soulava ou bagi, o verdadeiro artigo kula. A direita, 0 katudababile (ou samakupa, como é conhecido entre os massim do sul) feito de discos maiores manufatu- rados nas aldeias de Sinaketa e Vakuta (ilhas Trobriand). O katudababile nfio desempe- nha fungdo de importancia no kula (veja segao III; cap. XIV, segdo II; cap. XV, segoes Me IID). [Entre pp. 76 ¢ 77.) 396 FIG. XIX - DUAS MULHERES ENFEITADAS COM COLARES A foto ilustra 0 modo como o soulava é usado, quando ostentado como enfeite. (Veja segdo III.) [Entre pp. 76 ¢ 77.] ¥ oie a FIG. XX - UMA REUNIAO KULA NA PRAIA DE SINAKETA Mais de oitenta canoas se acham ancoradas ou atracadas na praia, numa faixa de mais de dois quilémetros. Cerca de dois mil nativos, vindos de varios distritos, desde Kitava até Dobu, reinem-se na aldeia, na praia e em localidades vizinhas. Isso ilustra 0 modo como o Kula congrega grande niimero de pessoas pertencentes a diferentes culturas; neste caso, os de Kitava, Boyowa, ilhas Amphlett ¢ Dobu (veja segao Ill e cap. XVI, segio II). [Entre pp. 82 € 83.] 397 FIG. XXI- UMA CANOA MASA WA ‘Nigada Bu'a, a canoa maritima de Omarakana, Note-se sua forma geral, a ornamenta- ao das tabuas de proa, os remos em forma de folha, o formato de flutuador externo. (veja segdes Le I1.e também o préximo capitulo.) [Entre pp. 92 e 93.) FIG. XXII -COLOCANDO A CANOA EM SEU ABRIGO ‘As canoas das praias orientais de Boyowa raramente sio usadas; quando nio esto em uso, so guardadas em abrigos, construidos de maneira semelhante a das choupanas comuns, mas bem maiores. [Entre pp. 92 ¢ 93,] 398 FIG. XXIII- UMA CANOA VELEJANDO A foto ilustra 0 cordame, a inclinagZo da canoa — o flutuador erguido — e a capaci- dade de carga. Esta canoa esti bem dentro da agua, com uma tripulagdo de dezoito homens (veja segao Ie cap. IX). [Entre pp. 92 93.] FIG. XXIV - CANOA DE PESCA (KALIPOULO) Na foto superior, o perfil de uma canoa, onde aparecem a silhueta do casco, a largura relativa das pranchas laterais, e a forma da canoa. A foto de baixo mostra a proa, as tabuas de proa, a plataforma ilustra a maneira como o flutuador externo é atado a0 casco. (Veja segio II.) [Entre pp. 94¢ 95,] FIG. XXV -O TRONCO ESCAVADO NA ALDEIA No baku de uma das aldeias de Sinaketa, um tronco sendo escavado para transformar-se no casco de uma canoa, A porgao ainda nao escavada fica coberta com folhas de co- queiro. (Veja segdo II.) [Entre pp. 108 e 109.] FIG. XXVI- ENTALHANDO UM TABUYO Molilakwa, entalhador-mestre (tokabitam), da os retoques finais ao tabuyo (tabua de proa oval) feito para uma nova canoa de Olivilevi. Os entalhes sio feitos com martelo de madeira ¢ um prego de ferro comprido (no passado, usava-se um osso de canguru). (Veja segao II.) [Entre pp. 108 ¢ 109.] 401 FIG. XXVII - CONSTRUGAO DE UMA WAGA No processo de reamarragio, esta canoa foi parcial mente desmontada. A fotografia mos- tra o cavername ¢ as partes que compdem o flutuador externo. Os nativos estavam insta- lando uma nova prancha lateral (vista ao fundo) que se encaixa nas tabuas de proa entalhadas ¢ na ranhura da parte superior do casco (veja segao III). O proprietario ¢ o feiticeiro aparecem a direita da foto, [Entre pp. 118 ¢ 119.] FIG. XXVIII - CONFECGAO DA VELA No espago de poucas horas diversos nativos executam a enorme tarefa de coser, umas as outras, as pequenas tiras feitas da folha do pandano (veja segio III e, no proximo cap., a segao IT) até formar-se a vela. Entre os nativos da foto ha um albino. (Entre pp. 118 e 119.] FIG. XXIX - OS ROLOS DE FOLHAS SECAS DO PANDANO E este o material com que se confeccionam as velas. O bisila (galhardete) é feito de um tipo mais flexivel de folha do pandano, alvejado ao fogo. [Entre pp. 118 ¢ 119,] FIG. XXX - LANCAMENTO DE UMA CANOA A canoa Nigada Bu’a, depois de restaurada, é langada a agua. [Entre pp. 122 ¢.123.] 403 FIG. XXXI- TASASORIA NA PRAIA DE KAULUKUBA Os nativos erguem os mastros e preparam as velas para a regata. Em primeiro plano, To’ uluwa, chefe de Kiriwina, de pé junto ao mastro, supervisiona o trabalho de aparelha- mento da canoa Bu’a. [Entre pp. 122 e 123] me FIG. XXXII - CELEIRO DE UM CHEFE EM KASANA‘1 A foto ilustra a exposigiio dos tubérculos de inhame por entre as vigas das paredes, € os enfeites de coco colocados ao redor da cumeeira, ao longo dos suportes ¢ sobre as paredes. Este celeiro foi construido recentemente e as tébuas do frontdo ainda nao foram colocadas. (Veja segao IV.) [Entre pp. 122 123] 404 FIG. XXXIII - ABASTECIMENTO DE UM CELEIRO EM YALUMUGWA Os inhames sfo retirados dos montes cénicos ¢ colocados dentro dos bwayma (celeiros) pelo cunhado (irmao da esposa) do proprietario. Observar a ornamentacao do frontio — 0 proprietirio deste celeiro é um gumguyalu (chefe de posig&o social mais baixa). (Veja segao IV.) [Entre pp. 122¢ 123.) FIG. XXXIV - EXIBIGAO DE PORCOS E INHAMES NO SAGALI (CERIMONIA DE DISTRIBUIGAO DE ALIMENTOS) Todos os alimentos a serem distribuidos sao exibidos varias vezes antes, durante e depois da ceriménia. A exposigao de alimentos nos grandes receptaculos de forma prism: (Pwata') constitui uma das facetas dos costumes trobriandeses. (Veja segao IV.) [Entre pp. 136 ¢ 137] 405 FIG. XXXV - O TRABALHO COMUNITARIO DE COZIMENTO DO MONA (PUDIM DE TARO) Grandes potes de barro importados das ilhas Amphlett so usados para esse fim; neles se ferve, primeiro, 0 dleo de coco; em seguida, juntam-se pedagos de taro pilado, en- quanto um dos nativos mistura tudo com uma longa colher de madeira decorada. [Entre pp. 136¢ 137] FIG. XVI- CENA TIPICA DO WASI (TROCA CERIMONIAL DE PRODUTOS AGRICOLAS POR PEIXE) Uma comitiva vinda de uma aldeia do interior traz seus inhames, de barco, & aldeia de Qburaku, que é praticamente inacessivel por terra. Os nativos da foto estéio colocando os inhames em engradados de madeira, a fim de transporta-los a aldeia cerimonialmente € colocé-los a frente da casa do parceiro, (Veja segao VII.) [Entre pp. 136 ¢ 137] 406 FIG. XXXVII-0 VAVA (TROCA DIRETA DE PRODUTOS AGRICOLAS POR PEIXE) Nesta foto, nativos do interior trocam diretamente feixes de taro por peixe sem observa rem os rituais e ceriménias obrigatérios no wasi. (Veja seg&o VI.) [Entre pp. 136 ¢ 137. FIG. XXXVIII - KOUTA'UYA, UM DOS CHEFES DE SINAKETA Kouta’uya em frente de um dos seus celeiros decorados; sua lisiga (casa de moradia) aparece ao fundo. [Entre pp. 164 ¢ 165.] 407 FIG. XXXIX - UMA CANOA CARREGADA Uma canoa masawa na praia de Nu'agasi (nas ilhas Amphlett), com a carga principal no gebobo (compartimento central da canoa). [Entre pp. 164 165.] FIG. XL- UMA DAS CANOAS WAGA NUMA EXPEDICAO KULA ‘A canoa com carga completa e com uma tripulagao de doze homens, prepara-se para ferrar a vela, aproximando-se das ilhas Amphlett. A carga esta colocada no gebobo; note-se também a bagagem pessoal de cada nativo, embrulhada em esteira e colocada sobre a carga. [Entre pp. 176 ¢ 177.] 408 FIG. XLI - APRESTAMENTO DE UMA CANOA Toda vez que se inicia uma viagem, o mastro precisa ser erguido e firmado por meio de suportes e por uma armag&o especial de pequenas pegas transversais em forma de meia-lua € uma corda, como aparece na foto (veja segio II). Note-se a pequena canoa kewo'v a esquerda. [Entre pp. 176 ¢ 177.] FIG. XLII - PAISAGEM DAS ILHAS AMPHLETT. [Entre pp. 210 ¢ 21 1.) 409 FIG. XLIIl- ANCORADOURO DA ALDEIA PRINCIPAL DE GUMASILA {Entre pp. 210¢ 211] 410 FIG. XLIV- TECNOLOGIA DA FABRICACAO DE POTES (I) Foto superior: os pedagos de barro so dispostos em circulo ¢ ligados uns aos outros, formando um rolo grosso, de forma circular. Foto inferior: 0 rolo de barro esté sendo moldado de baixo para cima, fechando para o centro. (Veja segao IIL) [Entre pp. 218 e219] 411 FIG. XLV - TECNOLOGIA DA FABRICACAO DE POTES. (II) Foto 4 esquerda: o barro, formando uma ctipula, é moldado em sua parte superior, que em breve serd fechada; visto que esse € um pote pequeno, s6 mais tarde ¢ que 0 barro é batido, como mostra a foto a direita. (Veja segao III.) [Entre pp. 218 e 219.) FIG. XLVI- EXCELENTES AMOSTRAS DOS POTES FABRIC ADOS NAS ILHAS AMPHLETT Os potes maiores, usados somente para o preparo do pudim de taro, so de grande valor. Sao freqiientemente utilizados € exibidos em conex&o com as ceriménias de distri buigdo de alimentos (sagali) e o preparo comunitario da comida. (Veja segao III.) [Entre pp. 220 ¢ 221.] FIG. XLVII- UMA CANOA EM GUMASILA CARREGANDO POTES Os potes, principal produto de exportagao das ilhas Amphlett, tem de ser cuidadosa mente arrumados nas canoas. [Entre pp. 220 ¢ 221.] aia eae ae FIG. XLVIII- UMA FROTA KULA PARANDO PARA EXECUTAR OS RITOS FINAIS DO MWASILA Esta foto, tirada nas ilhas Trobriand, mostra a frota de Dobu chegando a seu destino (cf. capitulo XVI, segao II.) A chegada a praia de Sarubwoyna teria idéntico cena Observe os dois nativos em primeiro plano: estio ambos rumando para a praia a fim de buscar as folhas para o Kaykakaya, (Veja segao 1.) [Entre pp. 252 ¢ 253.] 413 FIG. XLIX - MWASILA — O FEITIGO DA BELEZA Os nativos se preparam para o desembarque final; em cada uma das canoas so lancados feitigos aos cosméticos e os nativos penteiam o cabelo, untam 0 corpo e pintam o rosto. (Veja segio 1.) [Entre pp. 252 ¢ 253,] FIG. L(A)- TRABALHANDO A CONCHA KALOMA (1) ‘A concha spondylus € quebrada e os pedagos sao aparados em forma de circulos grossei ros; esta tarefa é feita pelos homens. [Entre pp. 276 e 277] 414 FIG. L (B) -TRABALHANDO A CONCHA KALOMA (1) ‘As mulheres transformam pedagos de concha em discos achatados. Cada pedago é colo- cado em um orificio na extremidade de um cilindro de madeira e atritado contra um arenito. (Veja segao III.) [Entre pp. 276 e 277. FIG. LI- TRABALHANDO A CONCHA KALOMA (III) n orificio em cada disco (ver segao IID. [Entre pp. 278 ¢ 279.] Por meio de um instrumento de perfuragao faz-se um DATA setembro 1917 out. 1917 - fev. 1918 fev. - margo 1918 meados de margo mais ou menos 28 de marco na mesma época . mais ou menos 25 de marco mais ou menos na mesma época fa mesma época 29 de marco 31 de margo 1.8 de abril 2-de abril no mesmo dia 3 de abril 3 de abril 3a 5 de abril 6 de abril 6 a 10 de abril 10 de abrit 10 a 14 de abril 14 de abril 15 de abril mais ou menos em 21 ou 22 de abril Ais CALENDARIO DA EXPEDICGAO UVALAKU, DE DOBU A SINAKETA, 1918 OUVALAKU ANTERIOR Expedigdo chefiada por Kouta'uya de Sinaketa a Dobu, ESTAGIO PREPARATORIO Construgéo de novas canoas ¢ reforma das antigas. no distrito noroeste de Dobu Fabricagio do sagu, preparagio de objetos para comércio e alimentos. Langamento, aparelhamento e carregamento das canoas; magia prelimi nar. A VIAGEM As canoas de Dobu partem para sua viagem maritima. (Em Boyowa: os nativos de Vakuta voltam de Kitava com uma boa quantidade de mali.) (Nas ilhas Amphlett: preparativos para a viagem: preparacio de ali- mentos: conserto das canoas.) (Em Boyowa: To'uluwa volta de Kitava trazendo mwali,) (Nas ilhas Amphlet: chegam noticias da frota de Dobu que se apro- xima; noticias ds acontecimentos em Boyowa.) (Nas ilhas Amphlett: uma parte das canoas viaja para Vakuta.) A frota de Dobu chega as ilhias Amphlett. Prosseguem viagem até Boyowa. (Das ilhas Amphlett as canoas restantes partem para Boyowa.) (Em Boyowa: os nativos de Sinaketa vao para Kiriwina.) (Em Boyowa: voltam com os braceletes de conchas.) A CHEGADA DOS NATIVOS DE DOBU A BOYOWA. A frotade Dobu chega a Vakuta. Recebem presentes kula, trocam presentes e comerciam em Vakuta. Chegada da frota de Dobu a Sinaketa; magia na praia de Kaykuyawa: recepeiio cerimonial Os nativos de Dobu (bem como os de Amphlett) permanecem em Sina- keta, recebendo presentes kula, dando presentes pari e comerciando. Todos partem de Sinaketa, recebendo presentes falo i (de despedida). Os nativos de Dobu partem para o sul (¢ os de Amphlett vio para Kay leula e para as pequenas ilhtas Trobriand do ocidente). Os nativos de Dobu pescam na lagoa de Sanaroa. A VIAGEM DE VOLTA Reaparecem em Vakuta ¢ recebem seus presentes talot (de despedida). Partem de Vakuta. Tanarere (exibigao ¢ comparagio competitiva) na praia de Sarubwoyna eretorno a Dobu (P.283.) 416 FIG. LIl- TRABALHANDO A CONCHA KALOMA (IV) Os discos de concha, aplainados e perfurados, mas ainda com contornos irregulares, sio agora enfiados em varetas finas e fortes, ¢ desta maneira sio atritados sobre um arenito plano, até que a forma fique cilindrica, isto é, até que cada disco fique um circulo perfeito, (Veja segiio IIL.) [Entre pp.278 ¢ 279.| FIG, LIII - NA PRAIA DE NABWAGETA No centro do quadro pode-se ver uma vela colocada sobre uma armagio de caras; os nativos esto fazendo uma pausa no trabalho de vistorid-la e remenda-la (ver seco I). [Entre pp.286 e 287] 417 FIG. LIV - AS CANOAS DE DOBU NA PRAIA DE SINAKETA [Enire pp. 288 ¢ 289.] FIG. LV - ALGUMAS CANOAS ANCORADAS NA LAGUNA RASA PROXIMA A PRAIA. [Entre pp. 288 € 289.) 418 FIG. LVI- VISITANTES DE DOBU EM SINAKETA Acima: os visitantes do Kula ¢ os anfitrides sentados lado a lado na plataforma de uma casa em Sinaketa. Abaixo: a direita, Tovasana, com uma peruca de fibra de pan- dano, segurando sua vasilha de cal ¢ espatula, e com enfeites de concha buna na perna, senta-se com Kauyaporu (& esquerda), o chefe dos nativos de Dobu, na plataforma de um dos chefes de Sinaketa. Notam-se as ervas aromaticas nos braceletes de Kauyaporu. [Entre pp. 288 ¢ 289] 419 FIG. LVII- ENCANTAMENTO ASSOCIADO A GRAVIDEZ ‘As mulheres esto curvadas sobre um traje especial que seré usado pela mulher gravida Elas quase tocam o traje com a boca, para que ele fique bem impregnado com sua respirag3o que transmite a virtude da formula magica. (Ver segao IV.) [Entre pp. 300 e301] 420 FIG. LVIII - UM RITO DE MAGIA DE GUERRA Kanukubusi, 0 tiltimo feiticeiro de guerra de Kiriwina (ver segao V) faz uma demonstra- ga0 do modo como costumava encantar os escudos antigamente. (Entre pp. 300 e 301.) FIG. LIX - UM RITO DA MAGIA AGRICOLA Uma oferenda de alimento cozido para os espiritos fica exposta, durante algum tempo, no local da plantagao. O feiticeiro, com 0 machado cerimonial apoiado no brago, esté agachado, do lado direito. No primeiro plano vé-se um grande monte de folhas sobre © qual o feiticeiro vai fazer o encantamento. (Ver segio 1V.) [Entre pp. 300 ¢ 301.] “suawoy sonnu 3p ov301090109 » u02 D1u09 anb‘oouoH op —_ twod “oUpYatudasd oJed ODL 2 z0rnA3sUoD oJad SopEtounUOAd ODS auuodsunss ou oj2ax2 ‘SoLino sund}o ap upnfo w woo “4opoyyoua —_SoTUsUPIUEQUE SQ “DEyUD vou DUN DinD{s24 a6 OpuvNb ODI 2 uomnasuos 0 ‘wawoy oo1un wn 40d ajuoupodiouud oppzyoe1 9 DA0U noWND mum ap ovSrU)SUOD Dp oDise20 40d 3;uBWOS DPOZ1) 2 ndoya mysau oyyognss Q ‘ojMaumpueoua oxoud op opssoxa nou g -DownD op mow op auind zof opSpisa a1Sap DISD D vpOy 421 nos njouou nado y :owuauress25u9 3 soquepnfe 2 sornnsuoo ojad SepeUUOY OBS OULD Up soLEd SEINE Joust ‘ew ewnyuou epeavoso 9 voues ep wusaiur aed y | yedouud edesg eEpie ep rediouud wirag couon op eurayxo aured BU OUrEqEsL, Pip oussow op opr UN eeu epezoyo 2s anb 218 YUE FI, sod opryuedwene Cango®e8toy 2m pawowsoy) -3A9] of-Ru40y eed ojdnp Om stodop sep sunsiy “(eaiwepnte 2 somnnsu0d ojad ov) ‘vouns & J9zej esd CouON op aIseqsog ‘ayfeun euyUaU ‘pines wo 0807] (aoynnsu0s ‘no oupyaudosd ojad epezy|e>¥) consids9 0 ooo. ‘op sestndxo © opursis (ours1910%9 (soruepnfe 9 soinnisueo onsote 2 Epua1ay0) ADayOr ISNqBA ‘jad wy9) 40AK8 ep epegns9q, 2 oqunt:oxyuy wurrxoude ae apepany opdeunp 2 woody (11 0882s ‘A o1mideo) SVONVD Ad OYSNUISNOD VG TVIDINI OIDYLSA-1 SAINFONOdSTUYOD SIAVIALLY SVC A VINX VIOVW ¥a NAVD 422 No primeiro dia de trabalho As vezes a amarragao rao pode ser feito em um Gnico dia ¢ tem que ser retomada em outras sessies Segunda fase: & calafetagem ¢, 8 8s exoreismos, IL-0 SEGUNDO FSTAGIO DA CONSTRUGAO DE CANOAS (capitulo V, segao III) Asmargens da laguna ou em uma praia de alguma das faldeias orientais As margens da laguna ou em uma praia de alguma das aldeias orientais Fixar as tabuas da proa amarragio da canoa Calafetagem da canoa Pintura de canoa iniciada pelo procedidas pelo associada a0, associnda 4 associada & ‘ito Katulifiva tabuyo, executado sobre as tébuas de proa ‘ornamentais pelo roliwaga. Faz parte da ‘mwvasila (magia do Kula). rito Vakakaya. Limpezs magica © cerimonial da canoa, feita pelo io ou pelo construtor, irar toda a influéncia maligna da canoa e assim torné-la to do encantamento do wayugo iPS de amarragao}; 0 ato mag mais importante do segundo estagio. 10 pelo construtor ou. pelo rio para tornar a canoa_mais ripida © mais resistente, magia Kaybase (calafetage © construtor ou o proprietario pronuncia 0 eneantamento para tornar a canoa mais segura. Vakasulu, um exorcismo, Vaguri, um exorcismo. Kaytapena waga, um exorcism. 423 Hl. O LANGAMENTO CERIMONIAL DE UMA CANOA (capitulo VI! Segdo 1) Atividade Magia Olangamento ea iniciada pelo | rito Kaysalula wadola waga, que faz parte do viagem inaugural ciclo de magia mwasila. Depois disso ha um intervalo preenchido pelo Kabigidoya (visitas cerimoniais), pelo comércio preliminar e outros preparativos para a expedi¢ao maritima. IV- AMAGIA DA PARTIDA E OS PREPARATIVOS REALIZADOS, ANTES DA PARTIDA (capitulo VII) Epoca: de trés a sete dias antes da partida. Atividade Magia Preparagao da canoa | iniciada pelo | rito Yawarapu sobre as folhas de coqueiro, para a viagem realizado pelo toliwaga (colocagao das esteiray nas plataforma e das a rito kayikuna sulumwoya sobre a hortelé aromatica. armagies no corpo da cana) rito Kaymwaloyo sobre a hortela fervida no dleo de coco, realizado pelo toliwaga. Empacotamento dos associados artigos de troca 20 ito Gebobo (também chamado Kipwo t sikwabu), realizado sobre quatro cocos por um amigo ou parente afim do toliwaga, para fazer com que os alimentos durem (o encantamento expressa apenas o desejo de um bom Kula). Toda esta magia pertence ao tipo mwasila, e tem que ser executado pelo toliwaga, exceto a ultima, V. MAGIA DA CANOA! REALIZADA NO ULTIMO PONTO DE PARTIDA PARA A VIAGEM MARITIMA (capitulo VIII, seco II) A série de ritos comeca no momento em que as canoas esto prontas para partir na longa via ‘gem pelo Pilolu. Os ritos nao esto associados a uma seqtiencia progressiva de atos; todos se refe Tem a um mesmo objetivo: seguranga e rapidez da canoa. Sao todos realizados pelo toliwaga. Atividade: viagem maritima, precedida por uma Série de Ritos Magicos Epoca: na manha Kadumiyala: esfrega-se ou limpa-se ritualmente a canoa com folhas do segundo dia tratadas magicamente aaieapediyaey Magia do bisila: galhardetes de pendano previamente encantados so atados ao mastro e ao cordame Local: praia de Muwa Kayikuna veva: pronuncia-se um encantamento enquanto se agita a corda mestra que controla as velas. Objetivo da Magia: conferir velocidade a canoa. Vabusi moma u: “retira-se 0 peso” da canoa utilizando-se uma batata podre. Executante dosritos: | Bisiboda patile: um rito de magia maligna para tornar vagarosas © toliwaga as outras canoas e conseguir assim velocidades relativas. 424 VI- A MWASILA, REALIZADA AO SE ATINGIR O PONTO DE CHEGADA (A)- MAGIA DA BELEZA (capitulo XIII, seco 1) Atividade: lavar, untar e pintar. Kaykakaya: rito de lavar ¢ esftegar com folhas Local: na praia, ou perto dela, onde tratadas magicamente. a comitiva descansa antes de partir Encantamento do /uya (coco) feito sobre 0 coco para a etapa final (a caminho de Dobu: raspado, usado para untar. praia de Sarubwoyna; a caminho de Encantamento do Sinaketa: Kaykuyawa). sinata (pente) feito sobre o pente. Executantes: geralmente 05 Sayyaku: tinta preta aromatica. ‘eneantamentos séo pronunciados pelo Bowa: pintura preta com carvio vegetal comum. toliwaga, ¢ algumas vezes por um membro | Tafo: tinta vermelha mais velho da tripulagdo. obtida das nozes de areca esmagadas. (B) MAGIA DA APROXIMAGAO FINAL (capitulo XIII, sega II) Atividade: a frota est4 remando (na Ta ya: o toque ritual do bizio que foi chegada a Dobu) ou impelindo os barcos | _previamente encantado. ‘com varas (na chegada a Sinaketa), Kaykura-tabuyo: ato de balangar a tébua de formando um todo compacto. proa da frente enquanto a Executantes: 0 tolfwaga e formula magica é pronunciada. dois membros da tripulagao, Kavalikuliku: formula simultaneamente em cada uma das canoas | magica é pronunciad: Objetivo: “sacudir a montanha”, Kaytavilena mwoynawaga: encantamento para impressionar os pronunciado na popa, em diregao a Koya. parceiros que esperam na praia. (C) MAGIA DA SEGURANGA Atividade Magia ‘Ao entrar na aldeia de Dobu (esta - Ka ubana i: encantamento pronunciado sobre 0 magia é executada somente quando os gengibre, que depois é cuspido ritualmente nativos de Boyowa vém até Koya). sobre a aldeia de Dobu e sobre os parceiros, e que 0s torna amaveis. (D) MAGIA DA PERSUASAO (capitulo XIV, seg&o IID) Atividade Magia A persuagio no Kula (wawoyla) do Kwoygapani: encantamento pronunciado parceiro de além mar pelo visitante. sobre um pedago de noz de areca, que depois é dado ao parceiro, Vil - ENCANTAMENTO DA CANOA, PRONUNCIADO POR OCASIAO DA DESPE- DIDA (capitulo XIV, segao II) Atividade Magia As canoas séo carregadas com os Kaylupa: formula magica para tornar a canoa presentes recebidos dos parceiros,como | mais leve, para “levanta-la da agua”. produto do comércio ¢ com as provisdes para a viagem de volta. FIG, LX - BRACELETES TRAZIDOS DE KITAVA A parte que coube a To'uluwa da carga de braceletes trazida a Omarakana em outubro de 1915, (Ver seco IIL.) [Entre pp. 344 ¢ 345,] FIG. LXI- TRANSPORTANDO UM SOULA VA A comitiva, com o lider carregando o colar em uma vara ¢ 0 segundo homem soprando um bizio, aproxima-se da casa do chefe. (Ver segao III.) [Entre pp. 344 426 FIG. LXIl- OFERECENDO 0 SOULAVA colar na vara é introduzido na casa do chefe. Tanto este quadro como o anterior representam cenas do Kula essencialmente doméstico: um dos filhos de To’uluwa esta oferecendo um colar a seu pai. Explica-se ent&o a escassa assisténcia de publico. (Entre pp. 344. 345.) FIG. LXIIIl- DESTRUIG AO CERIMONIAL DURANTE UMA FESTA SO" Esta fotografia foi tirada na costa sul da Nova Guiné. (Cf. segdo II deste cap. ¢ segiio IIl edo cap. III) [Entre pp. 345 ¢ 355.) 427 FIG. LXIV-CANOA NAGEGA Este tipo de canoa é manufaturado pelos habitantes do nordeste de Massim e é usado no ramo do Kula. (Ver seco II deste cap. € cap. V, segao IV.) [Entre pp. 360 ¢ 361.] 428 He FIG. LXV - UM CADAVER COBERTO COM OBJETOS VALIOSOS Um grande niimero de objetos valiosos incluindo grandes laminas de machado. com 08 quais este homem foi recoberto ao morrer, ja foram retirados. Apenas os objetos pessoais foram deixados no corpo e serio removidos imediatamente antes do enterro. [Entre pp. 370 371] Prefacio de Sir James Frazer ......... Prélogo do autor .......... Agradecimentos ........ INTRODUCAO — Tema, método e objetivo desta pesquisa 1 — Navegacao e comércio no sul do Pactjico; 0 Kula, 11 — Metodolo- gia etnografica. II — Dando inicio @ pesquisa de campo. Certas difi- culdades embaracosas. Trés condigées para o éxito. IV — Vida numa barraca entre os nativos. Mecanismo do ‘contato’ com eles. V — Méto- dos ativos de pesquisa. Ordem e coeréncia nas culiuras selvagens. Conse- qiiéncias metodoldgicas dessa verdade. VI — Formulando os principios da constitui¢ao tribal e da anatomia da cultura. Método de inferéncia a partir da acumulagao estatistica de dados concretos. Usos dos quadros sindticos. VII — Apresentacéo dos toques intimos da vida nativa; dos tipos de comportamento. Método do registro sistemdtico de impressdes; dos registros detalhados ¢ consecutivos. Importancia da participacdo pes- soal na vida nativa. VII — Registro dos modos de pensar e agir este- reotipados. Corpus inscriptionum Kiriwinensium. IX — Resumo dos ar- gumentos. A visdo que o native tem do seu proprio mundo ....... CAP. I — A regio e os habitantes do distrito do Kula I — Divisoes raciais na Nova Guiné Oriental. A classificagao de Seligman. ‘Os nativos do Kula. II — Subdivisées do distrito Kula. Ill — O cend- rio do extremo oriental da Nova Guiné. Aldeias dos massim do sul; seus costumes e instituigdes sociais. IV — O Arquipélago d’Entrecasteaux. As tribos de Dobu. As associagdes mitoldgicas de sua regia. Alguns dos seus costumes e instituigdes. A feiticaria. Uma visao na praia de Sarubwoy- na. V — Navegando para o norte. O grupo das ilhas Amphlett. Os mo- nopolistas selvagens .. ee ae secs see sae ae CAP. II — Os nativos das ilhas Trobriand I — Chegada as ithas de coral. Primeiras impressées sobre 0 nativo. Al- guns fatos significativos e seu significado profundo. Il — A posigdo da mulher; sua vida e conduta antes e depois do casamento. III — Novas pesquisas nas aldeias. Um passeio pela regiao. Os terrenos de cullivo e a lavoura. IV — A capacidade de irabalhos dos nativos; seus motivos ¢ incentivos de trabalho. A magia e o trabalho. Uma digressio sobre Eco- nomia Primitiva. V — A chefia: poder através da riqueza; uma comu- nidade plutocrética. Lista das diversas provincias e divisdes politicas das ithas Trobriand. VI — Totemismo, solidariedade clinica e os lacos de parentesco. VII — Os espiritos dos mortos. A enorme importdncia da magia. Magia negra. Os feiticeiros em suas rondas e as bruxas voadoras. Os malévolos visitantes do sul e as epidemias. VIII — Os vizinhos orien- tais dos trobriandeses. Os demais distritos do Kula . j IS 19 21 39 430 MALINOWSKI CAP. Ll — Caracteristicas essenciais do Kula I — Uma definigao concisa do Kula. I] — Seu cardter econdmico. Ill — Os artigos trocados; a concepeaio de vaygu'a. IV — As regras e aspectos principais do Kula: 0 aspecto socioldgico (parceria); direcao do movimento; natureza da posse dos objetos kula; o efeito diferencial integral dessas regras. V — O ato da troca; seus regulamentos; 0 que isso revela sobre as tendéncias aquisitivas e “‘comunistas” dos nativos; seus principios gerais concretos; os presentes de solicitacao. VI — Ati- vidades associadas e aspectos secundérios do Kula: construco de canoas; comércio subsididrio — sua verdadeira relacao com 0 Kula; o cerimonial, @ mitologia e a magia associados ao Kula; os tabus e as distribuicoes mortudrias e sua relacéo com o Kula ........ res wie CAP. IV — As canoas e a navegacio 1 — 0 valor e a importéncia da canoa para o native. Sua aparéncia, as impressdes e emocdes que causa naqueles que a usam ou possuem. A atmosjera de romance que @ cerca para o native. 11 — Andlise de sua construgao em relagéo @ sua juncéo. Os trés tipos de canoas nas ilhas Trobriand, II-V — Sociologia da grande canoa (masawa). II — (A) Organizacao social do trabalho na construgao de unia canoa; a divisio de funcées; 0 controle do trabaiho através da magia. 1V — (B) Sociolo- gia da propriedade da canoa; a relagao toli-; 0 toliwaga, “mestre”” ow “dono” da canoa; os quatro privilégios e funcdes do toliwaga. V — (C) A divisdo social de juncdes no processo de tripular e navegar uma canoa. Dados estatisticos sobre a navegacio trobriandesa .... 2... 00.004 CAP. V — A construgao cerimonial de uma waga 1 — A construgdo de canoas como parte integrante das atividades do Kula. Magia e mitologia. O estdgio preparatorio e cerimonial da cons- trucao. 11 — O primeiro estagio: expulsdo dos Tokway, espiritos das Grvores; transporte do tronco; escavagao do tronco e a magia associada. IIT — 0 segundo estdgio: 0 ritual inaugural de magia Kula; os nativos em dificuldades com os problemas de construgao; 0 cipé wayugo; 0 encanta- mento pronunciado sobre ele; calafetagem; os trés exorcismos magicos. IV — ‘Algumas observagdes gerais sobre os dois estdgios da construcao de canoas e a magia correspondente. Bulubwalata (magia maligna) das canoas. As tdbuas de proa ornamentais. Os tipos de canoas maritimas de Dobu @ Muruwa ...eccececeesece ees scingt CAP. VI — Lancamento de uma canoa e ceriménia de visita cerimonial — Economia tribal nas ilhas Trobriand 1 — 0 processo de lancamento e sua magia. A viagem inaugural (tasa- soria). Relato sobre o lancamento e a tasasoria, fais como foram obser- vados na praia de Kaulukuba. Reflexdes sobre a deterioracao dos costumes em virtude da influéncia européia. II — Digressdo sobre a sociologia do trabalho: organizacao do trabalho; tipos de trabalho comunitério; remu- neracdo do trabalho. Ill — O costume da visita cerimonial (kabigidova); 0 comércio local feito nessas expedicdes. IV-VII — Digressao sobre os presentes, pagamentos ¢ troca, IV — Atitude do nativo no que se 75 91 105 ARGONAUTAS DO PACIFICO OCIDENTAL refere a riqueza. O desejo de exibicdo. Aumento do prestigio social atra- vés da riqueza. Os motivos para o actimulo de alimentos. O vilamalya (magia da fartura). O manuseio do inhame. Psicologia da alimentagéo. O valor das mercadorias manufaturadas, analisado sob o ponte de vista psi- coldgico. V — Motivos para troca. O ato de dar presentes, como satis- facao da vaidade e demonstragao de poder. A faldcia da “familia” ou do “individuo economicamente isolado”. Auséncia de lucro na troca, VI — Troca de presentes e escambo. Lista dos presentes, pagamentos e transa- des comerciais: 1. os presentes puros; 2. pagamentos costumeiros, retri- buidos de maneira irregular e sem estrita equivaléncia; 3. Pagamento por servicos prestados; 4. a troca de presentes rigorosamente equivalentes; 5. @ permuia de bens materiais por privilégios, titulos e bens nao-materiai 6. escambo cerimonial com pagamento adiado; 7. comércio puro e sim- ples. VII — Deveres econdmicos correspondentes aos diversos tipos de lagos sociais; quadro das oito categorias de relacées sociais, caracterizadas por deveres econémicos bem definidos ....... CAP. VII — A partida de uma expedig&o maritima O cendrio: Sinaketa. Os chejes tocais. Agitacao na aldeia. A diferenciacdo social dos participantes da jrota. Rituais mégicos associados ao preparo € carregamento de uma canoa. O ritual sulumwoya. O embrulho magico Gilava), Os compartimentos de uma canoa e 0 encantamento do gebobo Despedidas na praia ...... ta a CAP. VIII — A primeira parada da frota em Muwa 1 — Definig&o do uvalaku (expedicéo cerimonial, competitiva). 11 — O sagali (ceriménia de distribuic&o) em Muwa. IIT — A magia da nave- BUCH eevee eee vee sin saan seas alu eas 7 CAP. IX — Navegando no braco de mar de Pilolu 1 — A paisagem. Geografia mitoldgica das regices distantes. II — A navegacao: os ventos; controle da canoa; a técnica de navegacdo da canoa € seus perigos. Ill — Os costumes e os tabus referentes & navegacao. A situacao privitegiada de determinados subclas. IV — As crencas nos temiveis monstros do mar... +1... iit CAP. X — A histéria de um naufragio I — As bruxas voadoras, mulukwausi ou yoyova: os fundamentos dessa crenga; iniciagdo e educagao de uma yoyova (bruxa); 0 segredo que cerca essa condi¢do; modo de praticar essa bruxaria; casos concretos. Il — As bruxas voadoras, no mar ¢ nos naufrdgios. Outros seres perigosos. A magia kayga’u; maneira como funciona. III — Relato dos rituais preparatérios do kayga'u. Transcri¢ao de alguns encantamentos. IV — Historia de nau- irdgio e salvamento. V — A estéria do peixe gigantesco que salva os ndufragos. O mito e a formula magica de Tokulubwaydoga ....... CAP. XI — Nas ithas Amphlett — Sociologia do Kula 1 — Chegada a Gumasila. Exemplo de uma conversa Kula. Os trobrian- deses em demoradas visitas ds ithas Amphlett. 11 — Sociologia do Kula: 431 121 155 164 173 186 432 MALINOWSKI J. limitagdes sociolégicas da participagdo no Kula; 2. a relagao de par- ceria; 3. iniciando as relacdes kula; 4. participagao das mulheres no Kula. II] — Os nativos das ilhas Amphlett: sew artesanato e comeércio; a cerd- mica; importacao do barro; a tecnologia da fabricacao dos potes; relacdes com os distritos circunvizinhos, IV — Migragées e influéncias culturais nessa provincia .....+ +004: ressiess toctsse dt HEE 4 CAP. XII — Em Tewara e Sanaroa — Mitologia do Kula 1 — Navegando a sota-vento de Koytabu. Os canibais da selva inexplo- rada. Tradigoes e lendas trobriandesas sobre esses nativos. A historia cancdo de Gumagabu. I] — Os mitos e a realidade: 0 significado impresso no cenério pelos mitos; distincdo entre os fatos reais e os fatos miticos; 0 poder magico e a atmosjera mitica; as trés categorias de mitos trobriandeses. III-V — Os mitos do Kula. MI — Estudo da mito- logia Kula e sua distribuigao geogrdfica. A historia de Gere'u de Muyuwa {ilha de Woodlark). As duas hisidrias de Tokosikuna de Digumenu e Guma- sila, IV — O mito da canoa voadora de Kudayuri. Comentario e andlise desse mito. Associagoes entre a canoa e as bruxas voadoras. Mitologia ¢ © cla Lukuba. V —O mito de Kasabwayreta e 0 colar Gumakarake- Ylakeda. Comparacées entre essas est6rias. VI — Anilise sociolégica dos mitos: influéncia dos mitos kula na visao nativa; mito e costumes. VII —Reiterando a relacao entre o mito e a realidade, VIII — A historia, ‘os monumentos naturais e 0 cerimonial religioso das personagens miticas ‘Auraine, Aturamo'a e sua irma Sinatemubadiye'i. Outros rochedos de natureza tradicional andloga a essa... + 0-02-02 000 CAP. XIII — Na praia de Sarubwoyna 1 — A parada na praia. A magia da beleza. Transcricao de alguns encan- tamentos. O encantamento do tauya (biizio). I! — A investida mdgica a Koya. Andlise psicolégica dessa magia. III — O Gwara (tabu) 0 encantamento Ka’ubana'i ......6. 0.20200 e eee ee cere eee ees CAP. XIV — O Kula em Dobu — Pormenores técnicos da troca I — Recepcao em Dobu. I — As transagdes principais do Kula © os presentes € trocas subsidiérios: algumas rejlexdes gerais sobre @ forca motriz do Kula; regulamentos referentes a permuta principal; vaga (pre- ssente inicial) e yotile (contrapresente); os presentes de solicitacao (pokala, kwaypolu, kaributu, korotomna); presentes intermedidrios (basi) e pre- sente final (kudu); 05 outros presentes por vezes permutados durante a transagdo principal do Kula (doga, samakupa, beku); honra e ética co- mercial do Kula. IL — As atividades kula em Dobu: atraindo 0 par- ceiro; magia kwoygapani; o comércio subsididrio; passeios dos nativos de Boyowa ao distrito de Dobu ..... saglik BEES (ies vs Dae 6 CAP. XV — A viagem de volta — A pesca e a confecgao de discos e colares com a concha Kaloma 1 — Visitas feitas na viagem de volta. Alguns artigos adquiridos. 1 — ‘A pesca da concha de spondylus na laguna de Sanaroa e em aguas domés- ticas: seu cardter geral e a magia; 0 mito Kaloma; relato sucessivo dos . 207 253 . 264 a ARGONAUTAS DO PACIFICO OCIDENTAL 433 pormenores técnicos, o cerimonial e a magia do ato de mergulhar para buscar a concha. II — Tecnologia, economia e sociologia da producao dos discos e colares da concha. IV — Tanarere, exibicdo dos produtos obtidos na viagem. Chegada da comitiva em Sinaketa........... anu OS CAP. XVI — A visita de retribuigao dos nativos de Dobu a Sinaketa T — O uvalaku (expedico cerimonial) de Dobu até a Boyowa Meri- dional: os preparativos em Dobu e Sanaroa; preparativos em Gumasila; @ agitacao, a difusdo e convergéncia de noticias; chegada da frota de Dobu em Nabwageta. 1] — Preparativos em Sinaketa para a recepcao 4 comitiva dos visitantes. Os nativos de Dobu chegam. A cena no promon- trio de Kaykuyawa. A recepcao cerimonial. Discursos e presentes. A per manéncia dos nativos de Dobu durante trés dias em Sinaketa. Modo de viver. Troca de presentes e comércio em espécie. Ill — Viagem de volta. Exibigdo dos resultados no tanarere . rea esas Bed CAP. XVII — A magia e o Kula 1 — A questéo da magia em Boyowa. Sua associagéo com todas as ativi- dades vitais e com os aspectos inexplicdveis da realidade. II-V — A concepcao nativa da magia. II — Os métodos para se chegar ao conhe- cimento da magia. III — As idéias nativas a respeito das fontes origi- nais da magia. Seu cardter primevo. A impossibilidade, para os nativos, de admitir a geragdo espontinea na magia. Magia, um poder humano e ndo uma forca da natureza. A magia e 0 mito e sua atmosfera supra- normal. IV — Os atos magicos: a formula mdgica e rito; relagdo entre esses dois fatores; encantamentos Pronunciados diretamente, sem um rito correspondente; encantamentos acompanhados por rito simples de impreg- naedo; encantamentos acompanhados por um rito de transferéncia; encan- tamentos acompanhados por oferendas e invocagées; resumo deste levan- tamento. V — Lugar onde a magia é armazenada na anatomia humana. VI — Condigdo do executante. Tabus e prescrigdes. Porcdo sociolégica. Origem verdadeira e filiacéo magica. VII — Definicdo de magia siste. mdtica. Os “sistemas” da magia da cana e da magia do Kula, VIII — O cardter supranormal ou sobrenatural da magia; a reagéo emocional dos nativos a certas formas de magia; o Kariyala (sinal ou pressdgio magico); © papel dos espiritos dos antepassados; a terminologia nativa. IX — O aspecto cerimonial da magia. X — A instituigao do tabu, apoiada pela magia. Kaytubutabu e Kaytapaku. XI — A compra de certos tipos de magia. Pagamentos por servicos mdgicos. XII — Breve resumo ...... 292 CAP. XVIII — O poder das palavras na magia — Alguns dados lingiiisticos I — Estudo de dados lingiiisticos na magia para tornar claras as idéias nativas acerca do poder das palavras. Il — O texto da férmula magica wayugo com traducao literal. II — Andlise lingiiistica de sew wala (predmbulo). IV — Técnica vocal de pronunciar um encantamento. And lise do tapwana (parte principal) e dogina (parte final). V — O texto da formula magica Sulumwoya e sua andlise. VI-XI — Dados lingiiisticos referentes a outros encantamentos mencionados neste volume e algumas inferéncias gerais. VI — © encantamento do tokway e as frases iniciais dos encantamentos da canoa. VII — O tapwana (parte principal) 434 MALINOWSKI dos encantamentos da canoa. VIII — A parte final (dogina) desies encantamentos. IX — O wala dos encantamentos mwasila. X — O tapwana e o dogina destes encantamentos. XI — Os encantamentos Kayga’u. XII — Resumo dos resultados deste levantamento lingiiistico. XIII — Substancias usadas nesses ritos mdgicos. XIV-XVII — Ané- lise de alguns textos lingiisticos nao magicos para ilustrar 0 método etno- grafico ¢ o modo de pensar dos nativos. XIV — ObservagGes gerais sobre certos aspectos do método, XV — Texto ntimero 1, sua traducao literal e livre. XVI — Comentario. XVII — Textos niimeros 2 e 3, Wradugidos € COMENGBOT 6c 6. 05 owen Cees we eens cones ee nnn o SEF CAP, XIX — O Kula interior 1 — To'uluwa, o chefe de Kiriwina, em uma visita a Sinaketa. O declinio de seu poder. Algumas reflexes melancdlicas sobre a insensatez de des- truir a ordem nativa e de solapar a autoridade nativa como prevalece agorc, II — A diviséo em “comunidades kula’; os trés tipos de Kula, em relagéo a esta divisdo. O Kula marttimo. III — O Kula interior entre duos “comunidades kula” e dentro destas comunidades, IV — As “co- munidades kula” em Boyowa (ilhas Trobriand) .... . 339 CAP. XX — Expedigées entre Kiriwina e Kitava I-Il — Relato de uma expedigfo de Kiriwina para Kitava. I — Fixan- do datas e preparando os distritos. I — Preliminares da viagem. Par- tida da praia de Kaulukuba. Navegagdo. Analogias e diferencas entre estas exnedicoes ¢ aquelas realizadas pelos nativos de Sinaketa até Dobu. En- trando na aldeia. O costume voulawada. A permanéncia em Kitava e 0 retorno. Ill — O So'i (festa mortudria) no distrito oriental (de Kitava a Muyuwa) e sua associagéo com o Kula . . 349 CAP. XXI — As subdivisdes restantes e as ramificacdes do Kula I — Breve levantamento das rotas entre a itha de Woodlark (Murua ou Muyowa) e 0 grupo Engineer, ¢ entre este tiltimo e Dobu. 1 — O comér- cio comum realizado entre estas comunidades. III — Uma ramificagao do Kula; expedicao de troca entre as linhas Trobriand ocideniais (Kava- taria e Kayleula) e as ithas d’Entrecasteaux ocidentais. IV — Producéo dos mwali (braceletes). Algumas outras ramificacdes e extravasamentos do circuito do Kula. A entrada do vaygu’a do Kula no circuito ......... 359 CAP. XXII — O significado do Kula .. cs cece 369 UM DOS ATOS CERIMONIAIS DO KULA I u i Vv y vI vil var Ix x XI XI XU xiv XV XVI XVIT XVUL XIX XX XXI XXII XXM1 XXIILA XXULB XXIV XXV XXVI XXVIL XXVII XXIX XXX XXXI XXXIT XXXII XXXIV XXXV XXXVI XXXVIL XXXVIIT XXXIX XL XLT XL Lista das Iustragdes A TENDA DO ETNOGRAFO NA PRAIA DE NU’AGASI a A LISIGA (CABANA PARTICULAR) DO CHEFE, EM OMARAKANA. RUA DE KASANA‘I (EM KIRIWINA, NAS ILHAS TROBRIAND) . CENA EM YOURAWOTU (ILHAS TROBRIAND) ... CENAS DA PRAIA DE SILOSILO (DISTRITO MASSIM MERIDIONAL) CENAS DA ALDEIA NO DECORRER DO FESTEJO SO’ .... NAS ILHAS AMPHLETT GRUPO DE NATIVOS NA ALDEIA DE TUKWA'UKWA . “ARISTOCRATAS” DE KIRIWINA = PESCADORES DE TEYAVA . * UMA TIPICA NAKUBUKWABUYA (MULHER SOLTEIRA) nee JOVENS DE BOYOWA. . . DANCA KAYDEBU .... OS DANGARINOS OSTENTAM “ORNAMENTAGAO € COMPLETA UMA FAMILIA NATIVA BRACELETES ..... DOIS HOMENS EXIBEM OS BRACELETES | DOIS COLARES FEITOS DE DISCOS DE SPONDYLUS VERMELHO | DUAS MULHERES ENFEITADAS COM COLARES UMA REUNIAO KULA NA PRAIA DE SINAKETA _ UMA CANOA MASAWA vee COLOCANDO A CANOA EM SEU ABRIGO UMA CANOA VELEJANDO DIAGRAMA DA ESTABILIDADE E DA CONSTRUCAO DA CANOA SECOES DIAGRAMATICAS DAS CANOAS CANOA DE PESCA (KALIPOULO) ... © TRONCO ESCAVADO NA ALDEIA ENTALHANDO UM TABUYO CONSTRUCAO DE UMA WAGA CONFECCAO DA VELA ........ OS ROLOS DE FOLHAS SECAS DE PANDANO LANCAMENTO DE UMA CANOA .......... TASASORIA NA PRAIA DE KAULUKUBA CELEIRO DE UM CHEFE EM KASANA'T ABASTECIMENTO DE UM CELEIRO EM YALUMUGWA ._.... EXIBICAO DE PORCOS E INHAMES NO SAGALI (CERIMONIA DE DISTRIBUICAO DE ALIMENTOS) . case © TRABALHO COMUNITARIO DE COZIMENTO DO MONA (PUDIM DE TARO) a CENA TIPICA DO WASI (TROCA CERIMONIAL DE PRODUTOS AGRI- COLAS POR PEIXE) ......... Senet © VAVA (TROCA DIRETA DE PRODUTOS AGRICOLAS POR L PELER) KOUTA’UYA, UM DOS CHEFES DE SINAKETA . UMA CANOA CARREGADA .... ae UMA DAS CANOAS WAGA NUMA EXPEDICAO } KULA .... . APRESTAMENTO DE UMA CANOA. Fanaa, PAISAGEM DAS ILHAS AMPHLETT 379) 381 381 382 382 384 385 386 387 388 388 390 391 392 392 393 393 394 395 396 397 397 398, 94 96 399) 400 400 401 401 402 402 403 403 404 404 405 405 406 406 407 407 408 408 436 xu XLV XLV XLVI . XLVI XLVI XLIX ui Lu Litt LIV Lv LVI LVI LVL LIX LXIL LXIL LXIV LXv u ri Vv u mm ANCORADOURO DA ALDEIA PRINCIPAL DE GUMASILA TECNOLOGIA DA FABRICACAO DE POTES (I) TECNOLOGIA DA FABRICAGAO DE POTES (Il) .. EXCELENTES AMOSTRAS DOS POTES FABRICADOS NAS ILHAS AMPHLETT : UMA CANOA EM GUMASILA CARREGANDO POTES UMA FROTA KULA PARANDO PARA EXECUTAR OS RITOS FINAIS DO MWASILA .... as MWASILA — © FEITIGO DA BELEZA (A) TRABALHANDO A CONCHA KALOMA (1) . (B) TRABALHANDO A CONCHA KALOMA (Il) . TRABALHANDO A CONCHA KALOMA (Il) TRABALHANDO A CONCHA KALOMA (IV) NA PRAIA DE NABWAGETA ... AS CANOAS DE DOBU NA PRAIA DE SINAKETA ..... ALGUMAS CANOAS ANCORADAS NA LAGUNA RASA PROXIMA A PRAIA ...... . VISITANTES DE DOBU EM SINAKETA™ ENCANTAMENTO ASSOCIADO A GRAVID) UM RITO DE MAGIA DE GUERRA UM RITO DA MAGIA AGRICOLA BRACELETES TRAZIDOS DE KITAVA . TRANSPORTANDO UM SOULAVA OFERECENDO O SOULAVA ... DESTRUICAO CERIMONIAL DURANTE UM. CANOA NAGEGA «000000000200 coe eee eeeer eee eeeee UM CADAVER COBERTO COM OBJETOS VALIOSOS ..... Mapas NOVA GUINE ORIENTAL . oi DISTRIBUICAO RACIAL EM NOVA ouine ORIENTAL © DISTRITO DO KULA ..... © ARQUIPELAGO DE TROBRIAND © CIRCUITO DO KULA ....... Quadros Sinéticos LISTA CRONOLOGICA DOS EVENTOS KULA TESTEMUNHADOS PELO AUTOR aiscaiceevreyass secon uagevsmepeseemennercns CALENDARIO DA EXPEDICAO UVALAKU, DE DOBU A SINA- KETA, 1918 ¥ QUADRO DA DENTES DAS ATIVIDADES” CORRESPON- 409 410 aul aul 412 412 413 413 ala 414 416 416 417 417 418 419 420 420 425 425 426 426 427 428 389 394 32 als 424

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