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PENELOPE FAZER E DESFAZER A HISTORIA PUBLICAGAO QUADRIMESTRAL — N? 9/10 + 1993 DIRECTOR A.M. HESPANHA REDACCAO, Atvaro Ferreira da Silva (Fe-un.); Amélia Aguiar Andrade (Fcst-uxi); Antonio Costa Pinto (ceHce- -iscTe); Ant6nio M. Hespanha (Ics); Bernardo Vasconcelos e Sousa (rest-unt); Carlos Fabio (Fut); Fernando Rosas (Fcsi-unt); Helder A. Fonseca (ue); José Manuel Sobral (ics); Lufs Krus (rost- unt); Lufs Ramathosa Guerreiro; Mafalda Soares da Cunha (ue); Maria Alexandre Lousada (Fu); Nuno Gongalo Monteiro (ics); Nuno Severiano Teixeira (ue/ucr); Rui Ramos (ics); Valentim Alexandre (ics); Vitor Serréo (ruc); Secretério da Redaccéo: Joao Carlos Cardoso Propriedade do titulo: Cooperativa Penélope. Fazer e Desfazer a Historia Subsidios Redacc&o da J.N.I.C.T. @ S.E.C. Os originais recebidos, mesmo quando solicitados, nao serao devolvides. Na capa: «Monarchia de Espaiia», Dialogo Hamado Phelippino, ms. éa Biblioteca do Escorial. © Epicoes Cosmos © Cooperativa Penélope Reservados todos os direitos de acordo com a legislagao em vigor Capa Fotolitos: Joerma - Antes Grificas, Ld® Impressao: Litografia Amorim Impressao e acabamentos: Eicdes Cosmos } edigio: Fevereiro de 1993 Depésito Legal: 49152/91 ISSN: 0871-7486 Difusio Distribuigao Livraria Arco-fris Epicoes Cosmos Ay. Jélio Dinis, 6-A Lojas 23 € 30 —P 1000 Lisboa Rua da Emenda, 111-12 — 1200 Lisboa Telefones: 795 51 40 (6 linhas) ‘Telefones: 342 20 50 + 346 82 O1 Fax: (1) 796 97 13 + Telex 62393 versus-P Fax: (1) 796 97 13 Restauracao e «Razao de Estado» Luis Reis Torgal Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra 1. Ao abordarmos 0 tema «Restaurago e RazSo de Estado» nio pretendemos restringir-nos ao estudo da literatura sobre a «Raziio de Estado», que tem em Por- tugal — ¢ na cultura europeia — um particular significado na época moderma. Desejamos sim recorrer a ideia-base que constitui a «Razio de Estado» e mostrar como ela preside a uma série de praticas e de concepgées teérico-priticas no con- texto da conjuntura de crise ¢ de reorganizagio que significou 0 movimento restau- racionista, A nossa reflexio, embora concretizadora, nfo se vai desdobrar num amplo processo de pormenorizacao e justificagdo, inclusive através da transcrigéio do discurso politico, pelo que apelamos para leitura da nossa obra, publicada em 1981- -1982, Ideologia Politica e Teoria de Estado na Restauracdo, que, neste ano em que se perfazem 350 anos sobre 1640, devera vir a ser reeditada. Enquadrados no limite do tempo e na estratégia de uma comunicagao, apenas desej4mos apresentar uma amostragem sobre um tema que reputamos do maior inte- resse e de grande riqueza. 2, Nao podemos esquecer — conforme tem recordado Borges de Macedo em intervengdes recentes — que a situacgZio dramitica da realidade politica portuguesa a seguir 4 «Revolugiio de 1640» se centrava no facto de nao existir propriamente um Estado. Estamos perante um rei que ndo liderou (pelo menos ostensivamente) a «tevolugiio» e que sai de uma situagdo ducal de «corte na aldeia» para, desesperada- mente, constituir um «Estado». Um rei que, por isso, tem de utilizar toda a prudén- cia para, através de um conjunto de leis de emergéncia, nao sé resolver problemas conjunturais de extrema gravidade e evitar oposigGes desnecessarias como também, quando preciso, assumir medidas drasticas. Um rei que, noutro sentido, procura constituir juridica ¢ institucionalmente um Estado, afirmando a sua soberania, criando novos aparelhos e, por vezes, utilizando os j4 existentes ou concebidos durante a Monarquia dual e até mesmo os burocratas que serviram Filipe IV. Na verdade, poderiamos verificar que D. Jodo IV e, antes, os governadores do Teino que ocuparam o lugar até & aclamagdo do duque de Braganga mantiveram em exercicio os tribunais existentes, confirmaram as mercés concedidas pelo rei de Espanha, continuaram a adoptar as Ordenagées Filipinas e muitas leis ¢ regimentos anteriores a 1640. Por outro lado, o rei procurou nio conceder aos «restauradores» 163 PENELOPE - FAZER E DESFAZER A HisTORIA um papel de excep¢4o na politica portuguesa e, como se disse, aproveitou muitos dos altos funciondrios existentes no tempo do seu antecessor espanhol. Os exemplos de Francisco de Lucena, de Pedro Vieira da Silva, de Tomé Pinheiro da Veiga, os dois primeiros que foram nomeados secretirios de Estado, depois de terem ocupado altos postos no tempo de Filipe IV (até revelando uma acgo repressiva em relacio as «revoltas da fome», no caso do segundo) € 0 terceiro que manteve o lugar de procurador da coroa, so reveladores desta acgao politica. Isto para nao falar dos conselheiros de Estado que mantiveram as suas funcdes — os casos do inquisidor geral D. Francisco de Castro, do arcebispo de Braga ou do mar- qués de Vila Real sdo exemplos significativos, até pelo lado de, apesar da confianga que Ihes foi concedida, no terem deixado de tomar posigées de lideranga na primeira conjura organizada, logo em 1641, contra a nova dinastia. A par disso, porém, proibiu a saida de numerdrio e de produtos de primeira necessidade para o estrangeiro, tabelou precos e exigiu o regresso de todos os «emi- grados», sob pena de expropriagdio dos seus bens, a0 mesmo tempo que procurou aliciar os investimentos e formas de desenvolvimento econémico ¢ teve de procurar preparar um exército com estruturas regulares ¢ disciplinadas. Neste sentido, por assim dizer «tendencialmente planificador», foi-se reorgan- izando, de forma «moderna», a estrutura do Estado. Para além do seu conselho pes- soal e do Conselho de Estado, ao qual conferiu regulamentagiio adequada, deu nova ordena¢ao ao Conselho da Fazenda e criou 0 Conselho Ultramarino e 0 Conselho de Guerra. Entretanto, embora este «Estado de Conselhos» repudiasse a ideia de «vali- do», nao deixou, numa expresso moderna, de manter o sistema filipino do secretario de Estado, ao qual se somou, para maior eficécia administrativa, 0 cargo de secretério das Mercés e do Expediente. A par disso, mantinha activos velhos cargos e velhos tribunais, como 0 chanceler-mor e procurador da coroa, para 0 caso dos primeiros, e 0 Desembargo do Paco ea Casa da Suplicagao, para o caso dos segun- dos. Ao mesmo tempo, porém, os poderosos periféricos — estudados numa notdvel tese de Ant6nio Manuel Hespanha — continuavam a desempenhar uma fungao essencial no quadro da governagao do territério, como expressio do poder local com que © poder central se procurava articular. 3. Neste contexto politico € 6bvio que se afirmariam novos grupos sociais. Um caso exemplar é 0 dos «letrados», que cada vez mais eram tidos como elementos fun- damentais da administragio moderna. Nao parece ser por acaso que Jo%o Pinto Ribeiro, que fora secretério pessoal do duque de Braganca, publicou em 1645 a obra Preferéncia das Letras as Armas. Ela corresponde A voz desse sector social «letrado», de certo modo «burgués» ¢ «nobre», sem todavia deixar de manifestar algumas cautelas em relagio a «nobreza de espada», que ocupava um lugar fundamental na guerra da independéncia. Por outro lado, é também sintomatico deste posicionamento «politico», ao mes- mo tempo «novo» e «conservador», a «audécia cautelosa» de medidas adoptadas em relagiio aos «cristios-novos». O conselho politico de Vieira é disso a prova, como 0 164 Estupos € a criagdo da Companhia do Brasil ¢ 0 alvard de 1649, como, ao invés, o respeito mantido em relago a Inquisicao e ao inquisidor geral («apresentado» por Filipe IV e presumivel conspirador apés a Restauragao, nao esquecamos). E, de resto, esta posigaio de equilibrio instavel que vai, apesar de tudo, criar fortes problemas a D. Joao IV e que facultar4 uma situagao de instabilidade prolongada apés a sua morte. 4. Mesmo as teses justificativas da independéncia sio reveladoras de uma notavel prudéncia teérica. Elas radicam-se — como € l6gico — nas concep¢6es orto- doxas e escolasticas da origem «popular» do poder régio. S6 elas serviam a causa da aclamagiio de D. Joiio IV e da deposigio de Filipe IV — 0 «

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