TEXTO 1.0 - Sociedade e Instituições PDF

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Compéndio de analise institucional e outras correntes: teoria e pratica Gregorio F. Baremblitt Sted. Belo Horizonte, MG: Instituto Felix Guattari, 2002 (Biblioteca Instituto Félix Guattari; 2) Baremblitt, Gregorio F. (2002) Compéndio de andlise institucional e outras correntes: teoria e pritica, Sed., Belo Horizonte, MG: Instituto Felix Guattari (Biblioteca Instituto Félix Guattari; 2) Copyright 1992 by Gregorio Baremblitt 1 * edigdo: Editora Record, 1992 Capitulo TT SOCIEDADE! INSTI LIC Institucionalismo, 4 sua maneira, tem uma concepeao prépria do que é a Sociedade e do que é a Histéria, a Sociedade como forma organizada de associagéio humana e a Histéria como o devir da Sociedade no tempo. O Institucionalismo, sem considerar no momento as diferengas doutrinarias de escola para escola, afirma que a sociedade € uma rede, um tecido de instituigdes. E que sto as instituigdes? As instituigdes so légicas, so drvores de composigdes logicas que, segundo a forma ‘0 grau de formalizaciio que adotem, podem ser leis, podem ser normas e, quando nao esto enunciadas de maneira manifesta, podem ser habitos ou regularidades de comportamentos. Alguns autores sustentam que leis, normas ¢ costumes so objetificages de valores. As leis, em geral, estdo escritas; as normas e os cédigos também. Mas uma instituigdo nao necessita de tal formalizagao por escrito: as sociedades dgrafas também tém cédigos, s6 que eles so transmitidos verbal ou praticamente, ndo figurando em nenhum documento. © que essas l6gicas significam? Significam a regulago de uma atividade humana, caracterizam uma atividade humana e se pronunciam valorativamente com respeito a ela, esclarecendo 258 © que deve ser, o que est prescrito, e 0 que ndo deve ser, isto é, 0 que esta proscrito, assim corno o que & indiferente. Essas légicas, esses corpos discriminativos, sto varios, e & curioso que os institucionalistas tm dificuldades para chegar a um acordo acerca de quais e quantos so. Vamos examinar algumas ilustragées mais ou menos indiscutiveis. Um exemplo de uma instituigdo: a instituigdo da’ linguagem. Ela caberia nesta definigdo que formatamos quando a pensamos em termos gramaticais. A gramatica ndo é nada mais que um conjunto de leis, de normas que regem a combinatéria de elementos fonicos, de unidades de significagdo na linguagem. Com a combinagdo desses elementos, conforme indicado por essas leis, pode construir-se um infinito numero de mensagens, de tal modo que estas mensagens sfo compreensiveis para qualquer falante ou ouvinte dessa lingua. Entio, corno se pode ver, no final das contas, urna gramatica & urna instituigdo que explicita as opgdes de acordo com as quais se vao produzir mensagens, consideradas gramaticais ou agramaticais, os prescritos ou os proscritos. F claro que, no caso da lingua, ndo estardo estipulados também os prémios e os castigos para quem usa de forma correta ou incorreta a lingua, que € 0 que acontece em outros tipos de instituigo. Mas o prego de seu desconhecimento ou transgressdo & ébvio: a incomunicabilidade dentro do universo humano, pelo menos dentro desse universo humano em particular. Outro exemplo sio as instituigdes de regulamentago do parentesco, as que definem os lugares tais como: pai, mae, filho, nora, genro etc. Elas so as que prescrevem entre quais membros dessa classificagdo podem se dar unides, entre quais membros ndo podem se dar unides ¢ que tipo, que caracteristica de vineulo. de descendéncia ¢ alianga relaciona cada uma destas posigdes com a outra Isso também é um cédigo que, formalizado ou nao, regula a relagdo de parentesco ¢ tem prescriges ~o que é indicado; e também proscrigdes - 0 que é proibido; assim como o que ¢ indiferente ou ndo abrangido por essa l6gica. Outra instituigdo pouco discutivel entre os institucionalistas € a da divisio do trabalho humano, O trabalho humano esti dividido segundo os momentos e as especificidades de cada tipo de produgao e tarefa (divisdo técnica). Mas, por outro lado, essa divisio vem acompanhada de uma hierarquia que institui diferengas de poder, 26 & prestigio e lucro — ndo necessariamente justificadas pela importincia produtiva daqueles que detém esses lugares (divisio social). Por exemplo: trabalho manual e intelectual, do campo e da cidade, lariados ¢ auténomos, feminino e masculino ete. Ha também as instituigdes da educagao, isto é, aquelas leis, normas e pautas que prescrevem como se deve socializar, instruir um aspirante a membro de nossa comunidade para que ele possa integrar-se & mesma com suas caracteristicas efetivas. ‘Ternos também a instituigdo da religido, que é a que regula as relagdes do homem com a divindade, divindade sobrenatural para uns ou imanente a vida terrena para outros, mas com respeito & qual existe toda uma série de comportamentos indicados © toda uma série de comportamentos contra-indicados. ‘Temos também as instituigées de justiga, as instituigées da administragdo da forga, e assim por diante. Em um plano formal, uma sociedade no & mais que isso: um tecido de instituigdes qui se interpenetram e se articulam entre si para regular a produgo e a reprodugdo da vida humana sobre a terra e a relago entre os homens. Agora, entendidas assim, as instituigdes so entidades abstratas, por mais que possam estar registra das em escritos ou conservadas em tradigdes. Para vigorar, para cumprir sua fungdo de regulagdo da vida humana, as instituigdes t@m de realizar-se, tém de "materializar-se". E em que elas se materializam? Em dispositivos concretos que slo as organizagdes. As organizagdes, entdo, sé formas materiais muito variadas que compreendem desde um grande complexo organizacional tal como um ministério Ministério da Educagio, Ministério da Justiga, Ministério da Fazenda etc. até um pequeno estabelecimento, Ou seja, as organizagées sao grandes ou pequenos conjuntos de formas materiais que coneretizam as opgGes que as instituigdes distribuem e enunciam. Isto é, as instituigSes ndo teriam vida, no teriam realidade social sendo através das organizagSes. Mas as organizagées nao teriam sentido, nao teriam objetivo, nao teriam diresao se nio estivessem informadas como estio, pelas instituigGes. Por sua vez, uma organizagio (que, como insist, costuma ser um complexo grande, vultoso) esté composta de unidades menores. Estas so de naturezas muito diversas e € dificil enun todas. Mas, pelo menos, hd algumas que stio muito 27k caracteristicas, como, por exemplo, os estabelecimentos. Estabelecimentos seriam as escolas, um convento, uma fébrica, uma loja, um banco, um quartel. Ha diversos tipos de estabelecimentos, de caracteristic © que integra uma organizagao. Os estabelecimentos, em geral, incluem dispositivos técnicos cujos exemplos mais basicos so a maquinaria, as instalagdes, arquivos, aparelhos. Isso recebe 0 nome de equipamento. © equipamento pode ter uma realidade material que coincide com o estabelecimento, ou seja, as maquinas de um estabelecimento — ou pode ter uma realidade muito mais ampla, de maneira que forme um grande sistema de méquinas, um grande equipamento. Isso é 0 que acontece, suponhamos, com os equipamentos das organizagées da comunicagao de massa, que, por sua vez, so organizagdes que realizam as prescrigdes de uma grande instituigdo que é a instituigao da Comunicagao Social. s muito diferentes. Mas é um conjunto de estabelecimentos Instituigdo — Organizagdo — Fstabelecimento — Equipamento. Tudo isso, naturalmente, s6 adquire dinamismo através dos agentes. Nada disso se mobiliza, nada disso pode operar sendio através dos agentes. Os agentes so "seres humanos", so os suportes e os protagonistas de toda essa paraferndlia. E os agentes protagonizam praticas. Praticas que podem ser verbai ndo-verbais, discursivas ou ndo, préticas teéricas, priticas téenicas, préticas cotidianas ou inespecificas. Mas é nas agdes que toda essa paraferndlia acaba por operar transformagées na realidade. Entdo, estas unidades (instituigdo — organizago — estabelecimento — equipamento — agente — priticas) ndo podem ser confundidas. Mas, infelizmente, com freqiiéncia isso cocorre, E niio so confimdidas apenas pelos leigos, mas também pelos institucionalistas. Ento, quando se estuda uma escola institucionalista, esta escola pode chamar de instituigao as organizacées; de organizacao a um estabelecimento. Isso ndo é nada recomendavel porque fa primeira coisa a se fazer para se entender este complexo panorama & criar uma nomenclatura mais ou menos universal e compartilhada. A que proponho aqui é a que grande parte dos institucionalistas aceit Isso ndo apenas o exercicio de um desafio, mas algo importante. Se comegamos a dizer, por exemplo, que essa escola é uma instituigdo, 0 assunto se complica, pois essa escola nao é Wa uma instituigdio, e sim um estabelecimento que faz parte de uma grande organizagdo — provavelmente do Ministério da Educagdo, que, por sua vez, realiza uma grande instituigao: a instituigdo da Educagdo, que uma légica, uma série de prescrigdes ou leis. Em uma instituigéo podem-se distinguir duas vertentes importantes. Uma é a vertente do instituinte, e outra a do instituido. Apesar de as origens das instituigdes serem muito dificeis de se determinar — ou seja, fazer a histéria de uma instituigdo, particularmente a de seu comeso, é uma tarefa is vezes impossivel, como se costuma dizer, "perde-se no comego dos tempos". Inclusive ha muitas instituigdes, como a instituigdo da lingua, das relagdes de parentesco, da religiio e da divisio do trabalho, das quais no se pode dizer qual veio primeiro ¢ qual veio depois. Mas podemos afirmar que para uma sociedade humana existir & preciso haver no minimo essas quatro instituigées humanas, ou seja, humanidade _é sinénimo de coletivo regido por essas instituigdes, ¢ essas instituigdes so sindnimo de existéncia de um coletivo humano. Entdo, € dificil saber como eram os coletivos antes que aparecessem cessas instituigdes. E o mesmo que perguntar como era o homem antes de ser homem, pelo menos como 0 entendemos. Entdo, situar a origem dessas instituigses € muito dificil. $6 se pode dizer que uma instituigdo supde outra, precisa da outra, ¢ 0 seu conjunto ——é que constitui uma civilizagao ou uma sociedade humana. Agora, se freqlentemente ndo se pode dizer como essas grandes instituigdes comegaram, sem divida se pode distinguir nelas uma poténcia, um movimento de transformagao constante que tende a modificar, a operar mutagdes nas suas caracteristicas. Em poucas ocasides privilegiadas pode-se assistir historicamente ao nascimento de uma grande instituigdo. Mas, em geral, ndo € isso que acontece. O que se pode presenciar so grandes momentos histéricos de revolugdo de uma instituigo, de profundas transformagGes de urna instituigdo. Entdo, a esses momentos de transformagaio institucional, a essas forgas que tendem a transformar as instituigdes ou também a estas forgas que tendem a fundi-las (quando ainda nao existem), a isso se chama o instituinte, forgas instituintes. Sdo as forgas produtivas de l6gicas institucionais. Este grande momento inicial do processo constante de produgdo, de criagdo de instituig6es, tem um produto, geram 2k uum resultado, € este é 0 institufdo. © instituido ¢ 0 efeito da atividade instituinte. Se voces prestarem atengdio a esses nomes, eles mesmos ja estdio dizendo alguma coisa com relagdo a diferenga entre 0 instituinte ¢ o instituido. O instituinte aparece como um proceso, enquanto © instituido aparece como um resultado. O instituinte transmite uma caracteristica dindmica; 0 instituido transmite uma caracteristica estitica, estabilizada. Ento, —_ ¢ evidente que o instituido cumpre um papel histérico importante, porque as leis criadas, as normas constituidas ou os habitos, os padres, vigoram para regular as atividades sociais, essenciais vida da sociedade, Mas acontece que essa vida é um processo essencialmente cambiante, mutante; entio, para que os instituidos sejam fumcionais na vida social, eles tém de estar acompanhando a transformagao da vida social mesma para produzir cada vez mais novos instituidos que sejam apropriados aos novos estados sociais. Tem-se que evitar uma leitura do tipo maniqueista, que pensa que o instituinte _ é bom e o instituido € ruim, embora seja verdade que o instituido apresente, por natureza, uma tendéncia _ resisténcia, uma disposig&o que se poderia chamar a persistir em seu ser, a no mudar, que quando se exacerba, se exagera, Se conhece politicamente pelo nome de conservadorismo, reacionarismo. Pelo contrario, 0 instituinte aparece como atividade revolucionaria, criativa, transformadora por exceléncia. Na realidade, ndo é cxatamente assim, porque o instituinte careceria completamente de sentido se ndo se plasmasse, se no se materializasse nos instituidos. Por outro lado, os instituidos nao seriam_efetivos, ndo seriam funcionais, se ndo estivessem permanentemente abertos poténcia instituinte. Por sua vez, © mesmo acontece a nivel organizacional. Existe o organizante € 0 organizado, Ha uma atividade permanentemente critica e transformadora, otimizadora das organizagées — 0 organizante. E ha 0 organizado, que se pode ilustrar com 0 famoso organograma ou fluxograma, que é necessdrio, mas que tem uma tendéncia "natural" a cristalizar-se (entre aspas porque nada tem a ver com o natural), uma tendéncia histérica a esclerosar-se ea adotar uma série de vicios, entre os quais © mais conhecido € a burocracia, embora ndo seja 0 tinico. Entéo, ¢ importante saber que a vida social — entendida como o proceso em permanente transformagao que deve tender ao aperfeigoamento e visar a maior felicidade, maior realizago, 30 4 maior satide e maior criatividade de todos os membros. — sé é possivel quando ela é regulada por instituigées e organizagdes e quando nessas instituigdes € organizagdes a relagio e a dialética existentes entre o instituinte © 0 instituido, entre © organizante © o organizado (proceso. de institucionalizagiio-organizagdo) se mantém permanentemente permedveis, fluidas, elasticas. Outra maneira de referimse a isso é dizer que nas instituigdes, organizages, estabelecimentos, agentes, priticas, pode-se distinguir uma fungo ¢ um funcionamento. Para poder entender essa terminologia, tem-se que compreender que nas civilizages e nos conjuntos humanos, ¢ na vida humana tomada num sentido muito amplo, hé a tendéncia a adquirir sempre caracteristicas histéricas que comprometem este objetivo ut6pico ativo. Essas caracteristicas histéricas, muito diferentes de uma sociedade para outra, de uma fase hist6rica para outra, podem ser resumidas em trés grandes situagdes viciosas conhecidas por todo mundo: so os processos de exploragdo, de dominagdo ¢ de mistificagdo (desinformagdo ou engano). Essas so as deformagées do percurso da vida social ¢ de seus objetivos mais nobres, de suas finalidades mais altas, que cada sociedade coloca sua man chamadas de utopias sociais: como uma sociedade tenta, deseja, deve chegar a ser. E claro que, & excegtio de algumas sociedades em particular, desde que existem sociedades, as utopias sociais incluem diferentes formas de liberdade, diferentes formas de igualdade, diferentes formas de veracidade ¢ fraternidade, apesar de eu estar usando, para referir _-me a isso, a utopia da Revolugdo Francesa, chamada de revoluedo burguesa, que no é nem a tnica nem a melhor das utopias, mas é a mais conhecida por nés. Entio, cada sociedade, em seus aspectos instituintes © organizantes, sempre tem uma utopia, uma orientagdo hist6rica de seus objetivos, que € desvirtuada ou comprometida por uma deformagdo que se resume em: exploragdo de alguns homens pelos outros (expropriagdo da poténcia e do resultado produtivo de uns por parte de outros); dominagdo, ou seja, imposigéio da vontade de uns sobre os outros e desrespeito vontade coletiva, compartilhada, de consenso; ¢ mistificago, ou seja, uma administragdo arbitraria ou deformada do que se considera saber ¢ verdade histérica, que & substituida por diversas formas de mentira, engano, ilusdo, sonegagdo de informagao etc. Assim, se se compreende cesta oposigdo entre a 3k utopia, o aperfeigoamento da vida social e suas deformagdes exploragd0, dominago, mistificagio-, entio se pode compreender mais facilmente uma divisio que se estabelece entre fungdo ¢ funcionamento. O dito no significa que as utopias sejam sempre inocentes e acabem traidas, mas em geral elas so mesmo traidas. As instituigdes, organizagdes, estabelecimentos, agentes © priticas desempenham uma fungio. Esta fungdio esta sempre a servigo das formas hist6ricas de exploragdo, dominagao mistificagdo que se apresentam nesta Sociedade. Toda instituigdo, toda organizagio, todo estabelecimento apresenta esta fungdo a servigo dos exploradores, dos domina dores, dos mistificadores. $6 que esta fungo raramente se apresenta como ela é, justamente por causa da questo da mistificagdo... A fungdo apresenta-se deformada, disfarga da, mostra-se como 0 objetivo natural, desejado e logico das instituigdes e das organizagGes. Isto é, no se manifesta claramente a0 nivel do instituido © do organizado. Ou seja, os instituidos © os organizados apresentam, predominantemente, freqtientemente, fungdes a servigo da exploragdo, da dominagao, da mistificagdo, E as exprimem de tal maneira que as fazem parecer "naturais", desejaveis ¢ etemas, a0 passo que o instituinte e 0 organizante so sempre inspirados pela utopia, esto sempre a servigo dos objetivos que, provisoriamente, chamamos de Justiga, de Igualdade e Fraternidade, Podem ser chamados de outra maneira. as forgas, esses processos, recebem o nome de funcionamento. Entio, o funcionamento é sempre instituinte, é sempre transformador, é justiceiro e tende & utopi ‘A fungdo, cla ¢ predominantemente reaciondria, conservadora, a servigo da exploragao, da dominagio e da mistificagdo, e se apresenta aos olhos nao atentos como eterna, natural, desejavel e invariavel. Agora, pode-se definir outros termos que temos aqui presentes. O instituido, o organizado, enquanto produtivo, enquanto expresso apropriada, enquanto recurso operante o instituinte, & claro que é necessirio. Acontece que, rapidamente, tendem a cair fora do seu sentido de funcionamento para adotar a caracteristica da fungao, coisa que se compreendera melhor quando se entender que a caracteristica essencial do instituinte, do organizante e dos seus produtos operantes é serem propicios & produgdo, produgdo que ¢ a geragao do novo, daquilo que 322k almeja a utopia; funcionamento ¢ produgdo so a mesma coisa. Fungdo ¢ sinénimo de reprodugao: & a tentativa de reiterar 0 mesmo, de perpetuar o que jé existe, aquilo que ndo é operativo para propiciar as transformagGes sociais, Entdo: instituinte e instituido, organizante ¢ organizado, produgdo contra reprodugdo, funcionamento contra fungi, Para concluir, exporemos definigées que so um pouco Aridas, abstratas, mas necessérias para entender os passos seguintes que vamos dar: digamos em que consiste, como entender, como analisar cada instituigdo, cada organizagdo, ¢ como intervir para favorecer a ado do instituinte ¢ do organizante. Nao se pode fazer este trabalho sem ter claras estas definig6es. Para concluir, os instituintes-instituidos, organizantes-organizados que constituem a malha, a rede social, nao atuam separadamente, mas sim em conjunto. E essa atividade em conjunto pode ser enunciada com uma formula pedagdgica: cada um deles atua no outro, pejo outro, para o outro, desde 0 outro. Essa & uma tentativa de enunciar o entrelagamento, a interpenetragdo que existe entre todos os instituintes © instituidos, entre todos os organizantes e organizados, Esta interpenetrago acontece ao nivel da fungo e ao nivel do funcionamento; ao nivel da produgdo e ao nivel da reprodugio; a0 nivel daquilo que funcionaré a favor da utopia e ao nivel daquilo que esti contra. EntGo, essa interpenetragao ao nivel da fungao, do conservador, do reprodutivo, chama-se atravessamento, Essa interpenetragdo ao nivel do instituinte, do produtivo, do revoluciondrio, do eriative chama-se transversalidade. Para dar apenas um exemplo, vou mostrar-Ihes um caso de atravessamento de fumgdes a nivel organizacional. Nés dizemos, por exemplo, que uma escola é um estabelecimento das organizagées do ensino, que por sua vez séo uma realizagdo da instituigéo da educacdo. Acontece que uma escola nao s6 alfabetiza, ndo s6 instrui, nfo s6 educa dentro dos objetivos manifestos do organizado e do instituido, mas também prepara forga de trabalho (alienado), ou seja, uma escola também é uma fibrica. Por outro lado, uma escola, de acordo com a concepgao de ensino que ela tenha, também consegue manter os alunos presos durante seis a oito horas por dia, ¢ além de ensiné-los a ler e escrever, o que fundamentalmente Ihes ensina a obedecer, e 0 que basicamente Ihes transmite & um sistema de prémios e punigdes, especialmente 3a de punigdes. Neste sentido & que uma escola é também um edrcere. Mas, além disso, o que a escola ensina € uma série de valores do que deve ser construido, do que deve ser destruido, ensina formas de exercicio da agressividade. Entdo, de alguma maneira, também se pode dizer que uma escola & um quartel ou uma delegacia de policia. Entio, vocés véo vendo como uma escola, ao nivel do instituido, do organizado, ao nivel da fungdo, ao nivel da reprodugio, esté atravessada pelas outras organizagoes. Existe uma estreita colaboragdo na tarefa de reproduzir 0 que esti, tal como esti, € dessa maneira colaborar para a perpetuago da exploragio, da dominagao e da mistificagao, Mas uma escola também é um Ambito onde se tem a ocasido de formar um agrupamento politico- escolar,um clube estudantil; uma escola também € um lugar onde se pode aprender a lutar pelos direitos; uma escola também ¢ um lugar onde se pode integrar um sistema de ajuda miitua entre os alunos; uma escola também é um lugar onde se pode adquirir elementos para poder materializar as correntes instituintes, produtivas; numa escola também se pode aprender a lutar contra a explorago, a dominagao, a mistificago, Ento, uma escola tem um lado instituinte, um lado organizante. Neste sentido, a escola pode ser também, por exemplo, uma frente de luta revolucionaria, de uta sindical, um lugar de doutrinamento para a revolugao, um lugar de exercicio da solidariedade. Neste sentido € que uma escola tem também um funcionamento articulado, interpenetrado com muitas outras organizagées, instituigdes, com muitos outros instituintes e organizantes da sociedade que atuam nela, através dela, para ela, por ela, e ela por outras, e ainda entre os diversos: quadros e segmentos desse mesmo estabelecimento, Essa interpenetragdo chama-se transversalidade. A interpenetraga0 a0 nivel da fungdo, da reprodugdo, como ja vimos, chama-se atravessamento. A interpenetrasao a nivel instituinte, produtivo, chama-se transversalidade, ¢ esta se define também como uma dimensio da vida social e organizacional que nao se reduz 4 ordem hierarquica da verticalidade nem a ordem informal da horizontalidade. Os efeitos da transversalidade caracterizam-se por criar dispositivos que nao respeitam os limites das unidades organizacionais formalmente constituidas, gerando assim movimentos © montagens alternativos, marginais ¢ até clandestinos as estruturas oficiais ¢ consagradas. 34 8 ‘Com isso temos definida, até certo ponto, a concepedo institucionalista da sociedade. A sociedade é uma rede constituida pela interpenctrago de forgas ¢ entidades reprodutivas e antiprodutivas cujas fungGes estdo a servico da exploracio, dominagao e mistificagdo (atravessamento), assim como também esté constituida pela interpenetragdo das forgas e entidades que estiio a servigo da cooperagao, da liberdade, da plena informagdo, ou seja, da produgio e da transformagdo afirmativa e ativa da realidade (transversalidade). PERGUNTAS REFERENTES AO CAPITULO II 1) 0 que 2) O que implica dizer que as instituigdes sdo légicas e que podem estar formalizadas em leis, ‘ow normas ou que se manifestam em hébitos? (o, para o Institucionalismo, as sociedades? 3) Quais seriam exemplos de instituigdes? Que so as organizagdes, os estabelecimentos, ‘equipamentos, agentes e priticas? 4) O que & o instituint funcionamento, a produga € © instituido, © organizante e © organi a reprodugdo ¢ a antiprodugaio? ido, a fungio © o 5) O que € 0 atravessamento e a transversalidade? 6) De que esté composta a rede social? 36 A

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