3 - 28-05 Ernesto - Ennes - As - Guerras - Nos - Palmares

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ERNESTO ENNES ‘Ceneereier oy Aneabs Blutrioa Calan e-Prenelee Milltecare-Chele de Seorie Ulivemrinn de Bilt Rachoal de Liber » GUBRRAS OS PALMARES (SUBSIDIOS PARA 4 SUA EISTORIA) 1° VOLUME INGOS JORGE VELIO «a “TROIA NEGRA* 1687 - 1700 Prefécio de Avonso pn E. TAUNAT —S a LP “COMPANHIA EDITORA NACIONAL Sio Poul, — Rio de Jancira — Reelfe — PérteAlegre PLINIO BARRETO tomy Crs e500 i963 aad OBRAS DO MESMO AUTOR © Gabinete Numismatico da Bibliowea Narional de Lisboa — Tnventirios, 1927 —: Lisboa, Offeinas Grificns da Biblioteca Naclonal, tn .° A Socio Ulramarina da Biblictecs Nacional de Lithoa — Inventariaa, 1929 — Lishoa, Offelias da Biblietece Neeioaal, ia &.° EM PREPARAGAO: DOIS PAULISTAS INSIGNES: Matlas Aires © Te Feea Margarida da Silvw Horta, AS GUERRAS NOS PALMARES — £° volume — Os Primeires: quilombas. PREFACIO A mats generosa dedicatéria entencen 0 antor deste oro reforpar com nma expostea) de molivor em forma carta, nova e honresissima demonstrate que me deixa ineds desbenceida, B que esta prove de apreco parte de um espectalista quem se aliam @ erndi¢do, a maestrfa, do melier ¢ a Meidex do critérto, Velo dste volume a'AS GUERRAS DOS PALMARES: Bina vex confirmer, exuberantemente, a adaplorda, collsds da pesquisa histérlea colonial brasileira, do @ fda repelido brocendo de que as chaves de S. @ ea as da hisloria medieval do Ocidente. _Acaba © Sar, Ernesto Ennes de demonatrar, ¢ do do mats brilkante, quanto ¢ narrative do epteodio pate » apesarde jet largamente debatido e vbservado historledores brasileiros, fattacam ainda muitas das importanies peas decumenteis inéditas do Arqttivo fal Portngués a cite exumou, Se se coleiasse tudo gue of nosros historiégrafos modernos ¢ conlempardneos escreveram sdbre s haveric material compardoel, pete volume, a enciclopédia ce avantajadas dimensdes, Maz ¢ que maioria destas paginas coplastsslrnas mio passa B repelicéo, frequentemente a mats deseleante, por fe de seus autores, profissionats do aproveitamento Ernesto ENNES de wlheio estérco on meros candidates @ remunerariis @ tanto por pagina. © epleddta palmarense, dentre of que enehem os 0% sos velhas fastos, fot talves que mats impressionoy Us iistoridgrofos brasitetres anttgos. Compreende-s¢ porque: representa uma evocagio dé Intenso temor retrospective por parte do brance arreplade pela idéla do exterminio da gente da sna ropa pelo negro rebelade, horrorisade pele passibilldade da chacina dot Senhores pelos escravos, apqvorado ante 0 expeldcute da subversée completa da ordem sociale disetplinar de Brasil, da‘ruina abdbluta do edifieio colonial, numa wale cipagdo dayuela ferrleel experiéne’a fetta, em fins do secwlo XVHI, com os celonos francéses de Sdo Do- mmdngor. © perige era grande, era mesmo enormic, ¢ a ead passo quentada e hipsfese de sna ocurréncia, seaito mesma propuosticada, Até mesma ft tm anor do Brasft (ndé= pendente pela vor de arautas de meat agouro, no genera fie mn Vietor dacquemont @ outros valicinadores que fellzmente nado foram senda eassandras destituldas de dom profétice, Tai a impressio defvade pela eatenta ¢ projunda rebeltga servil do secuto XVUE, que os nossos cronistas seus repelidores, a partie de Rocha Pitta, the atrtbuirant Importéncia muito maior do que ao ciclo bundetrante. per exemplo. FF esta tmpressto se fransmitin aos eslrangeiros que se vcuparan do Brasil, Consagraram éstes posites ‘mats paginas aa caso palmarerse c & debelardo da ameara fortissima que répresentava. & que perceblam 9 pertge enorme da renovacde desta rebeldia, podende tornar-se pravisslme com as enormes aglomerapser de cativos pro- minerardo ito ouro ¢ depots pela faveura @lada cm 1850 havia ro Bi rast dots millnies de y. 1 mesmo dais ¢ "meio milhdes ove miles de almas! peters HOKE, COM Os anos, oO nitmera de conteibai- milotay, tendo metmo a cada passe tnafets, doe res lmpenttenies que por vexes nuda mals cram a” praticantes do efernamente nowa sic vos @ aparecimento da Revista do Instituto Histori stérieo eomeraram a oparecer as* contribuigdes do sdbre os Palmares como por exemple @ Rela- as iervas fellas ace Palmares de Pernambuco ne governador D. Pedro de Almeida, « Memoria Mie so deram durante os, primeiros anos de fom os esros quilombolns dos Palmares, publ ro Paulino de Fonseca, as Condleses alu am o governador dos panlistae (Domingos Jen [A Bitnat 9 mmeonitica extudo de Nina Redilenal mamas da hist6via dos Palmares. : @ elevagdo do espirite formosa abordon @ itt a gare de TRGTA NEGIA lancardo méo de litos holuad?ses e ontros, com grande pra- © maior esclarecimente de ta imperfeito Revista do Instituto Arqueolégica de Al: i weld 0 frnto de pecquisar recllcades new ar felpats alareanos, alguanes delas muta fre 4 de Dias Cabrel por exempto, Assim Revista do Instituto Arquoolégica Pernam- apendiava em suas paginas boos achégas, Borla tornon conhecido o documento ele dra da Plawi, estabelecedor de prioridade 4 Exnesto ENNES inconenssa de Domingos Jorge Velho come apessador ‘das terras do vate merfdfonal do Parnaibe. i Noo ltimos decénios crescew ¢ mule, & acérva documental palmarense dictlgade pelo penemérite Sta Mjort «por Borges de Barcos, saudoso itl, tao. pre= meturamente desaperectda, a quem se dene & divielgagte a otimos papels encontrades no argiiva a Bala, Citimamente 0 douto Rodolpho Garcia aumenion imento ‘late mananctat com ax peca rranecritas 2a $6716 preciosa dos Porumentos da nossa Biblioteca Nacfonell Oatro e excelente rebuscador, embora modesto, Wen- cerlan de Almeida, tho cedo ¢ erwelmente arrebatedo @ victa, tambéne aleneou excelentes resultados rebis- ‘cand em cartérios munteipale © realstror de ferras de Alagoas. “Grogas ao seu trabalho pude identificar vem era 0. Domingos Jorge Vetho, expagnadar de Palmar ts, dentre itiversos paatistas homdnimes ¢ confempartncos. ribuipiéo de Eraesto Banes tniter plsadto Vem agora & cot verdadeiras precioridades pera a ventilagée do ¢ aviscentista, Néo hd exageragtio no que aqui se afirava, Lembremo-nos simpleamente de que adn relatérios exfensos do préprio punko do meatre de campo dos paulis- far an Ref, qbsotaitanente (nedlios ¢ replelos de PATE nores. Recordemo-nos de que étes papeis nos revelam sre adele de aluslea e capitnlarécs mlttiarer s80re Gontpanhes palmarenses ¢ « expugnagdo de grande qul- Tombo; divulgam-nos tniimeras [és de ofteto refertas de particulartdades weliosas ¢ ariadas. Noramente reforpa esta ctreunstinela @ asseverapto relative & existencia de sésamos de numerdsisstines capi> As Guemmis Nos Paustanes Rosa histéria na re rcesse dos B ena, lentremerte en is exdlo 2 expressiva do que estes palavn os Eanes: ite Ener: "Os ergiace # bbistecas te Port Imanecem peindes de manures ¢ edd 2 imenios oficiats cee a Histéria do Brasit Berlenese por miibares, pare nto dtr milter ee estes, documents, carey, wees, men - Hustla, mapas, planus, desenhos, et. ceca , 1 @ fenton as dt es sates, mit Ms entron apenas extrolto, ral esta faaas Ie mea, ¢ at Tnerpretads « materia re inp ir pots para o contecimente © diveloario riquesa decuinental 4 fe benemérita”, fal é obra absolidamente indtspen- absolutamente tnédifos Rememor femora Hrneslo Bones 0 coucelto friuante de or drtdsea de gue «ere da Titi se. encerron B dan User @ do Bosumens, & reatmente nlngrém Mile 0 ge se perma fore “a deo ¢ dathenton M Tita, gu, fem pene stele XVI he verb g fess Pedro Tegues “escrever a Hitdra em a ts anamente dori yates tae dosent, pa aioe Mate Brwcsto Runes enorme cpa sce material ro eiloesinente dex feos palnateser Hoh on eos opuionfs achater cont a seqtranea ae te Henou senhor abstite do custo. vertade, se gee uatna a thcfder do eiterio, « a / propdatta, Pes um service relevante & m q tile volume a4 CUERRAS DOS PArAanee 45D) See ac hl AO Exmo, Sar. * ! Dr, AFONSO DE E. TAUNAY Hoctee Dirntor do Musen Paullsta . é ater da monumental obra “HISTORIA GERAL DAS BANDEIRAS PAUDISTAS" ‘Olereoe respeitosamente 0 AUTOR Ernesto Ennas quede da TROLA NEGRA ¢ as operacdes rdbre ax cam otha: conlempordieas da Guerra dos Barbaros pela fafnagita de Matis Cardoso de Almeida ¢ seus émulos Famosos, Assim v. g. aduz E. Ennes o texto dex capitulagses de pas entre brancos e indios, promovidas por aquela interessantissima figura até hoje paxco desvendada, ‘de Joda Pais Froriéa, 6 neto (2) do ven homdnimo. de Mogu dos Cruzer (?) win des herols dagueta ainda semi miste- rosa relirada da Cabo de Sdo Rogne, em 1640, epizédio des meis gloriosas dos wossos fastos militares, Néo consegul ver o fexto de tat trotado nas minkas buscas hos arguives Brasileiros, aa redigir o stlima iéma de minha HISTORIA GHRAL DAS BANDEIRAS PAULIS- PAS, Veio-o agora de torna viagem de Portugal, Outros documentos excelentes aéste volume: ox que se referere aa primeira povoamento do Ploul, Infell« mente ndo os acompanham papéts que conirébnam para © tluctdumente definitive da prioridade debaitda, entre Domingos Jorge Velho e Domingos Affonso Sertaa, ques- tao esfa a men ver tiguidada pelos termes da peea prie maclal e wié hoje indesirulteel, da peticdo de 0, Jerint ma Cardim Froes, viuwa do vencedor de Palmares, a Bor Pedro if, descoberta por Pereira da Coste, Outros papdis divutga Ernesto Eanes também impor fanies para os fastos de povoamento maranhense: os que 4@ referein ds possadus de poueo conhecidd Francisco Dias de Siquetra o cruel Apwed, Aa mesmo fempa ainde se vaten de ensejo para tom nar conhecidas documentos inéditos precioscr para a Aistria da medicine do Brasil, o: que se referem & tre- ienda pandemla amaritice setscentiste, d BICHA coi temponinea des campanhes palmerenses, As GUERRAS ‘Nos PALataREs Mo nosso antor prossegnir na fina de escterecer fasios mercé dos riguissimos filées daeamen imensa mina do Arquivo Golontal Portugués. issim o fara, fongamente, a exemplo désse ifustre emtérile Jodo Litclo d'Azevedo a quem tanto devemos brasifeiros ¢ désse outro e eminente caltor de nossos Seraphim Leite, “Ampare 0 nosso puiblico este vaiume TAS GUERRAS PAEMARES, com a mator interdsse, Serd ato da AFONSO DE BE, TAUNAY |S. Paulo, 26 de junho de 1998 Lisboa, 4 de Abril de 1937, ir. Dr. Afonso de E, Taunay Diretor do Museu Paulista i S, Paulo — Brasil, 0, Senhor: Carta do Amtor ... Ag Guerras not Palmares, certa maneira, « paternidade espiritual déste a V. Ex". Avésso a@ utilizar do- que se me deparam no exercicia da profissio tecdrio. « Arguivista, que professo ha mais de -e pela convicedo arreignda de que a missio do compets, exclusivamente, coligér @ material estudiasos utilisarem, fui forcade, por motivos dem profissional, a trensigir com éste modo do isar material, algum que ji conhecia, outro ei @ recolhi, acérea dos Palmares. Féram 2 meses de irebalho intensa © exaustivo, que | momento me dasa rebates de conciéncia, Ia- no que ésses documentos ndo fissem antes uti- { por P. Ex.*, o grande historiador das Bendeiras wv sucessor do exiraordinario Capistrano, fasting, de certo modo, olhos pregados em. sons labores, pensando no reléva que V, Ex." the yprimir, das conclusSes eruditas que déles frar, que coligi os documentos, que stilizei nie, pera o trabalho que tenho o henra a V. Ext, descarregando a minha coneléacia ERNESTO ENNES de Arquivista ¢ prestando uma justa homenagem da minha mais alta consideragéo pelo seu elevado talento de Historisgrofo brasileiro, Queira, pois, V. Ex! accitar a pequencs da oferta e ‘os protestors da mais alta consideragio de quem & AS GUERRAS NOS PALMARES fio obstante a inclinagéo acentuada pela his- De YBa nacional, do espirito renovador da mo- Mie At? o Obg.? i geracio de estudiosos brasileiros, a eultura ERNESTO ENNES idos histéricos — devemos dizé-lo — tem sado os trabalhos de investigagio de novas fon- 1 publieagio de novos documentos, Tirados trabalhos de alguns investigadores de todos co- dos, exceptuando as contribuicées dos Insti- ticos e Geogrficos de quasi todas os es- da Sociedade Capistrano de Abreu e das Re- oficiais de Museus ¢ Bibliotecas, pauco mais am aumentado o cabedal da documentagio, ea da Histéria do Brasil. no entanto, os Arquives ¢ Bibliotecas de gal permaneetim pejados de manuseritos ¢ repletos de documentos off bsolutas inédites acérea da referida Histéria. Con- yee por milhares, para nio dizer milhdes; sio Bs ¢ cédices, documentos ¢ documentos, car- os, memdérias, desericSes, mapas, plantas, ete,, tude inaproveitado, inerte, sébre © tantos assuntos, muitos ignorados, outros ‘ehtrevisios, mal estudados uns, errados mui- ‘mal interpretados a maioria, Contribuir, o conhecimento e divulgagio dessa ri- 4 Eanesto Ennes queza documental espalhada por éses Arquivos & @ que nos propemos fazer, em ripidas notas ¢ maior numero possivel de documentos. E porque a questo dos Palmares & das mais mal cstudadas ¢, até, desconhecida de cruditos ¢ investigadores, por caréncia de documentos, 6 com a questio dos Palmares que iamas éstes trabalhos, eertos de que contribuimos assim para a rectificaefo de um dos capitulos da histéria do Brasil mais interes: santes, que tio funda ¢ yincada influéneia assinae lou na Sociedade Pernambucana do séeulo XVII, Vito largos os anos ¢ longe ax tempos das fale sas narrativas, mais on menos genialmente urdidas, em, que os documentos eram simples motives dé arte, sem outra consequéncia que o desvirtuamen- tae deturpacto dos textos ¢ da verdade. Hoje ¢ isso impossiyel — o documento substituiu o veeba- lismo literario © convencional, a yerdade histériea tobrepéc-se as locubragics mais ou menos fantas: teas. A afirmativa dum eseritor inglts: que o tempo da Histéria passou ¢ estamos em tempo de Documentos cuja leitura é mil yeres mais interes sante e mais instrutiva do que a de todas as his. térias, é uma verdade verificada. N&o que as sin- teses ea divulgacio da Histéria néo sejam uma necessidade ha muito reconhecida, mas uma c ou- ‘ira s6 podem ser feitas s6bre verdades rigorosamen- te apuradas, de modo a serem exeetas ¢ nio incu tirem nos espiritos ideias falsas e factos erroneos, As Gummms Nos Paumanes 15 @rea dos Palmares, mais talyez do que em ‘outra capitulo da Histéria do Brasil, teem- do, transmitido © repetido falsidades e erosimeis de conceber, em presenga de do- Sio esses, que pacientemente coligi- damos & luz, certos de que prestamos uni fs historiografia nacional e brasileira. esta conformidade, em presenga da enermis- megs documental existente no Arquivo His: Colonial de Lisboa, selecionamos uma série umentos interessantissimos, que vio clucidar damente obscuro, da extingio dos Palmares, s apreensées causou ao Brasil ¢ & Metro- niio podia deixar de ser, precedemos a eGo désses documentos de unias Hgeiras con. acérea da maneiza como a maioria dos téem interpretado ¢ descrita os factos, na realidade, em face dos documentos oficiais, ‘passaram, sem esquecer que outros mais com saberio, melhor do que nds, tirar o fruto ladeiro désses documentos, que temos a honra submeter 4 apreciagio dos estudiosos, com a satisfagio de havermes prestado um serviga ografin nacional ¢ brasileira, E isto, ¢ sé indemniza largamente dos trabalhos e can dle os termos coligido, 16 Exnesro Exxes Estudar cada um dos elementos que o valor da raga soube utilizar, para a Expansto Portu- guess ne Mundo, 6 tarefa a que se deve impor todo aquéle que ao estudo da Historia da Colonizacio do Brasil deseja oferecer qualquer contribuicko, Por mais modesta que seja, Nésse proposite, con- vencidos de que um dos mais importantes © po- jos de que nos servimos para a cir derotos elemer lonizagio do Brasil foi o negro, é 0 negro que vamos estudar, numa das mais importantes das suas revolias contra os dominaderes — na ansia uns, de se liberiarem da escravidio e do dominios ow twos, de civilizarem, colonizarem ¢ os encaminha. rem na senda do progtessa e da civilizagio, Frustrado @ sonko da India, viram os portu gueses a necessidade do regressarem a tradigho agricola, que haviam abandonado pela coméreio das especiarias. © exemplo da Madeira © dos Ago- tes, onde a cultura da enna do agucar provocara um rapido desenvolvimento ¢ prosperidade, fei com verteza o estimulo que levon os portugueses a i ciarem no Brasil a cultura deseas @ outras especies tropicais (o agucar, 0 tabaco, 0 algodio, éte.,). Em face, porcm, dum territorio imenso, limitados a uma escassa c reduzida populago de poueo mais de milhio ¢ meio de almas, nko podiam os portugue- ses satisfazer ds exigencias do seu genio coloniza: dor, se niio langassem mio das populagées negras, As Gurrmis Nos PaLManes Ww que @le souhera cativar e submeter. E para tal, sas faculdades soube desenvalver, que ios, que estupendos heroismos, que Intas homéricas ‘nao foram precisas realizar! Alem disso, depressa ce concluiu que nem o europe resistia ao sol dos tropicos, pois enfraqueeia ¢ mor- fins nem o india se sujeitaya ao trabalho intenso ¢ continue tio necessiria ao progresso das industrias, Daqui, Gasceu, inevitavelmente, a ideia de aprovei- tar o negro como maquina de trabalho, e foi en que se comegou a introdusir éste no Brasil. A pat tir déste momento, jamais deixaram de se importar eserayog e instalar engenhos até & descoberta das Minas, em que de novo se quebra a tradi¢ho agei- cola, ¢ em que a raca paulista toma definitivamente a hegemonia, mercé do genio heraico e aventureiro que Thes soube radiear a raga portuguesa, Os primeiros negros ¢ os primeiros engenhos datam respectivamente de 1570 ¢ de 1533 (1542 em Pernambuco), D'ors-ern-diante, nao dem numero os hegtos importados e, em 1630, 56 em Pernambuco, andava por 4 mil em cada ano, ¢ a producio do Aguear ¢ o estabclecimente de engenhos atingia res- pectivamente 528 ¢ 1.297.500 arrobas (J. Lucie de Azevedo — Epecas de Portugal Economica), ‘A ste desenvolvimento agricola, principale mente em Pernambuco, devia ter correspondido, haturalmente o aumento da populagio negra, pois 18 Nesta ENNBS que ainda o Rio de Janciro no contava nem um engenho de aguear, j4 Pernambuco contava 23 e a Baia 18; por outro Indo, a proximidade rela- tiva das vastas florestas de palmeiras, a 20 on 30 Ie- guas da costa, com um terreno fertilissime e um clima excelente, convidava o negro a tentar liber- tar-se da escravidio fugindo a severidade e violen- cias dos Senhores. Foi assim presumivelmento, que se constituiram os primeicos “quilombos” em que se reprodutia, com maior ou menor exactidio, a vie da pris dos negros, donde a crueldade do bran- ¢0, ¢m nome da Civilizagao, o tinha ido arrancar, O que foi ésse drama da eseravatura, sabemo-lo nés, sabe-o toda a genie, No Arquivo Historica Colonial sia inumeros os documentos que se guar- dam, que dio a medida dos meios que se utilizavam para o resgate désses miseraveis csctavos, utilizan- do-se por vezes os mais ferozes antropéfagos, os Jar gas “como ciiis de eaga”; no dizer de Luiz Mendes de Vasconcelos, que foi Gevernader de Angola em 1617 “devem ser mats os que comem que os que entrogam vivos, por ser esta a sua mais ordinaria comida”, (Alfredo Felner — Angola: Documento n° 39, p. 456) para depois serem resgatadas ¢ des- cidos © finalmente, embarendos. “Amontoados no pordo, quando o navio jagava batide pelo temporal, .. As Gurams wos Parmanes 19 ide corpos negros agitava-se como am formi- e homens, para beber évidamente um pouco ‘ar Ingubre que se escoava pela escotilha gra- de ferro, Havia li no scio do navio balou pela mar, Iutas ferozes, gritos, uivos de colera pero. Os que «sorte favorecia, nésse ondear carne viva negra, aferravamese d luz ¢ rolka: @ estreita nesga do céu, Na obscuridade do os injelizes, promiscuamente arrumados a , ou catam indnimes num torpor letal, ou e, desesperados ¢ cheios de jurias, Es- sulavam-se, esmagavam-se: a uns saiam-lhe do a3 entranhas, @ outros quebravam-se-lhe bros nox choques dessas obscuras batalhas, massa humana, cujo rumor selvagem. saia pela titha aberta, revolvia-se no seu antro afogade igrimas e em. imundicie®. (Oliveira Martins Brasil ¢ os Colonies Portuguezas’— p. 59 © E niio obstante essa mercadoria era assaz siosa, pois custava perigos inenarraveis, herois- estupendos, lutas deshumanas; eram tais os Ores a que cram sujeitos, que ainda hoje vertigens a cua descrigio: muitos, para es- parem a tais pavores, preferiam o suicidio, lan- o-s¢ a0 mar na Ansia de ge libertarem do mar- pela morte redentora, ou produziam fendas ‘nos pordes onde cram transportados, para a morte serem igualados na mesma sor- fe algozes, 20 ERNESTO ENNES “Quando 0 navio chegava ao porto do destino — uma praia deserta ¢ afastada — o carregamen- to desembarcova; ¢ & lus clara do sol dos tropicos aparecia uma coluna de esqueietos cheios de mrestut- las, com o ventre protuberante, as rotulas chagadas, a pole rosgada, comidos de bichos, com o ar parte e esgazeado dos idiotas. Muitos nao se tinham de pé: tropecavam, caiam, e eram levados aos om- bros como fardos”. (Oliveira Martins — O Bra- sil e as Colonias Portugnezas, p. 60). F Chegados a fazonda, quanda o mereador of nao vendia on exportava para as Indias de Castela dondo os espanhois os earregavam para 9s Antilhas, o negro dava entrada na Raga ou no Engenho, onde o fazendeiro o submetia 4 disciplina mais feroz. Era vulgar vér os negros presos por correntes de ferro aum eépo, a trahalharem junto das ealdeirass o chicote era © acicate quo os fazia trabalhar; o castigo era frequente, alimento ¢ vestuario limi tados, “Houve senhor, que Iangow algum na cal- deira fervente ou fez passar ua moenda, esmage- do por vinganca on castigo” (Lueio de Azevedo — Epocas de Portugal Economica, ps. 267 © 268) e aos ingleses se atrilmem os termentos a que sie jeltavani os escravos metendodhes os pés entre as rodas dos éngenhos (Marquez de Lavradio — aboligdo. da escravature e a ocupagéo do Ambriz, p. 47). Mas, se nos horrorizam estas violencias ¢ atto- eidades praticadas, devemos reconhecer que a es ‘As Gurmeas Nos Pausanus al i foi o duro preco por que todas as soci odernas puderam entrar no gremio dos po- @ que, so realmente praticdimos em larga o comercio da escravatura, niio devemos nem mos esquecer que sem negras 0 Brasil nfio sxistido; sem escrayos Nacho alguma come- Martins, idem, p. 53) © que todas déles “am, em maior ou menor eseala. Desde a mota antiguidade a esctavatura foi a triste yencidos, ¢ nem sempre fomos os mais na aplicagio dos eastigos; mas até os plerantes © compassivos, como ainda hoje as colonias o atestam ¢ modernos inqueritos o am eloquentemente, E se é certo que o jo désse negro escravizado foi imenso, im menores os herreres e martitios que ‘Weres ses pobres colonos portugueses su- em Pernambuco, vitimas do barbarismo ies désses mesmos negros revoltados, ne perto dum seculo, suportdmes com a gnacio © heroismo assaltas, roubos, assas- violeneias, que 6 apés porfiadas Intas co- » portugueses souberam dominar, nessa tre- rebeliio que impropriamente ge habitnon a Confederagio dos Palmares admira pois que o negro se rebelasse? tl mse, ainda, 8 factores que deviam influir do infortunado negro; a nostalgia da vita nascer; 4 famosa doenga “O Ban- as EuNEsto ENNES zo", a quo éste niio resiste, nio havendo coagio, jura, compromisso on contrate que éle nao abandone na de seja que perigo ou vielencia for; ¢, finalmente, a titania dos Capitdis do Mato, a que incumbia « tarefa de csquadrinhar, farejar as pa- ragens ¢ os bairros cscusos onde se ceoitaya, para quando os tepava a enteegar ag primitive dono, constituindo a eaga so negro um dos negocios mais rendosos desta época, Que admira pois que o negro se rebelasse?!! Mas, ainda assim mesmo, o negro se née rebelou, Fugiu — embrenhau-se no mato, perdeuse pelos desvios das serras, acondicionou-se 4 sombra dos palmares, escondeuse na escuridie da floresta, Se de principio roubon_¢ pilhou, se por largo tempo viveu da rasia das plantagées proximas ¢ do saque dos fazendciros, se foi asilo de escravos fugitivos, depressa ce fornou agticultor, plantow, arreteou, amanhou ag terrae, que transitoriamente ocupava e, A medida que a sua organizagio crescia, ia ahando- nando a primitiva pilhagem ¢ roubo, para comer- ciar ¢ permutar os produtos das suas lavouras ¢ granjas com os fazendeiros, ¢ antigos vizinhos, pelos _ generos de que carccia: alfsias agricolas, armas, eto, Assim viveram pacificamemte durante os pri meiros tempos estes negros, transfugas sim, mas Tibertos das tiranias dos homens, fortes na sua unite, vivendo no sossego das suas layouras, apsscentande 08 seus gados, cuidando das suas grangearins, até GUERRAS Nos PALatinrs Feunitam outros, ¢ mais outros, que © abandono em que os senhores di fous engenhos ¢ Inyouras, para pegaren ‘eontra 6 invasor holandés ou se récolhe- ices arraiais, fulctos homerieos de re- iriotiea da raga pormgucsa, Os nogros Aproveitaram da oportunidade para se ree nos Palmares, onde disfrutavam um solo Tina natureza previligiadas onde os tios M4, 4 ened, & pesea, as matas ¢ os frutes cram. ites, E possivel, ¢ até certo. Ponto segu- Nesta emergencia da guerra, nem 56 es © cativos se utilizassem do seguro asilo dos | ie tambem negros liberios, mulatos, © até-brancos criminosos ¢ deeerto- PFocurassem ali o refugio seguro con- des da guerra, deracio dos Palmares, que quasi oeu- te © secule XVIL€ embora para al- nfo passe de ima monotona revol- vos, para outros|constituin uma republi- © organizada, © talves até queiram vér nela eiros alvores da independéncia da raga, se- nigho de um Estado Negro, que, reeon- fieado © norte do Brasil, 0 governo meter © que ao malogrado homem de Nina Rodrigues mereceu as palaveas F talias quo transcrevemos: “A todos os 4 Ernesto Exnas respeltos menos discutivel & 0 service relevante prestada pelas armas portuguesis © coloniais, dese truindo de uma vez a maior das ameacas & civilisa- gto do futuro pova brasileiro, nésse navo Haiti, re fractario do progresso ¢ inaccessivel 4 civilisacio, que Palmares victorioso teria plantado no coragée do Brasil. E ésse sucesso ndo foi producto de uma accéo facil ¢ sem perigo, Custou ao contrario & tcnacidade e providencia de Governa Colonial gran- des sacrificios de homens e de dinheiro™, (Dr. Nina Rodrigues — Os Ajricanos no Brasil, p, 121), Mas, que foram ses Palmares? . Melhor do que nés o fariamos, 0 Governador de Pernambuco, Fernio de Sousa Coutinho, em carta de 1 de Junho de 1671, escreve: “Snor, Ha alguns anos, que dos negros de Angola fugidos ao Rigor do Cativeiro, @ fabricas dos Enigenhos desta Capitenia se formaram. povoagées numerosas pela terra dentro entre os Palmares ¢ mnatos, cujas aspereses, e faltas de Caminhos os tem mais fortifieadas por naturesa, do que pudera ser por Arte, ¢ crescendo cada dia em numero se adiantam tanto no atrevimento, com que continuos roubos, ¢ assaltos fazem despejar mutva parte dos moradores desta Capitania mais vizinhos aos seus modambos, cujo exemplo, ¢ conservagéo vai convi- dando cada dia avs mais que fogem. por se livrar do rigoroso cativeira que padecem, ¢ se verem com a Tiberdade lograda nia fertil das terras, e seguranca 25, es podendo-se temer que com estas cresgam. em poder de mancira que maior o mimere, pretendam atrever-se Mice como sic os moradores desta Capitania 0 dos seus calivos; para evitar este dano, @ passar ao Porta Calvo na entrada deste mais proporcionado para se fazer esta dali com cantinnos trogos de gente que se doutra, mandar abrir caminkas para os wes por onde possam ser investidos e Gs suas povoagaes, continuamente até de ttinguirem, e ficar livre esta Capitania deste funio a amenca; ¢ posta que ndo sito pow c que para este finn se me oferecem. tsa das terras, falta de caminhos, ¢ do ‘Para os mantimentos que em toda este nie podem conduslr seudo ds castas de tide haver estradas para carros, mem para um homem atrés de outros, Contudo es- a boa deligencia seja poderosa para vencer lek inconvenientes, Fico refazendo os ter- | Mumero da sua ultima reformacao, ¢ alise dores mais capazes para esta guerra, se niio poderd cobrar cousa alguma sem da fazenda de V. A., é necessario seja servido haveto assim por bem, ¢ ‘ordem para isso sem embargo de que s poves contribuem com tudo vo come fiz pare o socorre de Angola,

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