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———S~=*é=<=<;272;2SCSC;C; iI, 0 pag DO FILME Sergei Eisenstein O Sentido do Filme Apresentagéo, notas e revisio técnica: José Carlos Avellar Tradusao: ‘Teresa Ottoni Jorge Zahar Editor Rio de Janciro re ‘Tieulo original: The Film Sense Copyright © 1947, 1942 by Harcourt Brace Jovanovich, Inc. Copyright renewed 1975, 1970 by Jay Leyda Published by arrangement with Harcourt Brace Jovanovich, Inc. Copyright © 2002 da edigéo em lingua portuguesa: Jorge Zahar Editor Leda, tua México, 31 sobreloja 2031-144 Rio de Janciro, RJ 1) 2240-0226 / fax (21) 2262-5123 e-mail je@zaharcom.br sites wwwzahar.com.br tel “Todos os direitos reservados, A reprodugio nio-autorizada desta publicasao, no todo ‘ou em parte, consticui violagio de direitos autorais. (Lei 9.610/98) Capat Séigio Campance Primeita edigio em lingua portuguesa: 1990 Oseditores ageadecem & Fundagio do Cinema Brasilcto e, em especial, {sua Diretoria Técnica, ropresentada por Ana Pessoa, pela reprodusio fotogréfica das cenas dos filmes de Eisenstein utilizadas na edigio brasileira de farma do filme e Osentide do filme. Os edicores agradecem também & Cinemateca do Museu de Arte Moderna do Rio de Janeito por ter cedido cépias dos filmes Alexander Nevsky, A greve, O encounigado Potemkin e Ourubro para que as reprodugies fossem feitas dirctamente dos fotogramas desses filmes. Reprodugio dos fotogramas feita no Laboratério da Pundagio do Cinema Brasileiro por José de Almeida Mauro. CIP. Brasil, catalogagio-na-fonte Sindicato Nacional dos Editores de Li Eisenstein, Ser 1898-1948 E375 _ Osentidodo filme/ Sergei Eisenstein; apresentacio, notase revisio técnica, José Carlos Avelar; traducio, ‘Teresa Oxtoni. — | Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2002 ity ‘Tradugio de: The film sense Anexos ISBN 85-7110-107-8 1, Cinema — Estética, I. Avellar, José Carlos, 1936-, iI. | Tilo. | CDD 791.4301 02-1642 epu743 | Sumario INTRODUGAO: Seria imposstvel viver, por José Carlos Avellar . . . « Palavra e imagem . . Sineronizagao dos sentidos Core significado... Forma e contetido: pratica NOTABIOGRAFICA © eee ee eee 147 FILMOGRAFIA. Se ee ee 149 SUGESTOES DE LEITURA « 153 153, 154 INDICE DENOMESEASSUNTOS .. 2... ee eee eee ee see 15S Textos de Eisenstein Textos sobre Eisenstein As notas ao final de cada capftulo assinaladas com as iniciais N.S.E. slo originais de Sergei Eisenstein. Apesar de 0 autor ser da profissio e saber tudo aquilo que a experién- cia, com a ajuda de mutta reflex4o, pode ensinas, nfo se debrugard tanto quanto se poderia pensar sobre esta faceta da arte que, para muitos artistas medfocres, parece.constituir a arte em seu todo, mas sem a qual a arte nfo existiria, Com isso, estard dando a sensagio de invadir o dominio dos eriticos das questdes estéticas, gente que, sem diivida, acha a experiéncia desnecessdria para ascenderem & andlise especulativa das artes. Tratard mais de questées filosdficas do que técnicas. Isto pode parecer singular num pintor que escreve sobre arte: muitos semi-eru- ditos se dedicaram 4 filosofia da arte. Parece que consideravam sua profunda ignorincia das questées técnicas um titulo a ser respeitado, convencidos de que a preocupagio com esse aspecto to vital para qualquer arte privava os artistas profissionais da especulagio estética. Parece até que imaginaram que uma profunda ignordncia das questées técnicas era uma razio a mais para se elevarem As considera- ges estritamente metafisicas; em suma, que a preocupagio com a técnica impede os artistas profissionais de ascenderem a alturas proi- bidas para os que nio pertencem aos campos da estética ¢ da pura especulagio. Euggne Delacroix Journal, 13 de janeiro de 1857 INTRODUGAO, Seria impossivel viver José Carlos Avellar A idéia deste liveo surgitt em agosto de 1941. Eisenstein, entio ainda em Moscou (em outubro cle ¢ todo pessoal da Mosfilm setiam transferidos para Alma-Ata), enviou um telegrama a Jay Leyda, em Nova York, perguntando se ele conseguiria nos Estados Unidos a edigao de um livro com Montagem 1938 ¢ outros artigos nao conhecidos fora da Unio Soviética. Pouco depois do telegrama, uma carta. Nela, os textos ¢ uma indicagio da ordem em que deveriam ser publicados — primeiro Montagem 1938, depois as trés partes de Montagem vertical; tambérn nela, as fotos de Alexander Nevsky para as ilustrag6es ¢ uma observagdo quanto 4 tradugio do primeiro capitulo — deveria ser consultada a versio de Montagem 1938 publicada em Lift and Letters Today, de Londres, porque para esta revista ele selecionara especialmente exemplos de poemas escritos em inglés. Jay Leyda, que na década de 1930 estudara cinema com Eisenstein em Moscou ¢ fora seu assistente de ditegéo no interrompido O prado de Bejin, conta como tudo aconteceu em Eisenstein at Work, liveo que escreveu com Zina Voynow, publicado em 1982 pela Pantheon Books e pelo Museu de Atte Moderna de Nova York. O sentido do filme ficou pronto em agosto de 1942, ¢ Eisenstein recebeu o seu exemplar no dia em que comemorava 45 anos, em 23 de janeiro de 1943. Ele preparava entio a filmagem da primeira parte de vd, o Terrivel, que comesatia em abril. Contente com o livro, escreve a Leyda dizendo que gostara de tudo, a comecar pela capa, amarelo e preto, como a capa de uma histéria de detetive, com um retrato dele com um sorriso de Giocondo, uma expressio meio irénica, um tipo de face daquele usado para ilustrar algo como “cle sabe tudo sobre o seu futuro”, ou como um livro sobre hipnotismo. A foto, diz Eisenstein, fora tirada no México. Ele tinha na mao direita, etguida até a altura do ombro, uma caveira de agiicar, das usadas nas festas do dia dos mortos. Cortada a caveira 0 que ficou foi aquele sorriso de Giocondo. “Wonderful. Splen- did”, comentou para Leyda. O sensido do filme foi o primeito liveo a reunir textos de Eisenstein. Foi também o tinico de seus livros publicados enquanto ele vivia. Pouco depois da edigéo norte-americana veio a inglesa, que ficou pronta no comego de 1943, ¢ para ela Eisenstein escreveu um preficio que jamais chegou as mios do editor. Ele se encontrava entio em Alma-Ata, O texto — Seria imposstvel viver — foi escrito ¢ enviado para Londres em outubro de 1942, mas se extraviou 10 O semtido do filme por causa da guerra, Parte deste prefiicio foi retomada pelo autor ¢ citada no quarto capitulo de A natureza néo indiferente, escrito cm 1945, Nele, Eisenstein conta como em outubro de 1941 deixou Moscou, entéo bombardeada pelos nazistas, 20 lado de outros cineastas soviéticos, em diregio a Alma-Ata — doze dias e doze noites num trem, espécie de nova arca de No no meio do diltivio da guerra. Diz como encontrar Alma-Ata no mapa, tragando com a ponta do dedo uma linha que vai do Sul da {ndia para o alto, parando na fronteira asidtica do Sul da Unio Soviética. Diz que ali, tio Longe, tio na retaguarda, seria vergonhoso trabalhar ¢ criar, seria imposs{vel viver, se ndo estivessem todos conscientes das missdes que deveriam desempenhar durante a guerra: primeito, disparat filmes ¢ filmes contra © inimigo, aplicando com o cinema golpes tio devastadores quanto os de um tanque ou de um avisios segundo, presezvar a cultura cinematogrifica da onda de destruigdo fascista. Diz mais, que as enormes montanhas cobertas de neve contra.o céu azul de Alma-Ata convidam A meditagio; que observar a neve na montanha desloca o pensamento do caos daquele instante de guerra para aarte ea cultura que virgo depois de terminada a loucuras que quem luta longe do front tem como missio analisar o passado para preparar o futuro; lembra que o fim da Primeira Guerra Mundial trouxe um inesperado florescimento da cultura, ¢ que o perfodo entre as duas guerras foi, mais do que qualquer outra coisa, a era do triunfo do cinema; diz que neste mesmo petfodo as outras artes se langaram febrilmente no caminho da desintegtagio e da desagregagao da forma, da imagem e do pensamen- to; que em nenhum outro momento da histéria as artes viveram semelhante impasse; que depois de atingit 08 mais altos pontos de seu desenvolvimento a arte subitamente despencou até chegar ao grat zeros ¢ que sé 0 cinema, porque ¢ a mais jovem das artes, porque partiu exatamente da desintegracdo em que as outras artes encalharam, sé o cinema soube resistir A tempestade de desagregagdo. Corta entdo © seu texto com uma frase solt Aarte € 0 mais sens{vel dos sismégrafos. E retoma a conversa dizendo que o impasse tragico em que as artes se encon- trayam nos tiltimos anos antes da Segunda Guerra refletia com preciso o grau de tensfo e as contradigGes dilacerantes em que o mundo se encontrava, contradigGes que finalmente explodiram numa carnificina de proporgées jamais vistas até entio, de proporgies dificeis de estabelecer quando observadas dali, daquele momento, de outubro de 1942. Diz nfo ter dtividas da vitéria sobre as trevas, mas que nao era posstvel ainda determinar o que 0 mundo teria de suportar até a vitéria ¢ depois dela. Relembra a histéria de Arquimedes, que teria gritado para os soldados roma- nos que invaditam sua casa para massacré-lo “no toquem nos meus desenhos”, ¢ diz que todos deveriam gritar um grito semelhante para salvar os filmes e as reflexes de toda a gente que trabalha em cinema; e que era por isso, que era como um grito, que ele publicava entéo, no meio da guerra, esta coletinea de artigos que examinam o passado ese voltam para o futuro da montagem, que foi de certo modo Seria impossivel viver " acoluna vertebral da estilfstica do cinema soviético até entdo. Nos iltimos anos, diz em seguida, esta linha foi mais ou menos apagada, a montagem deixou de ser 0 meio mais largamente usado nos filmes soviéticos, 0 que, sem diivida, historica- mente, no foi simples obra do acaso. Explica que nos textos de O sentido do filme procura demonstrar que a montagem é uma propriedade orginica de todas as artes. E que, estudando a histéria dos aumentos e diminuigées de intensidade do uso da montagem através da histétia das artes, chegou & conclusio de que a importincia do método e da estrutura de montagem diminui invariavelmente em épocas de estabilizacgo social, em épocas em que as artes se dedicam antes de qualquer outra coisa a refletir a realidade. E que inversamente, nos perfodos de uma intromissio ativa no desmonte, reorganizagio ¢ reestruturagao da realidade, nos perfodos de uma reconstrugfo ativa da vida, a montagem ganha entre os métodos de construgio daarte uma importincia ¢ uma intensidade que nio cessam de crescer. Eo primeiro livro a reunir artigos de Eisenstein. Foi o tinico que ele chegou a ver publicado. Na carta que enderecou a Jay Leyda com.os textos e a indicagao da ordem em que eles deveriam ser publicados, Eisenstein cita outros artigos que terminava de escrever entio, agosto-setembro de 1941; um texto sobre El Greco, a versio inglexa de um artigo sobre Griffith, partes iniciais de um futuro livro sobre a histéria da idéia do primeiro plano, projeto que nfo chegou a terminar, O artigo sobre El Greco, El Greco y el cine, foi posteriormente integrado 4 coletinea Cinematisme: 0 attigo sobre Griffith, Dickens, Griffith e nds foi posteriormente integrado & segunda coletinea de textos de Eisenstein. A forma do filme, editado em 1949, primeiro nos Estados Unidos, logo depois na Inglaterra, a partir de uma sclegio de artigos feita pelo autor no final da década de 1930 ¢ revista em 1947, um ano antes de sua motte, época em que trabalhava num outro projeto de livro: A natureza ndo indiferente, mais ou menos organizado de acordo com o projeto original ¢ divulgs- do em francés ¢ inglés a partir de 1978, E bem af, no final deste ensaio, quando diz que no indiference nao é tanto a natureza que nos cerca mas sim a nossa prépria natureza, a natureza humana que jamais indiferente mas sim apaixonada, ativa e ctiativamente investiga ¢ reconstréi o mundo, bem af nesta frase € que quase se pode resumir a energia de isenstein (igual a m de montagem e cde velocidade da luz, ou de cinema ao quadrado, 0 que existe nos filmes, ¢ 0 que existe também em. todas as outras artes), Energia nfo indiferente que se espalha igual em scus textos ¢ em seus filmes, que contagia 0 leitor ¢ 0 espectador a ponto de fazer presente pelo menos por um instante, pelo menos como sensagdo que brilha o tempo de um relimpago, pelo menos como coisa sentida como um sonho, s6 no consciente, pelo menos como sentimento que mal se traduz em razdo, que sem o cinema seria imposstvel viver. og I. Palavra e imagem: ‘Cada palavra foi permeada, como cada imagem foi transformada, pela intensidade da imaginagio de um ato criativo instigante. “Pense bem”, diz Abt Vogler sobre o milagre andlogo do mtisico: Dense bem: cada tom de nossa escala em si é nada; Exté em toda parte do mundo —- alto, suave, esdo estd dito: Dé-me, para usd-lo! eu 0 misturo com mais dois em meu. pensamento; Eis all Vocés virame e ouviram: pensem ¢ curvem a cabecal Dé a Coleridge uma palavra vivida de alguma antiga narrativa; deixe-o misturd-la a outras duas em seu pen- samento; ¢ entio (traduzindo termos musicais para termos literdrios), “a partir de trés sons ele formard ndo um quarto som, mas uma estrela,” JOHN LIVINGSTONE LOWES? Houve um perfodo do cinema soviético em que se proclamava que a montagem era “cudo”. Agora estamos no final de um perfodo no qual a montagem foi considerada como “nada”, Considerando a montagem nem como nada, nem como tudo, acho oportuno neste momento lembrar que a montagem é um componente tio indis- pensdvel da produgio cinematogrifica quanto qualquer outro elemento eficaz do Cinema. Depois da tempestade “a favor da montagem” e da batalha “contra a montagem”, devemos voltar a abordar esse problema com a maior simplicidade. Isto é ainda mais necessétio quando se considera que, no perfodo de “negacao” da montagem, seu aspecto mais inquestiondvel, o tinico clemento realmente imune 20 desafio, também foi repudiado. A questio ¢ que os criadores de numerosos filmes, nos iltimos anos, “descartarars” a montagem a tal ponto que esqueceram até de seu objetivo e fungio fundamentais: papel que toda obra de arte se impSe, a necessi- dade da exposigéo coerente e organica do tema, do material, da trama, dat ago, do movimento interno da seqiiéncia cinematogrifica ¢ de sua agio dramética como 13 14 O sentido do filme um todo, Sem falar no aspecto emocional da histéria, ou mesmo de sua légica continuidade, o simples ato de narrar uma histéria coesa foi freqiientemente omi- tido nas obras de alguns proeminentes mestres do cinema, que realizam vérios géneros de filme. O que precisamos, claro, é nao tanto da critica individual desses mestres, mas basicamente de um esforgo organizado para recuperar o exercicio da montagem, que tantos abandonaram. Isto é ainda mais necessétio a partir do momento em que nossos filmes enfrentam a missfo de apresentar no apenas uma natrativa logicamente coesa, mas uma narrativa que contenha o méximo de emagdo ¢ de vigor estimudante. ‘A montagem é uma poderosa ajuda na solucio desta tarefa. Afinal, por que usamos a montagem? Mesmo 0 mais fandtico inimigo da montagem concordar4 que. nfo a usamos apenas porque o rolo de filme 4 nossa disposi¢go nfo tem um comprimento infinito ¢, conseqiientemente, condenados a trabalhar com pedagos de comprimento restrito, temos de colocé-los ecasional- mente, Os “csquerdistas” da montagem estZo no extremo oposto. Ao brincar com pedagos de filme, descobriram uma propriedade do brinquedo que os deixou aténitos por muitos anos. Esta propriedade consiste no fato de que dois pedagos de (filme de qualquer tipo, colocados juntos, inevitavelmente criam um novo conceita, uma ‘nova qualidade, que surge da justaposi¢ao, Esta nao €, de modo algum, uma caracte- ristica peculiar do cinema, mas um fendmeno encontrado sempre que lidamos com a justaposicao de dois fatos, dois fendmenos, dois objetos. Estamos acostumados a fazer, quase que automaticamente, uma sintese dedutiva definida ébvia quando quaisquer objetos isolados so colocados & nossa frente lado a lado. Por exemplo, tomemos um timulo, justaposto a uma mulher de futo chorando ao lado, ¢ dificilmente alguém deixard de concluir: uma viva, E exatamente neste aspecto da nossa percep¢io que a seguinte minianedota de Ambrose Bierce baseia seu efeito. Trara-se de: “A vitiva inconsolavel”, uma de suas Fébulas fantdsticas: Uma mulher de luto chorava sobre um timulo. “Acalme-se, minha senhora’, disse um estranho compassivo. “A misericérdia divina é infinita, Em algum lugar hé um. ‘outro homem, além de seu marido, com quem ainda poderd ser feliz.” “Havia’, ela solugou— “havia, mas este € 0 seu timulo.”3 Todo o efeito da histéria é construfdo tendo por base o fato de que o timulo eamulher enlutadaa seu fado levam a inferéncia, devido & convengio estabelecida, de que cla é uma viva que chora o marido, quando na tealidade 0 homem por quem chora &seu amante. ‘A mesma circunstincia é freqtientemente encontrada em charadas — por exemplo, esta do folclore internacional: “O corvo voou enquanto um cachorro sentou-se em seu rabo, Como isso € poss{vel2” Automaticamente combinamos os Palavra e imagem 5 elementos justapostos ¢ os reduzimos a uma unidade, Como resultado, entende- mos a pergunta como se 0 cachorro estivesse sentado no tabo do corvo, quando na realidade a charada contém duas ages nfo-relacionadas: 0 corvo voa, enquanto 0 cachorro senta-se em seu préprio rabo. Esta tendéncia a juntar numa unidade dois ou mais objetos ou qualidades independentes é muito forte, mesmo no caso de palavras isoladas que caracterizam diferentes aspectos de um tinico fendmeno. ‘Um exemplo extremo disso pode set encontrado no inventor da “palavra portmanteas, Lewis Carroll. A despretensiosa descrigao que fez de sua invengio, de “dois significados colocados em uma palavra, como se a palavra fosse uma mala portmantean”,* conclui a introdugio de seu A caga ao Snark (The Hunting of the Snark). Por exemplo, pegue duas palavras, “tezr(vel” e “horsivel”. Decida que diré as duas palavras, mas nio decida qual dint primeiro. Agora abra a boca e fale, Se seus jensamentos se inclinam mesmo sé um pouco em ditegio a “terrivel”, vocd dirk ‘errivel-horrivel”; se eles se voltam, até devido a um golpe de ar, em diregio a “horrivel”, vocé diré “horrivel-terrfvel”; mas se vot tem o mais raro dos dons, uma mente perfeitamente equilibrada, dird “torrivel” > E claro que neste caso ndo ganhamos um novo conceito, ou uma nova qualidade. O encanto deste efeito “portmanteax” & construtdo com base na sensa- Gao de dualidade que existe na palavra formada arbitrariamente. Todo idioma tem seu profissional de “portmanteax:” —o noste-americano tem seu Walter Winchell. Obviamente, 2 manipulaggo méxima da palavra portmanteau é encontcada em Finnegans Wake. Por isso, o método de Carroll ¢ essencialmente uma parddia de um fendémeno natural, uma parte de nossa percepgio habitual — a formagio de unidades qualita- tivamente novas; em conseqiiéncia, é um método basico para se obterem efeitos cémicos. Este efeito cOmico é conseguido através da percepgdo tanto do novo resultado quanto de suas duas partes independentes — ao mesmo tempo. Os exemplos deste tipo de engenho sio inumerdveis, Citarei aqui apenas trés exemplos que se podem encontrar em Freud: Durante a guerra entre a Turquia eos Estados ba‘cinicos, em 1912, Punch retratou 0 papel desempenhado pela Roménia (Roumania) representando-a como um ladtio de estrada assaltando membros da Alianga Balcanica. A caricatura fol intitulada: Klepto- rourmania... ‘A malfcia européia rebatizou um ex-potentado, Leopold, de. Cleopold, por causa de sua relagio com uma dama chamada Cleo...

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