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ARGUMENTAGAO E MATEMATICA. Muitos estudos enfatizaram a importancia da argumentagao (Stylianides; Bieda; Morselli, 2016; Kim; Hand, 2015), pois as habilidades de argumentagao efetiva siio essenciais para a compreensao conceitual e a boa comunicagiio. Diversos estudos e documentos referentes a reformas recomendaram que os estudantes devem ter oportunidades precoces de fazer conjecturas, explorar sua fidedignidade, usar contraexemplos, justificar suas conclusées, comunicéd-las aos outros e responder aos seus argumentos (Common Core State Standards Initiative, 2010; Hanna; Villiers 2012; National Council of Teachers of Mathematics, 2000). Entretanto, o ensino da argumentagio em sala de aula tem sido lento, pois existem varios desafios tanto para professores como para estudantes. Os estudantes de diferentes niveis educacionais tendem a enfrentar sérias dificuldades em argumentac4o, como aquelas enfrentadas por estudantes do Ensino Médio ao justificarem suas solugdes (Ko, 2010; Stylianides; Philippou, 2007). A expresso “argumentagao matematica” é usada para designar argumentagao na aula de Matematica, ou seja, conversagées ai desenvolvidas cujo foco é a Matematica e que assumem a forma de raciocinios de caracter explicativo e justificativo destinados seja a diminuir riscos de erro ou incerteza na escolha de um caminho, seja a convencer um auditorio a aceitar ou rejeitar certos enunciados, ideias ou posi¢gdes, pela indicagao de razGes. Esta caracterizagdo merece trés reparos. O primeiro foca-se na natureza discursiva da argumentagao: “a argumentacio serve-se da linguagem natural como utensilio de comunicagao entre quem argumenta e o seu interlocutor” (Pedemonte, 2002, p. 29). Esta caracteristica nao exclui a referéncia a elementos nao discursivos: por exemplo, figuras, dados numéricos ou algébricos (Douek, 2000). O segundo reparo prende-se com 0 conceito de auditorio que entendo, seguindo Perelman (1993), como “o conjunto daqueles que o orador quer influenciar pela sua argumentagao” (p. 33). Este conceito remete para a ideia de que na argumentagio se deve ter em conta um outro. No caso concreto da aula de Matematica, o auditério pode restringir-se apenas a um aluno que delibera consigo proprio, pode ser constituido pela turma, na sua globalidade, ou por alguém em particular com quem se estabelece um dialogo, ou pode ser formado pela comunidade matematica. Em qualquer dos casos, trata-se do “auditério universal” referido por Perelman, no sentido em que é “um auditério racional que pode estar de acordo ou em desacordo com quem argumenta mas que em todos os casos esta apto a responder” (Pedemonte, 2002, p. 31). O terceiro reparo visa destacar a demonstracao, designada por prova matematica ou simplesmente prova, como uma argumentagao particular (Douek, 1998; Pedemonte, 2002; 2003), ou seja, a prova esta sujeita a constrangimentos proprios: “No que respeita 4 forma do raciocinio visivel no produto final, a argumentagao apresenta uma gama de possibilidades mais amplas do que a prova matematica: nao apenas deducao, mas também analogia, metafora, etc.” (Douek, 2000, p. 3). Por exemplo, a formulagao e avaliacao de conjecturas, a que esta subjacente o raciocinio plausivel (Polya, 1990), incluem-se nas atividades de argumenta¢ao matematica. A importancia de ensinar a argumentar em Matematica O interesse pela argumentagao no ambito da educagao matematica é bastante recente. Segundo Douek (1999) foi apenas nos anos 80 que ganharam terreno as discussdes sobre 0 tema, no Ambito do esforco feito para “atacar” o problema da especificidade da prova matematica relativamente a argumentacao e estabelecer ligagdes entre perspectivas epistemoldgicas, cognitivas e educacionais. Kilpatrick, ao apresentar uma perspectiva historica sobre 0 ensino da Matematica, referiu-se ao periodo de 1980-2000 como “the age of argumentation” . Encontram-se nas atuais orientagdes para 0 desenvolvimento do curriculo de Matematica, quer a nivel nacional, quer internacional, diversas recomendagdes que remetem para a necessidade de se dedicar atengao a argumentagao na aula de Matematica e de se criarem condigGes para os alunos se envolverem neste tipo de actividades (Abrantes, Serrazina, & Oliveira, 1999; APM, 1988; NCTM, 1991, 1994, 2000; Ponte, Boavida, Graca, & Abrantes, 1997). O destaque atribuido ao raciocinio matematico entrelaga-se com a importancia de aprender Matematica com compreensao. Subjacente a esta recomendagao esta a ideia de que saber Matematica é, fundamentalmente, fazer Matematica, e que os alunos através das experiéncias de aprendizagem que lhe sao proporcionadas deverao desenvolver o seu “poder matematico” (NCTM, 1991, p. 6). Em aulas em que é valorizado 0 raciocinio, a explicagao € a justificagao sao aspectos chave da atividade dos alunos e, assim, “uma €nfase no raciocinio, em todos os niveis da educacao matematica, atrai a atencao para a argumentacao e justificagao” (Yackel & Hanna, 2003, p. 228). A comunicagao matematica ¢ entendida como uma componente intrinseca do fazer Matematica: “Fazer Matematica envolve comunicar matematicamente” (Forman, 2003, p. 337). Esta recomendagao surge associada a perspectivarem-se os fendmenos de aprendizagem em enquadramentos tedricos que reconhecem o valor da linguagem natural e das interagGes sociais na construcao de conhecimento. Os alunos nao compreendem a necessidade da prova, nao Ihe reconhecem valor, ndo se apercebem do poder explicativo que pode ter e, frequentemente, nado conseguem encontrar sentido nos raciocinios demonstrativos, que surgem aos seus olhos como algo de estranho e obscuro. Hanna (1996) salienta que para a prova ser, antes de mais, um instrumento explicativo e para exercer 0 seu papel como forma Ultima de justificagao matemiatica, os alunos “tém que estar familiarizados com os padrées de argumentagao matematica” (p. 33). E acrescenta que, embora. nio seja facil ensinar-lhes a reconhecer e a produzir argumentos validos de um ponto de vista matematico, este é “um desafio que nao podemos evitar”. Segundo Gracio (1992), a competéncia argumentativa pode entender-se simultaneamente como a “capacidade de dialogar, de pensar, de optar e de se comprometer” (p. 67): como capacidade de dialogar, remete para uma atitude de abertura nas relagdes com 0 outro que se torna efectiva pelo desejo de comunicar e pela disposig&io para ouvir; como capacidade de pensar, remete para uma atitude critica e de atengdo; como capacidade de optar e se comprometer, remete para individuos que procuram assumir as suas posigdes de forma esclarecida e, neste processo, assumem uma atitude interveniente e empenhada. O lugar que a argumentagao ocupa num dado contexto reflete 0 peso que a liberdade de reflexao e agio ai conquistou. E se se aceitar, seguindo Johnstone (1992), que argumentar é, também, correr riscos, ¢ que correr riscos de um ou de outro tipo é fundamental para a estruturago e formagaio da pessoa, ento a argumentagio parece “ser constitutiva daqueles que nela participam” (p. 48). Deste modo, a educagao para a argumentagio é um objectivo democratico decisivo, pelo que importa pensi-la no apenas pelo Angulo intelectual, mas também pelo social e ético. A importancia atualmente atribuida ao envolvimento dos alunos em atividades de argumentag¢ao, em particular na aula de Matematica, decorre da sinergia de varios argumentos em destaque: (a) a valorizagao do raciocinio matematico nas suas miltiplas vertentes numa perspectiva que nao pée a énfase no rigor e formalismo entendidos como um fim em si mesmo, (b) a recomendagao de que os alunos aprendam Matematica com compreensio, (c) 0 valor atribuido as linguagens naturais e a interagao social para a aprendizagem, (d) a aproximagado da comunicagao na aula de Matematica da existente na comunidade dos matematicos, (c) dificuldades encontradas na aprendizagem da prova e a procura de caminhos que facilitem esta aprendizagem e (f) a relevancia da escola proporcionar a todos os alunos condigées necessérias para desenvolverem certas competéncias transversais, entre as quais esta a competéncia argumentativa, fundamentais ao exercicio pleno de uma cidadania responsivel numa sociedade democratica. Frequentemente os alunos agem com uma certa “irresponsabilidade matematica” (Chevallard, Bosch, & Gascén, 2001), como se nao fizesse parte do seu papel comprometerem-se com a coeréncia, avaliagao ou justificagao dos seus raciocinios, nem com a analise critica e fundamentada do que ouvem dos colegas. ARGUMENTACAO EXPLICATIVA E ARGUMENTAGAO JUSTIFICATIVA. Acreditamos que 0 proprio conceito de argumentagao deve ser melhor delineado, em vista das analises de alguns autores. Monteiro & Santos (2013), Toulmin (2006) e Duval (1993), por exemplo, se referem as diferencas existentes entre os conceitos de explicago e justificagao. A partir da perspectiva de Balacheff (1988), enquanto a explicagao supde um discurso com o objetivo de tornar inteligivel uma proposi¢do ou um resultado, 0 termo justificativa compreende uma exposi¢do das razdes que os legitimam, Nesse contexto, chegamos, a partir de Carmo & Carvalho (2012), e, principalmente, Sales & Pais (2011) aos conceitos de “argumentagao explicativa” e “argumentagao justificativa”. Em termos gerais, podemos dizer que, enquanto a argumentagdo explicativa é utilizada coma finalidade de apenas esclarecer, a argumentagio justificativa tem 0 objetivo nao somente de elucidar, mas de convencer. Nossa hipotese é a de que, no processo de ensino de matematica, o modo de argumentagéio mais utilizado é o primeiro. Nesse conjunto, é necessario afirmar que, entre os objetivos do ensino de matemiatica, acreditamos que a meta a ser atingida deve ser a compreensao relacional e, avaliamos que, pare

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