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Colagdo HISTORIA & HISTORIOGRAFIA, Antoine Prost Doze licdes sobre a historia RADUGAO Guilherme Jodo de Freitas Teixeira 2 edico 3° reimpressdo auténtica CAPITULO xt Criagao de enredos'® e narratividade Recomhecer, de acordo com nossa demonstragio, que a historia inteira ‘depende do raciocinio natural vai implicar determ:nadas consequéncias. Por umm lado, tal postura justfica nossa recusa de qualquer tipo de exclusio. Desde 0 comego, decidimos considerar como histéria todas as produgSes intelectuais reconhecidas, do ponto de vista historico, sob ‘ese terto; como temos pouco gosto pelos manifestos ¢, menos ainda, pelos requisitérios, escolhemos uma perspectiva analitica e no normativa, Essa posigio esti, agora, fundamentada do ponto de vista ogico. De fato, existe realmente um método eritico para estabelecet, a partir das fontes, respostas confiéveis para as perguntas formuladas pelos historiadores; alids, esse método é aplicaclo por todo © mundo, Em compensacio, nio conseguimos identificar um método hist6rico, cnja observincia viesse a garantir a historia perfeita Por outro lado, essa constatagio volta a chamar a atengio para a ise. Apcsar de depender do raciocinio natural, historia ndo é a tinica 1agio: a sociologia ¢ a antropologia utiliza os mesmos conceitos tipos ideais © a mesma busca de causas € coeréncias. Melhor ainda, os jomnalistas e os frequentadores de botequim praticam © mesmo tipo de argumentagio. Onde esti, portanto, a diferenca? Ela existe, de fato; porque o livea de historia ¢ imediatamente reconhecivel, Pode-se formular, de outra maneira, tanto 4 constatagio, quanto a guestio. A constatacio: apesar de suas diferengas, os métodos adotados, podem levar a elaboragio de grandes livros de historia, obras epletas de sentido, que nos fornecem esclarecimentos e nos dio plenasatisfagio desde gine na ertr nae ame -o momento em que aceitamos seu tema, Havers algo de mais heterogénco, para citar publicagdes quase contempor Baptiste Duroselle— La Deécadence: 193 ., 1979 © 1982, respectivamente) ~ ¢ a obra, Ci _XV*-XVIIP (Paris, Armand C ris diplomaticn de curta duragio & wma hist6ria das est inte trés alentados séculos? E, no entanto, essas obras possuer éncia semelhante. Se julgarmos a arvore por seus mos de declarar que, apesar de suas grandes diferencas, clas sio vilida ¢ plenamente fs, 0 leitor nfo se equivoca 30 reconhecé-Ias imediatamente c ‘questio: que exi comum para designi-las, de forma tio evidente, como hist6ricas? Para responder a essa questio, mudar de perspectiva: dei- xaremos de acompanhar o historiador no decotrer de sua pesq verificarmos como ele cons fatos ¢ suas interpretagdes. ssc procedimento analitico tinha o seu interesse, mas nos forneceu 0 que dele podiamos esperar; de resto, e precisamente porque estamos em um tuniverso histérico em que 0s fatos sio indissociiveis de seus contextos, cle nio permite compreender o ceme do que é fazer histéria. Do todo ds partes A ria, efetivamente, nio procede das partes até 0 todo: ela io i pela re fos em uma fase subsequente, a exemplo do pedreiro que constr6i um ‘muro com tijolos; tampouco, ela articula explicagdes & semelhanga das pétolas enfiadas em um colar. Os fatos as explicagSes nunca sio dados a0 historiador, iolados, separados, como se tratasse de &tomos. A matéria hhst6rica nunca se apresenta como uma sequéncia de pedrinhas distintas, ‘mas antes como uma espécie de massa de matéria heterogénea e, rida, configs, Nada de surpre da lbgica fracassam quando se limitam a articular logicamente causas © se questionam sobre a: incia de uma efeitos, em sentido estrito: relagio de causalidade entre c Stomos individualizéveis. A questio de Weber a respeito do papel de Bismarck no desencade- amento da Guerra de 1866 nunca chegou a ser formulada, sob essa por um historiador; cla havia sido encontrada em diferentes géneros de 212 (Cucia werner neon politica na Europa, no século XIX”, Se existe pertinéncia na argumen- tagio de Weber e de Aron sobre esse exemplo, ela deve-se a0 fato de ter levado em consideragio, em torno dos d a rede ramificada das hipéteses alternativas € © historiador constréi para ponderar essa causa ent modo, como ocorre com todos ot exemplos, mtra, aqui, seu sentido: diferentemente © artesio nunca concebe sma pega independentemente de um cor © historiador comporta-se como 0 m pedagos quaisquer de madeira: ao pedaco com entalhes para as gavetas ¢ um outro pedaco com pino para 0 forro. © todo orienta as partes. Para compreender o procedimento do historiador, vamos partir, ‘O mesmo é como textos completos e, em primeiro lugar, nos questionar sobre sua composigio e, em seguida, sobre sua escrita, \Narrativas, quadros, comentarios Verifiqn segao de historia de uma livraria: a diversidade de i justapostos ¢ impressionante, Para colocar um pouco de ordem que permitem distinguir as, quadros e comentiros. rinimo, partem de um primero elemento para chegarem a um «elemento mais tardio e explicam como se fez passagem do primeio para 0 segundo; por outras palavras, ¢necessirio ¢ basta, para haver uma haja dois acontecimentos, ou situagdes, por ordem no ten entender," esses tracos formas sio suficientes para definir a narrativa De fito, ela pode abranger periodos de tempo bastante diferentes A colegio “Trente journées qui ont f de apresentar relatos limitados a um dia, Panga" (NT): 213 om 4 Heroan periodos muito mais prolongados: um reinado, um século ou virios — is vvezes, milénios a exemplo das histrias da Franga, desde as origens até nnosos dias, publicadas com cert regularidade. A narrativa implica uma dimensio cronolégica, mas adapta-se a qualquer cronologia Do mesmo modo, a narrativa pode refere-se a qualquer objeto hist rico. Aqui, convém disipar a confisio frequente entre naratva e histéra évinementielle ou politica. Neste sentido, existe certo abuso em falar de “retomo & narsativa” (Sroe, 1980): esta nunca desapareceu e 0 proprio Braudel que, naturalmente, identificava a histria-narrativa coma historia factual, votada por ele i execracio piblica, frou a expressio “relato da conjuntura’™ para designar as narrativas de seu agrado, A semelhanga da historia das pritias culeurais ou das representayaes, a historia econdmica pode fazer apelo 3 naratva, asim como a hist6ria politica; em seu tex- to, Le Dbir de riage, por exemplo, A. Corbin (1988) analisa como uma representagio do litoral tomou o lugar de uma representagio anterior e 4 significagio dessa mudanga. Estamos, incontestavelmente, na ordem da narrativa, Inversamente, como veremos, 0 rstomo de alguns historiadores els, a exemplo de G. Duby com seu livro Le Dimance de Bowines, nio & wma indicagio de que eles se inte ressem pelo relato desses tems mo, a nattativa nio é necessariamente linear; haveria cer- ordem cronolégica. Por um lado, esse respeito é, em geral sivel, inclusive, na mais tradicional hist6 le © p Imaginemos, por exemplo, um relato dos acontecimentos de 13 de imaio de 1958": se o narrador pretender ser claro, evitari o vaivém incessante de Paris para Argel inversamente, mas, no interior de adto globalmente cronolégico, delineari sucessivamente os em ordem enbricados uns nos outros. Por outro lado, a narrativa axlapracse a mil as proce: Cecio se enc emis A narrativa pre dessa oconrtncia e€ das intengSes; no enta Outros se a explicacio das mudangas (“qual a razio implicando naturalmente uma busca das causas a imével permite a claboragio de quados plurisseculares, Em ver de estar centrado na mudanga, © quadro focaliza as particulari- aes de seu objeto e aquilo que garant® Sua uridade; iga, entre si, uma ploraidade de fitos contemporineos e, asim, constréi uma tum conjunto em que as coisas “encontram-se em dependéncia reciproca”, “conseguem harmonizar-se” No mesmo plano da narrativa, © quadro nfo esti associado, neces- sariamente, a um tipo de objeto histérico, Naturalmente, cle presta-se apresentagio de determinada sociedade ou de um grupo social preciso em determinado momento da hist6ria: por exemplo, o livro de M. Bloch, La Socité féodale, No entanto, a histria cultural exige, as vezes, quadros: silagem mental” do século XVI. £ possivel elaborar quadtos sobre acontecimentos ¢, privilegiada: no narragio da bat apenas na sua primeira parte. A segunda, e mais longa, serve-se desse combate como ponto de entrada para formular questoes ue escapam i narrativa: © que era a guera, 2s batalhas, a paz no inicio do século XIIF? Assim, a batalha é, de algum modo, “desnarrativizada”, ‘6 quadro prevalece em relagio 3 narrativa ‘O'eomentirio 6 mais rao: ele aborda seu tema a partir das interpre- tages propostas pelos historiadores ou pelos contemporineos. Trata-se tie Aut nent, conraget, eer 0 oe ce ln erred esr bee de um ensaio sobre outros textos, considerados em seus contextos; neste ‘aio, 0 exemplo poderia ser 0 livro de Frangois Furet, Penser a Ri tion fanaise, ow 0 programa televisivo de M, Ferro, Histoire paalale, que ‘mostra episédios da guerra tal como haviam sido apresentados, na época, pelas atualidades cinematogréficas dos diversos beligerantes. Por ser um igéneto bistérico ainda pouco frequente, nio vamos aprofiandar sua an Naturalmente, as narrativas comportam quadros e, por sua vez, 6s quadros dispem de relatos. No miolo de Le Dimanche de Bouwines, encontrar-se~i uma narragio da bat ha, assim como outras sequéncias sam como se processou a instalacio dos prin- res da langa ou o ritual do {juramento de fidelidade. Inversamente, 3s narrativas incorporam sequéncias descritvas e est gumas expdem, até mesmo, a evolugio de es ruras ou de configuragdes cocrent qual devem comegar gio. De forma mais profunda, a explicagao causal da narrativa faz apelo a regularidades que depencem de estruturas, a0 passo que a descrigao das estruturas recorre a personal a transformam em. atores de narrativas de um outro tipo; as duas categorias distinguem-se Tal procedimento permite compreender a existéncia de formas mistas, ‘mais complexas. A primeira desis formasjustape partes do quadro com partes da narativa, A tese labroussiana comegava, em geral, por uma ou duas partes dedicadas 3s estruturas geoprificas, demogrificas¢ econmicas: tratava-se de A segunda forma complexa € a narrativa por ¢ por etapas."® Um bom exemplo é 0 livro de Philippe At mo de quatro ca 26 cio a senose wansmont de uma situacZo para outra; o plano 6, aliés,cronolégico. Contudo, esta fe seu ritmo & bastant ‘que Ariés apresenta uma sucessio de quatro quad {¢0s adotados em cada 6poca sio pertinentes em relagio 8s configuracbes precedentes e subsequentes, de tal modo que a andlise global da mudanga das atitudes, diante da morte, até nosso tempo, orienta e serve de estrutura paraa descri¢io, Neste caso, 0s quados io organizados por A histéria como recorte de um enredo Independentemente de ser uma narrativa, um quadro mista histéria € um texto acabado, um elemento recortado. tado da historia. Qualquer como dissemos mais acima, comega por uma questio. [Nao basta mosttar 0 enraizamento soc: € pessoal das questbes, rica, qualquer questio deve ser uma resposta, assim como dos procedimentos izar tal objetivo; € ainda necessirio dstinguir entre as ques~ ico de fatos ¢ aguelas que fazem apelo a0 enredo. De fato, ha uma diferenga entre questionar- elaboragio com 10 tipo: defi subordinadas (a da sabotagem pode ser pertinent (vamos recuar até que data?) ¢ um territério (que seri oar was sour a Hieae ibolos, técnicas, produgdes agricola ou i artes, ete. E, propositalmente, no acrescento das defesas de tese sio inventirios mais surreaistas que © proprio Prévert. ‘Assim, temos a alimentagio, as doengas, o crescimento, a contracep¢io, igo, a festa, a familia sob suas mi ade, a alfabetizagio, a descristianizagio, todos operatios, as greves, 05 campanarios, a pesca 3 linha; , ainda, as téenicas, as cigncias, os livros, os jomais, as revistas ¢ as intimeras formas de arte. Estou pronto a desafiar quem quer que seja a imaginar um tema que no possa ser objeto de historia, Ona, o historiador & incapaz de fazer a historia de tudo isso: tem de escolher. Trata-se de uma escolha, em parte, arbitriria porque tudo \luido no continuum da hist6ria, sem que haja comego ou cermo absolutos. Mas, escolha inclutivel; caso contratio, deixa de haver historia. Esse confinamento ¢ esa organizagio do texto hist6rico, em torno da questio que Ihe serve de estrutura, slo levados em consideragao, em uma primeira abordagem, pelo conceito de enredo, pedido de empréstimo a P. Veyne eH. WI autores nio Ihe atribuem exatamente 0 ‘mesmo sentido, Deixando de lado, por enquanto, a questo de sua validade em relacio a0s quadiros, vamos utilizi-lo para mostrar como a perspectiva slobal do livro acabado € o principio de construgaio €, a0 mesmo tempo, de explicagio da historia, O enredo histérico O enredo como configuracéo | ___ Para um historiador, a definigio de um enredo consist, antes de ‘mais nada, em configurar seu tema; cle munca 0 encontra jé pronto, tem de construi-lo, modeli-lo por um ato inaugural e constitutive que pode ser designado como a criagao de enredo. Tal criagio comeca pelo recorte do objeto, ou seja, a identificagio de um inicio © de um fim, A escolha dos limites cronolégicos nfo & a delimitagio de um terreno que deveria ser lavrado, mas a definigio da evolugio que se pretende explicar e, portanto, da questio a que se deve responder. O recorte do enredo determina jé o sentido da hist6ria: uma 23 Cano oto0r emt narrativa da Guerra de 1914 com inicio em 1871 e fim em 1933 niio é a historia da mesma Guerra se esse relato comegar em 1914 para chegar mo com os tratados de 1919. Do mesmo modo, se alguém fizer a ia do casamento, como instituicio, na Franga do inicio do século a questio da passagem de um. (mas, tal controle seria completo € ara 0 casamento poramor; ¢, se avangar 1988) teve o objetivo de propor 10 sobre esse acontecimento, A criagio de entedos incide, também, sobre as personagens ¢ os cenirios; implica a escolha dos atores ¢ dos epis6dios. Qualquer his:bria mente, uma lista das uma sequénea de cenirios. Para citar ainda a Guerra de 1 4 possivel construir 0 _mesmo enredo se for levada em consideragio a retaguarda ~ as mulheres, 68 idosos, as criangas —, on se 0 historiador se limita aos soldados; nem 6 enredo relativo aos generais corresponde ao dos simples historia adquirirs um sentido, em parte, diferente se alguém decide vsitar 6s hospitais e 0s cemitérios ou se limita is trincheiras ¢ aos ministéros {A criago de enredos determina, também, 0 plano em que o his- toriador se coloca: cle pode adotar um Angulo de visio, mais ou menos focal e 0 poder de definicio de suas lentes; de fato, toda histéria pode ser nartada sempre com um nimero maior ou menor de detalhes. Ela pode ser re-relatada sempre de outro modo; & possivel acrescentar-Ihe sempre algum dado mais preciso, assim como ampliar ou redutir 0 cenirio ¢ fazer apelo a atores suplementares. Neste sentido, relato estio sujeitas & revisio por um historiador lilterior”." Ou, para retomar a metifora geogrifica de P. Veyne: nio basta dizer que 0 his toriador 6 incapaz de elaborar um mapa completo dos acontecime: contentando-se com o esbogo de seus itinerdrios, convém acrescentar que ele escolhe a escala desse mapa. enredo é 0 ato fandador pelo qual o historiador sular na ilimitada trama de acontecimentos da A construcio recorta um objeto par "Yer PANTO, sesumido por RICCEUR (1983, wf. 254) 219 Dose uot ome AHO hist6ria, No entanto, essa es:ol 0% fitos como tais, © fato i cle & const ainda outro aspecto: ela cor 10 s6 exisie como objeto de estudo; a0 mesmo tempo, sob um aspecto particular. © acon- “Fe virios itineririos posveis; po iversos aspectos que Ihe conferem significagio e importincia de um fato dependem do enredo de que cle & parte integrante. O exempo citado por P, Veyne € a Guetra de 1914: se faco 0 recorte de una histéria militar da guerea, a ampanha de Verdun & certamente um acontecimento apit cluido na svi de batalhas travadas na regido de Marne, Champagne em 1915 e Somme, incluindo 0 episddio de Chemin des Dans, além de testemunhar os impasses de uma cstratégia; nessa hist6ria, a gripe espanhola & uma peripécia marginal. Pelo contririo, em uma histéria demogrifica da guerra, essa epidemia tornar- neste caso, seria formulada a questio de seus e, assim, a referéncia a Verdun a suas perdas que, globalm regio de Marne. Em umahis de Verdun — cujos combaces estenderam-se de fevereiro a dezembro de 1916 — ocuparia, em compensagio, o primeiro plano: o valor sin a na margem direita 0s, a relevincia dessa batalha na opinio pablica,o sistema de transporte que conduziu para frente de combate, sucessivamente, todos os regimentos do de modo que foi a batalhs travada pelo maior nimero de combatentes, conferem a este acontecimento uma importincia decisiva, A selegio do fao, sua construgio, dependem do enredo escolhido. ‘uma variével do enredo. A criagio de enredos jos eo valor que lhes é atrib nnfigura, portanto, a obra histicae, determina sua organizagio interna. Os elementos adotados sio integra~ dos em um cenirio, através de uma série de episédios ou de sequéncias ‘meticulosamente ordenados. A disposigio cronolégica é a mais sem implicar qualquer tipo de imposigao. Ela pode se complexificar pelo recurso 20 flashback ou servir-se da pluralidade dos tempos ¢ proceder a ima investigagio sucessiva dos diversos aspectos reunidos por seu inter ‘médio ou, ainda, utilizar ama panorimica que apreende sucessivamente a diversidade de atores e censrios, Uma hist6ria da Guerra de 1914 pode 220 moo ouros want 10 bem, por exemplo, abordar sucessivamente os exércitos ea retaguarda, ponderar as forgas de cada beligerante, as concepgdes estra- as, o moral dos combatentes franceses e, em seguida, pela economia da guerra, pelo reabastecimento, pela fail ‘em tempo de guerra, Em determinado m culeura nto, ela deveri encontrar ‘© ponto de conexio e mostrar a convergéncia ou os confitos entre diversos elementos ¢ relacions-los com as peripécias da politica interna, da diplomacia e do desfecho das baalhas. De qualquer modo, tal proced ‘mento nfo deixa de ser um cenirio € um enredo, entre outros pos es CO enredo e a explicagcio em forma de relato Na definigio da obra histérica como enredo, a configuragio im- plica a explicagio. Neste ponto, devemos estabelecer a distingio entre nartativas e quadros, No caso das narrativas, é claro que a historia € um emi tido literirio do termo: 0 dos romances, pecas de teatro ¢ filmes. Neste aspecto, podemos acompanhar P. Veyne que, preocupado em rejetar wo, defende que a histéria € uma narrativa de toriador no & a dos atores; tata-se de nar fos problemas. A exerplo histriaprocede a uma elolha, ‘endo con tna plan © cnn ste d nea quanto ade rosa memiéia quando evoeamos oF 0s qu acabamos de viver[.] fica, organiza, ‘Um acontecimento se destaca em um fando de uni alimentam-se ¢ mortem, mas de suse goers e de ste bons, nett to- ‘em determinada 6paca, cles proferiram ter maior huero durante am periodo mais diatado 2 se aporentarem depois de teem feito fortuna e como percebi icavam as cores, |..] A historia & co 221 ‘oa uot some Hoan mas distingue-se dele em um ponto essen-al. Suponhiamos que al- iguém me rlata uma revolea eeu siba que es pessoa pretende dese ‘modo fer histria © que esa revolts tenha ocorrido realmente; iei focaizi-la como se tiveste acontecide em determinado momento, ‘em determinada populagio; vou considerar como herofna essa nasio antiga que me eradesconbecida, hi um minuto, ¢ cla tormar-se-i para ‘mimo centeo da narrativa ou, melhor ainda seu suport indispensivel, ‘Assim procede também qualquer letor de -omance, Salvo que, neste onto, o romance & verda sua ver, a hist6ria dare se desvalorizar, (eva, 1 Aispensando-o de ser cativante: por a pode, eventualmente, ser enfidonha sem 153.622) ‘A historia faz um relato e, a0 narrar, & gue fornece a explicagio, ‘Voltemos ao exemplo do acidente de trinsito e da testemunha que, diante «do policial, afirma 0 seguinte: “Vou explicar-Ihe..." Como se procede na vida cotidiana quando se pretende “explicar"? #az-se um relato, Afir- yo no passa de um pleonasmo. E posivel proceder 4 dissociagio entre a narrativa, por um lado, e, por outro, © aparato documental em que ela se bascia e as provas que apresenta; no ‘0 vinculo explicativo que ela estabelece entre jsamente como narrativa que € se apresentada em ordem cro- coincidéncia entre explicara razio da mar que 0 relato é exp! noligica. Nartar & explicar cocorréncia de alguma coisa incapaz de explicar nfo meres {que uma narrativa pura e simy que aprendi de meus mestres: Gus nnéimero de geragdes de estudantes da ENS para a ogni .¢io entre a exposicio dos fatos e sua aque eles estabelecessem uma cexplicagio; ao fazer histéria, propria exposicio dos fatos. frmava ele, a explicagio deve surgir da jo se ajusta 4 narrativa é porque ela se encontra nos vex, sio apresentados por sua explicagio. His a clareza: “Os fatos tém uma © historiador encontra jé cem encontrar essa organizagiio. ssa explicagio em forma de relato mantém-se no plano do bom senso. Bis 0 que P. Veyne afirma de forma bem humorada: 22 cio oe wens wsne foi vencide; de fato, sio coisas que jo mais adiante: por amor 3 glia, ou guerra ¢ foi vencido por causa . salvo excegio, & hhitria nunca fica acima desse nivel de explicacio bastante simples cla permanece, fundamentalmente, uma narativa e 0 que se designa ‘como explicacio mada &além da maneira como a narrativa se ong ‘em um enredo compreensivel. (1971, p. 111) Neste trecho, encontramos 0 que jé havlamos afirmado sobre a continuidade entre os esquemas explicativos utilizados na vida cotidiana © 05 da histéria, ou sobre o raci Entre a narrativa das ages que vivenciamos ¢ a da hist6r idade & evidente; do ponto de vista linguistico, por exemplo, essas duas narrativas se destacam pela importincia que atribuem aos verbos de projeto e de agio. [No entanto, a narragio distingue-se da narrativa contemporinea da gio por trés caracteisticas. Em primeiro lugar, 0 narrador nfo é o ator, nem ‘ expectador imediato da acio; cle aparece depois da ocorréncia efi conhece _g desfecho, Em verde descrever a agio como o cronista radiofSnico comenta "uma competigao esportiva, ele fix seu telato porque esti separado dela por nna propria trama dos emunciados. Ou scja, :m 1717, nasceu o autor de Le Neveu de Rameau” (Dano, 1965, p. 18). Trés proposicdes temporas estio {implicadas neste emunciado. Em primeiro lugar, menciona-se o ano de 1717, ‘mas ainda nio se sabe que, um dia, o ecém-nascido escreveri um livro. Ao afirmar “o autor de...", 0 narrador certifica seu conhecimento da historia ulterior e focaliza uma segunda posigio temporal. No entanto, para saber {que este livro 6 tio importante queé a data de nascimento do autor m ser mencionada, € necessirio ter chegado bem depois de sua publicagio: terceira posicio temporal. A temporalidade dos enunciados narrativos acaba por separi-los nitidamente da descricio das agSes. Segunds caracterinica: a naragio implica 0 conhecimento prévio do desenrolare do desfecho do enredo, cija revelagio nio & feita progressi- "Vamente. Deste modo, ela fica atenta as diferencas entre os projetos € os resultados (explicagio pelas causas e pelas intengGes), ow entre a situagio observada ¢ aquela que é previsivel a partir das regularidades (Forgas € limites das estruturas): 0 acontecido &, ou néo, 0 que havia sido previsto ‘ou era previsivel, Para P, Veyne, a historia & conhecimento do “‘especifico”, ‘on seja, no daquilo que ocorre apenas uma vez, do acontecimento ou 23 Dorr ucessoue ase serem repetitivas, no Antigo Regime sio significativas das diferengas. No entanto, P. Veyne tem razio a0 fazer tal observagio. Als, a expressio mais caracteristica da a & precisamente afirmar: do historiador do ator, o nanrador conhece as peripécias e desfecho, prestando maior atengio aos efeitos designados pelos socislogos como “perverso seja, aos efeitos que nio haviam sido descjados, nem mesmo pre pelos atores ~ e a historia est repleta de tai situagdes.. ele conduz sua narrativa segundo um ritmo irregular, a exemplo do guia que leva tutis- tas a visitar uma cidade. Em relagio a determinado periodo, ele avanga rapidamente e resume, em uma pigina, um século ou um ano ~ tudo depende da escala adotada ~ porque nada ocorre de se desenrola como previsto... Em outras ocasides, pelo cont explora os detalhes porque 0 acor a0 episédio por um historiador precedente. Além de elipses, a narracio comporta imagens fixas em grande plano. tiva & constituida por unidades diferentes em ris ula constatagdes de regularidades ¢ sequéncias fac~ de prova de toda a espécie a servigo de uma angumentagio. © narrador interrompe o fio da narrativa para fornecer explicagSes; pode, entio, sublinhar as regularidades em que se apoia, reca~ lar as cass a condigGes que acaba de analisar para hierar além de se dedicara uma comparacio di a cevocaro dircito chinés para esclarecer um aspecto do direito romano. Enquanto argumentagio, a narragdo emprega todos os meios, com a condigio de que a ajudem a alcangar seu objet Aqui, convém estabelecer a distingio entre o argumento ¢ sua prova. A explicagio historica implica provas que nio se confundem com 60 argumentos aos quais elas servem de suporte. Eis o que é ilustrado perfeitamente por alguns advogidos que, a0 prepararem a defesa de seus processos, criam uma pasta por argumento, a fim de arquivarem 6s elementos ~ artigos de lei, depoimentos de testemunhas, fatos ma- eriais confirmados — que invocario para consolidar seu argumento. A 204 distingio é importante: logicamente a da explicagio exemplo, constituem um dispositive de prova ‘no modifica a natureza ~ historica ~ da argumentagio. ica que a natureza da prova nio determina A explicagdo om forma de relato @ os quadros © que acaba de ser afirmado acerca do ented pata as narrativas, Seri possivel af seu objeto de estudo’ Para mostrar que toda historia comporta uma di plo de La Méditenan icl: na realidade, esse espago no estava fora do tempo € sua transformagio, apesar de imperceptivel, acontecia de forma inexorivel; nfo esti confinado na terceira parte; nem um quase enredo da conjuntura, na segunda parte; tampouco, um quadko estitico, na primeira parte. Por um lado, nterno — percorrido por navios fabricados com técnicas ‘comprovadas, dotado de portos que acolhem as caravanas e os comboios de mercadorias—era um espago trabalhado, esquadrinhado, investido por jomens, de algum modo, um espago vivo em que, incessantemente, ‘uma narragio, Por outro lad 10 teatro privilegiado da historia mundi ria, Como desfecho, & evocado 0 confronto entre os no € 0 espanol — que compartilhavam. lantico ¢ para a Europa do Norte. Tal desenlace seria coralmente imcompreensivel sem a integragio das trés partes do livro entre si e no interior desse grande enredo, ‘A conclusio epistemol6gica esti, entio, fundamentada; como 0 ob- Jeto construido pelo historiador é dinmico, existe um enredo ~ inclusive cronolégico — no proprio Amago da descrigo de uma estrutura. A historia se fiz em forma de relato por inchuir sempre mudangas Esse argumento deiva, no entanto, fora do enredo o que caracteriza © quadro como tak: seu axpecto sincrénico, 0 que designamos pelo termo 228

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