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HIsTORIAE }€ Musica y ea NO BRASIL Entre a memoria e a historia da misica popular José Geraldo Vinci de Moraes! Abertura - (8) “Topas as sweras-rEInas, entre abil € agosto de 1958, 0 locutor da eidio Tupi do Rio de Janeiro anunciava as 21100 0 i jo de um dos programas da série No tempo de Noel Rea nediatamente a orqusstta da emissora, regia plo masst Carioca, tocava os primeiros acordes de Palpie Infliz iniclando a sans ‘A orquestra acompanhava a locugio introduté para outra composigio de Noel ~ Com que roupa? — que cantada em coro servia ¢ lentamente fara a passagem para apresentar o patrcinador da série, as Casts Bark, conherida loa ie recidos dda Capital, Almirante, ideaizador e produtor da sé falmente, de Hélio Rosa, sempre ,, contava com a presenga permanente de Aracy de Almeida ¢, even vmnunciados de modo esfuziante. Aracy havia coavivido com Noel ¢ ers uma das ingérpretes preferidas do compositor. & seu itmo estave all para cosas © *jnstrumento-reliquia (0 violéo usado pot Noel! da mesma mancing coma se dono we, Aucor de Metréple em Sinfonia (Bd. 34) © Sonoridades Paw- 1 Professor do Departamento de fio Liberdade), Conversa enanas (Fanart) 218 José Geratno Vi pe Morars aries seus préprios sambas”.* Almirante, na abertura do primeiro programa a série, anunciou seu papel com a vor carregada e grave: “Eu posto dizer cheio de sfenias eu fui am A dupla re cde Noel Rosa. Noel Rosa comecou sua vida artistica comigo”? (0, um verdadeiro reencontro de cava também a restauracéo por meio 1a. Todo este seriam interpretadas -reliquia, de mancira exata ¢ de acordo “glorioso passado” musical e culeural ca ambiente assegurava a0 p\ por Aracy ¢ tocadas pelo irmao 20 com desejos do “filésofo do samba’ Na segunda sexta-feira de maio 0 cortiqueiro encontro semanal registrou certo mal-estar logo no i icado por alguns que insinuavam que 0 pro- ‘grama pouco falava de Noel e que o ra is colegas estariam na verdade se auto-promovendo & custa do compositor de |, Almirante airmou em tom de resposta: “no extames aguifalando de nds; quando nos incuimos nestaseve- a ‘pre nna verdade estamos envolvides nos episbdiosligado vida do filbafo samba" Pat daqueles que hi refutar as insinuagées ele destacou a importancia da meméria convivido com 0 compositor ¢ a converteu na fonte mais respeitada para trtar de Noel e seu passido, Baseado neste argumento, ele dew sequéncia 8 resposta e anunciou que quase uma centena de composigées do sam- bista cerd sido apresentada no final da série. Logo depois deste registro, o progra- ito estabelecido: 1, falou-se sobre ma deste dia 11.05 evoluiu nacuralmente de acordo com o 10 foram contadas histérias da fa cultural da capital da Repit 2 festa da Penha ¢ do bando dos Tangarés, sempre criando refes obra de Noel. Ao final, Aracy Onagéo, encerrando © programa de forma expressiva, A resposta ha cias com a vida spretou Capricho de napaz soltiro e Feitio de sido dada aparentemente de modo c 2 Auseinas No tempo de Noel Ross, vol 1. 13.04.19 lado B, Colegéo Collector, Petespolis, 9st, Lado A. ta magnética 1 AER-O79, | AERO79. Entre a meméria e a histdria da misica popular 219 Esee pequeno e passageir episdio ocorrido nos primes minutos do pro- rama nfo era novidade na tajetria do sadialita, Apesar de no assumir per fl polémnico, como era comum entre alguns de seus eolegas da exten musical ‘Almirante sempre estava envolvido em disputas e controvérsias na sta incondi- onal defesa e divulgacio da misica populat’ Esse combate em favor da msica fou nos anos 50, na mesma proporgéo em que cresceu a divul- gag as “influtncas da miscaestrangsea’, geando grand instisfigfo, es tampada na sétie Pesoal da Vethe Guarda, De manera geal um dos principal Jncia estava apoiado justamen- nacional aumé argumentos que apresentava nesta auténtica te na idela da autoridade das evocagGes-meméria ea veracidade de suas fontes, ‘Aidoneidade daquele que evoca e testemunha a veracidade dos acontecimentos propriose allicios, sempre foi elemento central na construsio da memdria ¢ 0 ‘convencimento de uma narrativa.‘ Almirante mangjou muito bem este miicleo, desde seus primeiros programas de rio no final dos anos 30 ¢ permaneccu tic como revela em No tempo de Noel Rosa. Como ele izando-os tos mais recen fi zeiterado 2 exaustéo, durante anos, nas centenas de programas que produzit a fol iniiada {5 Amaisinetivel delas ocorreu com oapresentador de rv livio Cavale en 1957, quando 0 apresentador oacusou pela Tv Tupi de esconder Noel Rosa ¢sabotar seus parceros fato que implica incsiva esposta de Almirante em programa nam emissora, Em 1968, a disputa teve desdobramento de impacto, quase tigico, Al ado 0 apresentador de pldglo de alguns de seus programas de por acurando-o de ainds do dertame ocortide em 1958. Almirante, em , cobrando explicagbes do jnvadiu o progeama de Flavio Cavalcanti realizado 20 vi cde problemas para um programa transmitido 20 vivo. apresentadore ctiando toda pois fo a0 at Este “pega-preccapar entre Flav «foi registrado, com a pura ironla de se Sésgo. No tempo de Almirante, Uma histéria do dio ¢ da sr, 2* Rio de Jans nian, 2005, p. 268-9 € 293-350. Ponts Path, Stanislaw, Febeapd 1, 2¢3,2* ed. Rio Cavalcanti Almirante” ceve teperces , por Stanicaw Ponte Preva. Ver CABRAL, de Jancieo: Agit p- 297. 6 Canosa, Fernando. Meméri,hitria ebistoringrafia, Coimbra: Quarto, 200% P- 47 220 José Geratpo Vinct pe Morars © apresentou, alcangandy grande repercussdo pelas ondas do ridio, o argumento scabou identficado com 0 radialista. Foi por essa razio que, no inicio dos anos 60, Edigar de Alencar descreveu Almirante se a autoridade da meméria eos procedimentos metodoldgicos do historiador que trabalha de modo infatigivel em busca da autenticidade das fontes ¢ da verda- de hi Ninguém poderia contar 2 vida de Noel Rosa melhor do ‘que Almirante. Nao somente por tr ‘ompanhado de per- ‘0 0 imortal compositor popular em toda sua répida, mas bretudo, pelo senso de pela segue aordindria de historiador que De historiador we desta missio de reg trarofito para coevos e pésteros, sem acapacidade inventiva ou fantasiosa, Com ele nio cem bandeira, Contase 0 caso como 0 caso fo Acontece que o préptio Almirante, nesta época, jé havia assumido este mil- a credenciad 9 ymbém evocava com autoridade as diversas outtas recordagées do passado, que se convertia no historiador hipno- tizado pela verdade dos fatos e das fontes. Na apresentacio de sua tinica obra, No ‘tempo de Noel Rosa, baseada integralmente nos reteiros do programa radiofonico hombnimo,* ele diz: 7 Auencan, Edigar de, "Noe! visto por Al ‘No tempo de Noe Rove, 2 ed Rio de Jae ante’, Peficio & 1 edigio, To: Ausinante, Livrata Francisco Alves, 1977, p-9. 3 Como Almicante tinha costume de escrever todos os roteros de seus programas para reunido destes textos da sie automaticamente tornou com pequena adapragdes como pode ser verfcado no cenfronto da dacumenta¢s0, Entre a meméria ea histéria da miisica popular 221 E tempo, po dade pass 08 his sranscievo para estas piginas que nfo sio somente uma ho- figuras do cancioneiro populat, ‘menage a uma das maior mas um tributo a verdade que merece respeito Deste modo, baseado na memiéria pessoal ¢ na recordagio do outta, asso- ciada a muito trabalho de investigasio realizado em arquivo pessoal, Almirante hhegemdnica na construgio e narragio da histéria da moderna misica po bana durante anos, ‘A formulagio baseada nesse Hla jd era parte integrance do diseutso geral da nascente também dos procedimentos de trabalho daqucles que comeyavam a se preocu: ia. Na verdade, essa primeira geragdo de historiadores da par em contar sua hi iisica popular* cons de deslocamentos € cr uma rede de entrelagamentos ¢ aproximagoes permanentes que gerout passado e certa opacidade que di- mica justaposigbes entre as duas formas de acesso 20 ntificagdo eas fronteiras de cada um destes uni- ficuleou~e ainda dificulta ~a -yersos distintos, Essa situago, contudo, 11d0 ¢ exclusiva do jogo entre memé 9) Atse RANE, opcits p13 10 Mosaes, José Geraldo Vinel de. “Hist © In: Latin American Musie Review, 28.2 Aus 1s da rnisica popular no Brasil". jad “Texas, eu, 2007

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