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Supremo Tribunal de Justiça - Cível: Processo Data Do Documento Relator
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Acórdão
DESCRITORES
SUMÁRIO
II) – Tal regime jurídico impede que o financiador da aquisição dele beneficie,
invocando ter-lhe sido cedida pelo alienante do veículo automóvel a cláusula de
reserva de propriedade.
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estender o seu campo de aplicação, se de tal interpretação resultar um
desfecho compatível com o sistema jurídico enquanto unidade, e não for
afrontado o regime jurídico dos institutos com que contende, sob pena de, a
coberto de uma interpretação postulada pela essoutra realidade social que a
convoca, se tornar arbitrária a interpretação da lei, ferindo, assim, a certeza e a
segurança jurídicas, valores caros ao Direito.
TEXTO INTEGRAL
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propriedade constituída a favor daquela.
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Lisboa, datados de 13.02.2003 in CJ, Ano XXVII, I, pág. 102 - “Celebrado
contrato de mútuo para financiamento de aquisição de veículo com reserva de
propriedade, deve ser decretada a apreensão daquele, ao abrigo do Dec-lei n.
°54/75 (art. 16º nº1) se o mutuário deixar de pagar prestações a que se
obrigou, ainda que o mutuante não seja o reservatário. e 20.10.2005, e, nas
alegações apresentadas, formulou as seguintes conclusões:
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aquele cujo regular cumprimento das obrigações se encontra garantido pela
reserva de propriedade, in casu, o contrato de financiamento.
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K) Assim, não deve proceder o entendimento do Tribunal “a quo”, e deve desse
modo ser decretada a presente providência e determinada a apreensão dos
veículos automóveis de marca Land Rover, modelo Freelander com a matrícula
..-..-.. e de marca Ford, modelo Transit, com a matrícula ..-..-.., bem como dos
respectivos documentos, e feita a sua entrega ao fiel depositário indicado nos
autos.
L) Decidindo nos termos em que o fez, o Tribunal “a quo” violou, entre outras
disposições legais, os artigos 9º e 409° do Código Civil, bem como o artigo 5°,
15°, 16° e 18° do Decreto-Lei 54/75 de 12.02.
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- Veículo marca Land Rover, modelo Freelander 3 P, chassis LNA.........,
matrícula ..-..-..;
- Vendedor registado do veículo: [em branco];
- Promotor da venda (que não intervém neste Contrato) - FIML;
- Preço do veículo a contado - € 44 816,00;
- Desembolso inicial - € 8 963,20;
- Montante financiado - € 35 852,80;
- Encargos - taxa de juro anual - 12,45 %; TAE -13,74% - € 12 611,91; Imposto
de Selo (…).
- Montante total a reembolsar - € 49 185,60;
- Prazo - 60 meses, mediante 60 prestações mensais no valor de € 819,76,
cada, com vencimento nos dias 10 dos meses de Setembro de 2003 a Agosto
de 2008;
A – Reserva de Propriedade.
Nos termos do art. 409° do Código Civil, e até à data em que todas as
prestações referidas no número 9 das Condições Particulares hajam sido pagas
pelo COMPRADOR à AA, a propriedade do veículo é inicialmente reservada para
o VENDEDOR REGISTADO, que cedeu ou cederá à AA a titularidade de tal
reserva de propriedade. O COMPRADOR presta o seu consentimento a tal
cessão. Nos termos do disposto no artigo 591° do Código Civil o COMPRADOR
sub-roga a AA nos direitos do VENDEDOR REGISTADO, decorrentes da reserva
de propriedade [...] — o texto desta cláusula é o que consta do documento,
sendo algo diferente do incluído na matéria de facto dada como provada na
sentença, eventualmente por lapso.
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- C. Incumprimento
- E. Devolução
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9. A referida carta foi recebida pela requerida.
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- Prazo - 48 meses, mediante 48 prestações mensais no valor de € 610,75 cada,
com vencimento nos dias 15 dos meses de Setembro de 2003 a Agosto de
2007;
- Reserva de propriedade - O presente contrato é celebrado com reserva de
propriedade do veículo a favor do vendedor registado no mesmo, nos termos
das Cláusulas Gerais constantes deste contrato. O vendedor registado cede ou
cederá à AA a titularidade de tal reserva de propriedade e o comprador desde já
presta o seu consentimento a tal cessão.
A. Reserva de propriedade
Nos termos do art. 409° do Código Civil, e até à data em que todas as
prestações referidas no número 9 das Condições Particulares hajam sido pagas
pelo COMPRADOR à AA, a propriedade do veículo é inicialmente reservada para
o VENDEDOR REGISTADO, que cedeu ou cederá à AA a titularidade de tal
reserva de propriedade. O COMPRADOR presta o seu consentimento a tal
cessão. Nos termos do disposto no artigo 591° do Código Civil o COMPRADOR
sub-roga a AA nos direitos do VENDEDOR REGISTADO, decorrentes da reserva
de propriedade [...] — o texto desta cláusula é o que consta do documento,
sendo algo diferente do incluído na matéria de facto dada como provada na
sentença, eventualmente por lapso.
- C. Incumprimento
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de qualquer das prestações na data do vencimento.
- F. Devolução
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entrega do veículo.
Fundamentação:
Sendo pelo teor das conclusões das alegações do recorrente que, em regra, se
delimita o objecto do recurso – afora as questões de conhecimento oficioso –
importa saber se o procedimento cautelar de apreensão de veículos automóveis
pode ser requerido pela entidade financiadora da aquisição, a quem foi cedida
pela vendedora a cláusula de reserva de propriedade de que era titular, em
caso de incumprimento do pagamento das prestações do preço acordado no
contrato de financiamento (mútuo).
Vejamos:
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que originaram a reserva de propriedade, o titular dos respectivos registos pode
requerer em juízo a apreensão do veículo e do certificado de matrícula.
2 – O requerente expõe na petição o fundamento do pedido e indica a
providência requerida.
3 – A prova é oferecida com a petição referida no número anterior.
Tendo sido a versão inicial do diploma de 1975 editada ainda antes da explosão
consumista no sector automóvel, veio ela dotar os vendedores de veículos
automóveis, de um meio rápido e expedito para obter a apreensão e entrega de
veículos vendidos a prestações com cláusula de reserva de propriedade, em
caso de incumprimento do contrato de compra e venda.
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originaram a reserva de propriedade”, e verificados os requisitos de resolução
do contrato de compra e venda, o vendedor, no caso de ter a seu favor reserva
de propriedade, apenas tem de provar o não cumprimento do contrato por
parte do adquirente e “ser titular dos respectivos registos” – nº1 do art. 16º do
citado normativo – para requerer cautelarmente a apreensão do veículo.
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No campo da venda automóvel é muito comum intervirem empresas
financiadoras dos consumidores, celebrando com eles, enquanto compradores,
contratos de mútuo (financiamento à aquisição de bens de consumo).
Passou a ser, então, prática cada vez mais comum o vendedor ceder ao
financiador da aquisição a sua posição contratual, mormente, no caso de venda
de veículos automóveis a cláusula de reserva de propriedade.
Cremos ser maioritária a tese que nega que o regime legal previsto no art.
18º,nº1, do citado DL possa ser invocada pela entidade financiadora, que
resolveu o contrato de mútuo celebrado com o comprador de veículo
automóvel.
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prevalecer-se do procedimento cautelar de apreensão, demanda, segundo certo
entendimento, uma interpretação actualista do art. 18/1 de forma a ser
extensível o seu regime ao contrato de mútuo conexo com o de compra e
venda.
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legis”.
O que se pretende é transpor para a realidade presente o juízo de valor que
presidiu à elaboração da norma, adaptando o seu significado à evolução —
social e jurídica — entretanto operada, por forma a extrair da norma um novo
sentido e ajustá-la assim à evolução histórica ocorrida. O que poderá
eventualmente implicar uma mudança do sentido que lhe era originariamente
atribuído, em face da realidade histórica vigente ao tempo da sua entrada em
vigor” – Pinto Monteiro “Cláusulas Limitativas e de Exclusão da
Responsabilidade Civil”, 1985-25, nota 31.
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1. Nos contratos de alienação é lícito ao alienante reservar para si a
propriedade da coisa até ao cumprimento total ou parcial das obrigações da
outra parte ou até à verificação de qualquer outro evento.
2. Tratando-se de coisa imóvel, ou de coisa móvel sujeita a registo, só a
cláusula constante do registo é oponível a terceiros.
Pires de Lima e Antunes Varela, in “Código Civil Anotado” vol. I, entendem que
no caso previsto neste artigo (pactum reservati dominii) o negócio é realizado
sob condição suspensiva, quanto à transferência da propriedade.
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Revista da Faculdade de Direito da UNL”” – Ano V – nº11 – 2005, pág.74.
Respondemos negativamente.
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de reserva de propriedade celebrada, e não fora dela.
Mas, mesmo que se admitisse que a entidade financiadora pudesse ver para si
transferida a reserva de propriedade, mediante cessão da posição contratual do
vendedor inicialmente titular da reserva, entendemos carece de legitimidade
para lançar mão do procedimento cautelar do DL. 54/75, de 12.2, desde logo,
porque sendo o procedimento cautelar instrumental, visando a rápida
recuperação do veículo para posterior venda (que a lei impõe), não se
vislumbra que se ajuste tal procedimento típico aos fins que o financiador visa
tutelar, que são apenas as consequências resultantes da resolução do contrato
de mútuo.
Como compatibilizar estes efeitos com os que adviriam da pretensão que teria
de ser exercida na acção principal – poderia a financiadora pedir a apreensão
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do veículo?
Não podia, cremos, porque o contrato de compra e venda não foi celebrado
entre si e o mutuário.
O art. 18º,nº1, parte final, do DL. 54/75 expressamente impõe ao credor que
promova a venda nos 15 dias subsequentes à apreensão do veículo e, no
mesmo prazo, que proponha acção de resolução do contrato de alienação.
Aqui novo escolho para os que sustentam que a alusão a qualquer outro evento
– art. 409º, nº1, do Código Civil – possa ser algo relacionado com o comprador,
que não se relacione com o contrato de alienação.
Conjugando aquele normativo do Código Civil com esta norma do DL. 54/75,
não é defensável que o terceiro que financiou a aquisição do bem possa lançar
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mão do procedimento cautelar de apreensão de veículo automóvel já que nunca
lhe assistirá o direito de alienação do bem.
Concluindo:
Decisão:
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Conselheiro Azevedo Ramos.
Conselheiro Silva Salazar
Fonte: http://www.dgsi.pt
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