Estudos Sobre A Formação de Professores de

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ESTUDOS SOBRE A FORMAÇÃO DE PROFESSORES DE

QUÍMICA NUMA DISCIPLINA EXPERIMENTAL COM


ABORDAGEM CULTURAL DIASPÓRICA

Juvan Pereira da Silva

Orientadora: Profa. Dra. Anna Maria Canavarro Benite

Goiânia
2020
15/04/2020 SEI/UFG - 1277028 - Termo de Ciência e de Autorização (TECA)

UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS


INSTITUTO DE QUÍMICA

TERMO DE CIÊNCIA E DE AUTORIZAÇÃO (TECA) PARA DISPONIBILIZAR VERSÕES ELETRÔNICAS DE


TESES

E DISSERTAÇÕES NA BIBLIOTECA DIGITAL DA UFG

Na qualidade de tular dos direitos de autor, autorizo a Universidade Federal de Goiás


(UFG) a disponibilizar, gratuitamente, por meio da Biblioteca Digital de Teses e Dissertações (BDTD/UFG),
regulamentada pela Resolução CEPEC nº 832/2007, sem ressarcimento dos direitos autorais, de acordo
com a Lei 9.610/98, o documento conforme permissões assinaladas abaixo, para fins de leitura,
impressão e/ou download, a tulo de divulgação da produção cien fica brasileira, a par r desta data.
O conteúdo das Teses e Dissertações disponibilizado na BDTD/UFG é de responsabilidade
exclusiva do autor. Ao encaminhar o produto final, o autor(a) e o(a) orientador(a) firmam o compromisso
de que o trabalho não contém nenhuma violação de quaisquer direitos autorais ou outro direito de
terceiros.
1. Iden ficação do material bibliográfico
[ ] Dissertação [ X ] Tese

2. Nome completo do autor


Juvan Pereira da Silva
3. Título do trabalho
ESTUDOS SOBRE A FORMAÇÃO DE PROFESSORES DE QUÍMICA NUMA DISCIPLINA EXPERIMENTAL COM
ABORDAGEM CULTURAL DIASPÓRICA
4. Informações de acesso ao documento (este campo deve ser preenchido pelo orientador)
Concorda com a liberação total do documento [ X ] SIM [ ] NÃO¹
[1] Neste caso o documento será embargado por até um ano a par r da data de defesa. Após esse
período, a possível disponibilização ocorrerá apenas mediante:
a) consulta ao(à) autor(a) e ao(à) orientador(a);
b) novo Termo de Ciência e de Autorização (TECA) assinado e inserido no arquivo da tese ou
dissertação.
O documento não será disponibilizado durante o período de embargo.
Casos de embargo:
- Solicitação de registro de patente;
- Submissão de ar go em revista cien fica;
- Publicação como capítulo de livro;
- Publicação da dissertação/tese em livro.

Documento assinado eletronicamente por Anna Maria Canavarro Benite, Professor do Magistério
Superior, em 14/04/2020, às 14:15, conforme horário oficial de Brasília, com fundamento no art. 6º,
§ 1º, do Decreto nº 8.539, de 8 de outubro de 2015.

Documento assinado eletronicamente por JUVAN PEREIRA DA SILVA, Discente, em 14/04/2020, às


https://sei.ufg.br/sei/controlador.php?acao=documento_imprimir_web&acao_origem=arvore_visualizar&id_documento=1375525&infra_sistema=1… 1/2
15/04/2020 SEI/UFG - 1277028 - Termo de Ciência e de Autorização (TECA)

18:09, conforme horário oficial de Brasília, com fundamento no art. 6º, § 1º, do Decreto nº 8.539, de
8 de outubro de 2015.

A auten cidade deste documento pode ser conferida no site


h ps://sei.ufg.br/sei/controlador_externo.php?
acao=documento_conferir&id_orgao_acesso_externo=0, informando o código verificador 1277028 e
o código CRC CE76B15D.

Obs. Este termo deverá ser assinado no SEI pelo orientador e pelo autor.
Referência: Processo nº 23070.003462/2020-11 SEI nº 1277028

https://sei.ufg.br/sei/controlador.php?acao=documento_imprimir_web&acao_origem=arvore_visualizar&id_documento=1375525&infra_sistema=1… 2/2
UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS
INSTITUTO DE QUÍMICA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM QUÍMICA

ESTUDOS SOBRE A FORMAÇÃO DE PROFESSORES DE


QUÍMICA NUMA DISCIPLINA EXPERIMENTAL COM
ABORDAGEM CULTURAL DIASPÓRICA

Juvan Pereira da Silva

Tese de Doutorado apresentada ao


Instituto de Química da Universidade
Federal de Goiás como pré-requisito
para o Exame Defesa de Doutorado no
Programa de Pós-Graduação em
Química.

Orientadora: Profa. Dra. Anna Maria Canavarro Benite

Goiânia, 2020
02/04/2020 SEI/UFG - 1206446 - Ata de Defesa de Tese

UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS

INSTITUTO DE QUÍMICA

ATA DE DEFESA DE TESE

Ata nº 107 da sessão da Defesa de Doutorado de Juvan Pereira da Silva, que confere o
tulo de Doutor em Química, na área de concentração em Química.

Aos 5 (cinco) dias do mês de março de 2020 (dois mil e vinte), a par r das 16h00m, no
NUPEC, realizou-se a sessão pública da Defesa de Doutorado in tulada "ESTUDOS SOBRE A FORMAÇÃO
DE PROFESSORES DE QUÍMICA NUMA DISCIPLINA EXPERIMENTAL COM ABORDAGEM CULTURAL
DIASPÓRICA". Os trabalhos foram instalados pela Orientadora, Profª. Drª. Anna Maria Canavarro
Benite, com a par cipação dos demais membros da Banca Examinadora: Prof. Dr. Juvenal Carolino da
Silva (UFG), Profª. Drª. Petronilha Beatriz Gonçalves e Silva (UFSCar), Prof. Dr. Vinícius Gomes de Aguiar
(UFT) e Profª. Drª. Nyuara Araújo da Silva Mesquita (UFG). Durante a arguição os membros da banca
não fizeram sugestão de alteração do tulo do trabalho. A Banca Examinadora reuniu-se em sessão
secreta a fim de concluir o julgamento da Defesa de Doutorado, tendo sido o candidato aprovado pelos
seus membros. Proclamados os resultados pela Profª. Drª. Anna Maria Canavarro Benite, Presidente da
Banca Examinadora, foram encerrados os trabalhos e, para constar, lavrou-se a presente ata que é
assinada pelos Membros da Banca Examinadora, ao(s) 5 (cinco) dias do mês de março de 2020 (dois mil e
vinte).

TÍTULO SUGERIDO PELA BANCA

Documento assinado eletronicamente por Juvenal Carolino Da Silva Filho, Coordenador de Curso,
em 06/03/2020, às 16:31, conforme horário oficial de Brasília, com fundamento no art. 6º, § 1º, do
Decreto nº 8.539, de 8 de outubro de 2015.

Documento assinado eletronicamente por Nyuara Araújo Da Silva Mesquita, Professor do


Magistério Superior, em 09/03/2020, às 10:05, conforme horário oficial de Brasília, com fundamento
no art. 6º, § 1º, do Decreto nº 8.539, de 8 de outubro de 2015.

Documento assinado eletronicamente por Anna Maria Canavarro Benite, Professor do Magistério
Superior, em 09/03/2020, às 21:14, conforme horário oficial de Brasília, com fundamento no art. 6º,
§ 1º, do Decreto nº 8.539, de 8 de outubro de 2015.

Documento assinado eletronicamente por Vinicius Gomes de Aguiar, Usuário Externo, em


10/03/2020, às 18:11, conforme horário oficial de Brasília, com fundamento no art. 6º, § 1º, do
Decreto nº 8.539, de 8 de outubro de 2015.

A auten cidade deste documento pode ser conferida no site


h ps://sei.ufg.br/sei/controlador_externo.php?
acao=documento_conferir&id_orgao_acesso_externo=0, informando o código verificador 1206446 e
o código CRC 7F373463.

https://sei.ufg.br/sei/controlador.php?acao=documento_imprimir_web&acao_origem=arvore_visualizar&id_documento=1299672&infra_sistema=1… 1/2
02/04/2020 SEI/UFG - 1206446 - Ata de Defesa de Tese

Referência: Processo nº 23070.003462/2020-11 SEI nº 1206446

https://sei.ufg.br/sei/controlador.php?acao=documento_imprimir_web&acao_origem=arvore_visualizar&id_documento=1299672&infra_sistema=1… 2/2
02/04/2020 SEI/UFG - 1262259 - Despacho

UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS


INSTITUTO DE QUÍMICA

DESPACHO

Atesto, conforme o item 04 da instrução normativa da PRPG nº 001, de 27 de março de


2020, que a Profª. Drª. Petronilha Beatriz Gonçalves e Silva (UFSCar) participou como
membra avaliadora, da banca de doutorado intitulada "Estudos sobre a formação de
professores de química numa disciplina experimental com abordagem cultural
diaspórica" do discente Juvan Pereira da Silva no dia 05 (cinco) dias do mês de março
de 2020 (dois mil e vinte), a partir das 16h00min, no Núcleo de Pesquisa e Ensino de
Ciências (NUPEC) do Instituto de Química (IQ) na Universidade Federal de Goiás
(UFG).

Documento assinado eletronicamente por Anna Maria Canavarro Benite, Professor do Magistério
Superior, em 02/04/2020, às 17:09, conforme horário oficial de Brasília, com fundamento no art. 6º,
§ 1º, do Decreto nº 8.539, de 8 de outubro de 2015.

A auten cidade deste documento pode ser conferida no site


h ps://sei.ufg.br/sei/controlador_externo.php?
acao=documento_conferir&id_orgao_acesso_externo=0, informando o código verificador 1262259 e
o código CRC CF743569.

Referência: Processo nº 23070.003462/2020-11 SEI nº 1262259

https://sei.ufg.br/sei/controlador.php?acao=documento_imprimir_web&acao_origem=arvore_visualizar&id_documento=1359606&infra_sistema=1… 1/1
Dedico essa obra à minha amada esposa
Fabiane Borges e aos meus filhos
Pedro Otávio, Luiz Alberto e a minha filha Linda Isabele.

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AGRADECIMENTOS

Ao terminar uma obra dessas, que é o começo da realização de um sonho, chego


a conclusão que ela seria impossível sem a presença de algumas pessoas e/ou instituições,
pois como já dizia o poeta:
Sonho que se sonha só
É só um sonho que se sonha só
Mas sonho que se sonha junto é realidade
(Prelúdio - Raul Seixas)
Agradeço inicialmente as forças vindas dos céus/orun que em nossa civilazação
ocidental é chamado de Deus, mas que também recebe diferentes nomes em outras
civilizações e crenças, Olórun e Alá, por exemplo.
À minha querida mãe, Francisca, e ao meu estimado e amado pai, Germano, pela
confiança de sempre e por suas orações intercedendo junto ao Deus que ela e ele
acreditam. Agradeço, também, ao meu irmão Joel, sem o qual nem o sonho da graduação
teria sido possível, meu obrigado sempre mano.
A minha querida e amada esposa Fabiane, pela dedicação e incentivo no
transcorrer dessa trajetória a quem, peço desculpas públicas, por algumas ausências que
com certeza existiram nesses últimos tempos.
Ao Conselho Diretor (CD) do IQ/UFG que um dia entendeu a necessidade dos
seus técnicos e técnicas se capacitarem e qualificarem. Aos professores e professoras do
IQ que, como costumo dizer, me mantém em formação continuada desde 1995.
Agradeço ao incentivo e apoio dos meus colegas técnicos e técnicas de
laboratório, que sempre me acarinharam quando, por muitas vezes, pensava em desitir
desse sonho. Aqui faço um agradecimento especial a minha colega e amiga Danielle
Mitze, pelos incentivos de sempre.
A professora Petronilha Gonçalves, e aos professores Juvenal e Vinicius por suas
valiosas contribuições quando do exame de qualificação.
Ao professor e amigo Claudio Benite pela amizade, pelos papos, pelas cervejas e,
principalmente, pelo apoio de sempre. Usando palavras dele: “um cara que fecha
comigo”.
Aos colegas do Coletivo Ciata: Antônio, Wanderson, Marciano, Arcanjo,
Regina, Fernanda, Marysson, pelas importantes afro discussões.

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Aos amigos Antônio e Marysson que durante seus estágios docência me ajudaram
a ministrar as disciplinas de Ensino de Química, Identidade e Cultura Afrobrasileira
e “Educação para as Relações Étnico-Raciais (ERER) no Ensino de Ciências,
respectivamente.
Um agradecimento muito especial ao meu aluno de IC, na época das disciplinas,
ao parceiro de escrita de artigos, parceiro de congressos, ao cara que quando eu pensei
em desistir chegou em minha sala e disse: “ levanta-se Juvan, vamos terminar essa tese”.
Estou a falar do Gustavo Augusto, muito obrigado meu querido amigo, por tudo. Nunca
vou te esquecer.
Agora o meu eterno reconhecimento e agradecimento a minha amiga e
orientadora, exatamente nessa ordem, a professora Anna Benite, que topou sonhar comigo
esse sonho louco. Enfrentou o preconceito do CD quando propôs, inicialmente, a
ministrar dentro de um instituto de química a disciplina Ensino de Química, Identidade
e Cultura Afrobrasileira. E depois já a pedido da Pró Reitoria de graduação e das
coordenações de graduação dos cursos de Licenciatura em Química, Física e Biologia, a
disciplina Educação para as Relações Étnico-Raciais (ERER) no Ensino de Ciências.
Anna, meu muito obrigado por confiar e mim.

8
RESUMO
Esta pesquisa que tratou da implementação da lei 10639/03 e o cumprimento da
Resolução CNE/CP 01/2004 e o Parecer CNE/CP 03/2004 no ensino de química, originou
esta tese que teve os seguintes objetivos: a) responder à pergunta: é possível formar
professores de química numa disciplina experimental com abordagem cultural
diaspórica? b) Investigar a apropriação conceitual nessa disciplina experimental como
possibilidade da implementação da Lei 10639/03 no ensino de ciências/química em nível
superior; c) avaliar, se durante essa apropriação conceitual, estiveram presentes nos
discursos dos participantes da pesquisa os três níveis dos aspectos do conhecimento
químico – teórico, fenomenológico e representacional - propostos por Mortimer e
colaboradores (2000). Visando alcançar esses objetivos criamos duas disciplinas
experimentais no Instituto de Química da UFG, para a coleta de dados para a pesquisa. O
estudo teve elementos de pesquisa participante tratou -se, portanto, de uma atividade
educativa de investigação e ação social. O “termo participante sugere a controversa
inserção de um pesquisador formado pela vida sociocultural de um próximo ou distante
que, por sua vez, é convocado a participar da investigação na qualidade de informante,
colaborador ou interlocutor. O corpus total de análise foi formado pela transcrição de
45,75h provenientes de gravações em áudio e vídeo dos discursos produzidos pelos
sujeitos da investigação. Os dados obtidos foram agrupados por unidades de significação
e analisados com elementos da técnica de Análise do Discurso de Bakhtin. A escolha
desta técnica de análise de dados significou um empreendimento em tentar explicar e
entender “como se constrói o sentido de um texto e como esse texto se articula com a
história e a sociedade que o produziu. Nas disciplinas ministradas durante a pesquisa,
para cada tópico contindo na ementa foram realizadas abordagens culturais diaspóricas e
conceituais científicos. Assim conceitos químicos envolvendo reações química com o Fe
e Ni, síntese de uma ferrita, estabilidades de complexos em solução, efeito quelato, foram
contextualizados com as seguintes abordagens culturais: legado do ferreiro africano e de
seus descendentes nos campos das artes, mineração e religião e a herança africana em
Goiás, qual seja, as Congadas. Estas abordagens conceituais e culturais diaspóricas foram
realizadas com os assuntos: a química do ferro e o papel do ferreiro africano nas
sociedades centro-africanas e no Brasil colônia e a herança cultural africana, indígena e
portuguesa nas regiões de mineração do estado de Goiás contidos nas ementas das
disciplinas. Conceitos de densidade e viscosidade, ácidos graxos e fitoquímica, foram
entrelaçados com a abordagem cultural sobre a importância do dendê na formação e

9
manutenção da cultura afro-brasileira dos povos, comunidades, saberes tradicionais e de
religiões de matriz africana. O assunto nas ementas que originaram essas duas abordagens
foram: a química do e no dendê, sua importância nas religiões de matriz africana e na
culinária afro-brasileira e abordagem etnobotânica acerca de plantas utilizadas nas
religiões de matriz africana. No tópico a arqueologia da África e suas técnicas foram
discutidas as técnicas analíticas usadas na chamada arqueometria, que ajudam a recontar
a história do continente africano. A abordagem cultural nesse tópico foi a pecuária leiteira
praticada por povos africanos a cerca de cinco mil anos antes da era cristã e as reações
químicas que foram contextualizadas nessas abordagens foram aquelas que comprovam
algumas fraudes realizadas no leite para o consumo humano. Para finalizar, os estudos da
química dos metais nobres, o uso de Pd e Pt em dispositivos para controle da qualidade
do ar, o currículo escolar x currículo em ação, foram contextualizados com o apartheid
vivido pelos povos sul-africanos nos anos de 1946 até 1995.

PALAVRAS-CHAVE: Lei 10.639/03, ensino de química, experimentos e reações


químicas, educação para as relações étnico raciais.

ABSTRACT
This research that dealt with the implementation of law 10639/03 and the fulfillment of
Resolution CNE / CP 01/2004 and Opinion CNE / CP 03/2004 in the teaching of
chemistry, originated this which had the following objectives: a) to answer the question:
is is it possible to train chemistry teachers in an experimental discipline with a diasporic
cultural approach? b) Investigate a conceptual appropriation in this experimental
discipline as a possibility of implementing Law 10639/03 in science / chemistry tea ching
at a higher level; c) evaluate, during this conceptual appropriation, present in the speeches
of the research participants the three levels of aspects of scientific knowledge -
theoretical, phenomenological and representational - proposed by Mortimer and
collaborators (2000). In order to achieve these objectives, we created two experimental
disciplines at the Chemistry Institute of UFG, to collect data for research. The study had
elements of participatory research; therefore, it was an educational activity of research
and social action. The term “participant suggests the controversial insertion of a
researcher formed by the socio-cultural life of a close or distant person, who, in turn, is
invited to participate in the investigation as an informant, collaborator or interlocutor. The
total corpus of analysis was formed by the transcription of 45.75h from audio and video
recordings of the speeches produced by the subjects of the investigation. The data
obtained were grouped by units of meaning and analyzed with elements of Bakhtin
Discourse Analysis technique. The choice of this data analysis technique meant an
undertaking in trying to explain and understand “how the meaning of a text is constructed
and how that text is articulated with the history and the society that produced it. In the
subjects taught during the research, for each topic contained in the menu, diasporic
cultural and scientific conceptual approaches were carried out. Thus chemical concepts
involving chemical reactions with Fe and Ni, synthesis of a ferrite, stability of complexes
in solution, chelate effect, were contextualized with the following cultural approaches:

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legacy of the African blacksmith and his descendants in the fields of arts, mining and
religion and the African heritage in Goiás, namely the Congadas. These diasporic
conceptual and cultural approaches were carried out with the subjects: the chemistry of
iron and the role of the African blacksmith in Central African societies and in colonial
Brazil and the African, indigenous and Portuguese cultural heritage in the mining regions
of the state of Goiás contained in course menus. Concepts of density and viscosity, fatty
acids and phytochemistry, were intertwined with the cultural approach on the importance
of oil palm in the formation and maintenance of Afro-Brazilian culture of African
peoples, communities, traditional knowledge and religions. The subjects in the menus that
gave rise to these two approaches were: the chemistry of and in oil palm, its importance
in religions of African origin and in Afro-Brazilian cuisine and an ethnobotanical
approach to plants used in religions of African origin. In the topic of archeology in Africa
and its techniques, the analytical techniques used in so-called archeometry were
discussed, which help to retell the history of the African continent. The cultural approach
in this topic was dairy farming practiced by African peoples about five thousand years
before the Christian era and the chemical reactions that were contextualized in these
approaches were those that prove some frauds carried out on milk for human
consumption. Finally, the studies of noble metal chemistry, the use of Pd and Pt in devices
to control air quality, the school curriculum x curriculum in action, were contextualized
with the apartheid experienced by the South African peoples in the years 1946 until 1995.

KEYWORDS: Law 10.639 / 03, chemistry teaching, experiments and chemicals,


education for racial ethnic relations

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LISTA DE ABREVIATURAS

(a.C.) antes da era cristã


36ª RASBQ: 36ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira de Química
AA: absorção atômica
ABPN: Associação de Pesquisadores/as Negros/as
ACN: Associação Cultural do Negro
AD: Análise do Discurso
Bel.: Bacharel
CAE: Catalisadores Automotivo Exauridos
CD: Conselho Diretor
CEPAE: Centro de Ensino e Pesquisa Aplicada à Educação
CEU: Casa do Estudante Universitário
CFEM: Compensação Financeira por Exploração Mineral
CNA: Cadastro Nacional de Adoção
CNE/CP 003/2004: Parecer 003/2004 do Conselho Nacional de Educação
DCN: Diretrizes Curriculares Nacionais
DMG: dimetiliglioxima
DNAmt: DNA mitocondrial
DNPM: Departamento de Produção Mineral do Ministério das Minas e Energia
DO: Disciplina Optativa
EDTA: etilenodiamintetraacetato
en: etilenodiamina
ENEQ: Encontro Nacional de Ensino de Química
ERER: Educação para as Relações Étnico Raciais
FH: Faculdade de História
FHC; Fernando Henrique Cardoso
FNB: Frente Negra Brasileira
IBGE: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IES: Instituições de Ensino Superior
IFES: Instituição Federal de Ensino superior
III CONAPIR: III Conferência Nacional de Igualdade Racial
IP: Intervenção Pedagógica
IQ: Instituto de Química

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IQG: Instituto de Química e Geociências
Kf: Constante de formação
LPEQI: Laboratório de Pesquisa em Educação Química e Inclusão
MEC: Ministério da Educação
MGP: Metais do grupo da platina
MNU: Movimento Negro Unificado
NL: Núcleo Livre
OMS; Organização Mundial de Saúde
PIBID: Programa Institucional de Bolsas de Incentivo a Docência
PNPCT: Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades
Tradicionais
PP: pesquisa participante
PPC: Projeto Político Pedagógico dos Cursos.
PPGECM: Programa de Pós Graduação em Educação em Ciências e Matemática
PPGIDH : Programa de Pós-Graduação Interdisciplinar em Direitos Humanos
PPGeo :Programa de Pós-Graduação em Geografia.
PPI: Projeto Político Pedagógico Institucional
QNesc; Química Nova na Escola
SEEGO: Secretária da Educação do Estado de Goiás
SI: Sujeitos da Investigação
SUS: Sistema Único de Saúde
TCC: Trabalho de Conclusão de Curso
TCLE Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
TEN: Teatro Experimental do Negro
UEG: Universidade Estadual de Goiás
VM-Ni; Votorantim Metais, unidade de Niquelândia.

20
INTRODUÇÃO
DO MEU PRIMEIRO ENCONTRO COM A QUÍMICA ATÉ A CONFECÇÃO
DA TESE.

Tudo tem o seu tempo determinado e há tempo para todo o propósito


debaixo do Orum.1: 2) Há tempo de nascer, e tempo de morrer; tempo
de plantar, e tempo de arrancar o que se plantou, 3) tempo de matar e
tempo de curar, tempo de derribar, e tempo de edificar; 4) tempo de
chorar, e tempo de rir, tempo de prantear e tempo de saltar; 5) tempo
de espalhar pedras, e tempo de ajuntar pedras, tempo de abraçar e
tempo de afastar-se do abraço. ( ECLESIASTES, Cap. 3 versículos. 1-
5, p. 900, s/data).

Começo a escrever este texto de apresentação da minha tese pedindo licença


e escusa àqueles/as que sempre me ensinaram que um texto científico deve se primar
pela escrita na voz passiva, nestas páginas iniciais usarei a primeira pessoa do singular,
algumas vezes usarei, também, a primeira pessoa do plural.
Paradoxalmente, início este texto com uma citação de um livro do Velho
Testamento para falar dos diferentes tempos da minha trajetória na química até chegar
a este manuscrito. A substituição do vocábulo céu por Orun faz-se com o devido
respeito e, dá uma dica do porquê deste paradoxo, que ficará mais nítido nos
subcapítulos 3.2, 3.3 e 3.4 deste manuscrito.
A química me foi apresentada no penúltimo ano, da penúltima década, do
século passado, quando fui cursar a antiga 8ª Série, do antigo 1º Grau, no Colégio
Estadual Joaquim Maria de Godoy, na cidade de Niquelândia GO. E tal apresentação,
acreditem, aconteceu de maneira bem abrupta, e não muito amistosa. Explico: na
minha primeira aula de ciências me foi apresentada e pedido para que eu decorasse a
Tabela Periódica. Em tempo, esse ano ela completou o seu 150º aniversário.
Mas o tempo foi passando, a animosidade foi acabando e eu fui aprendendo
a lidar com ela. Sabe aquela frase, “a química está em tudo”? Então, ela foi
fundamental para que eu passasse a entender a Tabela Periódica e por consequência, a
química. E, em um desses “tudo” que a química está, naqueles mesmos tempos
descobri que a extração de níquel que acontecia/acontece em minha cidade, tinha
muito de processos e reações químicas, falo mais disso um pouco mais adiante.
Esta descoberta se deu quando em uma visita “técnica” a um laboratório de
uma das mineradoras daquela cidade foi nos mostrado (digo a todos/as alunos/as da

1
Segundo a crença nagô, o Orun em muito se assemelha ao céu paradisíaco de outros povos.

22
turma), como a partir de uma rocha contendo Ni e Fe, chega-se a uma liga desses
mesmos metais. Esse evento fez com que eu optasse por cursar o Curso Técnico em
Química, uma das três opções que tinha, na antiga Escola Técnica Tocantins de
Niquelândia GO. Em tempo, esse “Tocantins” não tem nada a ver com o homônimo
estado de nossa federação.
Assim, no início da última década, do último século, passei a fazer o Curso
Técnico em Química. Sem me estender muito, digo que no ano de 1991 quando já no
terceiro ano do curso, iniciei, também, o meu estágio em uma das mineradoras daquela
cidade, a Votoratim Metais, unidade de Niquelânida, (VM-Ni) à época chamada Cia
Níquel Tocantins, daí o porquê do nome da escola técnica que estudei.
O meu estágio ocorreu dentro da chamada área de “produção” e era
exatamente nessa área que aconteciam os principais processos químicos. Naquela área
existia uma sub área chamada de bateria de lixiviação, tempos depois fui saber que a
lixiviação nada mais era do que as transformações dos metais nas formas de óxidos,
carbonatos e sulfetos, para as formas catiônicas em solução que, tempos mais tarde,
descobri se tratarem de complexos. Nessa tese procurei resgatar um pouco desse
tempo, o/a leitor/a irá perceber.
Já no final do meu estágio, após tomar o primeiro “pau” no antigo vestibular
para o curso de Química, na iminência de ser contratado como Técnico na VM-Ni,
num determinado dia do mês de fevereiro do ano de 1992, após um longo contato
cutâneo tanto com a amônia gás, quanto com ela dissolvida em água, cheguei em casa
com fortes dores de cabeça e, ao ser internado, descobri que era portador do bacilo de
Hansen. Em tempo, ter adquirido o bacilo citado não teve nenhuma ligação com a
minha exposição à amônia.
Achei necessário contar esse último evento pois ali percebi que, com aquela
enfermidade e, com o preconceito advindo dela, naquele momento, a minha carreira
tornara-se natimorta. Era preciso dá outro salto. Só não sei dizer se este fôra quântico,
ou não.
Este salto começa com a minha chegada em Goiânia no início do ano de 1993
para fazer curso pré-vestibular e continuar o meu tratamento para curar do bacilo já
citado aqui. O curso pré-vestibular que fiz era mantido pela Secretária da Educação do
Estado de Goiás (SEEGO), sim meus caros e minhas caras, naquele tempo existia este
tipo de política pública. Hoje, com muito orgulho, coordeno uma ação de extensão

23
dentro da universidade nos mesmos moldes daquele “cursinho pré-vestibular”
estadual.
Essa linha do tempo continua com a minha aprovação num concurso para
Técnico Químico da UFG, o último realizado pelo governo neoliberal do presidente
Fernando Henrique Cardoso (FHC) e aprovação para o Curso de Bacharel (Bel.) em
Química dessa mesma instituição, no final no ano de 1994. A culminância desses dois
últimos eventos acontece quando me torno calouro no início de 1995 e assumo como
técnico em 12/01/1996, ambos no antigo Instituto de Química e Geociências (IQG), o
hoje Instituto de Química (IQ). Bons tempos!
Nos tempos que viriam a seguir eu seria estudante, morador da casa do
estudante universitário (CEU), professor de química na rede estadual e particular de
ensino de Goiânia e funcionário público federal. E, óbvio com essa multifacetada
pessoa que me tornei, acabei por concluir o curso de Bel na virada do século.
Da formatura no Curso de Bel. em Química, realizada em 15/03 de 2001, ao
início de 2003, vivi uns tempos que diria sabático, onde dediquei meu tempo apenas
ao trabalho na UFG e a ministrar algumas aulas de química em um extinto curso pré-
vestibular noturno da nossa capital.
No entanto, ainda em 2002, procurei o professor Dr. Aparecido da área de
Química Inorgânica do IQ para retomar uma pesquisa que havia começado por ocasião
do meu trabalho de conclusão de curso (TCC). Naquela época não precisava de uma
defesa perante a uma banca, bastava apenas o acompanhamento e a nota do professor,
razão pela qual, penso eu, que o trabalho tenha ficado inconcluso. Em tempo, esse
trabalho tratava-se de tentarmos modificar as drogas anticancerígenas: cis-platina e
carboplatina.
Como no laboratório não havia mais sal de platina, o professor me sugeriu
que recuperássemos esses metais de catalisadores automotivo exauridos (CAE). Ao
percebermos que não se tratava de tarefa fácil, fui desafiado a desenvolver uma
metodologia de recuperação desse metal, e que aquilo poderia render uma dissertação
de mestrado. Estou no início de 2003, quanto tempo!
Esse mesmo ano em que inicio o meu mestrado ele se tornaria ainda mais
marcante para mim, pois em 23 de maio nasceria o meu primogênito, estou a falar do
Pedro Otávio. Daí fui eu ser aluno trabalhador sem bolsa, sem licença e pai de primeira
viagem. Saudades desse tempo; estou a dizer do tempo que o meu filho era criança.

24
Assim em 08 de dezembro de 2005, após aproximadamente 30 meses,
defendo a minha dissertação de mestrado cujo título é: Recuperação de Metais
Platínicos em Catalisadores Automotivo Exaurido. De novo, o/a leitor/a irá ver parte
dos conhecimentos adquiridos durante a pesquisa de minha dissertação de mestrado
no subcapítulo 3.6 dessa tese.
Antes de terminar o mestrado, no início de 2005, fui convidado para ministrar
aulas práticas de laboratório na Universidade Estadual de Goiás (UEG) onde tive o
privilégio de além do ensino também pude colaborar na iniciação a pesquisa, orientar
TCC, participar de bancas dentre outras. Diria que do eixo fundamental constituído
pelo tripé pesquisa, ensino e extensão fiquei a dever apenas o terceiro. A minha
passagem por lá durou até meados de 2009. Também dessa experiência de lá trago
pequenas contribuições para a minha tese. Falarei delas um pouco mais adiante. E o
tempo passa!
Ao ministrar aulas na UEG percebi que faltava em minha formação
disciplinas de humanidades que melhorassem o meu trato com os/as alunos/as. Não
estou dizendo do trato no cotidiano digo no trato do processo ensino-aprendizagem
mesmo, ou seja, me faltava um Curso de Licenciatura.
Depois de relutar por três anos e, pensando em uma volta para a sala de aula,
resolvi no final de 2011 fazer o processo seletivo para entrar, como portador de
diploma, no curso de Licenciatura em Química, da UFG. E isso se concretiza em
2012/1. E é esse o tempo que dou os meus primeiros passos nessa pesquisa que culmina
nessa tese. Falarei um pouco mais, sobre.
Ao me matricular no curso fui informado que deveria procurar algum/a
professor/a para fazer o meu TCC. Mesmo tendo um bom relacionamento com todas
as professoras e o professor da área, pensei, a priori, no meu amigo Cláudio Benite
que acabara de passar no concurso para ser professor nesta instituição e que eu havia
conhecido quando da minha passagem pela UEG. Olha aí uma contribuição dessa
época que falei alguns parágrafos atrás.
No entanto, o professor Cláudio não foi nomeado de imediato, e eu precisava
de um orientador para no final do semestre, apresentar a minha proposta de TCC, foi
quando ele segeriu que eu procurasse a professora Anna M. Canavarro Benite, para
me orientar provisoriamente até que ele (Cláudio) tomasse posse.

25
Ao procurar a professora Anna, que à época trabalhava com “Inclusão
Escolar”, ela me disse que estava numa fase “embrionária”, diria eu, da pesquisa que
se tratava da implementação da lei 10.639/03 (Brasil, 2003), que não farei alusão a ela
nesse momento, no ensino de ciências e que estava pensando em trabalhar com plantas
utilizadas no candomblé, mas tudo muito superficial, como já disse.
Foi desafiadora esta proposta, mas confesso que a achei muito mais
assustadora. Falar de história e cultura afro-brasileira e africana no ensino de química?
Como diriam os/as jovens de hoje, como assim?
Nesta primeira reunião a professora Anna, como faz a maioria dos/as
orientadores/as no início, acho que para assustar as pessoas, me indicou “ um monte”
de artigos. No entanto, apenas dois deles falava do ensino de ciências, os do professor
Wilmo e, apenas um deles falava de química, o do professor Guimes. A expressão
aparentemente coloquial aqui, ao citar apenas o primeiro nome dos professores é
proposital, pois citarei esses artigos diversas vezes dentro desse texto com os nomes
Francisco Jr. e Rodrigues Filho, respectivamente.
Então fui cuidar de ler os artigos que ela, a professora Anna, havia me
indicado. Ao ler os apontamentos propostos por Francisco Jr. (2008), para possíveis
contribuições anti racistas no ensino de ciências, alguns termos como metalurgia,
tecnologia de fundição, conhecimentos de preparo de soluções e solubilidade, já há
muito tempo me era familiar.
Precisava agora saber como linkar esses termos com a história e cultura afro-
brasileira, precisava então, me instrumentalizar. Foi quando no segundo semestre de
2012 fui cursar duas disciplinas na Faculdade de História (FH): “Cultura e Identidade
Afro-Brasileira” e “Estudos de Religiões de Matriz Africana na Diáspora”, esta última
porque um dos três artigos que citei acima tinha o título de “A bioquímica do
Candomblé”.
Naquele momento, segundo semestre de 2012, eu já tinha em minha mente o
que eu queria para a construção do meu TCC. Queria propor uma disciplina, que fosse
por mim ministrada no Centro de Ensino e Pesquisa Aplicada à Educação (CEPAE),
em meu estágio obrigatório, cujo eixos principais fossem: a metalurgia/mineração
praticadas em Goiás e as plantas do bioma cerrado que possuíssem (re)significado nas
religiões de matriz africana.

26
Não sabia como fazer isso, mas já tinha um rumo. Caro leitor, caríssima
leitora, não se percam, estou ainda a falar da construção do meu TCC, mas que ao
final, vocês verão que no fundo, também, trata-se da construção de minha tese. Em
tempo, no final de 2012, mais precisamente em 14/12/2012 casei-me com a minha
esposa amada Fabiane Borges.
No início de 2013 eu já tinha uma proposta para a tal disciplina que na minha
cabeça, seria ministrada por mim e por um professor de história. Digo professor porque
cheguei a mostrar a proposta da disciplina para o mesmo e ele gostou e concordou em
oferecer comigo a tal disciplina. A professora de química que eu havia procurado à
época, também havia concordado com o projeto, no entanto ela falou que precisava
passar pelo Conselho Diretor (CD) daquela unidade.
Acho que não consegui vender muito bem a ideia de oferecer uma disciplina
para ser ministrada como minha atividade de estágio para aquele CD e o projeto não
foi aprovado. Mas também “né”, falar de Química e História e Cultura Afro-Brasileira
tudo junto e misturado, que loucura! Tempos depois, fiquei sabendo que o CEPAE não
era uma unidade de pesquisa (o que eu queria fazer), mas sim de estágio, o que eu
também queria fazer e fiz.
Antes de encerrar o tema “ disciplina no CEPAE” é preciso dizer que pouco
tempo depois o projeto foi aceito não com o mesmo formato que eu havia pensado, e
da parceria entre aquela unidade e o Coletivo Ciata do Laboratório de Pesquisa em
Educação Química e Inclusão ( LPEQI) já resultaram três dissertações de mestrado e
um bom números de artigos, o que deixa esse que vos escreve deverás orgulhoso pela
semente plantada.
Ainda estou no início de 2013. Que ano! Não. A exclamação não é pelos
protestos de junho, importantes, mas protestos estes que culminaram na cassação de
uma presidenta legitimamente eleita pelo povo. O ano de 2013 é para mim marcante
pois nesse ano tive pela primeira vez um trabalho escolhido para uma apresentação
oral em um dos principais congressos de química no Brasil. Estou a falar do trabalho:
Estudos das Propriedades Adsorventes de Elaeis Guineensis (Dendezeiro): A Lei
10.639 no Ensino de Química, apresentado por mim, ainda como aluno de licenciatura,
na 36ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira de Química (36ª RASBQ).
Foi a partir deste trabalho, apresentado em maio daquele ano, que resolvi
fazer o meu doutoramento na área de ensino de química e após voltar do congresso

27
coloquei isso para a minha orientadora e ela de pronto aceitou. Também em 2013
aconteceu a concepção do meu segundo filho e, ainda, tivemos eu e a Fabiane, o nosso
nome aprovado no Cadastro Nacional de Adoção (CNA). Já no segundo semestre de
2013, juntamente com a professora Anna, passei a cuidar da confecção do meu projeto
que deveria ser apresentado no início de 2014.
O tempo verbal de minha última enunciação aconteceu no futuro do pretérito
pois no início de 2014, na semana da inscrição, chegou o Luiz Alberto meu segundo
filho. E, como quase sempre, deixo tudo para a última hora, o derradeiro dia da
inscrição foi 04/02/2014, exatamente a data de nascimento dele, ou seja, a inscrição
ficou em segundo plano. Por falta de alguns documentos, ela foi indeferida e a
coordenadora da pós à época chegou a me dizer para eu recorrer, mas naquele
momento eu queria apenas cuidar do meu filho e de sua mãe, é óbvio. Então, sem
muito prejuízo, penso eu, a inscrição e apresentação do projeto de doutorado ficou para
o segundo semestre de 2014.
Assim em agosto de 2014 comecei então, de fato, este doutoramento que
resultou neste manuscrito que se segue. Não foi/não está sendo nem um pouco fácil.
Por ter mais de cinco anos de conclusão do mestrado, fui obrigado a cursar trinta
créditos e sempre sendo também aluno trabalhador, a licença que foi sugerida não era
compensatória financeiramente.
Aproveitei da obrigatoriedade de ter que cursar quatro ou cinco disciplinas
para me instrumentalizar melhor para esse desafio. Assim cursei a disciplina de
Metodologia da Pesquisa Educacional em Ensino de Ciências e Matemática e A
Formação do Professor de Ciências e Matemática no Contexto Educacional
no Programa de Pós Graduação em Educação em Ciências e Matemática (PPGECM)
e a disciplina de Relações Etnicorraciais e o Princípio da Igualdade no Programa de
Pós-Graduação Interdisciplinar em Direitos Humanos (PPGIDH), sendo esses três
programas da UFG. Cursei ainda uma disciplina de Geografia da África como aluno
especial no Programa de Pós-Graduação em Geografia PPGeo.
Ainda dentro do processo de instrumentalização me tornei membro da
Associação de Pesquisadores/as Negros/as (ABPN) e participei de alguns congressos
e seminários na área com apresentações de trabalhos e/ou ministrante de mini cursos.
Em tempo, já agora quase no final de escrita dessa tese fomos presenteados (Luiz

28
Alberto, Pedro Otávio, Fabiane e eu) com a nossa Linda Isabele. A tese iria ter que
esperar um pouco mais.
Durante esses últimos anos participei de vários congressos tanto na área de
ensino de química como na área de cultura afro-brasileira e africana. Esses trabalhos
rederam algumas publicações em anais de congressos, cinco artigos e dois capítulos
de livros que compõe este manuscrito. É neste cenário que se apresenta essa tese que
responde a seguinte pergunta de pesquisa: é possível formar professores de química
numa disciplina experimental com abordagem cultural diaspórica?
Cabe ressaltar que o ineditismo que se pretende nesse trabalho não é uma
revisão de conceitos químicos que já estão estabelecidos na academia, não se trata
também de entrar na seara da geografia ou história da África e da diáspora africana no
Brasil.
Trata-se, sobretudo, de contribuições de como o/a professor/a do ensino
superior de ciências, em especial o/a de química, pode a partir de conhecimentos
diaspóricos, ou seja, conhecimentos trazidos pelos/as negros/as africanos/as que para
cá vieram para serem escravizados/as, fazer um deslocamento epistêmico do currículo,
ou seja, fornecer uma alternativa para que este não seja totalmente europeu, masculino
e branco.
Para direcionar a leitura, o trabalho foi organizado em três capítulos e as
Considerações Finais.

O Capítulo 1 – SOBRE AS CIÊNCIAS E A INVENÇÃO DO RACISMO


– discorro sobre como as teorias raciais importadas da Europa no início do século
passado ajudaram e influenciaram alguns intelectuais e cientistas brasileiros na
criação, manutenção e propagação do racismo em todas as suas nuances. Discorro
também, sobre como o estado brasileiro com as suas leis operou em desfavor do/a
negro/a brasileiro/a contribuindo para a criação e manutenção de um estado racista.
Apresento ainda como os movimentos negros sociais organizados foram importantes
no combate a esse racismo até a promulgação da lei 10.639/03 (Brasil, 2003). Finalizo
o capítulo discutindo como a educação para as relações étnico raciais (ERER) deve
interagir com os cursos de formação de profissionais da educação segundo alguns
documentos legais. Por último faço um breve e despretensioso estudo do estado da arte
de como os/as pesquisadores/as e professores/as da área de ensino de química vêm

29
trabalhando com essa temática desde 2003. Nesse capítulo são apresentados ainda os
objetivos dessa pesquisa.
O Capítulo 2 – SOBRE O PERCURSO METODOLÓGICO - delineia a
escolha metodológica da pesquisa, o contexto na qual ela foi realizada, os instrumentos
de coleta de dados, a técnica de análise dos dados, bem como os sujeitos da pesquisa.
O Capítulo 3 – RESULTADOS E DISCUSSÔES –Neste capítulo apresenta-
se as discussões dos resultados obtidos por meio da análise dos discursos (AD)
produzidos pelos alunos/as das disciplinas de Ensino de Química, Identidade e
Cultura Afro-brasileira, - (UFG 2015), ofertada como disciplina de inverno em julho
de 2015 e Educação para as Relações Étnico-Raciais (ERER) no Ensino de
Ciências (UFG, 2016) ministrada como disciplina optativa (DO) no 1º semestre de
2016. Fazem parte, também, dos resultados dessa pesquisa e que também se encontra
neste capítulo, duas intervenções pedagógicas realizadas em duas turmas da disciplina
de Química Geral Experimental, ministradas no IQ/UFG. Sendo uma turma dos Cursos
de Física cuja intervenção deu origem ao subcapitulo 3.1 e uma turma dos cursos de
Engenharia cuja intervenção deu origem ao subcapítulo 3.5.

Tais resultados são divididos em seis subcapítulos;


3.1 A química do ferro e o papel do ferreiro africano nas sociedades centro-
africanas e no Brasil Colônia ;
3.2 A herança cultural africana, indígena e portuguesa nas regiões de
mineração do estado de Goiás;
3.3 A química do dendê e a sua importância nas religiões de matriz africana
e na culinária afro-brasileira;
3.4 Abordagem etnobotânica acerca de plantas utilizadas nas religiões de
matriz africana;
3.5 Leite em “mama” África e a educação para as relações étnico-raciais (erer)
no ensino de química;
3.6 O apartheid e a produção de metais nobres na África do Sul.

30
CAPÍTULO 1

SOBRE AS CIÊNCIAS
E A INVENÇÃO DO
RACISMO

31
1.1 SOBRE HISTÓRIA E CULTURA AFRICANA E AFRO-BRASILEIRA
De acordo com Santos (1990), a ideia de que existem raças é um produto
social, assim como os estereótipos de cada raça em que se dividiria a espécie humana.
Segundo o autor, o racismo é a suposição de que há raças e a conseguinte atribuição
biogenética de fenômenos sociais e culturais, além de uma forma de dominação de um
grupo e ainda a justificativa para tal dominação baseada apenas no fenótipo, ou seja,
pura ignorância.
O estado brasileiro opera na manutenção e propagação do racismo de diversas
maneiras. Um exemplo se dá na promulgação do primeiro código penal, através do
Decreto 847 de 11 de outubro de 1890, que no capítulo XIII trata da criminalização da
capoeira:

Art. 402. Fazer nas ruas e praças públicas exercícios de agilidade e destreza
corporal conhecidos pela denominação capoeiragem; andar em correrias,
com armas ou instrumentos capazes de produzir uma lesão corporal,
provocando tumultos ou desordens, ameaçando pessoa certa ou incerta, ou
incutindo temor de algum mal:
Pena - de prisão cellular por dous a seis mezes.
Paragrapho unico. E' considerado circumstancia aggravante pertencer a
capoeira a alguma banda ou malta. Aos chefes, ou cabeças, se imporá a
pena em dobro (BRASIL, 1890).

Ou seja, com a abolição a população negra é deixada a sua própria sorte, sem
emprego, sem instrução e vilipendiada em sua manifestação cultural. As Teorias
Raciais importadas da Europa, que serviram para o estado brasileiro manter e propagar
o racismo se fortaleceram com a publicação da obra “A origens das Espécies de
Darwin”. A partir desta, alguns intelectuais começaram a difundir ideais deterministas
conhecidos como Darwinismo Social cujos pressupostos eram: primeiro - a crença na
existência de “Tipos Perfeitos (indivíduos que não eram miscigenados), segundo-
consideravam a mestiçagem como uma praga para a sociedade “civilizada” que
precisava ser evitada e eliminada” (SILVA e SANTOS, 2012, p. 1-9).
As Teorias Raciais tiveram em Nina Rodrigues o seu maior representante.
Este publicava dentre outros lugares na Gazeta Médica da Bahia seus artigos que
tratavam a mestiçagem como problema de saúde pública (SILVA e SANTOS, 2012).
Para ele um mesmo tipo de crime praticado por um negro africano, indígena ou mestiço
deveria ser tratado diferente do crime praticado por um branco. “Os selvagens – negros
e índios – teriam, de acordo com Nina Rodrigues, um código de conduta próprio,

32
estabelecido nos seus locais de origem e que difeririam muito dos códigos de conduta
dos povos ditos civilizados” (RODRIGUES, 2015, p. 1118-1135).
Discursos racistas que perduraram de forma intensa até o fim da primeira
República em 1930 ganharam proporções sendo disseminados por museus, institutos
históricos, faculdades de direito e, “advogados que tinham um papel fundamental,
eram eles os responsáveis por justificar na lei as práticas racistas”. (SILVA e
SANTOS, 2012, p 1-9).
Dados do último censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
(IBGE, 2010) constataram que negros e pardos são maioria no Brasil, mais
especificamente 50,7% do total de brasileiros autodeclarados. Ainda que, a maioria
desses sujeitos sociais esteja concentrada nas regiões norte e nordeste e possui um
rendimento médio em torno de R$800,00, bem inferior à renda média de brancos e
amarelos de, aproximadamente, R$1.500,00. Tais dados nos levam a concluir que,
mesmo sendo a maioria, a comunidade negra brasileira é desvalorizada como força de
trabalho.
Soma-se a isso, o fato de que a juventude negra entre 19 a 29 anos é mais
exposta à violência letal do que jovens brancos, como concluíram Oliveira Junior e
Lima (2013). Analisando dados do Ministério da Saúde e do IBGE, os autores
perceberam que em 2009, para cada 100 mil habitantes a taxa de homicídios foi de
72,4 jovens negros, enquanto para o mesmo número de habitantes a taxa foi de 30,4
para juventude branca. Mesmo entre os jovens negros e brancos que possuem mesmo
nível de escolaridade, para que não se julgue ser apenas um problema social e não uma
questão racial, em 2009 se teve uma taxa maior de homicídio para os negros.
As instituições médicas, como a Faculdade de Medicina da Bahia, que um dia
chancelaram as práticas racistas no Brasil, durante a Primeira República, por exemplo,
hoje detectam in loco o resultado do racismo praticado ao longo dos anos contra a
população negra. Pesquisa coordenada pela médica Maria do Carmo Leal (Fundação
Osvaldo Cruz) analisou prontuários de 9.633 grávidas (brancas e negras) atendidas
pelo Sistema Único de Saúde (SUS) no Rio de Janeiro, tendo sido constatadas
situações discriminatórias em relação às negras. O dado mais marcante da pesquisa diz
respeito à anestesia no parto normal: apenas 13,5% das brancas não receberam contra
21,8% das negras. Apoiamo-nos em Zapater para afirmar que os dados apresentados
demonstram “o tratamento diferenciado dispensado às gestantes negras, sem qualquer

33
outro fator de discrímen2 perceptível que não a cor da pele (já que todas as pesquisadas,
sendo usuárias do SUS, presumem-se provenientes de um mesmo estrato social”
(ZAPATER, 2015, p.163).
A comunidade negra brasileira sofre discriminação até mesmo no âmbito dos
tribunais de justiça, tal como indicam os resultados da pesquisa de Adorno e
colaboradores realizada entre 1992 e 1993:

-Réus negros tendem a ser mais perseguidos pela vigilância policial, bem
como experimentam maiores obstáculos de acesso à justiça criminal e
maiores dificuldades de usufruírem do direito de ampla defesa, assegurado
pelas normas constitucionais vigentes;
-Em decorrência, réus negros tendem a merecer um tratamento penal mais
rigoroso, representado pela maior probabilidade de serem punidos
comparativamente aos réus brancos (ADORNO, et al, sem paginação).

O racismo não é um fenômeno contemporâneo de raízes fincadas na


escravização dos povos africanos pelos europeus a partir do século XVI, mas uma
realidade social e cultural pautada exclusivamente no fenótipo. É um fenômeno
histórico ligado a conflitos reais ocorridos nas histórias dos povos (MOORE, 2012).
Deste modo, não por acaso os meios acadêmicos – séculos XVII ao XX – gestaram
ideologicamente as noções raciais que predominam até hoje.
No Brasil, após a lei da abolição da escravatura, ocorrida em 13 de maio de
1888, foram relegados aos negros libertos e seus filhos os lugares mais subalternos da
sociedade brasileira. E assim esse modelo de racismo institucionalizado,

[...] trouxe desigualdades consideráveis entre pessoas negras e brancas,


sobretudo no que se refere aos direitos básicos de acesso aos bens de
serviço e consumo, bem como na distribuição de empregos do mercado de
trabalho e nos espaços de representações legais e nas esferas de poder
(SOUZA, 2016, p.48).

Para lutar contra essa marginalidade a que a população negra foi submetida,
as/os negras/os libertas/os e seus descendentes iniciam os movimentos negros
organizados com perspectiva de dialogar sobre seus problemas na sociedade,
problemas estes advindos principalmente dos preconceitos e das discriminações raciais
e que Dias (2012) o divide em três fases.

2
Ato, ou efeito ou faculdade de discriminar, discernir, discernimento, discriminação. Diferença,
distinção, linha divisória (Página da Web – Geocities. Disponível em:
http://www.geocities.ws/limazevedo/principios/floresta/fdiscrimen.htm

34
A Primeira Fase (1889-1937) que vai da Primeira República ao Estado Novo.
Nesse período surgem vários movimentos onde os negros lutam por seus direitos, cria-
se alguns movimentos de mobilização racial dos negros, tais como: Clube 13 de maio
dos Homens Pretos, Sociedade União Cívica dos Homens de Cor, o Clube 28 de
setembro de 1897. Esses movimentos deram início a uma série de outros grupos que
abordariam a questão racial no Brasil durante o século XX. Uma imprensa que tratava
um pouco sobre a realidade e acontecimentos em setores que jamais eram citados em
outros jornais. Os principais jornais ou folhetins da imprensa negra: A Alvorada
(1907); O Menelick (1915); A Rua (1916); O Alfinete (1918); A Liberdade (1919); A
Sentinela (1920); O Getulino; O Clarim d’ Alvorada (1924).
Importa dizer que antes desse período, episódios de lutas por ampliação de
direitos civis foram protagonizados pelos negros, apesar de terem sido retratados por
muito tempo sem a devida ênfase, como a Guerra dos Palmares (1690) e Revolta do
Malês (1837) (CASSOLI, 2014).
A segunda Fase (1945-1964) período que compreende a Segunda República
à Ditadura Militar. Nessa fase podem ser citados os seguintes movimentos. Frente
Negra Brasileira (FNB): Fundada em 16 de setembro de 1931 a FNB teve uma atuação
destacada na luta contra a discriminação racial, tendo sido, por exemplo, responsável
pela inclusão de negros na Força Pública de São Paulo. Em 1936 se tornou o primeiro
partido político presidido por negro. Em 1937 foi fechado por meio de um decreto
imposto por Getúlio Vargas (VELASCO, 2009).
Teatro Experimental do Negro (TEN): Em 1944, Abdias do Nascimento, no
Rio de Janeiro, fundou o TEN. Nascimento foi o responsável por expressiva produção
teatral onde buscava dinamizar a consciência da negritude brasileira, e combater a
discriminação racial. Abdias também editou um jornal, denominado “Quilombo” entre
1948 e 1952. “ O jornal trazia reportagens, entrevistas, e matérias sobre assuntos de
interesse à comunidade. A precariedade dos recursos financeiros do TEN, e do poder
aquisitivo de seu público, não lhe permitiu uma permanência maior. (NASCIMENTO,
2004). É através do TEN, que se começa a discutir a problemática dos conteúdos
curriculares, as relações sociais na escola e a importância de se introduzir informações
sobre as raízes culturais dos negros brasileiros, sobretudo na disciplina de História
(GOMES e CUNHA JUNIOR, 2002).

35
Associação Cultural do Negro (ACN): Em 1954 a ACN surge como um
movimento de reivindicações ideológica montando departamentos de cultura, esporte,
estudantil, feminino e uma Comissão de Recreação enfatizando a participação dos
negros que até então eram excluídos de qualquer movimento cultural (SILVA, 2012).
A Terceira Fase do movimento negro se inicia com a abertura política em
1978 e vai até o ano 2000. Nessa fase é fundado o Movimento Negro Unificado Contra
a Discriminação Racial (MNU): Surge em 1978 com o intuito de formar debates sobre
a discriminação racial. Foi um movimento com muita importância que culminou com
a criação, em 1984, do primeiro órgão público voltado para o apoio dos movimentos
sociais afro-brasileiros: O Conselho de Participação e Desenvolvimento da
Comunidade Negra, no Governo Franco Montoro em São Paulo. Foi ainda de Montoro
a iniciativa de indicar um representante dos Negros para a chamada Comissão Arinos
que criminalizou a discriminação racial na constituição de 1988. A tipificação do
racismo como crime foi estabelecida pela Lei Caó, de autoria do deputado Carlos
Alberto de Oliveira, promulgada em 1989. Dentre suas reivindicações está a luta pela
introdução da História da África e do Negro no Brasil nos currículos escolares. Assim,

O movimento negro passou a intervir no campo educacional, com


propostas de revisão dos conteúdos preconceituosos dos livros didáticos;
na capacitação de professores para uma pedagogia inter-racial; na
reavaliação do negro na história e, por fim, na exigência da inclusão do
ensino da história da África nos currículos escolares (DIAS, 2012, p. 20).

Frutos de trabalho, de concordância com pactos internacionais nos quais o


Estado brasileiro se compromete com as implementações de políticas de combate ao
racismo, a declaração de Durban (MARQUES JUNIOR, 2017), por exemplo, e
principalmente pela luta das diferentes representações do movimento negro
organizado, em 09 de janeiro de 2003 é assinada pelo então presidente da República
Luiz Inácio Lula da Silva a lei 10.639/03 (BRASIL, 2003) que inclui a obrigatoriedade
de estudos sobre a cultura afro-brasileira e africana em todos os níveis de ensino
alterando a lei maior da educação, a Lei Nº 9.394/1996 – LDBN (BRASIL, 1996).
Para orientar professores/as, pesquisadores/as e outros entes ligados aos
sistemas de ensino, em 2004 o governo brasileiro publica o Parecer 003/2004 do
Conselho Nacional de Educação (CNE/CP 003/2004) (BRASIL, 2004) que normatiza
as Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN) para a Educação das Relações Étnico-
Raciais (ERER) e para o Ensino de História e Cultura Afro-brasileira e Africana, cujo

36
dever é fazer justiça à história e cultura provenientes do continente africano, em
contínuo desenvolvimento e transformação na diáspora negra (BRASIL, 2004). Isso
significa recontar a história do/a negro/a de uma forma positiva colocando-o/a como
protagonista no desenvolvimento cultural, social, tecnológico e político do país.
Ressalta-se ainda que o parecer CNE/CP 003/2004 determina o papel de cada
ator/a na recontagem dessa nova história do/a negro/a, quais sejam os estabelecimentos de
ensino, seus/suas mantenedores/as, administradores/as, professores/as, famílias dos/as estudantes, os/as próprios/as estudantes e,

por fim, a todos/as os/as cidadãos/as comprometidos com a educação dos/as brasileiros/as
e que estejam comprometidos com a formação para a cidadania responsável pela
construção de uma sociedade justa e democrática (BRASIL, 2004).
O papel das Instituições de Ensino Superior (IES) é contemplado no § 1° que
diz que essas deverão incluir em seus conteúdos “disciplinas e atividades curriculares
dos cursos que ministram a ERER” (BRASIL, 2004, p.1) e prever que o cumprimento
dessas DCN por parte das IES que oferecem cursos de graduação presencial ou a
distância seja “considerado na avaliação das condições de funcionamento do
estabelecimento” (p. 31) (BRASIL, 2004).
A Resolução CNE/CP 1/2004 deve ser referendada nos cursos
de formação dos profissionais de educação (Pedagogia,
Licenciaturas em História, Geografia, Filosofia, Letras,
Química, Física, Matemática, Biologia, Psicologia,
Sociologia/Ciências Sociais, Artes e as correlacionadas, assim
como Curso normal superior), tanto nas atividades acadêmicas
(disciplinas, módulos, seminários, estágios ) comuns a todos
eles quantos nas específicas, possibilitando o aprofundamento
e o tratamentoo das temáticas voltada a especificidade de cada
área de conhecimento. (BRASIL, 2006 p.125).

A Figura 1 traz um esquema de como a Resolução CNE/CP 1/2004 deve se


articular com os cursos que formam os profissionais da educação.

37
Figura 1 - Relação entre a Resolução CNE/CP 1/2004 e cursos de formação inicial.

Adaptado de (Brasil, 2006 p.125).

Suas principais ações estão explicitadas no Plano Nacional de Implementação


das DCN para a ERER e para ensino de História e Cultura Afro-brasileira e Africana
(BRASIL, 2013). Dentre essas estão: incluir conteúdos e disciplinas curriculares
relacionados à ERER nos cursos de graduação; dedicar especial atenção aos cursos de
licenciatura e formação de professores/as e; desenvolver nos/as futuros/as
professores/as habilidades e atitudes que os permitam contribuir para a ERER.
A inserção das DCN para a ERER e para ensino de História e Cultura Afro-
brasileira e Africana nas IES, deverá perpassar pelos pilares indissociáveis uma IES,
o tripé ensino, pesquisa , ensino e extenção. No centro desse tripé deverão estar o
Projeto Políticio Pedagógico Institucional (PPI) e dos Cursos (PPC).
A figura 2 procura demonstrar algumas possíveis articulações internas à
instituição de educação superior a serem consideradas na inserção da Resolução
CNE/CP 1/04 (BRASIL, 2004).

Figura 2 - Processo de circularidade de inserção das DCN para a ERER nas IES.

38
Adaptado de (BRASIL, 2006, p.136).

A Figura 2 apresenta-se de forma circular intencionalmente, tal como uma


ciranda, para afirmar-se a necessidade e as possibilidades da inserção das
Diretrizes étnico-raciais nas instituições de ensino superior”, respaldada
nos valores de africanidade. O ponto de partida para a inserção é o projeto
político-pedagógico institucional e dos cursos, e a estes estão articulados
outros espaços-tempos das IES, considerados todos eles igualmente
importantes. Não há hierarquização, há dependências e interdependências,
inter-relação, concomitâncias, articulações. Tudo deve circular em torno do
centro, articulando-se a ele, interagindo com ele, modificando-o,
transformando-o colocando o PPI em movimento.
(BRASIL, 2006).

É necessário dizer que a maior parte das produções sobre pluralidade cultural,
educação e raça, datam de meados de 1990 (BRASIL, 2006, p.129) a partir da
institucionalização desses conteúdos que foram propostos inicialmente, como temas
transversais, por meio dos Parâmetros Curriculares Nacionais - PCNs - lançados pelo
Ministério da Educação (MEC) nos anos de 1997 e 1998 (BRASIL, 1997, 1998).
No entanto, a pesquisa que originou essa tese, tem como pano de fundo as
diretrizes curriculares nacionais (DCN) para a educação das relações étnico raciais
(ERER) e para o ensino de história e cultura afro-brasileira e africana instituídas pelo
Parecer CNE/CP 3/2004 (BRASIL, 2004) e a Resolução CNE /CP n. 01/2004
(BRASIL, 2004b) e tratar-se-á da formação de professores/as de ciências e, mais
especificamente, da formação inicial de professores/as de química.
Sentimos-nos autorizados a falar de ERER num curso de formação inicial de
professores/as de química, pois a Resolução CNE /CP n. 01/2004 deve ser referendada
em todos os cursos de licenciaturas [...] tanto nas atividades acadêmicas (disciplinas,
módulos, seminários, estágios) comum a todos eles, quanto nas específicas,
possibilitando aprofundamento e tratamento de temáticas voltadas à especificidade de
cada área de conhecimento (BRASIL, 2006, p.125).
Desta maneira buscamos elementos da cultura afrodiaspórica (produção de
pessoas negras espalhadas pelo mundo pós processo escravagista) brasileira e
africana onde possamos relacionar com os conteúdos e conceitos de química e assim
contribuir com as ações que uma instituição de ensino superior deve atender para uma
efetiva implentação da lei 10639/03 (Brasil, 2003) e da Resolução CNE /CP n.
01/2004, quais sejam:

incluir conteúdos e disciplinas curriculares relacionados à ERER, dedicar


especial atenção aos cursos de licenciatura e formação de professores e

39
desenvolver nos estudantes desses cursos as habilidades e atitudes que os
permitam contribuir para a ERER com destaque para a capacitação dos
mesmos na produção e análise crítica do livro, materiais didáticos e
paradidáticos que estejam em consonância com as DCN para ERER e para
o Ensino de História e Cultura Afro-brasileira e Africanas (BRASIL, 2004,
p. 43).

Baseado nesses pressupostos é urgente que se traga e discuta a temática


da cultura afro-brasileira e africana na universidade, em todos os cursos de
graduação e, sobretudo nos de licenciatura, pois são estes os cursos que formarão
o profissional capaz de implementar a 10.639, na educação básica. Além do mais
falar de cultura negra no Brasil é falar de cultura da maioria quantitativa, contudo
não de direitos, pois somos segundo o último censo do IBGE 51% de população
autodeclarada preta e/ou parda (BRASIL, 2010).

40
1.2 A DESCOLONIZAÇÃO DO CURRÍCULO E A ERER NO ENSINO DE
QUÍMICA
O conhecimento científico é construído socialmente, ele desenvolve modelos
para compreender os fenômenos naturais. Ainda, entende que esses fenômenos se
complexificaram lentamente a partir de inúmeras transformações/mutações que deram
origem aos organismos que se fixaram pela seleção natural, o que constitui um corpo
de conhecimento acumulado.
Concordamos com Moore (2012) que extensos são os limites impostos a uma
interpretação que seja capaz de retratar corretamente o lugar dos seres humanos na
história da vida. Para compreender esta situação:

É necessária a reconstituição de um passado obscuro por fatores diversos,


não apenas de natureza física. Por exemplo, as constantes transformações
geoclimáticas que a Terra vem sofrendo. Só um aspecto parece estar fora
de questão, a saber, a posição sui generis da África no longo e lento
processo que deu origem aos humanos (MOORE, 2012 p.29).

Os grandes achados paleontológicos no Chade, Etiópia, Quênia e mais


recentemente em Bomblos (África do Sul) revogam por que se reconte a pré-história
da humanidade (HENSHILWOOD et al, 2009; M’BOKOLO, 2011, I e II). Por sua
vez, Gyllensten et al. (2000) analisaram o DNA mitocondrial (DNAmt) de 53 pessoas
de diversas localidades do mundo. A análise foi realizada em todas as sequências do
DNAmt e permitiu estabelecer com precisão os laços de parentesco de várias gerações
por meio da identificação das sequências que sofreram mutações. Os resultados
apontam que o ancestral comum do homem moderno viveu na África há 171.500 anos
e parte de sua descendência começou a emigração. Corroborando com esses dados,
uma pesquisa sobre o estudo de variações genéticas globais e medidas cranianas de
diferentes regiões do mundo demonstra que o Homo Sapiens teve origem única: a
África (MANICA et al, 2007).

41
Através de análises por cromatografia gasosa3 e espectrometria de massas4
(GC-MS) Dunne et al (2012), utilizando-se de biomarcadores de lipídeos analisou os
ácidos gordos extraídos de algumas peças de cerâmica sem esmalte encontradas num
sítio arqueológico na Líbia e concluíram que o africano já dominava a tecnologia de
ordenha de leite há pelo menos sete mil anos antes da era cristã, corroborando assim
com resultados de arte rupestre encontrados naquele local5.
A arte rupestre demonstra que o gado desempenhou um importante papel na
vida e ideologia de antigos grupos humanos que viveram nesta região durante o
Holoceno (10 mil anos antes da era cristã). Este registro pictórico contém incontáveis
cenas com representações de cabeças de gado, algumas enfatizando úberes da fêmea
plena e, em alguns casos, representações reais de ordenha de uma vaca, no entanto as
datas confiáveis para esta arte rupestre raramente podem ser verificadas.
Finalmente, Adams III (1986) defende que existe uma rica história de
conhecimento científico, descobertas e invenções que antecedem o surgimento da
civilização europeia: a descoberta do tempo, o controle do fogo, o desenvolvimento de
ferramentas tecnológicas, a linguagem e a agricultura.
Quem lucra com a invisibilidade de um passado em ciência e tecnologia dos
povos africanos e da diáspora? Como esse constructo social, político e ideológico se
originaram? O que significa descolonizar os currículos? O currículo escolar que foi
escrito sob a ótica do colonizado.
As minorias (mulheres, LGBT, negros, quilombolas e indígenas) reclamam
por suas representatividades nos espaços de poderes e nos currículos escolares. E para
isso acontecer necessário é “incluir os outros conhecimentos invisibilizados e, assim
ter um currículo que contemple todas as raízes formadoras do Brasil” (GONÇALVES,
2013, p. 29).

3
Cromatografia Gasosa: “método físico-químico de separação [...] fundamentada na migração
diferencial dos componentes de uma mistura, que ocorre devido a diferentes interações, entre duas fases
imiscíveis, a fase móvel e a fase estacionária. ” [...] “a CG utiliza colunas de maior diâmetro
empacotadas com a fase estacionária” (DEGANI, CASS e VIEIRA, 1998).
4
Espectrometria de massas: técnica analítica extremamente valiosa em que moléculas em uma amostra
são convertidas em íons em fase gasosa, que são subsequentemente separados no espectrômetro de
massas de acordo com sua razão massa (m) sobre a carga (z), m/z (WILSON e WALKER, 2010).
5
Imagem de arte rupestre e rastreamento do abrigo de rock Teshuinat II, Sudoeste da Líbia, mostrando
os pastores saharianos com seus potes e gado pode ser encontrada em Dunne et al (2012).

42
Um currículo descolonizado não pode e nem deve ser um “currículo nacional,
organizado a partir de um conhecimento oficial tido como conhecimento válido”,
Apple (1999), citado por (KHAN e MORGADO, 2013, p. 19). Para além dos preceitos
e normas legais educacionais vigentes, o currículo descolonizado deve contemplar as
características físicas, sociais e econômicas do lugar (local físico, cidade, estado, etc.)
onde se encontra a escola e a comunidade com a qual e na qual se vai trabalhar, a
característica identitária e étnico-racial da sala de aula e, sobretudo deve contar com o
comportamento ideológico do professor que irá implementá-lo. Pois “os professores
assumem, neste processo, responsabilidades acrescidas, já que das suas capacidades
intelectuais e das virtudes do seu carácter depende, em muito, da excelência do ato
pedagógico” (MORGADO, 2013, p. 433-448).
Se a assertiva de que o professor é ator principal em um processo de
descolonização do currículo é verdadeira, também é verdadeiro o protagonismo que os
cursos de formação de professores devam assumir para que isso aconteça. É necessário
que haja uma quebra de paradigma nos cursos de pedagogia e de licenciaturas, pois os
nossos/as educadores/as sempre foram:

[...] formados em uma visão monocultural, baseada na perspectiva


ocidental, que nós chamamos de visão eurocêntrica. Além disso, esses
educadores viveram suas relações cotidianas dentro do universo racista
brasileiro, introjetando a ideia limitante de democracia racial e
naturalizando a invisibilidade do outro (GONÇALVES, 2013, p. 30).

É preciso que se leve para as salas de aulas dos cursos de formação inicial e
continuada de professores os conhecimentos sobre as
“contribuições dos povos indígenas que aqui estavam, dos colonizadores
portugueses e europeus de várias origens que aqui chegaram como
imigrante e dos africanos que foram transportados e trazidos para cá”
(GONÇALVES, 2013, p. 30).

Aos professores sugerimos a tarefa de elaborar o seu próprio material para


livrar-se das amarras dos materiais (apostilas, livros didáticos, manuais escolares)
produzidos por autores que trazem consigo o viés do colonizador que servem como
“meros instrumentos de transmissão de conhecimentos, acadêmico e
institucionalmente reconhecidos como válidos” (KHAN e MORGADO, 2013, p. 9).
E isso, de fato, não é tarefa fácil. Nas palavras de Munanga:

43
A gente tem que em primeiro lugar abrir mão de algumas teorias de cunho
ocidentais e trabalhar com novas teorias como, por exemplo, os Estudos
Culturais. Isso é importante para nós, uma vez que é uma visão de
descolonização da história do negro e da representação sobre o negro.
Necessitamos trabalhar com autores que tem esse enfoque, sair um
pouquinho dos autores tradicionais (GONÇALVES, 2013, p. 29).

Sob a ótica dialética, os Estudos Culturais se fundamentam em três premissas:

1ª) Os processos culturais estão intimamente vinculados com as relações


sociais, especialmente com as relações e formações de classe; 2ª) a cultura
envolve poder, contribuindo para produzir assimetrias nas capacidades dos
indivíduos e dos grupos sociais para definir e satisfazer suas necessidades
e a 3ª) que se deduz das outras duas, é que a cultura não é um campo
autônomo nem externamente determinado, mas um local de diferenças e
lutas sociais” (JOHNSON, 1986, p. 13).

Dentre os cursos de formação inicial e continuada de professores/as estão os


cursos de Matemática e Ciências que incluem as disciplinas de Matemática, Física,
Biologia e Química. No entanto, nos documentos legais que orientam o estudo de
ERER não está explícito o papel desses cursos e de seus/suas professores/as. Nas
orientações e ações para a ERER publicado pelo MEC em 2006, no que tange ao
campo das Ciências da Natureza e suas Tecnologias o papel da Química é citado
apenas em trabalho por projeto e que “esse pode incluir diferentes disciplinas: Física,
Química, Matemática e mesmo História, Sociologia e Filosofia” (p.196) (BRASIL,
2006).
Dessa maneira alguns/algumas educadores/as, pesquisadores/as e
formadores/as de professores/as de ensino de Ciências, muitos desses/as também
ativistas do movimento negro, começam a se questionar como se posicionar diante
dessa situação. Segundo Verrangia (2010) “por que ensinar história e cultura afro-
brasileira e africana no ensino de Ciências? Por que é obrigatório? Como fazer isso se,
de forma geral, os/as docentes não são preparados/as para tal ação?” (p. 2). Assim,
passamos por apresentar quais temas os/as pesquisadores/as da área de ensino de
Química têm trazido para a discussão desde a publicação da lei 10.639/03, do parecer
CNE/CP 3/2004 e da resolução CNE/CP 1/2004 (BRASIL, 2004).
No ensino de Química o debate se inicia com a publicação, em 2007, de dois
artigos (FRANCISCO JUNIOR, 2007 e FRANCISCO JUNIOR, 2008) nos quais o
autor faz alguns apontamentos de como o ensino de Ciências/Química pode contribuir
para uma educação antirracista. Pesquisas de como os/as professores/as de Ciências e

44
Matemática veem a aplicação da Lei 10.639/03 (BENITE et al, 2012; SOUZA,
ALVINO e BENITE, 2011; SOUZA, 2014), bem como quais entendimentos que os/as
alunos/as têm a respeito da aplicação das DCN para a ERER foram realizadas (BRITO,
2017; ALVINO, SILVA e BENITE, 2014). Objetos virtuais de aprendizagens (OVA)
(PINHEIRO e SILVA, 2008; PINHEIRO, 2009; SANTOS, RODRIGUES FILHO e
AMAURO, 2013) e os livros didáticos (PINHEIRO, HENRIQUE e SANTOS, 2010)
foram abordados em pesquisas como facilitadores ou não da aplicação das ERER no
ensino de Química.
Temas transdisciplinares, como Direitos Humanos (DIONYSIO, AMORIM
e OLIVEIRA, 2015), a Arte (FRANCISCO JUNIOR, 2017), Música/Poesia
(FRANCISCO JÚNIOR, SILVA e YAMASHITA, 2013; SANTOS, SIEMSEN e
SILVA, 2015) e as interdisciplinaridades, como a anemia falciforme (MOREIRA,
AMAURO e RODRIGUES FILHO, 2013), o átomo e o genocídio (SILVA E
PINHEIRO, 2017), desigualdades de raça e gênero e a produção científica (BENITE
et al, 2018), protetores solares e a mídia (VARGAS et al, 2018) produções científicas
do antigo Egito (SILVA e PINHEIRO, 2017) também fizeram parte do leque de
assuntos pesquisados como possibilidade de implementação da lei 10.639/03 no ensino
de Química. Ciclos econômicos do Brasil Colônia, como o do café (SANTOS,
MOURA e MOREIRA, 2016; BASTOS, AMAURO e BENITE, 2017), cana-de-
açúcar (BASTOS e BENITE, 2017) e mineração (BENITE et al, 2017; BENITE,
SILVA e ALVINO, 2016; SILVA e BENITE, 2017) assim como debates como
biocombustíveis (LIMA et al, 2016) e a vitamina (SANTOS e BENITE, 2018) também
foram objetos de pesquisas na área.
A extração de platina (SILVA et al, 2016) na África do Sul e a exploração do
Coltan (mineral formado por Tântalo e Nióbio) (SUTHERLAND, 2011) na República
Democrática do Congo (HEIDELMANN, SILVA e PINHO, 2016) foram temas
utilizados para contextualizar a história de alguns países africanos em aulas de
Química. O elenco de temas utilizados por pesquisadores/as da área de Ensino de
Química, como propostas para uma efetiva implementação da lei 10.639/03, é
contemplado na reinvenção do poder no currículo (BENITE e SILVA, 2018) com
discussões sobre a química presente na noz de cola (MOREIRA et al, 2011), no dendê
(SILVA et al, 2017) e nas plantas utilizadas em religiões de matriz africana, sobretudo
no Candomblé e Umbanda.

45
Um estudo do Estado da Arte sobre a lei 10639/03 e o ensino de química foi
publicado nos Anais do XVIII Encontro Nacional de Ensino de Química (ENEQ), por
(MARQUEZ et al, 2016). Os autores sugerem que, embora a lei 10.639/03 esteja em
vigor há quase 13 anos, ainda, faltam iniciativas fortes em âmbito nacional para que
se inicie uma verdadeira empreitada em busca da valorização da temática afro-
brasileira, principalmente no interior das Instituições de Ensino Superior, nos cursos
de formação docente e que há muitas barreiras a serem derrubadas para se atingir o
propósito da implementação das diretrizes que norteiam a inserção da temática nos
currículos. Segundo os autores

[...] ainda é tímida a inserção da temática nas pesquisas em ensino de


Química, o que sugere maiores investimentos em investigações. A temática
da diversidade cultural e suas múltiplas dimensões é um campo fértil para
o desenvolvimento de estudos, em especial, que contemplem dimensões e
categorias para além da proposição de materiais didáticos pedagógicos e
projetos de ensino, mas que sejam incluídas o desenvolvimento dessas
propostas/projetos na educação básica contribuindo na produção de
conhecimentos sobre a temática. (MARQUEZ et al, 2016, p. 11).

Concordamos com os autores, porém entendemos que a temática da


diversidade cultural só chegará à educação básica, como sugerem os resultados
apresentados, quando trouxermos efetivamente essas discussões para a universidade.
A história das lutas e cultura dos povos que para cá vieram para serem
escravizados e de seus descendentes, as tecnologias trazidas por estes, tais como os
conhecimentos na agricultura, na forja do ferro, na lida com as plantas são contextos
de apresentação para os conceitos químicos nos ensinos superior, médio e básico em
interface com a lei 10.639/03.
É neste cenário que se apresenta essa investigação que responde a pergunta:
é possível formar professores/as de química numa disciplina experimental com
abordagem cultural? Ressalta-se que o ineditismo que se pretende nesse trabalho não
é uma revisão de conceitos químicos que já estão estabelecidos na academia, não se
trata também de entrar na seara da geografia ou história da África e da diáspora
africana no Brasil, trata-se de uma contribuição sobre como o/a professor/a do ensino
superior de ciências, em especial o de química, pode a partir de elementos diaspóricos
e africanos, fazer um deslocamento epistêmico do currículo, ou seja, fornecer uma
alternativa para que este não seja totalmente europeu, masculino e branco.

46
1.3 OBJETIVO
Gerais:
Propor a seguinte tese: é possível formar professores de química numa
disciplina experimental com abordagem cultural diaspórica.
Investigar a apropriação conceitual nessa disciplina experimental como
possibilidade da implementação da Lei 10639/03 no ensino de ciências/química em
nível superior
Avaliar se durante essa apropriação conceitual esteve presentes nos discursos
dos participantes da pesquisa os três níveis dos aspectos do conhecimento químico –
teórico, fenomenológico e representacional - propostos por Mortimer e colaboradores
(2000).
Específicos:
Planejar e desenvolver duas disciplinas na área de química de maneira que
os conteúdos e conceitos de química sejam abordados de forma inter e trans
disciplinarmente com elementos da cultura afro-brasileira.
Elaborar as ementas e os planos de ensino para as referidas disciplinas onde
os conceitos de química/ciência sejam contextualizados com elementos da diáspora
africana no Brasil e da cultura afro-brasileira.
Promover a reflexão sobre como trabalhar as relações étnico-raciais de forma
inter e transdisciplinar, assim como formar professores de Química para trabalhar as
inter-relações possíveis de temas da Química e da cultura afro-brasileira.
Trazer para o seio de um instituto de química questões relacionadas a temática
étnico racial e assim abraçar e contemplar questões relativas as minorias, estudantes
cotistas, por exemplo.
Investigar como se dá a formação de professores de Química para trabalhar
as inter-relações possíveis de temas da Química com os definidos pelas leis, além de
desenvolver práticas significativas e promover a consciência da importância da
diversidade cultural e o respeito à convivência com as diferenças.
Criar materiais bibliográficos e instrucionais e publicá-los em formas de
artigos (em revistas de circulação nacional) e/ou em formas de resumos expandidos (
em congressos regionais e/ou nacionais), com vistas a implementação e aplicação da
Lei 10.639/03 e o cumprimento da Resolução CNE/CP 01/2004 e o Parecer CNE/CP

47
03/2004 no ensino de química para o nível superior, médio e básico na área de
ciências/química.

48
CAPÍTULO 2

SOBRE O PERCURSO
METODOLÓGICO

49
Este trabalho apresentou elementos de uma pesquisa participante (PP).
Tratou-se, portanto, de uma atividade educativa de investigação e ação social
(BRANDÃO, 1984). Cabe esclarecer que a participação em uma pesquisa, segundo
Demo, está para além de pertencer a essa comunidade, mas dar voz a ela,
especificamente no trato com o se situar dentro de uma sociedade composta por
diferentes etnias (DEMO, 2004). Esta investigação obedeceu as seguintes etapas
(Quadro 1).

Quadro 1 - As fases de desenvolvimento da pesquisa participante.

Fase 01: Montagem Institucional Planejamento conjunto por professora formadora (PQ),
e Metodológica da PP professor em formação continuada [aluno de doutorado (Ad)],
professores em formação continuada [alunos de mestrado
(Am1 e Am2)] e professor em formação inicial (IC) das
atividades a serem desenvolvidas na perspectiva do ensino de
Química com abordagem em caráter interdisciplinar,
baseando-se em aspectos da Lei 10.639/03.
Fase 02: Estudo preliminar da Discussão da temática de cultura Africana e Afro-brasileira no
região e da população envolvida currículo escolar dos/as futuros/as profissionais formados/as
pela Instituição Federal de Ensino superior (IFES).
Fase 03: Análise crítica dos Análise da dinâmica discursiva do processo de ensino-
problemas considerados aprendizagem dos conteúdos de Química associados ao tema
prioritários e que os/as de matriz Africana e suas contribuições nas aulas utilizando
participantes desejam estudar elementos da técnica da análise do discurso (AD) de Bakhtin.
Fase 04: Programação e Planejamento conjunto das atividades a serem desenvolvidas
desenvolvimento de um plano de e ações pedagógicas dos/as professores/as, em formação
ação que contribua para a inicial e formação continuada, em sala de aula, por meio de
solução dos problemas produção de material didático e bibliográfico. Consolidação
encontrados de duas disciplinas como a devolutiva para a comunidade
pesquisada.

Neste caso, assumimos as duas posições, pois representamos os/as


professores/as de Ciências que ensinam para a sociedade brasileira que é multicultural
e multirracial e, também, os/as membros dessa sociedade, isto é, representa-se a sala
de aula de Ciências condicionada pela heterogeneidade de sua constituição identitária
a partir de posições definidas e legitimadas nessa estrutura social.
Pode-se dizer, nas palavras de Schmidt, que “o termo participante sugere a

50
controversa inserção de um pesquisador formado pela vida sócio-cultural de um
próximo ou distante que, por sua vez, é convocado a participar da investigação na
qualidade de informante, colaborador ou interlocutor” (SCHMIDT, 2006, p.14). Os
elementos de uma pesquisa participante estão assim demarcados: nós pesquisadores/as
e autores/as desta pesquisa/tese fazemos o papel dos/as pesquisadores/as; a
comunidade que queremos pesquisar é um Instituto de Química; o problema que temos
para ser resolvido nessa comunidade é a não aplicação da lei 10.639/03 em seus cursos
de graduação em Química; os/as nossos/as informantes são os/as alunos/as que vieram
cursar as disciplinas baseadas na lei 10.639/03 e no parecer 03/2004 e; as disciplinas
consolidada, com ementa, com indicação de bibliografia, etc. é o produto de nossa
pesquisa que devolvemos para a comunidade.
O corpus empírico desta pesquisa foi construído através da criação e oferta
por parte do IQ/UFG de duas disciplinas de ERER no ensino de ciências. Uma
ministrada como núcleo livre (NL), como disciplina de inverno em julho de 2015, cujo
título é, Ensino de Química, Identidade e Cultura Afro-brasileira, - (UFG 2015),
e outra ministrada como disciplina optativa (DO) no 1º semestre de 2016, de título,
Educação para as Relações Étnico-Raciais (ERER) no Ensino de Ciências (UFG,
2016). A proposta de criação de disciplina específica para a ERER é contemplada nos
documentos de Orientações para ERER, Brasil (2006).

Há instituições e cursos em que se opta por criar disciplinas específicas


para o tema em pauta. O principal objetivo da disciplina específica, no caso
da formação inicial, deve ser o de complementar a abordagem da CNE/CP
Resolução 1/2004 nas atividades acadêmicas que constituem os cursos. A
disciplina pode também ser desenvolvida de acordo com as especificidades
dos cursos de Licenciatura, (p.134).

Essas disciplinas tiveram a professora orientadora desse trabalho como


responsável (PQ), três alunos de pós-graduação [01 aluno de doutorado (Ad) 02 e
mestrado (Am1 e Am2) como corresponsáveis, nos quais esses desenvolveram a suas
atividades de estágio docência além de um aluno de PIBID (IC).
Fazem parte, também, do corpus empírico desta pesquisa, duas intervenções
pedagógicas (IP), com 100 min de aulas cada, realizadas em duas turmas da disciplina
de Química Geral Experimental, ministradas no IQ/UFG. Sendo uma turma dos Cursos
de Física cuja intervenção teve o título: A química do ferro e o papel do ferreiro
africano nas sociedades centro-africanas e no Brasil Colônia) e uma turma dos

51
cursos de Engenharia cuja intervenção teve o título: Leite em “mama” África e a
educação para as relações étnico-raciais (ERER) no ensino de química. Em ambas
intervenções foram realizadas discussões com abordagens conceitual de química e
cultural diásporica. Ressalta-se que todos/as alunos assinaram o Termo de
Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) para pesquisa com seres humanos. As
ementas das disciplinas estão apresentadas no Quadro 2.

Quadro 2 - Ementas das disciplinas de Núcleo Livre (NL) e Disciplina Optativa (DO)

NL - Ensino de Química, Identidade e DO - Educação para as Relações Étnico-


Cultura Afrobrasileira Raciais (ERER) no Ensino de Ciências.
A arqueologia da África e suas técnicas. A ciência e a invenção do racismo. O currículo
Processos de datação. Elementos da diáspora como elemento de manutenção e/ou superação
africana no Brasil e o ensino de química: A do racismo. A metalurgia na África e o regime
química do ferro e o papel do ferreiro africano de Apartheid. Propriedades do ferro e o papel do
nas sociedades centro-africanas e no Brasil ferreiro africano nas sociedades centro-africanas
colônia; A química do dendê e a sua importância e no Brasil colônia. A herança cultural africana,
nas religiões de matriz africana e na culinária indígena e portuguesa nas regiões de mineração
afrobrasileira. Abordagem etnobotânica acerca do estado de Goiás. A química do dendê e a sua
de plantas utilizadas nas religiões de matriz importância nas religiões de matriz africana e na
africana. Produção de diamantes e metais culinária afro brasileira. Abordagem
nobres em alguns países do continente africano etnobotânica acerca de plantas utilizadas nas
e suas implicações nas guerras civis em África. religiões de matriz africana, em comunidades
indígenas e quilombolas.

Com o objetivo de ensinar uma Química descolonizada, para cada assunto


tratado na disciplina e portanto, contido nas ementas, existem duas abordagens: uma
cultural Afrobrasileira e/ou Africana e outra conceitual (conhecimento químico), tal
como apresentado no Quadro 3. Portanto, ensinar uma Química descolonizada, “[...]
significa admitir a força das culturas consideradas negadas e silenciadas nos
currículos” (GOMES, 2013, p.102).
As disciplinas foram ministradas de maneira que os conceitos químicos
tivessem uma abordagem afrocentrada, isto é, elementos da cultura brasileira
afrobrasileira e africana foram trazidos para o centro das discussões em aulas de
química, em consonância com as recomendações do parecer 003/2004 do CNE e na
esteira da resolução 001/2004 das DCN para ERER (SANTOS JUNIOR, 2010).

52
O quadro 3 apresenta um esboço de como foram realizadas essas abordagens.
Quadro 3 - Abordagem Cultural e Conceitual das Disciplinas de NL e DO.

ABORDAGEM
ASSUNTO CONTIDO
CULTURAL ABORDAGEM CONCEITUAL.
NAS EMENTAS
DIASPÓRICO
A química do ferro e o Legado, deixado no Brasil,
papel do ferreiro africano do ferreiro africano e de
Reações química com o Fe e Cu.
nas sociedades centro- seus descendentes nos
Sintese de uma ferrita.
africanas e no Brasil campos das artes,
colônia * mineração e religião.

A herança cultural
africana, indígena e Herança africana em Goiás: Formação de complexos de Ni
portuguesa nas regiões as Congadas, garimpo de Estabilidades de complexos em
de mineração do estado ouro e nineração. solução, Efeito quelato.
de Goiás

A química do dendê e a
Propriedades Físico-químicas do azeite
sua importância nas A importância do dendê na
de dendê
religiões de matriz formação e manutenção da
Conceitos de ácidos graxos, densidade
africana e na culinária cultura afro-brasileira.
e viscosidade.
afrobrasileira

Abordagem etnobotânica
Povos, comunidades,
acerca de plantas
saberes tradicionais e Fitoquímica.
utilizadas nas religiões
religiões de matriz africana.
de matriz africana

Reconhecimento do
Técnicas analíticas usadas em
A arqueologia da África continente africano com
arqueometria. Objetivos da pesquisa e
e suas técnicas.** importantes contribuições
da análise arqueométrica.
para o mundo.
Produção de diamantes e
metais nobres em alguns Alotropia dos elementos; C, S, P e O.
Guerra civil em alguns
países do continente Estudo da química dos metais nobres.
países da África o estudo da
africano e suas Uso de Pd e Pt em dispositivos para
história do apartheid na
implicações nas guerras controle da qualidade do ar e na
África do Sul.
civis em África/A quimioterapia.
metalurgia na África e o O currículo escolar x currículo em
regime de Apartheid. ação
*Química Geral Experimental, turma dos Cursos de Física.
** Química Geral Experimental, turma dos Cursos de Engenharia.

As etapas e o desenvolvimento de cada intervenção pedagógica (IP)


realizadas são mostrados na Quadro 4.
Quadro 4 - Etapas e desenvolvimento das Intervenções Pedagógicas (IP).
Etapa Desenvolvimento
Disposição na plataforma em sistema da universidade (SIGAA) de texto(s) que tratavam

da abordagem cultural e da abordagem conceitual.
Apresentação de resumos/resenhas dos textos antes do início da aula e posterior discussão

dos mesmos.

53
3ª Aula dialogada sobre os conceitos químicos envolvidos em cada abordagem.
4ª Realização e discussão dos experimentos
5ª Avaliação dos discursos produzidos pelos alunos, tanto em áudio como escritos segundo a
análise de discurso de (AD) de Bakhtin

Foram integrantes dessa pesquisa [no texto chamado de sujeito de


investigação (SI): uma professora formadora (PQ), um aluno de doutorado (Ad), dois
alunos de mestrado (Am1 e Am2) e um aluno de iniciação científica (IC), esses 05
membros do coletivo Ciata de professores/pesquisadores/alunos/as do IQ e 16
alunos/as de uma disciplina de Núcleo Livre (A1 a A16), intitulada “Ensino de
Química, Identidade e Cultura Afrobrasileira (NL), dos seguintes cursos: 4
alunos/as das Licenciaturas (Ciências Biológicas, Geografia, História e Química), e 12
alunos/as do bacharelado: 04 alunos/as das Engenharias (Alimentos, Ambiental,
Química e Agronomia), 03 alunos/as da Medicina Veterinária, 01 do Bacharelado em
Química, 01 do Bacharelado em Farmácia, 01 da Comunicaçao/ Jornalismo, 01 da
Biblioteconomia e 01 de Sistema da Informaçao. E 16 alunos/as do curso de
Licenciatura em Química (AL1 a AL16) que cursaram a disciplina optativa (DO)
“Educação para as Relações Étnico-Raciais (ERER) no Ensino de Ciências” treze
alunos (AF1, AF2...AF13) de Química Geral Experimental dos Cursos de Física e 12
alunos/as (A1 a A12) do Curso de Engenharia de Computação. Os Quadros 5 e 6
apresentam, respectivamente, os mapas de atividades das disciplinas de NL e DO.

Quadro 5 – Mapa de atividades da disciplina de NL.


IP: Aula inaugural. Data:07/07/2015 Participantes: Ad, IC, A1, A2, A3, A5,
A6, A7, A12, A13 e A16.
Ações desenvolvidas Observações
Apresentação da disciplina/pesquisa pelo Ad e Am1 do Os alunos se apresentaram e falaram de
aluno de IC, e dos alunos que iriam cursar a disciplina. suas expectativas quanto a disciplina.
Quanto suas opiniões em relação as ações
Em seguida foi explicado que a disciplina se tratava de afirmativas houve posições conservadoras
uma pesquisa de doutorado e que, caso esses (contra as ações) e progressistas (a favor
concordassem em participar teriam que assinar os das ações). E, por último, assinaram o
Termos de Livre Consentimento, para pesquisa com termo de livre consentimento para
seres humanos. Em seguida os aluno/as colocaram suas pesquisa com seres humanos.
opiniões a respeito de ações afirmativas e sobre o mito
da democracia racial.
IP: Ferro, ferreiros e forja: O Data: 13/07/2015 Participantes: Ad, IC, A1, A2, A3, A4,
ensino de química pela lei A5, A6, A12, A13, A15 e A16.
10639/03.
Ações desenvolvidas Observações
Leitura e discussões do livro “Homens de ferro”. Aula Os alunos participaram da discussão
prática da síntese do complexo de tris-oxalato de ferro mostrando a importância do ferreiro
III e potássio. africano em duas diferentes sociedades do

54
Atlântico Sul: África central e Brasil
Colônia.

A participação na aula prática foi


praticamente liderada e realizada pelos
alunos da química (bacharel, licenciatura
e engenharia)
IP: Ouros, níquel, congos e a Data: 15/07/2015 Participantes: Ad, Am1, IC, A1, A2, A3,
diáspora africana em Goiás: A A4, A5, A8, A10, A11, A12, A14, A15 e
lei 10639/03 no ensino de A16.
química.
Ações desenvolvidas Observações
Leitura e discussões sobre os textos Cultura, tradição e Os alunos participaram efetivamente da
religiosidade: do ouro ao níquel de Marly O’ Farrill discussão sobre a formação inicial do
Martinez e Centros africanos no Brasil Central, de 1780 estado de Goiás, das congadas nas
a 1835, de Mary Karasch. diferentes cidades do estado e do Brasil e
trouxeram outras experiências que não
Aula dialogada sobre a formação de complexos em somente as contidas nos textos.
solução; apresentação do processo de extração de níquel
na cidade de Niquelândia por Ad seguida de aula prática Na parte prática os alunos dos cursos de
sobre formação de complexos de níquel. química lideram a execução dos
experimentos.
IP: Tem dendê, tem axé, tem Datas: Participantes: Ad, Am1, IC, A2, A3,
química: A lei 10639/03 no A5, A6, A9, A13, A15 e A16.
ensino de química. 16, 17/07/2015
Ações desenvolvidas Observações
Leitura e discussões do livro “Tem dendê, tem axé”. Os alunos participaram da discussão sobre
Aula prática sobre as medidas de viscosidade e o livro. Trouxeram suas impressões e
densidade do azeite de dendê e a síntese do biodendê. conhecimentos anteriores sobre as
diferentes religiões de matriz africana,
racismo religioso, aspectos políticos
envolvidos na produção de dendê para
abastecimento do mercado de biodendê,
uso de algas marinhas para a produção de
biocombustível e tiveram efetiva
participação na aula prática.
IP: O regime de apartheid na Data: 22/07/2015 Participantes: Ad, IC, A1, A2, A4, A5,
África do Sul e a platina A6, A7, A12, A13, A15 e A16.
Ações desenvolvidas Observações
Inicialmente foi pedido para os alunos/as que Os alunos apresentaram a sinopse do filme
pesquisassem a sinopse do filme Sarafina e que e após a exibição do filme seguiu-se de um
apresentassem antes da exibição do filme. Após debate sobre apartheid e currículo. Foi
exibição do filme aula dialogada sobre a química dos pouca a participação dos estudantes na
metais do grupo da platina (MGP) e seus principais aula sobre os MGP.
usos.
IP: Seminário* - As plantas Data:23/07/2015 Participantes: Ad, IC, A1, A2, A3, A4,
utilizadas em religiões de A5, A6, A7, A9, A10, A11, A12, A13,
matriz africana A15 e A16.
Ações desenvolvidas Observações
A turma foi dividida em grupos para apresentar quatro Após a apresentação foi feito um amplo
diferentes temas. debate sobre cada tema onde cada grupo
fez e respondeu uma pergunta para grupos
diferentes.
*Além desse tema foram apresentados outros três: Metais em África; as congadas de Catalão GO e a extração de
fosfato; A química e os animais originários do continente africano.

55
Quadro 6 – Mapa de atividades da disciplina de DO.

IP: Aula inaugural. Data*: 08/04/2016 Participantes: PQ, Ad, Am2, AL2, AL3,
AL4, AL5, A6, AL8, AL9, AL15, AL16.
Ações desenvolvidas Observações
Apresentação da disciplina/pesquisa pela PF e por AD. Esta disciplina fora ofertada inicialmente
para alunos de Química e Biologias. Devido
Em seguida foi explicado que a disciplina se tratava de a problemas no sistema de oferta de vagas
uma pesquisa de doutorado e que, caso esses da UFG, ela foi ofertada apenas a alunos do
concordassem em participar teriam que assinar os Termos curso de Licenciatura em Química. Na
de Livre Consentimento, para pesquisa com seres disciplina buscamos dirigir nossas
humanos. discussões com objetivo de
instrumentalizar os futuros docentes para o
A PF fez uma exposição dialógica onde o tema foi o ensino de Química para as relações étnico-
Racismo Científico, discutiu-se um pouco do histórico do raciais e aplicação da lei 10.639/03.
racismo na humanidade principalmente no século XVIII e
XIX. Em seguida os alunos colocaram suas opiniões a Os/as alunos/as se apresentaram e falaram
respeito de ações afirmativas e sobre o mito da de suas expectativas quanto a disciplina.
democracia racial. Quanto suas opiniões em relação as ações
afirmativas houve posições conservadoras
(contra as ações) e progressistas (a favor
Por último responderam a um questionário que tinha por
das ações). E, por último, assinaram o
objetivo saber quais as disciplinas do núcleo específico e
termo de livre consentimento para pesquisa
comum ao curso de licenciatura eles/as haviam cursado.
com seres humanos e responderam ao
questionário.
IP: Metais em África Data: 29/04/16 Participantes: Ad, Am2, AL2, AL3, AL5,
AL7, AL9, AL11, AL12, AL16.
Ações desenvolvidas Observações
Leitura e discussões iniciais do livro “Homens de ferro”. Cada aluno/a colocou a sua impressão sobre
Aula prática sobre a reatividade dos metais. o tema que lhe coube sempre mostrando a
importância do ferreiro africano na África
Os alunos apresentaram um resumo sobre uma parte do Central e Ocidental.
livro previamente definida.
Houve uma efetiva participação dos/as
AD dividiu as preparações das soluções a serem utilizadas alunos/as na preparação das soluções em
na aula para cada um/a dos/as alunos/as. seguida foi iniciado os experimentos pelos
grupos. o qual foi observado uma semana
A turma foi dividida em dois grupos para a realização dos depois.
experimentos.
Os resultados foram discutidos a
apresentados segundo os aspectos teóricos,
fenomenológicos e representacionais do
conhecimento químico.
IP: Ferro, ferreiros e forja Data: 13/05/16 Participantes: Ad, AL2, AL3, AL7, AL9,
I: O ensino de química pela AL10, AL12, AL14 e AL16.
lei 10639/03.
Ações desenvolvidas Observações
Leitura e discussões do artigo “Notas sobre a Os alunos apresentaram um resumo prévio
historiografia da arte do ferro nas Áfricas central e sobre o artigo e a partir daí houve os debates
Ocidental”. sobre o tema. Foi notado por parte de alguns
alunos/as que esse artigo além de trazer a
Realização de 07 experimentos sobre a corrosão do ferro: importância do ferreiro africanos na África
a) corrosão do ferro na atmosfera, b) corrosão úmida do trazia também a importância deste para o
ferro, c) corrosão na linha d água, d) verificação de Brasil Colônia.
corrosão nas áreas anódicas e catódicas, e) corrosão sob

56
tensão, f) corrosão galvânica, g) métodos de prevenção de Após uma semana os alunos observaram o
corrosão. que havia acontecido e apresentaram os
resultados segundo os aspectos teóricos,
Cada aluno/a preparou um experimento para ser fenomenológicos e representacionais do
verificado após uma semana. conhecimento químico.

IP: O currículo escolar, regime Data: 10/06/2016 Participantes: Am2, AL2, AL3, A9, A14
de apartheid na África do Sul e a e AL16.
química dos MGP.
Ações desenvolvidas Observações
Apresentação do resumo e discussão do texto Repensando Os alunos apresentaram a sinopse do filme
a questão curricular: caminho para uma educação anti- e após a exibição do filme seguiu-se de um
racista. debate sobre apartheid e currículo.

Exibição do filme Sarafina e que apresentassem antes da Foi satisfatória a participação dos alunos
exibição do filme. sobre a química dos metais do grupo da
platina (MGP).
Após exibição do filme aula dialogada sobre a química
dos metais do grupo da platina (MGP) e seus principais
usos.
IP: Ouros, níquel, congos e a Data: 08/07/16 Participantes: AD, Am2, AL7 AL2, AL3,
diáspora africana em Goiás: A lei A9, A14 e A16.
10639/03 no ensino de química.
Ações desenvolvidas Observações
Leitura e discussões sobre os textos Cultura, tradição e Os alunos participaram efetivamente da
religiosidade: do ouro ao níquel de Marly O’ Farrill discussão sobre a formação inicial do
Martinez e Centros africanos no Brasil Central, de 1780 a estado de Goiás, das congadas nas
1835, de Mary Karasch. diferentes cidades do estado e do Brasil.

Aula dialogada sobre a formação de complexos em Na parte prática os/as alunos/as após
solução; apresentação do processo de extração de níquel fazerem as reações apresentaram a partes
na cidade de Niquelândia por AD seguida de aula prática teóricas, fenomenológicas e
sobre formação de complexos de níquel e reações de representacionais do conhecimento
transformação do cobre químico.
IP: Tem dendê, tem axé, tem Datas: 15/07/16 Participantes: Ad, Am2, AL2, AL3, AL7,
química: Bicombustíveis a partir AL9, AL14 e AL16.
da diáspora africana.
Ações desenvolvidas Observações
Leitura e discussões do livro “Tem dendê, tem axé”. Am2 e os alunos discutiram o conceito de
diáspora africana a partir da cultura e
Aula prática sobre as medidas de viscosidade e densidade produção do dendê no Brasil.
do azeite de dendê e a síntese do biodendê.
Apresentação das equações que
representam as reações envolvidas na
síntese do biocombustível.

* Trata-se da data inicial da intervenção

Cabe ressaltar que foi notada uma diminuição no número de alunos/as na DO,
contudo, entende-se, que não houve influência nos resultados da pesquisa, visto que a
avaliação dos mesmos fora feita de maneira qualitativa com os/as presentes em cada

57
IP. A pesquisa não estudou o porquê dessas desitências, visto que após essas atitudes
não foi mais possível o contato com eles/as.
As ações desenvolvidas e suas respectivas observações das IPs “A química
do ferro e o papel do ferreiro africano nas sociedades centro-africanas e no Brasil
Colônia” ministrada para os/as alunos/as dos Cursos de Física da UFG e “Leite em
“mama” África e a educação para as relações étnico-raciais (ERER) no ensino de
química”, ministrada para os/as alunos/as dos cursos de Engenharia da Computação
da UFG, serão tratados oportunamente dentro do capítulo de Resultados e Discussões.
O corpus total de análise foi formado pela transcrição de 45,75h provenientes
de gravações em áudio e vídeo dos discursos produzidos e de capturas de telas (prints)
das respostas dadas pelos SI em formas escritas e em slides. Os dados obtidos foram
agrupados por unidades de significação e analisados com elementos da técnica de
Análise do Discurso (AD) de Bakhtin (GREGOLIN, 1995). A escolha desta técnica de
análise de dados significou um empreendimento em tentar explicar e entender “como
se constrói o sentido de um texto e como esse texto se articula com a história e a
sociedade que o produziu” (GREGOLIN, 1995, p.13).
Por sua vez, o discurso como objeto de análise é, ao mesmo tempo,
linguístico, histórico e ideológico. Sua análise é movimento de compreensão destes
dois aspectos. Nessa perspectiva, os SI de nossa pesquisa são interpretados como
sujeitos essencialmente ideológicos e históricos, cuja “palavra está sempre carregada
de um conteúdo ou de um sentido ideológico ou vivencial” (BAKHTIN , 2006, p.99).
O quadro 7 apresenta as categorias analíticas bakhtinianas e seus respectivos conceitos
que serão encontradas ao longo desse texto.

Quadro 7 - Categorias analíticas baseadas na teoria da linguagem de Bakhtin.


Categorias Conceito
Sujeitos do discurso Quem são os agentes (interlocutores) do evento, de onde
vêm, o que fazem etc.
Objeto O que está em discussão no evento e qual a relação com o(s)
gêneros de discurso.
Gênero de discurso Qual(is) é(são) o(s) tipo(s) de gênero(s) presente(s) no
evento; discussão das esferas de atividade humana e comunicação
que o(s) copnfigura(m) e por que esse evento impkica a escolha de
determinado(s) gênero(s). Descrição, caso haja claramente mais de
um, de como se relacionam, se integram, como um incorpora o outro.
Descrição do conteúdo temático, a estrutura composicional (
essencialmente quando se trata de texto), o estilo.
Enunciado Quais são os enunciados e como eles se formam dentro do
contexto comunicativo estudado (as condições específicas e
finalidade da esfera da atividade, os gêneros presentes). Descrição

58
sobre como se dá a alternância dos sujeitos do discurso, a
conclusibilidade

Dialogismo Quais perpectivas de diálogos estão presentes: o enunciado


se constitui em relação aos enunciados que os precedem e aos que o
sucedem; o discurso incorpora outros discursos, que podem estar
abertamente demarcado ou não, e podem enfraquecer o fator
individual do enunciado ou não; as vozes sociais que constituem o
mundo interior do sujeito. Discussão dependendo do contexto e
objeto (texto), da intertextualidade e da interdiscursividade.
Destinatário Quem são os destinatários e sobredestinatários em relação
ao discurso do locutor: descrição de como eles contornam o enuciado
do locutor, a relação com a posição e origem docial dos sujeitos do
discurso.
Responsividade Como se dá a posição ativa do ouvinte (intelocutor) e como
sua presença influencia o discurso do outro.
Vozes Quais são as vozes do evento: identificaçãop de diferentes
vozes autônomas que nãoo são submetidas a um centro de sentido,
se estas coexistem e interagem em igualdade de posição (forças
centrífugas: identificação de vozes de poder que tentam se impor
como centro de sentido (forças centrípetas)
Fonte: Glossário de Termos-chave de Mikhail Bakhtin.
https://www.academia.edu/16545863/Gloss%C3%A1rio_de_Termos-chave_de_Mikhail_Bakhtin

Na discussão dos conceitos químicos procurou-se analisar se os SI trouxeram


nos seus discursos os três níveis dos aspectos do conhecimento químico – teórico,
fenomenológico e representacional - propostos por Mortimer e colaboradores (2000).
O nível teórico que se refere ao “conhecimento de natureza atômico-
molecular, envolvendo, portanto, explicações baseadas em modelos abstratos e que
incluem entidades não diretamente perceptíveis, como átomos, moléculas, íons,
elétrons, etc” (MORTIMER et al., 2000, p. 276). Os aspectos fenomenológicos que
são passíveis de visualização concreta, bem como de análise ou determinação das
propriedades dos materiais e de suas transformações (MACHADO, 2004, p.164). E
por último o aspecto representacional do conhecimento químico, fórmulas, equações,
gráficos, dentre outros.
Cabe ressaltar que os extratos apresentados nos resultados e discussões
significam partes dos discursos produzidos pelos SI tanto na forma falada como na
escrita, durante as IPs/pesquisa, e que cada fala corresponde a um turno representado
no texto por T que são enumerados de acordo com a sequência da IP.

59
CAPÍTULO 3

RESULTADOS E
DISCUSSÃO -
ANÁLISE DAS
INTERVENÇÕES
PEDAGÓGICAS

60
Nos resultados e discussões serão feitas as análises de quatro IPs da disciplina
de NL: Ensino de Química, Identidade e Cultura Afro-brasileira, - (UFG 2015) e
de duas IPs da disciplina DO: Educação para as Relações Étnico-Raciais (ERER)
no Ensino de Ciências (UFG, 2016), listadas nos mapas de atividades das duas
disciplinas lecionadas. Neste capítulo serão analisadas também duas IPs que foram
ministradas em disciplinas de Química Geral Prática para os/as alunos/as dos Cursos
de Física da UFG (1º semestre de 2014), primeira fase da pesquisa participante, e para
os/as alunos/as dos cursos de Engenharia ( 1º semestre de 2017), a quarta fase da
pesquisa participante.
Desta maneira este capítulo segue com os seguintes subcapítulos:
3.1 A química do ferro e o papel do ferreiro africano nas sociedades
centro-africanas e no Brasil Colônia; IP ministrada na disciplina de Química Geral
Prática para os/as alunos/as dos Cursos de Física da UFG (1º semestre de 2014). Estes
resultados foram publicados na Revista Educação em Foco v.21 nº 3 no artigo cujo
título é: “Ferro, ferreiros e forja: o ensino de Química pela Lei nº 10.639/03”.
3.2 A herança cultural africana, indígena e portuguesa nas regiões de
mineração do estado de Goiás; nesse tópico discutiremos os resultados obtidos nas
IPs ministrada para os/as alunos das disciplinas de NL (15/07/2015) e DO
(08/07/2016). Os resultados obtidos na IP de NL originaram o artigo de título “Ouros,
níquel, congos e a diáspora africana em Goiás: A lei 10639/03 no ensino de química”,
publicado na Revista da Associação Brasileira de Pesquisadores/as Negros/as
(ABPN), [S.l.], v. 9, n. 22, p. 273-302, jun. 2017.
3.3 A química do dendê e a sua importância nas religiões de matriz
africana e na culinária afro-brasileira; resultados obtidos das IPs ministradas nos
dias 16 e 17/07/2015 para NL e 16 e 17/2016 para DO. Essas IPs originaram da
proposta de implementação da lei 10.639 feita pelo nosso grupo de pesquisa, incluindo
PQ, Ad e Am1, publicada na seção “Espaço Aberto” da Revista Química Nova na
Escola (QNesc) no artigo denominado “TEM DENDÊ, TEM AXÉ, TEM QUÍMICA:
Sobre história e cultura africana e afro-brasileira no ensino de química”.
3.4 Abordagem etnobotânica acerca de plantas utilizadas nas religiões de
matriz africana; para esse tópico apresentaremos os discursos produzidos na
disciplina de NL (23/07/2015). Esses resultados deram origem ao artigo publicado
pela Química Nova com o título de DAI-ME AGÔ PARA FALAR DE SABERES

61
TRADICIONAIS DE MATRIZ AFRICANA NO ENSINO DE QUÍMICA Vol. 42,
No. 5, 570-579, 2019
3.5 Leite em “mama” áfrica e a educação para as relações étnico-raciais
(ERER) no ensino de química; os resultados desse tópico foram obtidos de uma IP
realizada com os/as alunos/as dos cursos de Engenharia ( 1º semestre de 2017). Os
mesmos foram aceitos na QNesc para a publicação de um artigo com o mesmo nome
da IP.
3.6 O apartheid e a produção de metais nobres na África do Sul; para esse
tópico apresentaremos os discursos produzidos na disciplina de NL (22/07/2015).
Esses foram publicados como capítulo de um livro cujo título é “ O papel do currículo
sob a ótica cinematográfica de Sarafina: uma experiência com a Lei 10.639/03 ensino
de química. In: BENITE, A. M. C.; CAMARGO, M. J. R.; AMAURO, N. Q (Orgs.)
Trajetórias de descolonização da escola: o enfrentamento do racismo no ensino de
Ciências e Tecnologias. Belo Horizonte: Nandyala, 2019 (prelo).

62
3.1 A QUÍMICA DO FERRO E O PAPEL DO FERREIRO AFRICANO NAS
SOCIEDADES CENTRO-AFRICANAS E NO BRASIL COLÔNIA6
Quanto mais se democratiza o direito à educação, maior é a presença no
espaço escolar de sujeitos desconsiderados como sujeitos do conhecimento. Essa
presença questiona os nossos currículos colonizadores. Defendemos que esta não é
tarefa fácil e, para tal, será “preciso entender e considerar a importância da articulação
entre cultura, identidade negra e educação. Uma articulação que se dá nos processos
educativos e não escolares” (GOMES, 2003, p. 169).
Entende-se que uma das primeiras alternativas nessa direção deve ser a
inserção, nos cursos de formação de professores e nas disciplinas de Química
oferecidas aos outros cursos de graduação, de debates e discussões que privilegiem a
relação entre a cultura e a educação.
Deste modo, apresentamos neste subcapítulo estudos sobre planejamento,
design e desenvolvimento de uma Intervenção Pedagógica (IP) desenvolvida em uma
disciplina de Química Geral Experimental para uma turma de Física com alunos
pertencentes a diferentes modalidades (Engenharia Física, Física Médica, Bacharelado
em Física e Licenciatura em Física).
Foram sujeitos dessa parte da investigação (SI) PQ, Ad, Am1, os autores
desse trabalho, membros do CIATA, o professor da disciplina (PF) e treze alunos
(AF1, AF2...AF13). A IP intitulada Transformações Química e os Saberes
Tecnológicos dos Ferreiros Africanos versou sobre o papel do ferreiro africano no
Brasil Colônia e abordou os conteúdos de transformações químicas, ferritas, reações
de óxido redução, corrosão, separação de misturas, fenômenos físicos e químicos e a
forja do ferro. A IP foi desenvolvida na disciplina de Química Geral Experimental
(QGE), de natureza obrigatória, pertencente ao núcleo comum dos cursos citados, e
oferecida pelo Instituto de Química com uma carga horária de 2 horas/aula semanal,
perfazendo um total de 32 horas/aula semestral. No Projeto Pedagógico do curso em
questão, a disciplina de QGE apresenta a seguinte ementa:

A matéria e seus estados físicos. Transformações da matéria: reações


químicas. Mol e estequiometria das reações. Termoquímica e
espontaneidade das reações. Equilíbrio químico: ácido-base e
eletroquímico. Propriedades das soluções: unidades de concentração e

6
Este subcapítulo é uma versão publicada do texto apresentado pelos/ as autores/as intitulada “Ferro,
ferreiros e forja: o ensino de química pela lei nº 10.639/03” na Revista Educação em Foco, Juiz de Fora,
v. 21, n. 3, set./dez, p. 735-768, 2016, assim optou-se pelo título mais específico, em questão.

63
propriedades coligativas. Modelos atômicos de Bohr e orbital.
Periodicidade química. Ligação química: geometria molecular e teorias de
ligação. Introdução aos procedimentos de segurança no manuseio e
descarte de produtos e resíduos (UFG, 2013, p. 33).

A IP foi realizada no 1º semestre de 2014 em um laboratório de graduação,


gravada em áudio e vídeo, perfazendo um total de 80 minutos de gravação. Após
transcrição, os dados obtidos foram agrupados por unidades de significado e analisados
segundo a AD de Bakhtin. O quadro 8 apresenta o mapa de atividades realizadas
nessaa IP.

Quadro 8 - Mapa de Planejamento das atividades realizadas na IP: Transformações Química e os


Saberes Tecnológicos dos Ferreiros Africanos.
Tempo utilizado 80 minutos

No primeiro momento buscou-se entender a


constituição identitária dos sujeitos da investigação. Para
isso, o contexto utilizado para iniciar o diálogo foram dados
do censo do IBGE de 2010 sobre a cor e a raça do brasileiro.
Desenvolvimento Foi perguntado aos alunos/as como eles/as se autodeclaram
em relação a sua cor ou raça e suas respectivas opiniões
sobre a política de cotas recentemente implantadas nas
instituições de ensino superior brasileiro.

No segundo momento foram apresentados e


discutidos os saberes tecnológicos de matriz africana e a
importância desses saberes na economia do Brasil colônia.

No terceiro momento o contexto da discussão


mediada foi mostrado a relação entre o saber do ferreiro
africano e as transformações químicas realizadas no
processo da forja.

No quarto momento sintetizamos e


caracterizamos um material ferrimagnético.
Objetivos Discutir o racismo no Brasil e desconstruir a ideia
de ciência apenas branca e masculina e européia, ou seja,
apresentar a ciência de matriz africana a partir da
compreensão do conceito de transformações químicas.
Estratégia de Avaliação Introdução da temática como questão de avaliação
na prova escrita.

64
Nesta IP foram produzidos 377 turnos (T) de discurso e passa-se a apresentar
alguns extratos destes.

Extrato 1- Sobre A Constituição Identitária Da Sala De Aula.


T.1 – Ad: no censo do IBGE em 2010 tinha uma pergunta sobre cor, raça, enfim. Eu
gostaria de saber como que vocês se declararam ou como declarariam se lhes fossem
feito essa pergunta quanto às opções são: brancos indígenas.
T.2 - Am1: pardos, pretos...
T.3 – Ad: alguém de vocês se considera racista?
Nenhum aluno se manifesta
T.4 - Am1: e quem acha que existe racismo no Brasil?
Todos os alunos levantam a mão.
T.5 – Ad: o que vocês acham da Lei de cotas?
T.6 - AF5: eu sou a favor da Lei das cotas, mas cotas baseadas no social e no econômico.
Situação social e econômica.
T.7 - AF10: eu particularmente vejo as cotas para negros, por exemplo, acho que talvez
como uma forma de discriminação. [...] acho que discrimina, porque de certa forma, eles
querem acabar com o preconceito dizendo que essas pessoas não podem concorrer de
uma forma universal que elas precisam do que é delas, algo só pra elas.
T.8 - AF5: Mas a gente tem que ver que tem todo um contexto social, a gente num pode
ser hipócrita e se esquecer da história anterior. O que aconteceu, o antecedente do povo
negro... ele é à base da sociedade mesmo. Ele tava ali no trabalho escravo, ele tava ali.
Então a gente não pode dizer que só porque ele é negro, não precisa de cotas, claro que
precisa. Por quê? Não porque ele é negro, mas por causa do histórico dele.

Respondendo aos questionamentos feitos nos turnos 1 e 2: AF5 e AF13 se auto


declaram negros; AF2, AF3, AF4, AF8 e AF9 se auto declaram pardos e os alunos: AF1,
AF6, AF10, AF11, AF12 se autodeclaram brancos. O aluno AF7 preferiu não se
manifestar. Importa dizer que a escola é um microcosmo da sociedade e como tal repete
os seus processos de estratificação sociorracial. Dos 13 alunos cursando a área de exatas

65
07 se autodeclaram pretos e/ou pardos. E o que isso de fato significa? “Identidade é um
lugar que se assume, uma costura de posição e contexto, e não uma essência ou
substância a ser examinada” (HALL, 2009, p.15).

Certamente, há uma dificuldade das universidades diante do mundo moderno, já


que existe uma contradição entre a convocação pela igualdade da modernidade e a
composição da universidade. Este é um elemento ainda não incorporado a sua existência
(SANTOS, 1995). Apoiamo-nos em Fonseca (2007) para afirmar que:

no mundo moderno, sobretudo no século XX, houve uma pressão social em


relação ao acesso às universidades, e isto resultou em um desenvolvimento
contraditório, que ocorreu pela incorporação de grupos sociais historicamente
excluídos destes espaços, mas sem uma alteração efetiva do padrão de elitismo
dessas instituições. Desse modo, a universidade procurou satisfazer as
exigências de democracia sem com isso incorporar plenamente a ideia de
igualdade (p.167).

É preciso compreender que a estratificação das universidades acontece segundo


o tipo de conhecimento produzido, as existências de universidades distintas – cursos de
grande prestígio (Direito, Medicina e Exatas) e cursos historicamente desvalorizados.
Assistimos as divisões que são construídas a partir da composição e origem social dos
estudantes universitários. Porém, quando nossos resultados refletem que mais da metade
dos sujeitos investigados são autodeclarados pretos e/ou pardos, esses nos parecem
dialogar com algumas medidas que o Estado brasileiro tem adotado desde o final dos anos
de 1980 para a contenção dos desníveis sociorraciais, tais como a criminalização do
racismo em 1989, adoção de políticas públicas de ações afirmativas em 2000 e a lei
10.639 em 2003. O Brasil tem sinalizado aos olhos do mundo possibilidades de
transformações importantes (MOORE, 2012 p. 21).
Hall (2009) discorre sobre as relações sociais em sociedades diaspóricas
multiculturais do mundo pós-colonial e as perspectivas destas em termos da
caracterização de suas culturas como híbridas. “Hibridismo não é uma referência a
composição racial mista de uma população, mas trata-se de um processo de tradução
cultural que nunca se completa (...)” (p.73). Vivemos um momento de transição que
acompanha qualquer modo de transformação social, sem a promessa de um fechamento
celebrativo (BHABHA, 1997).
No turno 3 quando Ad pergunta se algum dos sujeitos da investigação se
considera racista, não se percebeu nenhuma manifestação, no entanto, no turno 4 quando

66
Ad pergunta se os mesmos acham que existe racismo no Brasil, todos concordam que
sim, apesar de não se reconhecerem como tal. Esses resultados corroboram com Ciconello
(2008):

uma pesquisa de opinião realizada pela Fundação Perseu Abramo em 2003


demonstra que 87% dos brasileiros/as admitem que há racismo no Brasil,
contudo apenas 4% se reconhecem como racista. Podemos extrair duas
consequências desses dados: a primeira é que o racismo existe não pela
consciência de quem o exerce, mas sim pelos efeitos de quem sofre seus
efeitos. A segunda consequência é que o racismo no Brasil, embora
perceptível, se localiza sempre no outro, nunca nas práticas cotidianas de seus
agentes, o que torna ainda mais difícil sua superação (p.1).

Nossos resultados apontam para o fato de que “O brasileiro tem preconceito de


ter preconceito” (FERNANDES, 1972, p.42). Por sua vez, quando essa situação é
observada no contexto escolar brasileiro o que vemos é o preconceito desvelado em todas
as suas nuances7. De acordo com a pesquisa “Preconceito e discriminação no ambiente
escolar”, realizada pela Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe), a pedido do
Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), 94,2%
dos brasileiros têm preconceito étnico-racial. A Figura 3 traz o percentual de
respondentes com algum nível de preconceito no ambiente escolar, relatado nessa
pesquisa.

Figura 3 – Abrangência da atitude preconceituosa. Percentual de respondentes com algum nível de


preconceito no ambiente escolar. Fonte: MEC (2009)

7
De acordo com a pesquisa Preconceito e Discriminação no Ambiente Escolar, realizada pela Fipe
(Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas) a pedido do Inep (Instituto Nacional de Estudos e
Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira), 94,2% têm preconceito étnico-racial.
http://educacao.uol.com.br/ultnot/2009/06/17/ult105u8241.jhtm

67
Quando perguntamos, (T.5) sobre sua posição em relação à política de cotas
como uma estratégia para inclusão de grupos historicamente alijados de acessar o ensino
superior, os resultados revelam discursos contrários, o que Goss (2014), denomina de
retórica conservadora (T.7) versus progressista (T.6 e 8).
No T.7, AF10 apresenta um discurso universalista: eu particularmente vejo as
cotas para negros, [...] como uma forma de discriminação. [...] acho que discrimina,
porque de certa forma, eles querem acabar com o preconceito, dizendo que essas pessoas
não podem concorrer de uma forma universal que elas precisam do que é delas, algo só
pra elas.
Nesse interdiscurso de AF10 ele sugere que, a política de cotas poderia
prejudicar a imagens dos estudantes nas instituições de ensino e, futuramente no mercado
de trabalho, poderia estimular mais preconceito, porque estão sendo favorecidos, serão
sempre malvistos por terem entrado por uma porta diferente dos demais.

A noção de interdiscurso, portanto, traz para o campo da análise o discurso-


outro, o discurso de outrem – “como lei do espaço social e da memória
histórica, logo como o próprio princípio do real sócio-histórico” (PÊCHEUX,
1997, p. 55) – que evidentemente não é homogêneo, pois também sofre a
influência do encontro com outros discursos e outros sujeitos (SOUZA, 2007,
p.30).

Os argumentos de AF10 nos parecem ser a reverberação de alguns(mas)


intelectuais brasileiros(as) que foram/são contra as ações afirmativas propostas no início
da primeira década dos anos 20008, para inclusão de grupos historicamente alijados de
acessar o ensino superior. Segundo Goss (2014), essa é a tese da perversidade9 dentro
da retórica conservadora no pensamento acadêmico brasileiro, em relação às políticas de
ação afirmativa, na qual

as mudanças advindas de medidas visando a algum tipo de transformação na


sociedade, em vez de levar a sociedade em determinada direção, levarão
exatamente na direção contrária. A ação produzida gera uma “cadeia de
consequências” “imprevisíveis” e “não intencionais” que provocam o oposto
do que se deseja alcançar (p.22).

Em oposição à tese da perversidade, dentro da retórica conservadora, Goss


(2014), sugere a retórica progressista, na qual seus defensores reivindicam que “não há

8
A Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), por meio de uma lei estadual destinou 40% de
suas vagas a estudantes negros no vestibular de 2003.
9
Grifo nosso

68
por que ter cautela quanto a reformas, [...] os progressistas desconsideram o conceito
de consequências involuntárias das ações humanas e acreditam na sua própria
capacidade de controle (p.35).
E isso é verificado no turno 8 AF5: [...] então a gente não pode dizer que só
porque ele é negro, não precisa de cotas, claro que precisa. Por quê? Não porque ele é
negro, mas por causa do histórico dele., ou seja, não se pode tornar ainda mais perverso
um sistema historicamente perverso.
O discurso de AF5, ainda no turno 8, revela que para se compreender a política
de cotas racial é necessário entendermos que a marginalização dos negros na escola foi
socialmente construída e para isso podemos citar aqui o início desta construção legal.
A Constituição Política do Império do Brasil de 1824 foi a primeira constituição
brasileira e traz em seu “2º ato que pela legislação do império os negros não podiam
frequentar escolas, pois eram considerados doentes de moléstias contagiosas” (BRASIL,
Constituição, 1824). Decretada quase meio século antes da Lei Aurea (1888), tratou de
delegar ao negro a exclusão do sistema educacional.
Apesar de apenas a instrução pública primária estivesse legalmente assegurada
as camadas populares, ao segmento negro da população nem isso foi garantido.

O Decreto nº 1.331, de 17 de fevereiro de 1854, estabelecia que nas escolas


públicas do país não seriam admitidos escravos, e a previsão de instrução para
adultos negros dependia da disponibilidade de professores. Mais adiante, O
Decreto nº 7.031-A, de 6 de setembro de 1878, estabelecia que os negros só
podiam estudar no período noturno e diversas estratégias foram montadas no
sentido de impedir o acesso pleno dessa população aos bancos escolares
(BRASIL, 2004, p. 7).

Ainda em oposição ao discurso de AF10 no turno 7, apoiamos em Munanga


(2003), para afirmar que:

[...] ninguém perde seu orgulho e sua dignidade ao reivindicar uma política
compensatória numa sociedade que, por mais de quatrocentos anos, atrasou
seu desenvolvimento e prejudicou o exercício de sua plena cidadania. Desde
quando a reparação de danos causados por séculos de discriminação prejudica
a dignidade e o orgulho de uma população? (p. 126)

Entendemos que, se seguirmos adotando políticas universais tratando


igualmente pessoas desiguais, não haverá mudanças significativas no corpo docente e
discente de nossas universidades. Soma-se a isto o fato de que a política de cotas se
apresenta como uma ferramenta de transformação nas instituições de ensino superior,

69
sendo cota racial ou socioeconômica.
O racista combate de maneira fervorosa qualquer proposta que tende interferir
no status quo da invisibilidade sociorracial, usando dos mais diversos tipos de argumentos
universalistas, integracionistas e republicanos. “Essa barreira de insensibilidade,
incompreensão e rejeição ontológica do outro encontrou na América Latina a sua mais
eleborada formulação no mitoideologia da democracia racial” (MOORE 2012, p. 25).
No turno 6, AF5 reclama por cotas que levem em conta, também, a situação
social e econômica do/a negro/a: “eu sou a favor da Lei das cotas, mas cotas baseadas
no social e no econômico. Situação social e econômica”. De fato, desde a publicação Lei
de Reserva de Vagas n. 12.711, de 29 de agosto de 2012 (BRASIL, 2012)10, a chamada
Lei de Cotas, as instituições federais de ensino superior no Brasil vem adotando essa
estratégia, a de verificar a situação econômica e social do/a candidato/o negro/a. Na UFG,
por exemplo:

reserva 50% das vagas para o sistema de Cotas. Os 50% das vagas restantes
permanecem para ampla concorrência. Dessas vagas reservadas, todas para
estudantes de escola pública, metade será destinada para estudantes com renda
mensal familiar até um salário mínimo e meio. O preenchimento das vagas
deve levar em conta ainda, critérios étnico-raciais e da condição de deficiência,
seguindo dados estatísticos do IBGE (UFG, 2019, p.03).

O Quadro 9 mostra as opções de participação no processo seletivo da UFG


através do Sistema de Seleção Unificada (SISU).

10
Alterada pela Lei n. 13.409, de 28 de dezembro de 2016

70
Quadro 9 - Opções de participação no processo seletivo da UFG através do Sistema de
Seleção Unificada (SISU)

Fonte: https://www.ufg.br/n/112997-publicado-edital-de-matricula-sisu-ufg-2019

Continuando a intervenção pedagógica, foram discutidas as transformações


químicas praticadas pelos/as ferreiros/as africanos/as antes da chegada do europeu
naquele continente. O extrato 2 traz essas discussões.

Extrato 2 – Transformações Químicas (TQ) e o conhecimento científico em


África.
T. – 9 – Ad: o que é isso aqui? Dá pra ver?

Figura 4 – Foto da estátua de cobre de Pépi I (Antigo Império). Museu do Cairo.


Fonte: VERCOUTTER, 2010, p. 831.

71
T.10 - AF5: estátua de cobre
T.11 – Ad: é, aqui tem uma foto de uma estátua do século V antes da Era Cristã. Uma estátua
de cobre. Essa foto foi retirada da Enciclopédia História da África.
T.12 – Ad: e isso aqui é o quê?

Figura 5 - Navalha, Mirgissa, Sudão (Foto Missão Arqueológica Francesa no Sudão).


Fonte: VERCOUTTER, 2010, p. 827

T.13 - AF2: navalha. Me parece de Ferro.


T.14 – Ad: isso é uma foto de uma navalha de ferro do século V aC.
T.15 – Ad: como que o cobre e o ferro são encontrados na natureza?
T.16 - AF9: na forma de óxidos, no caso do ferro, na forma da hematita.
T.17 - Ad: quais os conhecimentos que os/as africanos/as deveriam ter para que a partir
dessas duas rochas construíssem essa estatua e a navalha?

Figura 6 - Esquema de representação da transformação de óxidos em metais.

T.18 - AF5: químico


T.19 - AF7: separar os materiais, separar o ferro, a brita.
T.20 – Ad: esse conhecimento químico de operações unitárias, quais seriam?
T.21 - AF1: métodos de separação.
T.22 - AF2: óxido redução.
T.23 – Ad: quando você fala de óxido redução você fala de quê?
T.24 - AF2: reações
T.25 – Ad: reações, ótimo.
T.26 – Ad: uma reação é o quê? Pode falar gente....
T.27 - AF2: transformação química.
T.28 – Ad: qual o estado de oxidação do ferro na hematita e na lâmina?
T.29 - AF2: na lâmina é zero
T.30 – Ad: e na hematita é 3+

72
T.31 – Ad: então vocês concordam que para chegar a essa navalha e a essa estátua os
africanos precisavam saber tratar o mineral, refinar, separar e transformá-lo
quimicamente?
T.32 – Ad: e como eram realizadas essas transformações, alguém tem noção?
T.33 – Ad: e como é realizado hoje? Vocês não têm noção de como é extraído lá na Serra
dos Carajás, por exemplo, o ferro na forma de minério e é transformado em ferro zero, assim
como faziam os ferreiros africanos?
T.34 – Ad: naquela época essas transformações eram realizadas em fornos, como estes da
mesma maneira que é hoje. Só que hoje estes são mais sofisticados. Vocês sabem que a África
assim como a América foi colonizada pelos Europeus. A historiografia da África mostra que
os africanos já dominavam esses conhecimentos e técnicas bem antes da chegada do europeu
naquele continente.

Figura 7 - Esquema mostrando Semelhança entre forno de fundição africano e um alto


forno siderúrgico moderno. Fonte: CHILDS, (1991, p.342).

T.35 – Ad: existiam diversos tipos de fornos. Esse aqui, por exemplo, é bem maior do que
um homem.

Figura 8 - Foto de um Ferreiro africano na Tanzânia. Fonte: (CHILDS, 1991, p.346).

T.36 – Ad: quem dominava essa tecnologia, eram os ferreiros, eles tinham status de reis. O
ferreiro era o líder da comunidade. E foram esses reis ferreiros que vieram aqui para o
Brasil para ser escravizados.
T.37 – Ad: as etapas do trabalho com o Fe se dividem de um modo geral: 1-Em garimpar o
minério. Esse fenômeno é físico ou é químico?
T.38 - AF2: físico
T.39 - AF5: físico
T.40 - Ad: 2, reparar o arenito. O arenito é o minério onde se encontra a hematita, por

73
exemplo.
T.41 - AF5: o que é reparar?
T.42 – Ad: reparar é tratar, separar.
T.43 - AF5: físico
T.44AF10: físico
T.45 – Ad: 3,fabricar o combustível, como o carvão. Isso é físico ou químico.
T.46 - AF11: químico, já
T.47 – Ad: químico, né?
T.48 – Ad: vocês sabem como é fabricado o carvão?
T.49 – Ad: o carvão que vocês usam para assar carne, por exemplo.
T.50 - AF3: eles colocam um forno. Eles pegam a tora, coloca no forno deixa queimar lá e
depois tira.
T.51 – Ad: e em termos de reações química, vocês sabem?
T.52 – Ad: é a transformação da celulose, que é a madeira em carvão
T.53 – Ad: é igual AF3 falou ali. É colocado no forno, é uma combustão incompleta, daí
forma o carbono.
T.54 – Ad: então, é a celulose reagindo com o O2 gasoso numa combustão incompleta,
formando carbono (carvão) e gases monóxido e dióxido de carbono e vapor de água.
T.55 – Ad: então concluindo, na etapa de fabricação do combustível, tem transformação
química.
T.56 – Ad: 04, construir o forno é químico ou físico?
T.57 – Todos: físico
T.58 – Ad: 05, a fundição em si. É físico ou químico?
T.59 - AF5: químico
T.60 – Ad: é aquilo que falei para vocês. É sair do ferro dois ou três e ir a ferro zero.
T.61 – Ad: 06, e por fim, a forja dos utensílios, a manipulação o que é?
T.62 - AF5: físico

O/a africano/a foi o/a responsável pela introdução da fundição do ferro no


Brasil na virada do século XVII para o XVIII:

os ferreiros africanos, além de dominar técnicas de fundição e forja do ferro


trouxeram consigo outros atributos de profundo significado cultural. Na região
do reinado do Congo (Século XVII), os ferreiros eram líderes espirituais e
militares respeitados (associados á nobreza). Eles criavam todos os tipos de
ferramentas, armas e utensílios domésticos e eram considerados intermediários
entre os homens e os espíritos, ocupando sempre um papel central nas
cerimônias tradicionais das comunidades (PENA, 2004, p.1).

Ensinar uma química descolonizada significa admitir “a força das culturas


consideradas negadas e silenciadas nos currículos” (GOMES, 2012 p.102). Pois, a
“negação de um passado em CT dos povos africanos e a exacerbação se seu caráter lúdico
foi uma das primeiras façanhas do eurocentrismo” (NASCIMENTO, 1994 p. 33).
Desta forma, remontamos o contexto de desenvolvimento/ exploração do Brasil
Colônia a partir das contribuições dos povos africanos, contexto selecionado para a IP em
aula prática de química geral (turnos 17 ao 62). A equação química (I) representa a
transformação química ocorrida que é significada (como símbolo da ciência apresentada-
a linguagem científica) nos discursos de AF3 no turno 50 e Ad no turno 54.

74
C6H10O5(s) + 3O2(g) → 2C (s) + 2CO2 (g) + 2CO (g) + 5H2O (g) (I)

A equação química (II) representa a transformação química ocorrida que,


novamente, são significadas nos discursos de Ad, AF5 e AF11 nos turnos 45 a 62.

Fe2O3(s) + 3CO(g) → 2Fe(s) + 3CO2(g) (II)

Esses resultados mostram que estudantes e professores integram a ação mediada


mobilizando a linguagem científica com seus símbolos e sua interação sinérgica –
palavras, símbolos, gráficos, tabelas (BENITE et al., 2015) – a partir de contexto contra
hegemônico, ou seja, a ciência de matriz africana.
Nos turnos 30 a 35, o Ad insere a discussão de que os ferreiros africanos já
realizavam transformações químicas e, portanto, questiona o mito de que as grandes
transformações surgiram na Europa na Revolução Industrial (M’BOKOLO, 2009, I e II).
Soma-se a isto o fato de que nossos ancestrais dominavam também conhecimentos de
arquitetura e engenharia mobilizados na produção dos fornos:

os tamanhos dos fornos variavam de acordo com a demanda de metal que se


desejasse produzir, tendo em conta algumas variáveis colocadas pela natureza.
A principal delas era a qualidade do minério para ser fundido encontrado nos
chapadões ou jazidas. Os arenitos com baixo teor de ferro necessitavam de
fornos maiores para que uma maior quantidade de minério fosse despejada em
seu interior a fim de que se produzisse a quantidade de metal desejada. Outro
fator ponderado pelo mestre fundidor para se atingir uma determinada
quantidade de metal era a duração do tempo da estação da seca, época propícia
para a fundição (PENA 2004, p. 3).

Os discursos produzidos nos turnos de 32 a 62 discorrem sobre as etapas


necessárias para se chegar à fundição e à forja do ferro. Importa ressaltarmos que “o
domínio dessas técnicas por algumas sociedades africanas é conhecido desde o século I
antes da era Cristã (a. C.)” (VERCOUTTER, 2010, p. 827).
Apoiamo-nos em Sherby e Wadsworth (2001) para dizer que o ferreiro africano
se utilizava de alguns métodos para criar uma compreensão sobre o comportamento do
ferro:
a) a observação da cor do ferro, uma vez que é aquecido para forja e por
tratamento térmico – esta é a base de um bom trabalho de forja (figura 9);

75
b) a determinação do teor de ferro, caracterizado pela facilidade de forjagem, o
que é uma função da temperatura;
c) a determinação da força e a dureza de ferro à temperatura ambiente. Essas
propriedades podem ser determinadas por raspagem ou pelo processo mecânico de dobrar
o ferro e são dependentes da temperatura da forja e da velocidade de arrefecimento após
o forjamento;
d) o uso de magneto para medir as propriedades magnéticas do ferro (magnetita
é o óxido de ferro magnético mineral);
e) a projeção de que o ferro tem duas estruturas internas distintas: uma compacta
e outra menos compacta.

Figura 9 – Os dois principais conhecimentos que norteavam o trabalho dos ferreiros.


Fonte: Sherby e Wadsworth (2001).

No Extrato 3 a seguir, Ad coordena a preparação da ferrita que, nesse caso, é a

76
magnetita (Fe3O4), um mineral ferrimagnético que contém ferro em dois estados de
oxidação, o Fe2+ e o Fe3+:

é uma fonte importante de minério de ferro, que é um óxido de ferro misto com
FeO e Fe2O3, apresentando estrutura semelhante à montmorilonita, de
espinélio invertida, com os íons O2- coordenados tanto a íons Fe2+ e Fe3+, nos
interstícios octaédricos, quanto a íons Fe3+ em interstícios tetraédricos. Como
os íons Fe3+ são divididos igualmente entre as posições tetraédricas e
octaédricas, não existe momento magnético resultante de presença destes íons.
Entretanto, todos os íons Fe2+ residem nos interstícios octaédricos, sendo estes
íons responsáveis pela magnetização de saturação ou, ainda, pelo
comportamento magnético do material (OLIVEIRA et al., 2012, p. 127).

Extrato 3 - Síntese da ferrita.


T.66 – Ad: tal como os ferreiros africanos iremos hoje fazer algumas reações envolvendo o
ferro.
T.67 – Ad: você AF11, pese 2,04 g de sulfato de ferro e amônia. AF5 pese para mim 1,2 de
sulfato ferroso, AF3 mede aqui pra mim 10,0 mL de hidróxido de amônio.
T.68 – Ad: agora retire 2,0 mL da solução preparada por A5, 2,0 mL da solução preparada
por A11 e 10 mL da solução medida por A3 e misture.
T.69 – Ad: vamos passar um imã em cada tubo para verificar se existe um comportamento
magnético.
T.70 – Ad: agora vamos discutir a formação da magnetita. Foi medida uma massa desse:
FeNH4(SO4)2.12H2O e de FeSO4. 7H2O. Pessoal, pra gente fazer aquele material ali
(aponta para a magnetita) nós juntamos esses dois sais de ferro.
T.71 – Ad: qual é o estado de oxidação do ferro nesses dois sais?
T.72 - AF9: no primeiro 3+ e no segundo 2+
T.73 – Ad: então, para eu fazer a magnetita, eu parti de um sal de Fe com Nox 3+ e de um
sal com o Nox do Fe = 2+ , e o AF3 mediu uma solução de hidróxido de amônio.
T.74 – Ad: para que esse hidróxido de amônio serviu?
T.75 - AF5: catalisador? Não sei.
T.77 – Ad: não. Vocês lembram lá do ensino médio quando falava sobre a solubilidade dos
hidróxidos?
T.78 – Ad: os hidróxidos de metais alcalinos são solúveis, (Li, Na, K, Rb, Cs). Esses
hidróxidos são todos solúveis, tanto é que vocês pegam lá o hidróxido de sódio e dissolvem
rapidinho.
T.79 – Ad: os de alcalinos terrosos (Mg, Ca, Sr, Ba ) esses aqui são todos parcialmente
solúveis, quem não conhece o leite de magnésia ?
T.80 – Ad: e os dos metais de transição são insolúveis.
T.81 – Ad: então quando eu pego um metal de transição e coloco na presença de uma base
ele é insolúvel. Então a função do hidróxido de amônio aqui é precipitar esses dois sais.
T.82- Ad: concluindo e voltando para os ferreiros:
T.83 – Ad: os ferreiros africanos tinham status de reis, eram senhores de suas comunidades
e dominavam uma certa tecnologia para época.

No turno 69 Ad passa um imã nas soluções de Fe2+ e Fe3+ para verificar o seu
comportamento magnético, ou seja, se as partículas dessas soluções são ou não atraídas
pelo magneto. A Figura 10 é uma foto desse momento e, não se percebe comportamento
magnético dessas soluções.

77
Figura 10 - Foto da avaliação do comportamento magnético de uma das soluções de Fe antes do
aquecimento

Segundo Sherby e Wadsworth (2001), o ferreiro africano se utilizava de magneto


para medir as propriedades magnéticas do ferro (magnetita é o óxido de ferro magnético
mineral) e assim também o fizemos. A figura 11 mostra as fotos das partículas da ferrita
sintetizada atraídas por imã.

Figura 11 – Foto da avaliação do comportamento magnético da ferrita sintetizada.

A ação mediada é espaço de negociações de significados, de manipulação dos


instrumentos próprios da ciência e do estabelecimento do diálogo. A mobilização de
símbolos, tais como número de oxidação (turnos 72 e 73); equações (Turnos 60 e
67); instrumentos como balança, pipeta, espátula e proveta (Turnos 67 a 69);
linguagem especializada com termos próprios: catalisadores (Turno 75), metais de
transição (Turno 80) e precipitar (Turno 81) são resultados que caracterizam a ação
mediada desenvolvida nesta IP como válida.
Soma-se a isto o fato de que não se pode negar a historiografia pobre delegada
à África nos livros e na ciência ensinada. É preciso reconhecer que os proprietários

78
escravistas, por não dominarem muitas técnicas associadas com a exploração da
colônia brasileira, buscavam mão de obra especializada:

os conhecimentos técnicos da metalurgia do ferro, acumulados pelas


tradições centroafricanas e pelos povos da África Ocidental, eram
fundamentais para a produção não apenas das ferramentas agrícolas, dos
utensílios domésticos e dos apetrechos de transporte (tropas e carretos) da
Minas colonial, mas, sobretudo, para a elaboração dos instrumentos
necessários à mineração de jazidas auríferas. Boa parte da recente
historiografia sobre revoltas e quilombos no Brasil Colônia destaca a
atuação dos ferreiros como líderes religiosos e militares (PENA, 2004, p.
1).

No turno 83, Ad faz alusão ao status de poder que possuía o ferreiro africano e,
para dizer que:

o chefe de uma mina representava uma figura de poder ao qual estavam sujeitos
os trabalhadores da mina e demais povos que se achegavam por não
dominarem as técnicas de siderurgia e metalurgia do ferro. Os súditos e estes
povos agregados legitimavam o poder desse rei-ferreiro, uma vez que “[...] a
ideia de poder na África central não está associada à extensão do território
dominado e sim à quantidade de pessoas submetidas à figura do chefe (SILVA,
2008, p. 36).

Nesse texto é verificado os três níveis do conhecimento químico –


fenomenológico, teórico e representacional propostos por Mortimer e colaboradores
(2000). O nível teórico que se refere ao “conhecimento de natureza atômico-molecular,
envolvendo, portanto, explicações baseadas em modelos abstratos e que incluem
entidades não diretamente perceptíveis, como átomos, moléculas, íons, elétrons etc.”
(MORTIMER et al., 2000, p. 276) estão presentes nos turnos 17, 22, 27, 29, 30, 34,
58, 70 a 73, dentre outros.
Os aspectos fenomenológicos são passíveis de visualização concreta, bem
como de análise ou determinação das propriedades dos materiais e de suas
transformações (MACHADO, 2004, p.164). Nesse texto estes aspectos são verificados
nos turnos, 17, 31, 45, 53, 69, 70 e nas fotos (figuras 10 e 11) dos fenômenos onde se
caracteriza o comportamento magnético ou não das substâncias sintetizadas. E por
último o aspecto representacional do conhecimento químico, são verificados nesse
texto nos turnos 17 e 34, e nas equações I e II.

79
Vivemos um momento, no ensino de ciências no país, que implora pela
articulação entre as precárias condições materiais vividas pelos sujeitos da escola e as
dinâmicas culturais, identitárias e políticas desta sociedade multirracial.
A demanda de introdução do ensino da história da África e das culturas afro-
brasileiras nas instituições de ensino trazidas pela Lei nº 10.639/03 exige o
questionamento das omissões e dos silenciamentos dos currículos em
ciências/química. Neste contexto, planejamos, produzimos e desenvolvemos a IP aqui
apresentada como uma proposta de descolonização de tal disciplina.
Nossos resultados permitem dizer que esta iniciativa denuncia a rigidez do
currículo da IES, o empobrecimento do caráter conteudista e a necessidade do diálogo
com a cultura negada por este modelo. Deste modo, a mudança estrutural proposta pela
lei abriu caminhos para construir uma intervenção baseada em uma educação
antirracista que rompe com a epistemologia curricular quando apresenta a ciência de
matriz africana.
As articulações entre passado, presente e futuro sobre as construções,
experiências e produções do povo negro são uma alternativa para apresentar uma
Química não branca e eurocêntrica. Ora, a Química é a ciência da transformação da
matéria e toda sociedade, quando se organiza culturalmente, é pelo trabalho e,
consequentemente, pela transformação.
Ainda sobre o ferreiro africano e suas contribuições serão discutidos no tópico
3.2 os ítens : propriedades do ferro e o papel do ferreiro africano nas sociedades centro-
africanas e no Brasil colônia e a herança cultural africana, indígena e portuguesa nas
regiões de mineração do estado de Goiás, presentes na ementa da DO.

80
3.2 A HERANÇA CULTURAL AFRICANA, INDÍGENA E PORTUGUESA
NAS REGIÕES DE MINERAÇÃO DO ESTADO DE GOIÁS11

Segundo as Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN) para a Educação das


Relações Étnico-Raciais (ERER) e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira
e Africana “as tecnologias de agricultura, de beneficiamento de cultivos, de
mineração e de edificações trazidas pelos escravizados” (BRASIL, 2004, p. 22)
devem ser levadas em conta quando da implementação da Lei 10639/03, pelas
diferentes instituições educacionais. Assim, o conhecimento sobre mineração e sobre
garimpo do ouro trazido pelos africanos escravizados quando da fundação da antiga
Capitania de Goiás (atuais estados de Goiás e Tocantins) e o legado cultural deixaram
esses a seus descendentes para a atividade de mineração, que ainda hoje é praticada
em Goiás é a temática desta investigação.
Após a descoberta do ouro em Minas Gerais na última década do século XVII
e em Cuiabá em 1719, situado entre Minas-São Paulo e Cuiabá, o ouro goiano não
podia ficar oculto por muito tempo. Dessa maneira: Em 1720, três paulistas da vila de
Santana de Parnaíba, Bartolomeu Bueno da Silva, João Leite da Silva Ortiz e
Domingos Rodrigues do Prado, escreveram ao Soberano oferecendo-se a organizar a
sua custa uma bandeira ao sertão da capitania, destinada ao descobrimento de minas
[...] (PALACIN, 1979 p.18).
No ano seguinte o rei respondeu e delegou ao governador Rodrigo César de
Menezes a assinatura do contrato. Este o fez e firmou com Bueno e seus companheiros
o termo de compromisso que lhes concedia a passagens dos rios, “os cargos de
Superintendente das minas a Bartolomeu Bueno, guarda-mor a Ortiz e escrivão a
Antônio Ferraz e dava-lhes um regimento, pelo qual haviam de governa-se durante a
expedição” (PALACIN, 1979, p.18). Atribuição constante no regimento era a
descoberta de minas de ouro, prata e outros haveres.
Dessa maneira, Goiás entra na história como as Minas dos Goyazes tendo
como pano de fundo o ouro. Pouco depois de Bueno retornar de São Paulo ele:

11
Este trabalho é uma versão publicada do texto apresentado pelos/ as autores/as intitulado “Ouro,
níquel, congos e a diáspora africana em Goiás: a lei 10639 no ensino de química” na Revista da
Associação Brasileira de Pesquisadores/as Negros/as (ABPN), v. 9, n. 22, p. 273-302, jun. 2017, assim
optou-se pelo título mais específico, em questão.

81
Funda solenemente o primeiro arraial, o arraial de Sant`Anna. Entre
morros, numa quebrada no sopé da Serra Dourada, muito próximo das
nascentes do Rio Vermelho, a nova povoação – que deveria converter-se
doze anos depois em vila e tornar-se Capital-, geograficamente se encontra
deslocada, como centro de operações no território goiano, e climaticamente
exposta aos rigores de uma insolação concentrada, sem ventilação
(PALACIN, 1979 p.25).

Mesmo com todas essas características adversas o fato é que existia por aqui
ouro e água, e isto foi o bastante. Seguindo esses critérios é que vão surgindo os demais
Arraiais e em 1804 a Capitania de Goyaz contava com duas Correições12: de Vila Boa
(ao sul) e a do Norte (sede principal, São João das Duas Barras). A Correição de Vila
Boa possuía sete Julgados13 e 17 Arraiais a Correição do Norte possuía também sete
Julgados e vinte e dois Arraiais.

[...]a capitania de Goiás estava constituída, durante o século dezoito, por


14 julgados, sete em cada região. Os sete julgados do Norte eram Porto
Real, Natividade, Conceição do Norte, Arraias, São Félix, Cavalcante e
Traíras. Os sete da comarca do Sul eram Crixás, Pilar de Goiás, Meia Ponte,
Santa Luzia, Santa Cruz, Araxá e Desemboque (ROCHA, 2001 citado por
LEMES 2009, p.398-399).

Habitaram esses Arriais gente das mais diferentes matizes raciais (brancos/as,
negros (as), pardos/as e pretos/as e indígenas), “e nos primeiros anos do século XVIII
já passavam de mais de trinta mil pessoas, homens e mulheres, jovens e velhos, pobres
e ricos, nobres e plebeus, escravizados e escravizadas” (PALACIN, 1979, p12). Em
1792, ano que se registrou o maior número de negros/as na Capitania de Goyaz, eram
um total de 38533 homens e mulheres, a maioria escravizados/as e representavam
cerca de 60 a 80% da população das vilas mineradoras. “Os africanos foram
escravizados para trabalhar nas minas de ouro por quase um século. O ouro foi
descoberto nos anos de 1720, no rio Vermelho, e logo depois os portugueses fundaram
a Vila Boa de Goiás, que mais tarde transformaram na capital da capitania de Goiás”
(KARASCH, 2012, p.129).
Na Correição de Vila Boa, habitavam 65,4% de negros/as e o restante
habitavam na Correição do Norte. Dos 34,6% da população negra da Capitania de

12
Os Termos de Correições, registrados nos livros de atas da câmara de Vila Boa, compõem-se de
narrativas que transcrevem o processo de fiscalização, realizado periodicamente, referente aos vários
aspectos de controle sobre vida urbana, exercida pela municipalidade através do direito de
almotaçaria. LEMES, Fernando Lobo Poder local e rede urbana nas minas de Goiás. HISTÓRIA,
São Paulo, 28 (1): 2009
13
Pequeno governo municipal que tinha sobre o seu poder vários outros Arraiais. Op. Cit.

82
Goyaz, habitantes da Correição do Norte, 5328 ou 39,9% habitavam no Julgado de
Traíras” (KARASCH, 2012, p.131). Este Julgado, atual município de Niquelândia, era
o mais importante da Correição do Norte e contava com nove Arraiais o que equivale
a 64% dos arraiais de toda essa correição.
Descoberto pelos bandeirantes, Manoel de Souza Bastos e Antônio Rodrigues
Tomar, esses vindos do Arraial de Meia Ponte, hoje Pirenópolis, após desavenças com
Bartolomeu Bueno, no início de 1735, o julgado de Traíras foi criado através de um
alvará Real em 10 de janeiro de 1755. Na época de sua criação militavam no seu fórum
mais de trinta advogados, já estava formado o regimento de milícia civil, ficava
sediada ali também a companhia de cavalaria do 2° regimento da Capitania, corpo de
milícia de alto prestígio. “E o ouro abundante da então fabulosa mina de Cocal, era o
que alimentava a opulência geral” (BERTRAN, 2002, p. 56-57).
Já em 1750 notava-se a presença da Igreja na cidade que viria a ser a Capital
do Níquel. “Nessa época já existia a confraria do Santíssimo Sacramento da Igreja de
N. Srª. da Conceição de Traíras, a irmandades dos pardos de Boa Morte e São Gonçalo,
a de N. Srª. Abadia de Muquém, a de nosso Sr. Dos Passos” (BERTRAN, 2002, p. 57-
58). Já existiam também as irmandades de negros/as de Nossa Senhora do Rosário e
de Santa Ifigênia.
Depois de Vila Boa o julgado de Traíras era o mais importante da Capitania
e em alguma época chegou a ser o mais importante da terra dos Goyazes. Existem
relatos por partes de descendentes dos moradores na época do império, que aquele
lugar um dia recebeu o Príncipe Dom Pedro I (o colonizador). “Elza conta orgulhosa
que Traíras já foi capital do Brasil por 24 horas. “Dom Pedro I em viagem por aqui, se
hospedou em um casarão, hoje em ruínas, e assinou o decreto”, afirma ela.
(MARTINEZ, 2011, p.6).
Para além das representações sociais (a sedução do colonizado por seu algoz-
o colonizador) desveladas na citação acima, nota-se a presença da oralidade, um dos
valores civilizatórios africanos, elemento que em diferentes contextos serve para
manter e ressignificar as tradições e as culturas africanas, no antigo povoado de traíras,
no território brasileiro e em toda a diáspora africana. Uma das tradições que
permanece até os dias atuais é a “Congada de Santa Efigênia14 do antigo Arraial de

14 Alguns autores escrevem Ifigênia.

83
São José do Tocantins (arraial pertencente ao Julgado de Traíras), atual Niquelândia,
sendo o compromisso da Irmandade de Santa Efigênia datado de 1753” (MORAES
apud RIOS e VIANA, 2011, p.1). Assim como nas demais congadas brasileiras

[…] há nesta festa a predominância de traços próprios dos povos centro-


africanos, pertencentes ao grande tronco linguístico cultural banto, que
caracterizam o catolicismo negro, mas há igualmente elementos que
indicam alguma influência de sudaneses e iorubás, não excluída tampouco
a possibilidade de contatos com os índios Avá-canoeiros, que tinham
presença forte na região (RIOS e VIANA, 2011, p.3).

“No entanto, diferentemente de outras festas, a festa de Santa Efigênia é


realizada por um único grupo, “os Congos”, que não visitam outras festas e não
recebem visitas de outros ternos” (RIOS e VIANA, 2011, p. 6). “A festa, em sua
organização atual, presta homenagem a duas Santas: Santa Ifigênia e Nossa Senhora
do Carmo. Cada uma delas possui sua própria corte composta por imperador ou
imperatriz, príncipe ou princesa e juiz ou juíza” (RIOS e VIANA, 2011, p. 4).
Na corte cada membro tem uma função:

Imperador e Imperatriz: São os principais festeiros. Um é da corte de Santa


Efigênia e o outro da corte de Nossa Senhora do Carmo. Têm compromisso
com todas as atividades da Congada e dão um almoço ou um jantar para o
grupo no dia da festa da respectiva Santa.
Príncipe e princesa: Geral, mas não necessariamente, jovens festeiros. São
um príncipe e uma princesa para a corte de cada Santa homenageada. A
família normalmente dá um lanche ou serve uma farofa para os Congos na
noite dos ensaios e durante a visita na noite da festa.
Juiz e juíza: Tem responsabilidade com o recolhimento de donativos para
a festa. Além disso, também dão um lanche ou servem uma farofa para os
Congos na noite dos ensaios e durante a visita na noite da festa (RIOS e
VIANA, 2011, p.7).

O reinado liga a população negra brasileira às estruturas políticas africanas e


aos seus antepassados. “Cria uma identidade partilhada a todos os membros da
comunidade, definindo, aprofundando, e fortalecendo seus vínculos uns com os outros
e com sua ancestralidade” (KIDDY, 2012, p.166).
Sociedades15 como a de Taíras nascida sob a égide da chamada “corrida do
ouro”

possuem características bem peculiares entre si e suas fases são quase


sempre fatais: descobrimento, um período de expansão febril, caracterizado

15
Minas (Brasil) Califórnia, África do Sul, Austrália e Alaska foram outras sociedades que
também passaram pelo processo chamado de “corrida do ouro” (PALACÍN, 1979, p.11).

84
pela pressa e semianarquia; depois um breve, mas brilhante, período de
apogeu, e, imediatamente, quase sem transição, a súbita decadência,
prolongada, às vezes, como uma lenta agonia (PALACIN, 1979, p. 11).

E mesmo no ocaso do ouro, Traíras não deixou o seu status de um dos


principais julgados da Capitania de Goyaz. Em 1783 já no período de decadência do
ouro goiano lá estavam abertas ainda 31 lavras desse metal, onde existiam 1161
escravizados e outros 2200 cuidavam de outros afazeres. Nesse mesmo ano, o segundo
maior núcleo de mineração, o de Vila Boa de Goiás, com as riquezas do Rio Vermelho,
continha 24 lavras. “Do efetivo minerador dos 10.000 escravizados (no ano de 1783)
moradores da Capitania de Goyaz, 30% trabalhavam no Julgado de Traíras”
(BERTRAN, 2002, p. 215).
E nesse período de decadência do ouro, Traíras já era o maior núcleo agrícola
de Goiás em fins do século XVIII.

Tinha 28 engenhos de cana, entre os movidos a água ou a tração bovina


(contra 17 em Vila Boa), em cujas roças trabalhavam outros/as 1082
negros/as. No mais, para o serviço doméstico, nas pequenas roças, no
comércio, empregavam-se outros 1064 servos. Ao todo mais de 4300
pessoas escravizadas (BERTRAN, 2002, p. 59).

No entanto, como em toda sociedade nascida do Ciclo do Ouro, um dia chega


a decadência. E isto foi verificado no Arraial de Traíras (principal arraial do Julgado
de mesmo nome) já em 1783 quando esse arraial tendia “a ser superado pelo arraial de
São José do Tocantins, onde o comércio e a população eram maiores em 35 a 40% ao
de Traíras” (BERTRAN, 2002, p.59).
Importa dizer que, fazia parte do Julgado de Traíras os seguintes arraiais:
“Traíras; Água Quente; Cocal; Maranhão; São José do Tocantins; Cachoeira; Santa
Rita; Muquém; Piedade e Amaro Leite” (PALACIN, 1979 p.25). Toda essa
comunidade foi elevada à categoria de vila com a denominação de São José do
Tocantins, pela Resolução do Conselho do governo, em 01-04-1833. E

Em 1938, o minerador alemão Freimund Brockers estava garimpando na


região e descobriu a 2ª maior jazida de níquel do mundo. Esta descoberta
atraiu exploradores do Brasil inteiro, fazendo com que a vila de São José
do Tocantins crescesse rapidamente, tanto em população quanto em
riqueza. Com este motivo, a vila passou à categoria de cidade, e no dia 31
de dezembro de 1943, a cidade passou a se chamar Niquelândia, uma
homenagem ao minério que lhe deu prosperidade e lhe fez famosa no
mundo inteiro (IBGE, 2013, 01).

85
Atualmente essa cidade que conta com aproximadamente 43,5 mil habitantes,
segundo dados do IBGE de 2010, possui uma das maiores reservas de níquel do mundo
(IBGE, 2013) e, também, uma das maiores em população negra do estado de Goiás. O
Complexo Buriti/Niquelândia de propriedade do Grupo Votorantins Metais, unidade
Niquelândia (VM-Ni):

É formado pela mina Buriti com nove frentes de lavra a céu aberto, em
bancada, em uma jazida de 22 KM de extensão, quatro usinas de britagem,
moagem e secagem do minério e uma planta hidrometalúrgica para a
produção de carbonato de níquel, com capacidade de 23000t/ano de metal
contido, utilizando o processo de lixiviação amoniacal (STRAUCH, 2011
p.137).

Esse processo consiste em transformar o níquel que está contido no subsolo


na forma de óxido ou sulfeto em carbonato básico de níquel (CbNi) que é transportado
em caminhões até a planta de níquel eletrolítico em São Miguel Paulista no estado de
São Paulo. Apesar da historiografia notória de Niquelândia, no curso de Química da
Universidade Federal de Goiás os processos que foram e são mantenedores da
economia de mineração deste estado não integram as ementas de disciplinas.
Desta forma numa tentativa de descolonização do currículo de química
propomos nesta IP trabalhar com elementos de contextualização da diáspora africana,
a fundação do estado de Goiás, o papel da mão de obra escravizada e especializada,
empregadas nos garimpos de ouro e o legado cultural que estes deixaram para seus
descendentes, qual seja, a congada.
Atualmente a congada é a maior festa popular (expressão cultural) do estado
de Goiás, uma manifestação cultural brasileira, de influência africana e católica
(BENITE et al, 2016, p.19). A congada tem origem colonial e até hoje permanece
como fator de afirmação identitária da comunidade que a prática BRANDÃO apud
Benite et al, 2016, p.19).
A Intervenção Pedagógica (IP), analisada aqui versou sobre o legado cultural,
mais precisamente as Congadas, que os ferreiros africanos e seus descendentes,
deixaram para o povo do estado de Goiás, quando aqui estiveram para trabalhar como
mão de obra especializada e escravizada nos garimpos de ouro.
O quadro 10 mostra o plano de aula e o quadro 11 mostra o procedimento
experimental.

86
Quadro 10 - Estudo das Congadas, extração de Au e Ni em Goiás.
Tema Conteúdo/Abordagem Contextualização/Abordagem Cultural.
Conceitual
Legado do ferreiro africano e de seus descendentes no
campo das artes, mineração e religião (Congadas).
Após a descoberta de ferro na região onde hoje está hoje
o estado de Minas Gerais, os traficantes de pessoas
buscaram no continente africano “profissionais” que
conheciam a fundo esse ofício, os chamados ferreiros
africanos (BENITE et al, 2016 p.757).
-Extração de ouro
aluvião. Esses homens e mulheres africanos, embarcados na Costa
-Extração do ouro da Mina com destino ao Brasil, eram tradicionais
através do método da conhecedores de técnicas de mineração do ouro e do ferro,
cianetação. além de dominarem antigas técnicas de fundição desses
-Extração de Níquel metais. Eles conheciam muito mais sobre a matéria que os
Complexos
através do processo de portugueses, antigos parceiros comerciais dos reinos
em solução
lixiviação amoniacal negros da África, vorazes consumidores do ouro desse
-Constante de formação continente e senhores de enorme extensão territorial no
de complexos em Novo Mundo (PAIVA, 2002, p.1).
solução
-Efeito quelato. Em que pese uma tendência para o casamento dentro de
grupos étnico-culturais próximos, não há exclusividade
étnica (ou de “nação”) na composição das irmandades e é
bastante plausível a hipótese de uma mistura de influência
de minas / sudaneses e iorubás bem como dos índios Avá-
canoeiros nas Congadas de Niquelândia, sem prejuízo da
predominância dos já citados elementos bantos (VIANA
e RIOS, 2011, p.5).

Quadro 11 - Procedimento experimental- Roteiro de Prática


Materiais e
Reagentes. Etapas do procedimento

Tubos de ensaio e
frascos conta gotas. Exp. Reagente adicionado Observação
Reagentes: Soluções 1 Em três tubos (1; 2 e 3) adicione 2,0 mL de NiSO4.
2 Ao tubo 1 adicione 10 gotas de NH4OH.
0,1 mol/L de: 3 Ao tubo 2 adicione 30 gotas de etileno diamina
4 A tubo 3 adicione 10 gotas de dimetilglioxima
NiSO4; NH4OH; 5 Ao produto formado no tubo 1 adicione 10 gotas de
etilenodiamia (en) e etilenodiamina
6 Ao produto formado no tubo 3 adicione 10 gotas de
Dimetilglioxima NH4OH.
(DMG) 7 Ao produto formado no tubo 3 adicione 10 gotas de
NH4OH
,

Os atuais estados de Goiás e Tocantins surgem com as chamadas Bandeiras


portuguesas que adentram ao interior do Brasil em busca de ouro e outras pedras
preciosas no início do século XVIII. O extrato 4 apresenta os discursos surgidos sobre
essa temática durante a intervenção.

87
Extrato 4 – Sobre a mineração do ouro e o surgimento do atual estado de Goiás.
T.56-Ad: Então vamos lá. De maneira geral o que esse texto vai tratar gente?
T.57-A4: A descoberta e a construção de Niquelândia e a exploração mineral.
T.58-A2: [...] eles, os autores, falam sobre a prioridade dos movimentos paulistas quando
eles entraram em algumas partes do Brasil a maioria dos paulistas eram brancos e
alguns mestiços.
T.59-A1: Na realidade essa contribuição dos paulistas ela se dá para o estado de Goiás
através de Bartolomeu da Silva (pai) que vem aqui no final século XVII e mais tarde
retorna o filho dele Bartolomeu (filho) que funda na realidade seus arraiais que eram as
pequenas províncias de antigamente [...] e tem a cidade de Sant’Ana que hoje e a Cidade
de Goiás [...] as minas são determinadas por essa entrada dentro do estado de Goiás que
e ... Goiás tem a de,
T.60-A4: Pirenopólis
T.61-A4: [...] e fala que o pai veio e descobriu o ouro e foi para São Paulo e depois o
filho veio e [...] e começaram a exploração, devastaram tudo e o descobrimento ia
ocorrendo e fundando a povoação das pequenas cidades. [...] e descobriu ouro primeiro
em Goiás (Cidade de Goiás) depois em Pirenópolis [...] e conta sobre a fundação das
cidades de acordo com a exploração, conforme ia descobrindo eles iam construindo
cidade ali em volta das minas.
T.62-A1: A exploração do ouro para a época geralmente era no jeito aluvião, o ouro que
é extraído da superfície. Tinha uma grande parte das cidades que eram desenvolvidas
próximas aos rios.
T.63-Ad: Hoje não é assim mais. É através do processo de cianetação. Depois falo para
vocês sobre esse processo.

Inicialmente nota-se a predominância do discurso citado, pois as enunciações


contidas nos turnos 56 a 62 são reportados do texto MARTINEZ, Marly O’ Farrill.
Cultura, tradição e religiosidade: do ouro ao níquel. Revista Brasileira de
História das Religiões. Maringá (PR) v. III, n.9, 2011, trazido para o debate em sala
de aula.
Na abordagem bakhtiniana, o discurso citado não se exaure na citação, já
que reportar não significa apenas repetir, mas também estabelecer uma
relação entre o discurso que reporta e o discurso reportado; uma forma de
interação dinâmica dessas duas dimensões. Nas palavras de Cunha (1997),
o discurso reportado não pode ser abordado fora da situação de
interlocução, pois, trata-se de um fenômeno bivocal por excelência.
(RAMOS, 2010, p.6)

Os resultados expressos nos turnos acima mostram a discussão sobre a


formação da Capitania de Goiás no início do século XVIII (turnos 57, 58 59 e 60), o
papel dos descendentes portugueses na formação das novas vilas e cidades (dentre
essas o que é hoje o município de Niquelândia) e como era realizado o processo de
extração de ouro. As primeiras expedições bandeirantes a chegarem ao atual estado de
Goiás, datam do final do século XVII. No entanto:

só foi com a mineração aurífera que se inicia o processo de ocupação definitivo. A


região do Rio Vermelho foi a primeira, onde fundaram, em 1727 o arraial de

88
Sant’Ànna. Anos mais tarde se transformaria na Cidade de Goiás, que foi capital por
200 anos até a construção de Goiânia (PALACIN e MORAES, 1994, p.9-10).

Para trabalhar nessas minas de ouro foram traficados africanos de diferentes


procedências – Mina, Angola, Guiné, Congo, Nagô, Moçambique, Cabo Verde,
Benguela- (LOIOLA, 2008, p.19) e que entraram no país através dos portos de Belém,
Salvador, Recife, Natal, Parnaíba e São Luiz. E desses portos eles chegaram até Goiás
ou via terrestre, fazendo longas caminhadas ou através do Rio Tocantins (KARASCH,
2012, p.129).
No turno 61, A1 se refere ao processo de extração do ouro. “A exploração
do ouro para a época geralmente era no jeito aluvião, o ouro que é extraído da
superfície”.

No rio Maranhão (outro nome para o curso superior do rio Tocantins), 12 mil
escravizados trabalharam em um enorme projeto para desviar o leito do rio e assim
obter acesso a seu ouro aluvial. [...] em todos os lugares, a maior parte do processo
de mineração se valia de tecnologia simples, isto é, a bateia (uma tigela simples de
madeira para lavar ouro) e ferramentas para cavar ou remover os sedimentos dos
leitos dos rios (KARASCH, 2012 p.129).

Nos atuais municípios de Goiás, Pirenópolis, Goiás (Vila Boa), Pilar de Goiás
e Niquelândia, cidades que surgiram a partir de garimpos de ouro, não existe a extração
desse metal por parte de grandes mineradoras. Este elemento corresponde a 3,82% de
toda a produção mineral de Goiás/DF16, e isso equivale a 6,32% de arrecadação por
Compensação Financeira por Exploração Mineral (CFEM), para essas entidades
federativas, segundo o Departamento Nacional de Produção Mineral do Ministério
(DNPM) das Minas e Energia. Alto Horizonte com participação de 21,63% e Crixás
(também cidade colonial) com participação 78,37% são os maiores produtores em
escala industrial do Estado de Goiás, (DNPM, 2014).
A extração de ouro hoje (no turno 63), se dá através do processo de
complexação por cianeto17. Esse processo (lixiviação de ouro com o uso do cianeto) é
o método favorito da grande maioria das mineradoras do mundo, (JACOBI, 2015), e
baseia-se exatamente na capacidade do cianeto em formar complexo com o ouro. A
equação III representa a reação global que acontece durante esse processo.

16 O distrito federal entra aqui porque existe uma única Superintendência do Departamento Nacional
de Produção Mineral (DNPM) para essas duas entidades federativas.

17 Devido a contaminação por cianetos outros agentes lixiviantes têm sido testados.

89
Au(s) + 4CN(aq) + 1/2O2(g) + 2H+ (aq) = 2Au(CN)2(aq) + H2O (l) III

Processo idêntico é utilizado para transformar NiO em NiCO3 em uma das


duas mineradoras da cidade de Niquelândia. Quando um Instituto de Química fomenta
a criação de uma disciplina dessa natureza ele admite que “os antigos escravizados
africanos trouxeram consigo saberes, conhecimentos, tecnologia, práticas que lhe
permitiram e construir um outro povo” (SILVA, 2003, p.45 - 46). Passamos a análise
do extrato 6 que apresenta as discussões a respeito da herança na tradição e
religiosidade deixada pelos africanos e seus descendentes para o munícipio de
Niquelândia.

Extrato 5 – Sobre a religiosidade em Niquelândia GO.

T.64- A5: Nesta parte do texto é sobre o Arraial de Traíras que é hoje Niquelândia.
T.65-A12: Essa cidade conserva uma cultura religiosa muito tradicional, que vem em
grande parte dos povos africanos.
T.66-Ad: A cultura que é bem sincrética, sofrendo influências dos Jesuítas, do Africano
e do Índio que lá moravam.
T.67-A3: Lá tem vários grupos religiosos, por exemplo, a Festa da Capina.
T.68- A3: E a festa do Congo que já é outra parte da população, a parte afro descendente,
eles vão e fazem a dança, a comida
T.69-A15: Na festa dos Congos, os negros se reuniam na Igreja de Santa Ifigênia. Eles
realizam a dança do congo. Tem os reis princesa, juiz, príncipe para representar cada
um, eles usam trajes coloridos
T.70-A3: Usam penacho na cabeça.

Em 1792 habitavam na capitania de Goiás 37.309 escravizados e destes


aproximadamente 14% moravam no Arraial de Traíras (KARASCH, 2012, p.131)
depois nomeado São Jose do Tocantins e hoje Niquelândia, nome dado não sem razão
devido a quantidade de minério de níquel no subsolo daquela cidade.
No turno 64 A5 refere-se à fundação do Arraial de Traíras hoje Niquelândia.
As minas de ouro neste arraial foram descobertas pelas Bandeiras chefiadas pelos
portugueses, Manoel Rodrigues Tomar e Antônio de Souza Bastos. Estes vieram do
Arraial de meia Ponte (atual Pirenópolis) após desentendimento com Bartolomeu
Bueno da Silva. Os escravizados que habitavam o Arraial de Traíras,

[...] em sua maioria, ocupavam-se da mineração. Nos séculos XVII e XVIII


a economia de Goiás ainda girava em torno da mineração, embora já se
faziam promissoras as iniciativas na área agropecuária. Se a economia
provincial centrava-se na mineração, de Traíras [...] extraia-se grande parte
da produção aurífera da Província. Essas minas atraiam grande quantidade

90
de pessoas vindas de outras regiões à procura do minério precioso e é na
dura lida de garimpagem do ouro que se põe a situação do negro [...]
escravo nas minas de Traíras, (SILVA, 2010, p.5).

É possível afirmar que esse sincretismo cultural citado por Ad, no turno 66,
seja devido à grande quantidade de pessoas vindas de outras regiões à procura do
minério precioso (SILVA, 2010, p. 5). Nos resultados apresentados pelos turnos 64,
65, 66 e 67 os estudantes se remetem a religiosidade que era e ainda é praticada na
cidade de Niquelândia. No turno 67 A3 afirma que as festas religiosas nessa cidade
eram separadas por determinados grupos: “eram separadas para os escravizados
africanos e para brancos e, entre os escravizados, havia confrarias especiais para
grupos determinados” (Munanga, 2009 p.94).
No turno 67, A3 fala sobre a festa da capina que é

A primeira atividade da Congada é a Capina do Largo da Igreja de Santa Efigênia. No


Largo da igreja, cresce durante o ano uma vegetação rasteira (vassoura, capim e malva)
que é capinada pelos Congos, devotos e promesseiros no dia de São João, 24 de Junho. A
cerimônia começa com uma missa na Igreja com a presença dos Congos e da irmandade
às 7h00. Além da liturgia normal e da homilia voltada ao Santo do dia, é feita referência
à tradição da Congada e, no final da missa, o padre faz a benção das enxadas, (VIANA e
RIOS, 2012, p.13).

Atualmente a festa da Capina é realizada apenas simbolicamente, já que a


Igreja de Santa Efigênia se encontra praticamente no centro da cidade, e em frente a
esta, foi erguida uma praça que conta até com pista de skate. A vegetação rasteira
citada por Rios, hoje cresce junto com a grama no Largo da igreja.
No turno 69 A15 faz referência a uma verdadeira corte presente na festa do
Congo (reis, rainhas, príncipes, princesas, juízes). Cada um desses elementos possui
um significado:

A corte assim como a família real ou reino do Congo é comum em todas as


manifestações, o rei, que possui em sua maioria um nome de origem
africana, a rainha, príncipes e princesas, são considerados tradição entre os
congadeiros possuindo permanência vitalícia. A corte é o grupo de pessoas
mais próximo da família real, compondo-se de fidalgos, secretários,
cacique, general e capitão, e as crianças que participam da manifestação
cultural são sempre chamadas de conguinhos (SILVA, 2012, p.3)

Através das Congadas os escravizados e seus descendentes, ressignificam a


figura do rei do Congo e, simbolicamente ligam negros/as brasileiros/as às estruturas
políticas africanas aos seus antepassados. No entanto, essa relação com um passado
relembrado,

91
[...] forja uma identidade compartilhada por membros da comunidade,
definindo, aprofundando e fortalecendo seus vínculos uns com os outros e
com a sua ancestralidade. A ligação que os representa, todavia, é mítica, no
sentido de que comunidades afro-brasileiras criaram um ritual de memória
ligado a um passado africano, mas um passado distinto e unicamente
brasileiro (KIDDY, 2012, p. 165-166).

Nos turnos 70 e 71, A3 e A4 fazem referências aos trajes utilizados pelos


Congos de Niquelândia e dizem que estes usam penachos na cabeça. Martinez (2011)
cita Galvão (1987) e diz que “[...] a festa de Santa Efigênia teve seu começo com os
índios que viviam aldeiados na região das Fazendas Xambá e São Jacó”. Os congos se
vestem com roupas coloridas usadas pelos seus antepassados, usam também uns
penachos na cabeça (influência dos índios da região), os que os distinguem dos demais
congos de Goiás (MARTINEZ, 2011 p. 9-10).
A tradição da festa do Congo trazida pelos/as ferreiros africanos/as e seus
descendentes, que aqui teve sua mão de obra especializada explorada nos desvios dos
leitos dos rios para a garimpagem do ouro ainda se mantém em Niquelândia e em
algumas cidades de Goiás e do Brasil. Porém o ouro na forma aluvião há muito tempo
deixou de ser extraído. Esse metal hoje é obtido através de reação de lixiviação e
complexação com o cianeto, como já mostrado e representado pela equação III.
Processo idêntico (lixiviação/complexação) é utilizado para a extração de
níquel e cobalto na cidade de Niquelândia. Sobre essa extração apresentamos a
produção do extrato de diálogo a seguir:

Extrato 6 – Sobre a descoberta de Ni em Niquelândia GO.

T.74-A1: [...] a cidade de Niquelândia nasce com a exploração do ouro houve um Alemão
que a procura de ouro [...]acabou descobrindo o níquel.
T.75-Ad: Há relatos que os escravizados já haviam tido contatos com aquelas rochas
verdes [...], mas não sabiam que se tratava do níquel.
T.76-Ad: Quem explora esse níquel hoje são dois grupos. A Votorantins Metais Níquel
(VM-Ni) e Anglo American [...] vou falar com vocês sobre o processo que conheço mais,
o que acontece na VM-Ni.
T.77-Ad: As pessoas acham que o minério de níquel como é extraído de niquelândia
possui um grande valor comercial [...] o que se faz nada mais é do que dar apenas uma
refinada para a retirada de algumas escórias e água para facilitar o transporte para São
Paulo. [...] então o minério de níquel só vai obter valor agregado no estado de São Paulo.
T.78-Ad: Nós estamos falando aqui de mineração [...] como eu disse para vocês o Ni é
encontrado nas rochas ou na forma de oxido ou na forma de sulfeto, vou colocar aqui na
forma genérica de oxido. No início acontece muitas operações unitárias como moagem,
britagem, secagem dentre outras. Mas o que interessa para nós é que [...] esse níquel na
forma de NiO é reduzido a Ní em fornos de redução cujo agente redutor é o monóxido de
carbono [...] e com o ferro presente no minério forma então uma liga ferro-níquel em

92
seguida essa liga é lixiviada e complexada com amônia e CO 2 formando esse complexo
de hexamin-niquel II. A amônia é evaporada desse complexo e forma o que eles chamam
lá de carbonato básico de níquel. Não vou colocar a fórmula corretinha aqui, mas é um
sólido verde e é este o produto que é levado para São Paulo para passar pelo processo
de eletrolise.

A Figura 12 apresenta um diagrama de blocos das operações e processos


apresentados por Ad no turno 78.

Figura 12 - Fluoxagrama simplificado do processo de extração de Ni.


Adaptado de (Gomes, 2010, p.13)

Nos turnos 73 a 78 (exceto 74) o professor lança mão da atmosfera do já dito


e também da polifonia para explicar o processo de extração de Ni. Esses discursos o
professor traz consigo, como já descrito nessa pesquisa, pelo fato do mesmo ser da
cidade de Niquelândia e também por ter trabalhado na VM-Ni e que hoje o mesmo o
transforma num discurso próprio e de autoridade de professor.
No turno 77 Ad fala do baixo valor agregado que o Ni produzido em
Niquelândia possui. Isto porque esse metal só passa a ter valor comercial após seu
processamento via eletrólise, na qual deixa a sua pureza em torno de 99,9%, que é
realizado no estado de São Paulo. No entanto, mesmo com esse baixo valor agregado,
o Ni produzido em Niquelândia, colocou esse município entre os dez maiores
arrecadadores para o CFEM em 2013.

Apenas 10 (dez) municípios contribuíram com aproximadamente 85,07%


da arrecadação de CFEM do Estado de Goiás e Distrito Federal em 2013,
são eles: Alto Horizonte, Barro Alto, Minaçu, Ouvidor, Crixás, Distrito
Federal, (Niquelândia 3,16%), Catalão, Jandaia e Indiara, pela ordem,
ficando os 15,69% restantes por conta de 141 (cento e quarenta e um)
municípios, (DNPM GO/DF 2014, p.161).

93
Ainda segundo dados do DNPM GO/DF (2014), o Ni com 17,5% em segundo
lugar, o primeiro foi o cobre, seguido de amianto, fosfato, calcário e ouro, foram as 06
(seis) substâncias que mais arrecadaram CFEM e contribuíram com 86,81% do total
arrecadado no Estado de Goiás.
No turno 78 quando Ad fala da extração do Ni18, pela VM-Ni, o mesmo diz
que esse é encontrado em forma de óxido e de sulfeto. No minério de níquel extraído
do solo daquela cidade estão presentes outros metais nas formas de óxidos, hidróxidos
e sulfetos tais como: NiO, NiS, CoO, CuO, FeOOH, Fe2O3, Fe3O4, SiO, MgO, MnO2,
dentre outros. As transformações ocorridas durante todo o processo são muito mais
complexas do que as que apareceram nas enunciações de Ad no turno 78. Porém, para
o escopo do curso, interessa dizer que o Ni inicialmente é reduzido dentro de um forno
e através de reação com Fe presente no minério, forma inicialmente uma liga Fe-Ni.
As reações que ocorrem no interior do forno são representadas pelas equações IV e V:

NiO(s) + 2Fe2O3(s) + 3H2(g) ⇌ FeNi(s) + Fe3O4(s) + 3H2O(g) IV


NiO(s) + 2 Fe2O3(s) + 3CO(g) ⇌ FeNi(s) + Fe3O4(s) + 3CO2(g) V

A liga FeNi(s) obtida nos produtos das reações representadas pelas equações II
e III é então enviada para outra parte do processo e colocada em contato com uma
solução de amônia carbonatada, aerada e amônia livre. As equações V e VI
representam as reações ocorridas nesta etapa.

FeNi(s) + O2(g) + 4NH4+ ( aq) + NH3(g) + 2H2O (l) + CO32-(aq) ⇌ [Ni(NH3)6]2-(aq) +


[Fe(NH3)2]2(aq) + H2O (l) + CO32-(aq) V
4[Fe(NH3)2]2-(aq) + O2(g) + 8OH- + 2H2O (l) ⇌ Fe(OH)3(s) + 8 NH3(g) VI
O produto das reações V e VI após evaporação do NH3 e separação do ferro
em forma de lama é o chamado carbonato básico de níquel (CbNi). Este produto seco
é então enviado para o estado de São Paulo para posterior eletrólise. É a partir deste
contexto específico de constituição da identidade étnica da população de Goiás que
introduzimos em aula de química o conceito de constante de formação de complexos
a partir de seis diferentes reações.

18 O cobalto também é extraído para o processamento de eletrolise no estado de SP., No entanto, não tratei
disso durante a IP.

94
O extrato 7 apresenta os discursos produzidos antes, durante e após cada
transformação química ocorrida.

Extrato 7 – Sobre a realização e discussão do experimento.


T.80-Ad: A gente vai fazer praticamente o que se faz na mineradora. Uma reação de
formação de complexo [...] que é mais ou menos o que acontece lá, só que no nosso caso
vamos obter o complexo a partir de um sal de níquel e formamos dois ou três complexos,
tá bom?
T.81-A4: Vai entregar o roteiro da pratica?
T.82- Ad: Não, eu só quero que vocês copiem aqui do quadro.
T.83-Ad: Pessoal eu quero que vocês escrevam na folha de papel o que estão fazendo,
por exemplo, coloquei sulfato de níquel de cor verde, reagi com reagente tal, formou uma
substancia com coloração tal. O conceito a gente vai discutir a partir daí já que não se
sabe qual a reação formada...
T.84-Ad: Gente, vocês se lembram da reação do cobre lá (refere-se a última aula) eu ia
fazendo e mostrando para vocês, é a mesma coisa, vão fazendo e anotando o que
aconteceu.
T. 85-Ad: Pessoas vamos então discutir isso aqui? O que aconteceu aqui? ... (refere-se
ao experimento: 2,0 mL de NiSO4 (cor verde) + 10 gotas de NH3)?
T. 86-A4: Ficou azul.
T. 87-Ad: Ficou uma coloração azul? Os meninos da química, ou quem já cursou a
disciplina de química conseguem propor o que teria formado aqui?
T.88-A5: Hidróxido amina níquel, alguma coisa desse tipo?
T.89-Ad: Hidróxido? Será que formou Hidróxido? E pode ter formando hidróxido com
base nas discussões nossas? [...], mas se formou Hidróxido...
T.90-A5: Não! o hidróxido de amin níquel !
T.91-Ad: Ah, você está falando do complexo,
T.92-A5: Isso
T.93-Ad: Ah ta! [...] o que estamos falando aqui é que formou um complexo de níquel
ligadas a 6 moléculas de amônia e que formou íons sulfatos e água [...] essa coloração
azul que ficou ai é característico desse complexo aqui (refere-se ao [Ni(NH3)6]2+).

Nesse momento Ad vai quadro e faz uma explanação dialógica sobre


constante de formação de complexos em solução adaptado de (Miessler et al 2014) e
(Shriver & Atkins 2003).

T. 94-Ad: Não vou entrar em detalhes. Fiquem com o conceito de constante de formação
[...] quanto maior o valor dessa constante mais fácil a reação irá acontecer. [...] baseado
nisso, qual das três reações vai ter um maior valor de constante de formação? Baseado
no que vocês observaram.
T. 95-A4: Qual é a definição da constante de formação? Quanto maior...
T.96-Ad: Quanto maior o valor numérico da constante mais fácil essa reação irá ocorrer,
com maior facilidade.
T. 97-A4: Ah sim.
T.98-Ad: Vocês estão vendo que estou reagindo um mesmo reagente com 3 ligantes
diferentes, ou seja, a reação que irá acontecer mais facilmente será aquela reação que
tiver maior constante de formação. Baseado nisso, qual dessas 3 tem a maior constante
de formação?
T.99-Todos: A terceira
T.100-Ad: A terceira né. Uma gotinha já mudou. Para vocês proporem as equações o
etilenodiamina vocês vão encontrar abreviado como (en) e o dimetilglioxima abreviado
como DMG.

95
T.101-Ad: Agora vou adicionar amônia aqui, (Refere-se ao tubo 2) estou comparando
essas duas constantes de formação. Se constante de formação do complexo de níquel com
a amônia for maior, esse tubo (2) tem que transformar em uma coisa parecido com isso
daqui (Tubo 1) [...] cadê a amônia?; Olhem o que estou fazendo, não muda ou seja esse
ligante amônia [...] você viu (aponta para o A5) esse ligante aqui é mais fraco do que
esse aqui (refere-se ao tubo 2 que contém o complexo de Ni com o etilenodiamina). Agora
vejam quando adiciono etilenodiamina ao tubo 1 nada acontece. Por quê? Da mesma
forma quando adiciono amônia ao tubo que contém o DMG e quando adiciono DMG ao
tubo que contém amônia [...] espero que esse ligante que estou chamando de DMG retire
essas moléculas de amônia e forma um composto vermelho, vamos ver se vai, me dar o
DMG ai, olha o tanto que é forte.

Uma aula idêntica a esta foi proferida para os alunos de Licenciatura em


Química da disciplina optativa, por isso, as discussões sobre esses experimentos
(Extrato 7), serão mostradas mais adiante nesse trabalho em conjunto com as
discussões dos experimentos realizados pelos/as alunos/as de licenciatura (Extrato 10).
O extrato 8 traz, inicialmente, uma mediação entre Ad e os/as alunos/as de
licenciatura sobre o conceito de complexo em solução. Para diferenciar os turnos das
falas dos/as alunos/as da disciplina de núcleo livre com as dos/as alunos/as da
disciplina optativa, usaremos um apóstrofo (’), após a numeração do turno.

Extrato 8 - Discussão sobre a formação de complexo em solução.

T.36’ – Ad: façam 3 grupos. Aqui tem tubos de ensaio. Quem já estudou a disciplina
Química Inorgânica?
T.37’ - AL2: eu.
T.38’ – Ad: química Inorgânica Prática?
T.39’ - AL2: eu, infelizmente.
T.40’ - AL1: eu não fiz a teórica nem a prática, na verdade a maioria não fez. Somente a
AL2
T.41’ - Ad: o que vocês entendem por complexo?
T.42’ - AL2: são átomos do grupo d da tabela periódica que fazem ligações na camada
d ou não? Sei lá, d e f. Mas é tipo assim, complexos do grupo d.
T.44’ - AL2: é porque, tipo assim, tem um átomo metálico central e os ligantes, pode ser
qualquer outro, um metal, mas sempre vai ter um átomo metálico.
T.43’ – Ad: 3Mas também pode ter complexos com o bloco dos elementos
representativos.
T.45’ – Ad: se eu pensar na teoria de ácido e base de Lewis, este átomo central que você
falou seria um ácido ou uma base?
T.48’ - AL2: ele é uma base.
T.49’ – Ad: o que é uma base de Lewis? Eu vou colocar um complexo aqui. O mesmo que
vocês vão usar: [Ni(OH2)6]2+
T.52’ – Ad: quem é o ácido e quem é a base aqui?
T.55’ - AL2: por exemplo, um metóxido é uma base por que é doador de elétrons, então,
posso falar... O níquel é um ácido de Lewis e a água é a base.
T.56’ – Ad: AL3 e o conceito?
T.57 – AL3: complexo é formado pela reação entre um metal que é um ácido de Lewis e
um ligante, que é uma base de Lewis. Este ligante ele tem que ter um par de elétron
disponível.
T.58 – Ad: como é um íon metóxido, AL2, que você citou lá atrás?

96
T.59’ - AL2: CH3O-
T.60’ – Ad: isso mesmo, como possui par de elétrons é uma base. [...]

Nos turnos T.36’ a T.40’ Ad procura descobrir qual(is) dos/as alunos/as já


cursaram a disciplina de química inorgânica prática e/ou teórica como esta poderia ou
não influenciar a mediação sobre a os conceitos envolvidos na formação de complexos
em solução. Dos estudantes presentes em sala de aula, apenas o AL2 havia cursado a
disciplina: T.37’ - AL2: eu. T.38’ – Ad: química Inorgânica Prática? T.39’ - AL2: eu,
infelizmente. E, se se considerar as enunciações formadas entre os turnos 37’ e 39’,
não fora uma experiência boa.
Mesmo assim AL2 tenta lançar mão do discurso de outrem, o que ele aprendeu
quando cursou tais disciplina, e formular o seu discurso resposta, quando Ad em T.
41’, formula a questão: o que vocês entendem por complexo? Em T.42’, Al2
responde: são átomos do grupo d da tabela periódica que fazem ligações na camada d,
ou não? Sei lá, d e f., mas é tipo assim, complexos do grupo d.
Nota-se, em seu discurso, algumas confusões tais como: a substituição do
conceito de elementos por átomo, elementos de transição por “grupo d da tabela”, “
tipo assim, complexos do grupo d’. Em T.44’, no entanto, ele conclui que, num
complexo sempre vai ter um átomo central e os ligantes. Percebe-se aqui que, AL2
ainda que de forma confusa, consegue apreender sobre a natureza de complexos.
As enunciações apresentadas pelos turnos T.45’ a T.55’, mostram as
mediações realizadas entre Ad e AL2 para se chegar ao conceito de ácido e base de
Lewis, para, no fim, concluir o conceito de complexo metálico. Ad em T.49’ e T.52’:
[...] eu vou colocar um complexo aqui. O mesmo que vocês vão usar: [Ni(OH2)6]2+;
quem é o ácido e quem é a base aqui? A figura 13 mostra uma foto da estrutura do :
[Ni(OH2)6]2+, escrita por Ad na lousa:

97
Figura 13 - Foto da representação, segundo Ad, da estrutura plana do [Ni(OH 2)6]2+.
No turno 55’, AL2 se remete a um discurso de aulas da disciplina de química
orgânica, que o íon metóxido é uma base de Lewis, o mesmo possui pares de elétrons
doadores e faz uma associação com os pares de elétrons da água e conclui: [...] um
metóxido é uma base porque é doador de elétrons, então, posso falar... O níquel é um
ácido de Lewis e a água é a base.
Por fim, no turno 57’, AL3 conclui: complexo é formado pela reação entre
um metal que é um ácido de Lewis e um ligante, que é uma base de Lewis. Este ligante
ele tem que ter um par de elétron disponível.
Lewis definiu uma base como um doador de pares de elétrons, é também
chamada de nucleófilo, e um ácido como um aceptor de par de elétrons, é também
chamado de eletrófilo (MIESSLER et al, 2014, p. 182). Para Barros (1992), não é
possível uma definição exata do que seja composto complexo (ou complexo de
coordenação ou composto de coordenação). Pode-se dizer, entretanto que: Ele
apresenta uma espécie central ligada a íons ou moléculas, que são denominados
ligantes. A espécie central pode ser um cátion, um ânion ou um átomo neutro.
(BARROS, 1992, p.334).
No turno 43’, Ad afirma que os elementos representativos também formam
complexos. De fato, os íons metálicos do bloco “s”, por exemplo, são capazes de
formar complexos através de interações Coulombicas com doadores pequenos,
“duros”, como aqueles possuindo O e N.

Os complexos mais notáveis dos cátions do Grupo I e dos metais mais


pesados do Grupo 2 (do cálcio até o bário) são formados pelos ligantes
polidentadados. [...]. Os éteres coroa, como 18-crown-6 (Figura 14 a),
formam complexos com íons de metais alcalinos que sobrevivem
indefinidamente em solução não aquosa. Os ligantes bicíclicos do tipo

98
criptando, como cripta 2.2.1 ((Figura 14 b) e cripta 2.2.2 ((Figura 14 c),
formam complexos com metais alcalinos que são mais estáveis, e então
podem sobreviver em solução aquosa. Esses ligantes são estericamente
seletivos para um íon metálico particular, sendo o fator dominante o ajuste
entre o cátion e a cavidade do ligante que o acomoda (SHIRIVER e
ATKINS (2003, p. 319).

Figura 14 – Éteres de coroa: (a) 18-crown-6 (b) cripta 2.2.1 (c) cripta 2.2.2
Fonte: Adaptado de Shiriver e Atkins (2003, p. 319).

Ainda como exemplos de complexos com metais representativos Shiriver e


Atkins (2003, p. 319-320) citam os complexos do Grupo 2 com o íon
etilenodiamintetraacetato (EDTA), cuja constante de formação seguem a ordem: Ca2+
> Mg2+ > Sr2+ > Ba2+, Figura 15.

Figura 15 – [Mg(edta)(OH)2]2-
Fonte: Adaptado de Shiriver e Atkins (2003, p. 319).

O acetato básico de berílio oxiacetato de berílio, Be4O(O2CCH3)3)6 é outro


exemplo de complexo de elemento de transição, Figura 16.

99
Figura 16 - [Be4O(O2CCH3)6]
Fonte: Adaptado de Shiriver e Atkins (2003, p. 320).

Após as negociações e conclusões a respeito dos conceitos de formação de


complexo em solução passou-se a discussão sobre o conceito de constante de formação
de complexo e a realização do experimento das reações de substituição nos complexos
de níquel. O extrato 9 apresenta as enunciações formadas durante esses eventos.

Extrato 9 - Discussão sobre a constante de formação de complexo e sobre o


experimento.

T60.[...] um complexo se forma quanto maior for a sua constante de formação. Se eu


tenho um metal mais um ligante formando um complexo-metal ligante. Eu tenho uma
constante de formação aqui. ( Ad vai o quadro e mostra uma equação genérica do tipo:
M + xL → MLx). Pelo que vocês sabem da Analítica, qual seria a forma da constante de
formação dessa equação?
T.61’ - AL1: ninguém fez analítica.
T.62’ – Ad: uma constante de qualquer equação é dada como?
T.63’ - AL1: produto sob o reagente.
T.64’ - AL3: seria ML sob M vezes L?
T.65’ – Ad: então, a constante de formação seria ML dividido por M vezes L elevado a
x. Quanto maior for essa constante de formação mais a reação...
T.66’ - AL3: tenderá para os produtos.
T.67’ – Ad: então, o que nós vamos fazer aqui, eu quero que vocês discutam em termos
de constante de formação. Isto quer dizer o que? Se vocês adicionarem um reagente e
formar a reação é por que a constante de formação desse reagente
T.68’ - AL3: tende para os produtos.
. T.69’ – Ad: Vamos lá, um complexo é formado por etapas. É claro, aqui a olho nu, não
é possível ver as etapas. Mas se eu tenho um complexo com 6 ligantes, essa substituição
acontece por etapa. Eu tenho MX6 + Y e forma MX5Y + X e eu tenho uma constante para
ele. Depois MX5Y + X e forma MX4Y2 + X e assim por diante. A constante global é o
produto dessas constantes. Se vocês olharem, qual dessas constantes é maior? Entenda,
a maior é a mais fácil de reagir. É K1 ou K6?

100
Figura 17 - Foto da explicação sobre a formação de complexo em solução

T.70’ - AL1: K1
T.71’ – Ad: por quê?
T.72’ - AL3: por causa do reagente é maior, porque o K6 é o inverso do K1.
T.73’ - AL2: eu acho que é o último, eu posso estar enganada, mas é o efeito que tem,
que vai trocando de ligante a ligação enfraquece, e enfraquece na posição anti, ou não
é isto? É fica mais fácil de tirar.
T.76 -Ad: veja aqui. Se eu coloco o Y aqui para reagir, onde é mais fácil para ele reagir?
Aqui neste exemplo, ele está concorrendo entre aspas com outros 5 Y. Então é mais difícil.
T.80’ – Ad; é tudo Y, aqui é uma coisa genérica. Feito isto, vamos tentar entender o que
vocês fizeram. É para falar do efeito fenomenológico e eu até já dei a dica

Nos turnos 60’ a 79’ Ad medeia a discussão sobre o conceito da constante de


formação de complexo. No turno 60’ Ad tenta lançar mão do discurso de outrem que,
porventura, os/as estudantes já trazem consigo, qual seja, o conceito de constante de
equilíbrio muito estudada em química analítica. Ao responder a indagação feita por
Ad no turno T.62’: uma constante de qualquer equação é dada como? AL1 e AL3
respondem erroneamente que seria algo do tipo produtos sobre os reagentes AL1:
produto sob o reagente; AL3: seria ML sob M vezes L? nos turnos T.63’ e T.64’,
respectivamente e, em T.65 Ad ajuda aos/as alunos/as a elaborarem o conceito da
constante de formação de um complexo que nada mais é do que a expressão de uma
constante de equilíbrio qualquer.
Uma constante de equilíbrio de uma equação química genérica do tipo:
𝑎𝐴 + 𝑏𝐵 ⇌ 𝑐𝐶 + 𝑑𝐷 (IV)
[𝐶]𝑐 [𝐷]𝑑
é dada como 𝐾𝑐 = (V). Portanto uma equação do tipo M + xL → MLx (VI)
[𝐴]𝑎 [𝐵]𝑏
[𝑀𝐿𝑥]
proposta por Ad no turno 60 teria a seguinte constante de formação: 𝐾𝑓 = [𝑀][𝐿]𝑥

(VII). Daí a conclusão de AL3 em T.66’, um alto valor de Kf indica um alto valor nas
concentrações dos produtos e um baixo valor nas concentrações dos reagentes.

101
Em seguida passou-se as realizações dos experimentos. A Figura 18 mostra as
fotos dos tubos contendo solução de Ni (II) antes e após a adição de cada um dos
ligantes (amônia (NH3), etilenodiamino (en) e dimetilglioxima (DMG)). E o extrato
10 trazem os discursos produzidos durante e após a realização dos experimentos

Antes (a) Depois (b)


Figura 18 - Fotos dos tubos contendo solução de Ni (II) antes e após a adição de cada um dos ligantes.
Fonte: Arquivo pessoal

Extrato 10 - Discursos produzidos pelos SI antes e após a realização dos


experimentos
T.81’ - AL6: então, no caso do Tubo 1, aconteceu uma reação. Eu vou ter que calcular a
constante dela?
T.82’ – Ad: não! A constante é dada! No tubo 1, escreva a equação considerando que
todas as moléculas de água foram substituídas. Nós temos no tubo 1 o complexo hexaquo
de níquel reagindo com a amônia. A pergunta é: reagiu ou não?
T.83’ – TODOS: reagiu
T.84’ – Ad: vamos considerar que todas as moléculas de água foram vamos ter o hexa
amim de níquel. Qual é a cor?

Figura 19 - Foto do tubo 1 após a adição de amônia.

T.85’ - AL1: rosa


T.86’ - AL2: lilás
T.87’ – Ad: Eu quero que vocês escrevam a constante de formação do complexo. A partir
deste exemplo, vocês conseguem fazer todos os outros.

102
Figura 20 - Foto do início da explicação sobre a constante de formação dos complexos
de Ni2+.

T.88’ - AL1: é a mesma coisa de Kc?


T.89’ – Ad: é a mesma coisa. É uma expressão de constante de equilíbrio, igual
mostramos anteriormente.
T.90’ - AL6: e como vai substituir as concentrações?
T.91’ – Ad: se for lhe fornecido valores de concentração é só você substituir.
T.92’ - AL1: aqui, produto sob reagente.
T.93’ – Ad: quando eu pergunto para vocês, desses três ligantes (amônia, etileno diamin
e dimetilglioxima) qual tem a maior constante de formação
T.94’ - AL3: o primeiro
T.95’ – Ad: a amônia não é. E quando você coloca etilenodiamina na amônia?
T.96’ - AL3: todos eles tiveram alteração de cor instantaneamente.
T.97’ – Ad: você colocou amônia onde tinha o DMG? O item 5?
T.98’ - AL2: não reage
T.99’ – Ad: então não teve alteração de cor.

Figura 21 - Foto do tubo 5 após a adição de DMG e NH3 em sequência.

T.100’ - A2: não reage, tem uma primeira parte que muda, mas não reage, para formar
o ...
T.101’ – Ad: então, a parte mais importante aqui e ver qual é o ligante mais forte. A gente
já sabe que a amônia não é.
T.102’ – AL1: eu acho que é o DMG
T.103’ - AL2: eu também acho
T.104’ - Ad: Vejam aqui, vou fazer menos diluído. O que nós tínhamos antes era
dimetilglioxima vermelhinho eu coloquei amônia e não aconteceu nada. Vejam o quanto
essa esta reação e exotérmica?
T.105’ - AL3: rompimento de ligação
T.106’ – Ad: rompimento e formação de novas ligação. Então, qual dos 3 ligantes é mais
forte:
T.107’ - AL6: DMG
T.108’ - AL2: etileno diamino
T.109’ – Ad: vejam! Vou adicionar etilenodiamina aqui.
T.110’ - AL2: não aconteceu nada.

103
T.111’ – Ad: agora vou pegar o que tem DMG e adicionar o etilenodiamina. Então, este
daqui ficou mais parecido com o que tem etilenodiamina. A constante de formação entre
o níquel e o etilenodiamina é maior do que o níquel e o DMG.

Figura 22 - Foto do tubo 7 após a adição de DMG e etileno diamino em sequência.

T.112’ - AL2: ah! É bidentado. Então a constante de formação dele é muito mais rápida!
T.113’ – Ad: por causa de qual efeito?
T.114’ - AL2: efeito quelante
T.115’ – Ad: efeito quelato. Você já viu complexo...
T.116’ - AL2: sim, já fiz inorgânica.
T.117’ – Ad: mas eu posso usar o (en) que é a sigla do etilenodiamina. É só substituir o
cobalto pelo níquel. Pessoas, lavam os tubos de ensaio e guardem os resíduos aqui.
T.118’ - AL7: o experimento.
T. 119’ - Ad: pessoal, resumindo a aula de hoje. Nos lemos sobre os bandeirantes que
vieram para o Estado de Goiás. O ouro como era retirado antigamente da terra?
Extraído
T.120’ - AL3: mercúrio
T. 121’ – Ad: não, isto acontece no final. Já ouviram falam em um instrumento chamado
bateia?
T.122’ - AL3: parece um prato, uma cuia, côncavo e você coloca cascalho dentro dele,
bate a água.
T.123’ - AL1: igual uma peneira?
T.124’ – Ad: vocês viram que tem um triangulo aí. O aspecto teórico seria o que? As
constantes de formação. O fenomenológico é você falar além do fenômeno, falar do
resto, do que representa socialmente, eu sugeri para falar do níquel. E o representacional
é o que o AL3 está fazendo no quadro. Ele fez para o etilenodiamino e vocês fazem para
o DMG. Aqui eu tinha 6 ligantes, e o níquel está com 3 ligantes, e este daqui é chamado
de etilenodiamina. Por que que aqui eu tinha 6 ligantes e aqui eu tenho apenas 3? Sendo
que aqui eu tinha 6 e continuei com 6 (na reação acima)

Figura 23 – Foto da lousa quando da discussão sobre o aspecto representacional do


conhecimento químico sobre o efeito quelato.

104
T.125’ - AL2: é porque ele é bidentado
T. 126’ – Ad: o etilenodiamina ele é bidentado, e é o seguinte, uma molécula que pode
fazer duas ligações. O etilenodiamina é assim H2N-(CH2)2-NH2
T. 127’ - AL7: Ah! O EDTA é hexadentado.
T. 128’ – Ad: Gente e quando um composto forma algo assim, diz que formou um quelato.
Quelato vem de caranguejo, tem uma expressão lá, que é garra mesmo!
Feito isto, até sexta feira que vem.

Nos turnos 80 a 101, do extrato 7, têm-se os discursos produzidos pelos/as


alunos/as da disciplina de núcleo livre, e nos turnos 81’ a 128’, do extrato 10, têm-se
os discursos produzidos pelos/as alunos/as de licenciatura sobre experimentos
idênticos, quais sejam, a formação em etapas de complexos de Ni (II). Em ambos os
casos, trata-se de discursos de natureza científica com o objetivo de apresentar e
conceito de formação de complexos. Para Machado (2004), o discurso químico, como
qualquer outra forma (ou gênero) de discurso, é constituído por enunciações e é de
natureza social.
a enunciação é o produto da interação de dois indivíduos socialmente organizados
e, mesmo que não haja uma interlocução real, este pode ser substituído pelo
representante médio do grupo social ao qual pertence o locutor. A palavra dirige-se
a um interlocutor: ela é função da pessoa desse interlocutor: variará se se tratar de
uma pessoa do mesmo grupo social ou não [...] (BAKHTIN, 2006 p.116).

Dessa maneira, espera-se que as palavras (conceitos químicos) mediadas por


Ad sejam mais facilmente abstraídos pelos indivíduos (alunos/as) pertencentes ao
grupo social de Ad, ou seja, alunas/os dos cursos de licenciatura ou aqueles/as que já
estudaram química em nível superior, alunas/os do bacharelado e da engenharia
química, por exemplo. Isso não significa dizer que, os/as alunos/as não pertencentes a
esse grupo social, não possam entender os aspectos do mundo, cultura afro-brasileira,
por exemplo, a partir de conhecimentos químicos.
O conhecimento químico se estrutura e estabelece mediante relações
complexas e dinâmicas que envolvem um tripé bastante específico, em seus três eixos
constitutivos fundamentais: as transformações químicas, os materiais e suas
propriedades e os modelos explicativos, Brasil (2002).
Nos turnos 83 e 84’ quando Ad pede para que os SI observem e anotem os
aspectos sensoriais, nesse caso a cor, que os alunos estão observando, ele está
atentando para os aspectos fenomenológicos do conhecimento químico. Segundo
Machado (2004), os aspectos fenomenológicos

105
[...] do conhecimento químico incluem a dimensão macroscópica considerada por
Jonhstone. Tópicos do conhecimento passíveis de visualização concreta, bem como
de análise ou determinação das propriedades dos materiais e de suas transformações,
(MACHADO, 2004, p.164).

A cor também é referenciada nos turnos 85, 86, 87 e 93, do extrato 7 e 84’,
85’, 86’, e 99’ do extrato 10. Quando A4 responde as indagações feita por Ad no turno
84 e no turno 93 quando diz que essa coloração azul que ficou ai é característico desse
complexo aqui, (referindo-se ao complexo de [Ni(NH3)6]2+(aq), estes (A4 e Ad) estão
referindo-se a uma características intrínsecas, da maioria dos complexos de metais de
transição, que é a de serem coloridos. Ao explicar as cores dos compostos de
coordenação, estamos lidando com o fenômeno das cores complementares: “Se um
composto absorve a luz de uma cor, vemos o complemento dessa cor” (MIESSLER et
al, 2014, p.345-346).
Quando a luz branca (que contém um amplo espectro de todos os
comprimentos de ondas visíveis) passa através da solução contendo o complexo de
[Ni(NH3)6]2+(aq), este absorve a luz laranja e a cor observada é azul. Azul é o
complemento do laranja, portanto, o azul predomina visualmente quando a luz laranja
é subtraída do branco.

A cor do complexo depende basicamente da natureza do íon metálico, do


número de elétrons nos orbitais d, da disposição espacial dos ligantes em
torno do íon metálico (por exemplo, os isômeros geométricos podem
apresentar colorações diferentes) e da natureza dos ligantes (SOUZA,
2019).

A Figura 24 traz um esquema do espectro eletromagnético destacando a luz


visível.

106
Figura 24 - Espectro eletromagnético destacando a luz visível.
Fonte: Adaptado de Souza, 2019.

Nos turnos 94 a 100 do extrato 7 e nos turnos T.81’ a T.111’ do extrato 10 são
discutidos a intensidade do valor da constante de formação de um complexo a partir
da mudança de coloração ou não ao adicionar um ou outro ligante. As Figuras 18, 19,
21 e 22 são fotos dos experimentos realizados pelos/as alunos/as de licenciatura e a
figura 25 mostram a sequência de fotos após a adição de cada ligante pelos alunos/as
da disciplina de núcleo livre.

107
Figura 25 – Fotos das reações [Ni(H2O)6]2+ com os ligantes amônia, etilenodiamina e
dimetilglioxima. Fonte: Adaptado de (SILVA et al 2015).

Foi pedido para que os alunos escrevessem as equações que representasse


cada uma das reações, discutissem os conceitos de constante de formação de
complexos em solução e o efeito quelato a partir de observações macroscópicas.
Além do aspecto fenomenológico, já discutido nesse trabalho, o aspecto
teórico e o aspecto representacional também fazem parte do conhecimento químico.

O aspecto teórico relaciona-se a informações de natureza atômico-molecular,


envolvendo, portanto, explicações baseadas em modelos abstratos e que incluem
entidades não diretamente perceptíveis, como átomos, moléculas, íons, elétrons [...].
Os conteúdos químicos de natureza simbólica estão agrupados no aspecto
representacional, que compreende informações inerentes à linguagem química,
como fórmulas e equações químicas, representações dos modelos, gráficos e
equações matemáticas (MORTIMER et al, 2000, p.276).

Nossos resultados mostram que, quando se analisa os discursos produzidos


pelos SI a maioria deles consegue responder a essas questões. Para o primeiro
experimento, A5 escreveu a equação como mostrado no quadro da Figura 26.

108
Figura 26 – Nível representacional mostrado A5 para o experimento 1, da Figura 25.

Esse resultado mostra que A5 se apropriou do discurso do livro didático e da


comunidade de químicos (união Internacional da química pura e aplicada), pois este
escreve o estado de agregação de cada substância presente no meio reacional de
maneira sobrescrita como “(aq)”; “(l)”; o número de mol de cada substância é
representado corretamente como um multiplicador desta como o “6NH4OH(aq)” bem
como os índices que representa cada átomo em cada substância.
Os nossos dados mostram ainda que A5 consegue implicitamente fazer
menção a dois dos três aspectos do conhecimento químico, quais sejam o
representacional quando escreve a equação mostrada na captura de tela da Figura 27 e
quando se refere a coloração azul, como sendo uma característica macroscópica do
complexo de [Ni(NH3)6]2+ (aq), (Figura 25), como já discutido nesse trabalho.

Figura 27 – Descrição do aspecto fenomenológico mostrado A5 para o experimento 1, da Figura 25.

A2 também descreve a equação que representa a reação ocorrida no


experimento 1, fala da coloração e acrescenta uma observação a mais quanto ao
aspecto fenomenológico, a liberação de calor. A Figura 28 mostra uma captura de tela
da resposta dada por A2.

Figura 28 – Nível fenomenológico mostrado por A2 para o experimento 1, da Figura 25.

A liberação de calor colocado nas enunciações de A2 deve ser entendida como


um aumento de temperatura que foi percebida através do tato desta com o tubo de

109
ensaio, “pois calor é uma quantidade algébrica e é proporcional a massa de água que,
nas vizinhanças, aumenta de 1 grau a temperatura, começando numa temperatura e sob
uma pressão especificadas”, (CASTELLAN, 2008, p.108). Sobre essa confusão no
discurso de A2 entre os conceitos de calor e temperatura que, mesmo uma aluna de
curso superior ainda faz, esse mesmo autor, nos alerta que

[...] que se um sistema está mais quente, isto é, está a uma temperatura mais alta
depois que alguma transformação ocorreu, não significa que ele tenha mais “calor”
ele poderia ter igualmente mais “trabalho”. Na verdade, o sistema não tem nem
“calor” nem “trabalho”; esse uso desses termos deve ser evitado a todo custo,
(CASTELLAN, 2008, p.109).

O aquecimento, elevação da temperatura, também é mencionado por A5


quando este descreve sobre os fenômenos observados no experimento dois: quanto
mais se adicionava o reagente, mais a solução aquecia. Reação exotérmica. Mas antes
do aluno escrever essas palavras ele sugere que esse aquecimento é devido a uma
adição cada vez maior de um ligante mais forte devido o mesmo ser bidentado.
Novamente nota-se a presença do discurso do outro nas enunciações de A5.
Neste discurso o aluno (A5) quis dizer que o ligante amônia (NH3),
monodentado, possui apenas um ponto de ligação (o par de elétrons livre do
nitrogênio) ao átomo metálico, enquanto que o ligante etilenodiamina
(2HNCH2CH2NH2)19, bidentado, possui dois pontos de ligação (os dois pares de
elétrons livre dos átomos de nitrogênio) ao átomo central. E quando se compara os
valores das constantes de formação dos complexos de [Ni(NH3)6]2+(aq) e de [Ni(en)3]2+
(aq) a do segundo é maior. Daí o porquê das enunciações de A5 “um ligante mais forte
devido o mesmo ser bi-dentado”. Esses resultados mostram que o aluno está trazendo
mais um aspecto do conhecimento químico apontado num dos vértices do triângulo de
(MORTIMER, 2000, p.276), qual seja, o teórico. A captura de tela da Figura 29 mostra
a resposta dada por A5 para o experimento 2. Este traz aspectos fenomenológicos e
teóricos do conhecimento químico.

19 Abreviado por (en).

110
Figura 29 – Captura de tela da reposta de A5 para o experimento 2, níveis fenomenológicos e teórico
do conhecimento químico.

Novamente este aluno mostra que ele traz consigo vários discursos e que estes
foram apropriados de outros discursos adquiridos no decorrer de sua formação inicial
em química. Isso equivale a dizer que todo discurso é atravessado, habitado pelo
discurso do outro e, por essa razão, ele é constitutivamente heterogêneo, (BORGES,
2012, p.159).
Para a comparação entre a magnitude (maior ou menor) dos valores das
constantes de formação entre os ligantes (amônia & etilenodiamina) e (amônia &
dimetilglioxima) foi pedido para que os alunos adicionassem amônia nos tubos 2 e 3 e
etilenodiamina no tubo 1 (experimento 4). As fotos 5, 6 e 7 da Figura 25 mostram os
tubos após esses experimentos. Nossos resultados mostram que mais uma vez os
alunos evocaram aspectos fenomenológicos do conhecimento químico, no entanto os
aspectos teóricos ficaram incompletos. A captura de tela da Figura 30 mostra a resposta
dada por A16 para o experimento quatro.

Figura 30 – Captura de tela da resposta de A16 para o experimento 4, níveis fenomenológicos e


teórico do conhecimento químico são mostrados.

Quando o A16 escreve que a constante de formação do complexo de hexamin-


niquel (II) é menor do que as constantes de formação dos complexos de etileno diamin-
níquel II, tem outro conceito envolvido, qual seja, o efeito quelato.

111
Esse conceito foi discutido, também, com os/as alunos de licenciatura nos
turnos T.108 a T.117 e T.124’ a T.128’. Em T.128’ Ad afirma: [...] quando um
composto forma algo assim, diz-se que formou um quelato. Quelato vem de
caranguejo, tem uma expressão lá, que é garra mesmo!
De fato, segundo Miessler, Fischer e Tarr (2014),

Aqueles com dois ou mais pontos de fixação para átomos metálicos são
chamados de ligantes quelantes, e seus compostos e seus compostos são
chamados quelatos, um nome derivado do grego khele, que significa garra
de caranguejo. Os ligantes como a amônia são monodentados, como um
ponto de fixação (literalmente “um dente”). Os ligantes são descritos como
bidentados se tiverem dois pontos de fixação como a etilenodiamina
(NH2CH2CH2NH2), que pode ligar-se aos metais através de dois átomos de
nitrogênio (p.312).

O efeito quelato é a maior estabilidade de um complexo contendo um ligante


poli-dentado coordenado comparado com um complexo contendo o número
equivalente de ligantes monodentado análogos.
Este pode ser compreendido a partir das observações (aspectos
fenomenológicos do conhecimento químico) trazidas nas enunciações de A16 (“nada
acontece” ou “a solução torna-se rósea”) e nas fotos 5 e 6 e da Figura 25 e tubo 2 da
Figuras 18 a e b. A Figura 31 é uma captura de tela da resposta dada por AL2 para esse
experimento.

112
Figura 31 - Captura de tela da resposta de AL2 para a reação entre o aquocomplexo de níquel e o ligante
(en)

Nota-se na resposta da aluna do curso de licenciatura os três aspectos do


conhecimento químico envolvido no experimento.
Quando se adiciona etilenodiamina ao tubo 1 observa-se que o produto
formado possui as mesmas características do produto contido no tubo 2 da foto 3.
Quando se adiciona NH3 ao tubo 2, nada acontece. Concluí-se Kf [Ni(en)3]2+ > Kf
[Ni(NH3)6]2+. Nesse caso diz-se que o [Ni(en)3]2+ é um complexo quelato. Segundo
(Barros 1992, p.312-313), complexos quelatos são mais estáveis com relação à
dissociação do que aqueles com ligantes monodentados semelhantes. As equações (VI)
a (VIII) trazem os valores de Kf para as reações estudadas com os ligantes amônia e
etilenodiamina.

[Ni(H2O)6]2+(aq) + 6(NH3)(aq) → [Ni(NH3)6]2+(aq) + 6 H2O (l) Kf = 4x108 VI


[Ni(H2O)6]2+(aq) + 3 en(aq) → [Ni(en)3] 2+
(aq) + 6 H2O (l) Kf = 2X10 18
VII
[Ni(NH3)6]2+(aq) + 3 en(aq) → [Ni(en)3]2+(aq) + 6 (NH3)(aq) Kf = 5 X109 VIII

113
Os discursos produzidos para a comparação dos valores de Kf dos complexos
de hexamin-niquel (II) e do dimetilglioximato de níquel II (foto7, figura 25) e tubos 3
e 5 das figuras 18 a e b também vão à linha das explicações sobretudo em relação ao
aspecto fenomenológico do conhecimento químico. A Figura 32 é uma captura de tela
da resposta dada por AL2 sobre essa questão.

Figura 32 – Captura de tela da resposta de Al2 sobre a reação entre aquocomplexo de níquel e o ligante
(DMG).

Outros aspectos que não se limitam àqueles que podem ser observados em
laboratório, também estão incluídos no aspecto fenomenológico do conhecimento
químico.

[...] falar sobre o supermercado, sobre o posto de gasolina é, também, uma


recorrência fenomenológica. Neste caso o fenômeno está materializado na atividade
social. E é isso que vai dar significado para a Química do ponto de vista do aluno.
São as relações sociais que ele estabelece através da Química que mostram que a
Química está na sociedade, no ambiente (MORTIMER apud MACHADO, 2004
p.164).

114
E é por isso que defendemos que ao falar da produção mineral de uma
determinada região do nosso estado, e que essa produção surgiu a partir de mãos de
obras especializadas e escravizadas de nossos ancestrais e que aqui ressignificaram
uma cultura trazida de África, qual seja, as Congadas, estamos dando um novo
significado para o aluno que estuda química em nível superior.
Nos turnos 119’ a 123’ Ad fala de um instrumento, legado, africano quando
do período do ciclo do ouro e até hoje utilizado em alguns garimpos manuais de ouro
no Brasil, qual seja, a bateia. Inicialmente produzida de madeira:

“A bateia é um prato cônico aberto, na maioria das vezes com uma


pequena depressão central. A bateia foi amplamente utilizada no centro-sul
da América por séculos, antes que das corridas do ouro da América do
Norte ocorrer e a bateia deveria ter se precipitado imediatamente para o
norte, mas isto não ocorreu. O bateia foi feita, inicialmente, transformando
e esculpindo a madeira para produzir um prato grande, ligeiramente cônico
de paredes de madeira espessas, capaz de flutuar ou de pelo menos possuir
flutuabilidade neutra. Mais tarde, um aperfeiçoamento parcial para uma
bateia de parede fina feita de metal ocorreu, permitindo que a bateia de liga
metálica fosse aquecida para cozer e expulsar o mercúrio da mistura
(amalgama) para deixar ouro. (SILVA, 2013, p.101).

A Figura 33 apresenta duas imagens que são fruto de estudo classificatório


delas pelo geólogo Robin Grayson, essas imagens pertencem a acervos museológicos
(SILVA, 2013 p. 104).

Figura 33 – Imagens de bateias.


Fonte: Adaptado de (Silva, 2013 p. 104).

Nossos resultados mostram que a ação mediada no ensino de química pode


utilizar contexto particular sobre a fundação da Capitania de Goyaz, atuais estados de
Goiás e Tocantins, o emprego da mão de obra africana escravizada e especializada no
garimpo de ouro e a cultura mantida pelos povos que fundaram o Arraial de Traíras

115
atual cidade de Niquelândia. Ou seja, os processos de mediação consideraram as
especificidades do sujeito em sala de aula e ainda seus fatores de constituição de
identidade
Nossos resultados ainda permitem dizer que quando professores negros/as se
sentem convocados por sua condição racial (construção social, histórica e econômica
num país colonizado) temos de fato a representatividade em ação. Ademais, o autor
dessa tese, como já descrito na introdução desse manuscrito, é nascido em Niquelândia
e cursou sua graduação, mestrado e agora doutorado na IES onde não se viu
contemplado no currículo em ação e na realização desta pesquisa teve a oportunidade
de exercer a representatividade quando assumiu a regência compartilhada de duas
disciplinas de ERER e assim pôde estabelecer diálogos sobre quem se é e, para quem
se ensina, assim democratizando o ensino de química.
No tópico 3.3 serão tratados e analisados os resultados obtidos relativos aos
itens das ementas de NL e DO imtitulados “A química do dendê e a sua importância
nas religiões de matriz africana e na culinária afro-brasileira”.

116
3.3 A QUÍMICA DO DENDÊ E A SUA IMPORTÂNCIA NAS RELIGIÕES DE
MATRIZ AFRICANA E NA CULINÁRIA AFRO-BRASILEIRA20
Nesta proposta utilizamos uma determinada marca de azeite de dendê
comercial, escolhida de forma aleatório como elemento contextual da ação mediada
no ensino de conceitos de ácidos graxos, sistemas heterogêneos, densidade,
viscosidade e técnicas de análise de absorção na região do infravermelho.
O dendezeiro (Elaeis guineensis) é uma palmeira de origem africana que se
que se desenvolve em clima quente e úmido, que foi trazida para o Brasil na época do
tráfico negreiro aproximadamente no século XV, (Valois, 1997). Segundo
Vainsencher, (2009) os egípcios, há mais de 5.000 anos, já consumiam o óleo de
dendê. Desde o século XV, o dendezeiro consta dos relatos dos primeiros visitantes
europeus à África, como parte integrante da paisagem, dos hábitos e da cultura popular.
Lá essa planta recebeu uma série de denominações, tais como abobobe, kisside, ade-
quoi, dendem, ou andim (disponível em http://basilio.fundaj.gov.br/ ).
O quadro 12 mostra o plano simplificado da aula e oo quadro 13 mostra o
procedimento experimental.

Quadro 12 - Estudo da importância e a química do e no dendê.


Tema Conteúdo/Abordagem Contextualização/Abordagem Cultural.
Conceitual
A química do A pluralidade do dendê na manutenção da cultura africana
dendê e a sua ressignificada aqui do outro lado do Atlântico Sul.
importância Ácidos graxos, medidas
nas religiões de densidade e
de matriz viscosidade; síntese de
africana e na um biocombustível
culinária afro-
brasileira
Estratégia de ensino:
1º - Divisão dos capítulos do livro Tem dendê tem axé entre a turma de NL e posterior discussão em
sala de aula
2º - Discussão do artigo TEM DENDÊ, TEM AXÉ, TEM QUÍMICA: Sobre história e cultura africana
e afro-brasileira no ensino de química
3º - Realização dos experimentos: Discussão sobre as interações ocorridas num sistema heterogêneo
água/dendê; medidas da densidade e viscosidade do azeite de dendê.

20
Este subcapítulo originou da proposta de implementação da lei 10.639 feita pelo nosso grupo de
pesquisa, incluindo PQ, Ad e Am1) publicada na seção “Espaço Aberto” da Revista QNesc no artigo
denominado “TEM DENDÊ, TEM AXÉ, TEM QUÍMICA: Sobre história e cultura africana e afro-
brasileira no ensino de química” na Revista Química Nova na Escola, v. 39, p. 19-26, 2017, assim optou-
se pelo título mais específico, em questão.

117
Quadro 13 - Procedimento experimental- Roteiro da Prática das medidas
de densidade e viscosidade do azeite de dendê.

Materiais e Materiais: Funill de separação, picnômetro, viscosímetro de Ostwald,


Reagentes. termômetro, chapa elétrica, provetas, béqueres.
Reagentes: Óleo de dendê comercial, óleo de fritura, hidróxido de sódio, etanol
Etapas do procedimento
Discussão sobre as interações ocorridas num sistema heterogêneo água/dendê
1) Medir iguais quantidade do azeite de dendê e água
2) Adicionar essas duas substâncis em funil de separação, agitar, deixar decantar e observar
3) Fazer a discussão apartir da pergunta: por que a água e o azeite não se misturam (Foto da
Figura 39)

Determinação da densidade do azeite de dendê:


1) Medir a massa do picnômetro vazio (m1)
2) Medir a massa do picnômetro cheio com o azeite de dendê (m2)
3) Medir a massa do picnômetro cheio de água destilada (m3) (Figura 41)
Determinação da viscosidade do azeite
1) Colocar no viscosímetro limpo e seco, com uma proveta e através do tubo de maior
diâmetro, uma quantidade de água destilada tal que, quando esta vier ocupar o volume
delimitado pelas marcas m e n do bulbo B, tenha a sua superfície no terço inferior do bulbo
A ( isso equivale aproximadamente a 10ml)
2) Adaptar ao braço do viscosímetro de menor diâmetro uma pêra de borracha e aspirar
lentamente com o auxílio desta o líquido até a metade do bulbo C.
3) Desconectar a seringa do tubo de modo a permitir o escoamento livre do líquido.
4) Marcar o tempo gasto para o menisco superior passar sucessivamente pelas duas marcas de
calibração m e n. . Fazer três determinações deste tempo.
5) Repetir, no mesmo viscosímetro, depois de limpo e seco, o procedimento acima, usando,
agora, o azeite de dendê, tendo o cuidado de empregar um volume igual ao da água.
6) Anotar a densidade da água e do azeite de dendê, a temperatura da experiência, obtidas em
tabelas ou determinadas no experimento anterior, se as temperaturas coincidirem.

Figura 34 – Foto do viscosímetro com as respectivas marcas citadas no procedimento.

118
O extrato 11 apresentas os discursos produzidos pelos/as alunos da
disciplina de NL sobre as diversas utilidades do dendê.

Extrato 11 – Sobre as diversas utilidades do dendezeiro

T.15-Ad: hoje nós vamos começar a discussão de outro elemento africano que é o dendê.
Ele é derivado da África ocidental e veio para o Brasil juntamente com os negros que
para cá vieram para serem escravizados. Há relatos que ele veio como alimentação dos
futuros escravizados/as nos navios negreiros,[...] e pelo fato do solo do litoral brasileiro
ser parecido com o solo da costa ocidental da África, a cultura dele se deu bem aqui [...].
T.16-Ad: o que vocês leram no livro, na internet, ou que já sabiam sobre o dendê?
T.17-A14: ele é utilizado na culinária, principalmente na culinária baiana, na indústria
para produção de bronzeador, produção de margarina.
T.18-Ad : e, também, na produção de biodiesel, o chamado biodendê.
T.42-A12: [...] o dendê também é muito ligado e associado as religiões e aos diferentes
cultos, do exu [...]...
T.43-A6: eu achei muito interessante uma parte que fala assim, que o dendê, entre
outras coisas lá, é como se ele deixasse o homem e a natureza em um mesmo
ecossistema [...] eu achei muito interessante.
T.47-A14: E como se eles fossem um só, sabe? O exu, o homem e o dendê. [...] o
dendê é como se fosse o sangue do exu, e a secreção dele reprodutiva e o homem aí
ficam tudo entrelaçado, entendeu, como se eles fossem um só.
T.48-Am1: Um equilíbrio?
T.49-A14: É, como se formasse o ecossistema, e de qualquer forma eles já formam
né? Mas como se fosse só aquilo pra ele, entendeu?
T.53 A9:[...] o dendê chegou ao Brasil através da África e começou a ser plantado no
litoral. [...] o dendê, dentro do Candomblé,não é usado só, porque as vezes a gente pensa
principalmente ligado a comida e religião. [...] o dendê dentro do terreiro vai ter muito
mais significado, ele vai ser usado na fabricação de pérolas, para a fabricação, pelo o
que eu entendi, de um tamboretinho, para limpar peças e também na culinária.
T.55-A9: [...] e fala do Exu, que para a gente às vezes é passado a imagem só da
parte mais diabólica deles, e no livro fala meio que, ele tem duas faces, que ora ele
é diabólico, ora ele é companheiro.
T.58-A14: E as pessoas brancas que queriam fazer parte do candomblé, mas tinha
preconceito, os brancos tinham preconceito com o candomblé por que para eles o
Exu era o diabo, por que os negros ficavam usando a figura dele pra poder conseguir
os seus ideais, eles tinham a simpatia pela a religião, mas eles não queriam usar o
dendê, por que para eles estavam ligado ao diabo, então na religião que eles se
constituíram que o povo branco, eles usavam o azeite doce pra não ter nenhuma
ligação com o dendê além de usarem roupas claras mais ai eles também tinham duas
divisão, que era o quente que usava o dendê e o que era o frio, que também eu acho
que eles não usavam o dendê.
T.59-Ad: É isso mesmo, o dendê meio que faz uma divisão nas religiões de matriz
africana, o povo que usa o dendê e o povo que não usa o dendê.

Nos turnos T.15 e T.53, Ad e A9 discutem a origem do dendê. O


dendezeiro (Elaeis guineensis) é uma palmeira de origem africana que se que
se desenvolve em clima quente e úmido, que foi trazida para o Brasil na época
do tráfico negreiro no início do século XVII. E, ainda segundo as enunciações
de Ad, no T.15, “e pelo fato do solo do litoral brasileiro ser parecido com o
solo da costa ocidental da África, a cultura dele se deu bem aqui no Brasil”.

119
Isso deu margem a que a planta fosse estabelecida na costa
brasileira, desde o estado do Ceará até o Rio de Janeiro, tendo a
maior proporção se concentrado no estado da Bahia. Ao longo
desses séculos, a espécie se adaptou àquelas condições ecológicas,
transformando-se em dendê subespontâneo, com características
das mais importantes para o melhoramento genético do dendezeiro
(VALOIS, 1997).

Rico em provitamina A, substância precursora da vitamina A, o


caroteno, corante responsável pela coloração avermelhada do fruto e do azeite,
que possui 576 µg/g de trans-β- caroteno e 296 µg/g de trans-α-caroteno. Figura
35 (TRUJILLO-QUIJANO et al., 1990).

Figura 35 - Estrutura química do alfa e beta caroteno.


Fonte: adaptado de (TRUJILLO-QUIJANO et al., 1990).

Alguns estudos do início dos anos 2000, revelam que o azeite de dendê
tem sido utilizado como suplemento nutricional de vitamina A.

A suplementação com óleo vermelho de palma (dendê) melhorou


o estado nutricional em vitamina A de mulheres grávidas da
Tanzânia (Lietz et al., 2000) e de lactantes e lactentes da Índia
(Radhika et al., 2003) e de Honduras (Canfield e Kaminsky, 2000).
Esses últimos autores obtiveram um efeito positivo com o óleo de
dendê comparável ao observado com o β-caroteno purificado
(AMAYA et al, 2008, p.33-34).

Ainda sobre os benefícios da vitamina A, presente no dendê, Afrânio


Peixoto, (1980), relata:
[...] Um sábio de São Paulo que o estudou, o professor Cantído de
Moura Campos, ensinou-me que esse dendê é rico de Vitamina A,
que tanto interesse tem no crescimento, na saúde ocular, na
limpeza e maciez da pele, na perfeição dos dentes.

120
Não precisei de mais: do sábio passei à lembrança...Revi na
memória os belos negros altos da Bahia, os auçás...Os nagôs que,
mesmo velhos, tinham esplêndidos dentes fortes e alvos...Tomasia,
minha ama, que era, pra mim, uma bela giganta boa, que, ao sorrir,
era uma alvorada, e os olhos, uns quebrados olhos grandes que
viam além da gente, e a pele, tão gabada, de grã-fina, tão fresca,
que os “conhecedores”, de minha terra, não se cansam de gabar,
marfim negro sem brilho, mate, baço, fosco e fresco. (O fogo é
interno)
E, então concordei com a ciência que tudo isto atribui à Vitamina
A, do dendê... (PEIXOTO, 1980, p.81)

No T.53, A9 enuncia: “o dendê chegou ao Brasil através da África e


começou a ser plantado no litoral”, de fato, para Peixoto (1980),

Trazido da Costa d`´Africa, espalhou-se pela Costa da América, da Bahia


para o Norte, dando com exuberância seus fartos cachos negro-caboclos
que chegam a um metro de comprimento, a trinta quilos de peso, a
oitocentos cocos, às vezes (p.80)

Certamente não foram os escravizados/as que trouxeram o dendê


para esse lado do Atlântico Sul, quem fez isso foram os traficantes de pessoas,
que sem maiores dificuldades acrescentaram o dendenzeiro à paisagem natural
do Brasil, Edison Carneiro (1964).

Era natural que o plantassem primeiro na Bahia, então o grande centro


do comércio de negros. Na sua Notícia da Bahia (1759), José Antônio
Caldas informava que os navios negreiros, na ocasião frequentavam a
Costa da Mina para negociar “azeite de palmas”, além de escravos.
(CARNEIRO, 1967, p.73).

No T.16, Ad questiona aos/as alunos/as qual o discurso de outrem


eles/as trazem consigo, ou seja, o que eles/as já sabem sobre o dendê através
da bibliografia recomendada e das sugestões de leitura. Em T.17, A14 afirma
que além da culinária ele é usado “na indústria para produção de bronzeador,
produção de margarina”, e Ad completa em T.18 que o seu óleo é utilizado,
também, “na produção de biodiesel, o chamado biodendê”. E, de fato segundo
Vainsencher, (2016), do fruto do dendezeiro são extraídos dois tipos de óleo
por meio de processos físicos, pressão e calor: o de palma extraído da polpa
ou mesocarpo (palm oil no mercado internacional) e o óleo de palmiste (palm
kernel oil), extraído da semente do fruto.
O óleo de dendê devido a sua consistência e por não rancificar é
destinado à indústria alimentícia (fabricação de margarina, sorvete, biscoito,

121
leite e chocolate artificiais, óleo de cozinha, maionese, frituras industriais,
etc.), e o segundo é aplicado nas indústrias de cosméticos, sabões, velas,
produtos farmacêuticos, lubrificantes, biocombustível, dentre outras
(VALOIS apud SILVA, 2016, p.21).
Segundo Vainsencher (2009):

[...] o azeite de dendê é o segundo óleo mais produzido e


consumido no país, representando 18,49% do consumo
mundial. Se o plantio do dendezeiro for corretamente
conduzido, a produção de óleo ocorre no final do terceiro
ano, com uma colheita de seis a oito toneladas de Cachos,
por hectare. A palmeira atinge seu pique máximo no oitavo
ano, quando chega a produzir vinte e cinco toneladas de
cacho por hectare, permanecendo nesse nível até o 17º ano,
e declinando, um pouco, até o final de sua vida útil
produtiva, que tem lugar por volta de 25 anos, (p.3).

O consumo do azeite de dendê, como insumo no setor industrial na


fabricação dentre outros, de sabão, sabonete, margarina, maionese, conservas
e rações, lubrificantes, tintas, bem como na indústria oleoquímica, como
citados nas enunciações de Ad e A14, nos turnos T.16 a T.18, fez surgir um
mercado local e, consequentemente, o aumento da demanda pelo produto, que
foi responsável pela expansão comercial do fruto. Desta forma, este
desempenhou e desempenha um papel muito importante na economia da
diáspora africana no Brasil (ROSA et al, 2011).

Em T.17, A14 afirma “ele é utilizado na culinária, principalmente na

culinária baiana.” Segundo Barros (1992), o dendê é amplamente utilizado na

culinária brasileira de matriz africana.

Grande parte de suas iguarias leva consigo o aroma exótico do azeite de


dendê, que seduz até os mais exigentes gastrônomos. O acarajé, o
caruru, a muqueca e o vatapá são apenas alguns dos pratos mais
populares, que trazem ao nosso paladar a deliciosa sensação de degustar
uma porção do Brasil com o sabor e o tempero da África. Quando
ingerimos os alimentos feitos com o óleo derivado do dendê, estamos
também, de alguma maneira, partilhando do fruto das culturas africanas
reinterpretadas em nosso país (Barros em Lody, 1992, p. VIII).

Isso faz com que o dendê tenha um papel de considerável relevância


na cultura afro-brasileira. Por exemplo, o acarajé, uma das iguarias mais

122
conhecidas preparada com o azeite de dendê, rendeu as mulheres especialistas
em sua preparação, as baianas do acarajé, o título de patrimônio imaterial
cultural brasileiro, concedido em 2005 pelo IPHAN. Segundo este órgão:

Este bem cultural de natureza imaterial, inscrito no Livro dos Saberes


em 2005, é uma prática tradicional de produção e venda, em tabuleiro,
das chamadas comidas de baiana, feitas com azeite de dendê e ligadas
ao culto dos orixás, amplamente disseminadas na cidade de Salvador,
Bahia. Dentre as comidas de baiana destaca-se o acarajé, bolinho de
feijão fradinho preparado de maneira artesanal, na qual o feijão é moído
em um pilão de pedra (pedra de acarajé), temperado e posteriormente
frito no azeite de dendê fervente. Sua receita tem origens no Golfo do
Benim, na África Ocidental, tendo sido trazida para o Brasil com a
vinda de escravos dessa região (IPHAN, 2005).

Nos discursos de A6, Am1 e A14 nos turnos T.43, T.48 e T.49,
respectivamente, aparecem enunciações com referências a um equilíbrio entre a
natureza e o dendê. Sobre essa assertiva, Lody (1992), afirma que

[...] para a visualidade, o imaginário e a comunicabilidade do que é afro,


assume o dendê um signo plástico, imediatamente decodificado em
situações de ordem gastronômica, artesanal, tecnológica – que vão do
preparo do azeite à feitura de implementos rituais religiosos com o uso de
folhas, talos e frutos – revertendo num aproveitamento integral do
dendenzeiro (p.1)

A Figura 36 apresenta um diagrama simplificado desse “equilíbrio”, no


imaginário afro, entre a natureza e o dendenzeiro.

123
Figura 36 - Diagrama de extração do azeite de dendê, seu uso e o seu equilíbrio com a natureza.
Fonte: Adaptado de Lody (1992), p.6.

Do diagrama apresentado na Figura 36 pode se inferir que do


dendenzeiro, retirado da natureza, é extraído o seu óleo (azeite) por meio de
processos físicos, pressão e calor, que pode ser artesanal ou industrial. Este é
destinado, como já descrito nesse trabalho, à indústria alimentícia (fabricação
de margarina, sorvete, biscoito, leite, chocolate artificiais, óleo de cozinha,
maionese, frituras industriais etc.), e o segundo é aplicado nas indústrias de
cosméticos, sabões, velas, produtos farmacêuticos, lubrificantes,
biocombustível, dentre outras.
Porém não são apenas os homens que se alimentam e fazem uso do de
dendê

Na realidade, é na preparação dos quitutes das mesas dos


deuses africanos que constatamos a necessária utilização
do dendê, juntamente com as favas e frutos de origem
africana, importantes na realização dos alimentos rituais,
garantindo assim sua eficácia e destinação cultual (Lody,
1992, p. 61).

O acarajé, por exemplo, está presente na cozinha dos orixás: Iansã,


Xangô, Obá, Euá e Oxumaré. O Amalá é o prato principal do Orixá Xangô e

124
nele o azeite de dendê está presente. Já Oxum prefere o Ipeté. “Esta cerimônia
é caracterizada pelas filhas-de-santo portando, na cabeça, panelas contendo o
peté, que será servido aos assistentes” (LODY, 1992, p.62). Ainda tem o Bobó,
o Omolocum, o Erã-peterê e as Farofas, comida dos Voduns, Oxum,
divindades de cunho masculino e Exu respectivamente.
O azeite pode, também, ser usado em rituais religiosos. Para isso, é
retido nos implementos sagrados para ser usado na limpeza dos terreiros, em
ébos e outras formas litúrgicas. Em seguida é depositado em diferentes
espaços externos (cursos hídricos, áreas de solos expostos, terrenkos com
locais elevados e outros) e daí é retornado para a natureza para iniciar o seu
ciclo novamente.
Nos turnos 42, 47, 53 e 55 os SI fazem referência ao uso do dendê na
religião do Candomblé, ligado ao Orixá Exu. Esse é um dos mais polêmicos
dos orixás, ora diabólico, ora companheiro inseparável dos homens e de outros
órixas.
Exu encarna um amplo sentido telúrico africano que é igual,
padrão, geral e por isto indivisível. Relação não menos indivisível
é a do homem africano e o dendê e por Exu não ser apenas um
componente deste homem africano, e, assim um ideal do ser
africano no Brasil é, sem dúvida, um agente do dendê, como o
dendê passa a ser Exu, sem que com isto se limite o uso ou a função
ritual-religiosa do dendê para a exclusividade de Exu, tanto para o
seu trato nos assentamentos, como nos seus alimentos (LODY,
1992, p.9).

Nos turnos 58 e 59 A14 e Ad discutem a não utilização do dendê, por


todos os orixás. De fato, nem todos os orixás se alimentam com iguarias
preparadas com o dendê. Os Orixás funfun, os deuses que se vestem de branco
(como é o caso de Oxalá) não utilizam o dendê em seus cultos. Segundo Lody,
(1992) “os deuses quentes são aqueles que incluem o dendê nos seus axés; os
deuses frios, deuses do pano branco -Funfun – não o fazem” (p. 57). Estas
categorias servem para orientar e, também, caracterizar os papéis e as funções
dos orixás nos terreiros. Dessa maneira o dendê representa uma divisão no
mundo dos orixás, os que usam e os que não usam o dendê.
Além disso, existe química no dendê e os alunos do curso de
Licenciatura (DO) discutiram “algumas dessas químicas” nos dias 08 e 15/07
de 2016. O extrato 12 traz esses discursos.

125
Extrato 12 – A química do e no dendê.
T.162-Ad: as principais composições de ácidos graxos são encontradas em gorduras
animais e óleos vegetais, destacando-se o óleo de palma, que é o dendê, como um dos
óleos vegetais que possui elevado teor de ácidos graxos. Então, a partir de um elemento
da diáspora, no caso o dendê, é possível discutir o conceito de ácidos graxos, suas
estruturas, nomenclatura, classificação e propriedades físicas.
T.163-Am2: na forma de triglicerídeos e não na forma de ácidos graxos
T.164-Ad: e como vocês discutiriam isto no ensino médio? Na nomenclatura por exemplo
T.166-Ad: A partir dos dados da Tabela 1 . Por que a água e o azeite não se misturam?
Por que a diferença nos pontos de fusão dos ácidos saturados e insaturados? (A tabela
citada continha os seguintes ácidos: mirístico, palmítico, esteárico, ácido oleico e
linoleico com os seus respectivos pontos de fusão.
T.167-Ad: e aí AL3?
T.168-AL3: porque a água é um elemento polar e o dendê provavelmente apolar. [...]
não é atrativo para a molécula do dendê fazer uma ligação com a molécula da água.
Então, a ligação dendê-dendê é mais forte do que ligação dendê-água, mesmo que tenha
essas partes aí polares.
T.169-Ad: e se eu estivesse falando de forças intermoleculares?
T.170-AL3: é que forma um impedimento estérico.
T.171-Ad: não, não! Não é estérico.
T.172-Am2: faz uma ligação dipolo instantâneo.
T.173-Ad: E como como podemos determinar a densidade de uma substância? No caso
aqui do azeite de dendê.
T.174-AL3: massa sob volume?
T.175-Ad: mas e aí?
T.176- AL1: com experimentação?
T.177-Ad: sim. Se este giz fosse um cilindro de alumínio? (Ad mostra um giz). Como que
eu faria?
T.178-AL1: pesa, sei lá, coloca água, e veja deslocamento do volume.
T.182-AL1: a gente pode pesar vazio com uma vidraria cheia, e fazia a diferença e via a
variação da massa.
T.183-Ad: e isto é conhecido como o quê?
T.184-AL1: você teria massa e volume.
T.185-Ad: e a densidade do azeite de dendê, como vocês determinariam?
T.186-AL1: a gente comparava com a água
T.187-AL4: a água seria o padrão.
T.188-Ad: como?
T.189-AL1: primeiro eles não iriam se misturar, e não vai deslocar,
T.190-Ad: vocês já estudaram físico química?
T.191-todos: não.
T.195-Am2: usa uma massa conhecida
T.196-Ad: sim, sim! Mas como a gente faz para saber o volume dele?
T.197-AL1: primeiro, a gente coloca um líquido, pode ser a água e depois usava uma
vidraria que tem uma calibração boa
T.198-Ad: sim! Você quase acertou. Se eu coloco água, o que eu sei da água?
T.199-AL3: tem uma densidade conhecida.
T.200-AL1: eu pesaria vazio e depois pesaria cheio.
T.201-Ad: essa vidraria aqui é um picnômetro e é usada em medidas de densidade de
líquidos. Para calcular a densidade do azeite, faço a densidade relativa de acordo com
essa fórmula. [Ad mostra a fórmula no slide Figura 35]. Tenho a massa do azeite, a da
água e o volume do picnômetro, daí é só jogar os valores na fórmula.

126
Figura 37 - Captura de tela do slide apresentado por Ad durante a IP.
T.202-Am2: vamos fazer a lavagem do material e depois a gente começa daqui. E eu faço
a apresentação.
T.203-Ad: a gente faz a viscosidade e a caracterização. Vamos deixar a viscosidade para
a próxima aula
T.204-Am2: coloca num béquer, separado, e na próxima aula a gente discute.
T.205-Ad: na última aula, estávamos falando, qual é a parte da química que podemos
trabalhar com o dendê. e outra maneira, é em cálculo de viscosidade que deixamos para
hoje. Quem já fez físico-química?
T.206-AL2: eu
T.207-Ad: então, me ajuda. O que é viscosidade?
T.208-AL2: é em relação as forças, ligações intermoleculares. Quanto mais viscoso,
maiores são as ligações intermoleculares que um líquido tem.
T.209-Ad: AL3, mesmo você não tendo feito físico-química, quando fala viscosidade, o
quem vem a sua cabeça?
T.210-AL3: viscoso vem...
T.211-AL4: fluidez
T.212-AL3: você pode observar a diferença do óleo para a água, quanto a densidade,
bem eu acho que sim. A água flui com uma velocidade bem diferente do óleo, o óleo é
mais pesado ou algo do gênero.
T.213-Ad: é tudo isto que vocês falaram, resistência ao fluido. Quanto mais resistência
ao fluido o líquido possui, mais viscoso ele é. Claro, falando grosso modo. E faz sentido,
como a AL2 falou, eu não tinha pensado nisto ainda ... quanto mais interações ele tem,
você AL3 usou o exemplo da água e do óleo, o óleo tem a cadeia maior, com mais
ramificações e insaturações do que a água. A fórmula da viscosidade é essa. [Nesse
momento Ad mostra o slide da Figura 38].

Figura 38 – Captura de tela, slide com fórmula da viscosidade.

127
[...] São tantos parâmetros que, a não ser que o fabricante te dê tudo daquela fórmula
ali, torna-se difícil o cálculo da viscosidade direta. Por isto é calculado em relação a
viscosidade da água que já é conhecida. No nosso caso, seria a viscosidade do dendê em
relação a água.

Inicialmente parece existir uma confusão nos conceitos de ácidos graxos e


triglicerídeos nos turnos T.162 para Ad: “as principais composições de ácidos
graxos são encontradas [...]” e T.163 para Am2: “na forma de triglicerídeos e não
na forma de ácidos graxos”. Pertencentes a classe dos lipídeos, os óleos vegetais
[...] são triglicerídeos, ou tricialgliceróis (triésteres de glicerol com três cadeias
longas de ácido carboxílico chamado de ácidos graxos) (MCMURRY, 2012,
p.990). E são esses compostos aludidos por Ad e Am2 nos turnos T.162 e T.163
que estão presentes no azeite de dendê e que são citadas, como presente em uma
determinada tabela por Ad no T.166. A Tabela 1 mostra as estruturas de alguns
ácidos graxos comuns encontrado no coco de dendê e seus respectivos ponto de
fusão

Tabela 1 - Ácidos Graxos comuns encontrado no coco de dendê e seus


respectivos ponto de fusão. Fonte: (Silva et al, 2017, p.22).

128
Da Tabela 1, pode se entender que os ácidos saturados mirístico,
palmítico e esteárico possui ponto de fusão maior que os insaturados oleico e
linoleico. Essa diferença decorre de suas estruturas. Gorduras saturadas possuem
uma forma uniforme que permite que se agrupem eficientemente em uma rede
cristalina. Entretanto, nos óleos vegetais insaturados, as ligações duplas, carbono-
carbono (C=C) introduzem dobras e rugas nas cadeias de hidrocarboneto, fazendo
com que a formação de cristal seja mais difícil. “Quanto mais ligações duplas
houver, mais difícil será a cristalização das moléculas e mais baixo o ponto de
fusão do óleo“ (MCMURRY, 2012, p. 992). Portanto essa seria o discurso
resposta, esperado por Ad no turno T.166. Ad: “Por que a diferença nos pontos de
fusão dos ácidos saturados e insaturados? ”.
Ainda nesse turno existe ou questionamento de Ad: Por que a água e o
azeite não se misturam? Os discursos respostas a essa indagação ocorrem nos
turnos entre T.169 a T.173. No T.168, o aluno AL3, instigada por Ad, tenta
construir a sua resposta lançando mão de expressões como “polar e apolar” para
as moléculas dos constituintes do azeite de dendê e dá água, que o aluno mesmo
sendo dos semestres finais de um curso de licenciatura em química chamou
erroneamente de elemento.
Em que pese as moléculas dos constituintes do azeite de dendê possuir
uma parte polar como sugerido por Al3: “mesmo que tenha essas partes aí
polares” qual seja os grupos carboxilas, eles possuem, também, uma cadeia apolar
bem longa, que é a parte que predomina na molécula, o que explica a expressão “a
ligação dendê-dendê é mais forte do que ligação dendê-agua”, utilizada por Al3
no T.168.
No T.169 Ad sugere que a resposta seja em torno do conceito de forças
intermoleculares. O discurso aludido por Ad trata-se de forças químicas que, em
geral, são muito mais fracas que as ligações químicas covalentes e que podem ser
explicadas usando apenas argumentos de forças eletrostáticas. Essas forças são
utilizadas para explicar alguns fenômenos tais como: interpretação do estado físico
dos líquidos e sólidos moleculares, tensão superficial e viscosidade dos líquidos,
capacidade calorífica, arranjos cristalinos em sólidos, processo de adsorção em
superfície etc. (BENVENUTTI, 2011, p.143).

129
O impedimento estérico discutido por Ad e AL3 nos turnos T.170 e T.171
é um tipo de efeito estérico. Trata-se de repulsão entre nuvens eletrônicas de
átomos ou grupos quando da possibilidade da ocorrência ou não de uma reação
química. Segundo Solomons (2005)

Um efeito estérico é um efeito nas velocidades relativas provocado


pela propriedade de preenchimento de espaço daquelas partes de uma
molécula ligada ao sitio reagente ou próximo dele. Com isso queremos
dizer que o arranjo espacial dos átomos ou grupos no sítio reagente,
ou próximo dele, de uma molécula impede ou retarda uma reação
(SOLOMONS, 2005, p.243)

E como afirmado por Ad, não é o que ocorre. Ocorre, como afirmado por
Am2 em T.172, uma ligação do tipo dipolo instantâneo-dipolo induzido também
chamadas de forças de London ou forças de dispersão, essas interações podem
ocorrer entre quaisquer átomos ou moléculas, entretanto seus efeitos somente
podem ser observados em átomos ou moléculas que não apresentam momento
dipolar permanente, ou então, que apresentam um momento dipolar pequeno,
Benvenutti (2011, p.148) e, que nesse caso, é causado pelo grupo carboxila na
ponta da cadeia dos constituintes do azeite de dendê.
Então, mesmo sendo possível, teoricamente, uma interação do tipo
ligação de hidrogênio, que é mais forte do que as interações dipolo-dipolo
induzido, como sugerido por Ad no T.170, entre as moléculas de água e o grupo
carboxila presente nas moléculas dos constituintes do dendê, a atração entre as
moléculas de água é mais intensa. Portanto, apesar de as moléculas dos
constituintes do azeite de dendê, serem atraídas pelas moléculas de água, essa
força de atração é menor. Assim, as moléculas de água se atraem e se agrupam
com mais força e as moléculas dos constituintes do azeite não conseguem ficar
entre duas moléculas de água vizinhas.
Sobre a solubilidade dos ácidos carboxílicos, de fórmula R-CO2H, como
os presentes nos constituintes do azeite de dendê, Martins et al (2013) afirma que,

[...] são altamente associados no estado líquido, uma vez que, nesse
caso, as ligações de hidrogênio se formam no composto puro. Devido
à formação das ligações de hidrogênio também quando misturados à
água, as solubilidades dos ácidos de cadeia curta em água são altas.
Ácidos com até quatro átomos de carbono são miscíveis com a água
em qualquer proporção, enquanto que, para os ácidos de cadeia maior,

130
a solubilidade decresce devido ao fato da cadeia carbônica se tornar a
parte mais significativa da molécula. Assim, o ácido pentanóico
CH3(CH2)3CO2H apresenta uma solubilidade de 1g/30g de H 2O,
enquanto o ácido decanóico CH3(CH2)8CO2H apresenta uma
solubilidade de apenas 0,015 g/100 g de H2O (MARTINS et al, 2013
p. 1258).
A Figura 39 tráz uma sequência de fotos de um sistema heterogêneo
azeite de dendê e água.

Figura 39 - Fotos de sistemas heterogêneos de azeite de dendê e água.

A solubilidade dos constituintes do azeite em água bem como as


interações entre essas moléculas são propriedades química da matéria. A Figura
40 traz uma ilustração de como poderia ser representado, salvo melhor juízo, uma
interação entre as moléculas do azeite de dendê e a água.

Figura 40 - Ilustração das interações entre moléculas constituintes do dendê e moléculas de água.

Além dessas propriedades os materiais possuem, também, as


propriedades físicas que não envolvem uma interação de uma substância com
outra, como foi o último caso estudado. As propriedades físicas não envolvem
qualquer mudança na composição ou identidade da substância, isto é, são
propriedades que podem ser observadas e medidas sem modificação de sua
composição As propriedades físicas podem ser classificadas como extensivas ou
intensivas, conforme tratado por Castellan (1986 p.14-15).

131
As propriedades extensivas são diretamente proporcionais à quantidade
de matéria da substância presente da amostra, enquanto as intensivas independem
da quantidade de matéria. Temperatura (T), pressão (p), cor e densidade (d) são
propriedades intensivas, enquanto que, massa (m) e volume (V) são propriedades
extensivas, segundo nos ensina Castellan (1986 p.14-15).
É importante ressaltar que uma propriedade extensiva pode ser convertida
em uma propriedade intensiva de duas maneiras: 1) dividindo-se a propriedade
extensiva pela quantidade de matéria ou 2) dividindo-se por outra propriedade
extensiva - usualmente massa ou volume. Castellan (1986 p.14-15).
Nos enunciados representados pelos turnos de T.173 a T.184 tem-se os
discursos entre os SI de como se determina a densidade de um sólido. Mesmo em
se tratando de uma operação relativamente simples em laboratório, entende ser
necessário discuti-la para ir afunilando os conceitos e se chegar ao conceito de
viscosidade. Se o sólido em questão tivesse a forma de um cilindro regular como
sugerido por Ad em T.177, bastaria medir a sua massa e através da fórmula do
cálculo de volume de um cilindro determinaria o seu volume.
Nos turnos de 173 a 178, os SI chegam à conclusão que a densidade de
uma substância pode ser determinada através de experimentação medindo-se a
massa e o volume dessa substância. E ainda no T.178, AL1 afirma: “pesa, sei lá,
coloca água, e veja deslocamento do volume”. Nota-se nessa enunciação que AL1
traz consigo o discurso de outrem, ou seja, implicitamente conhece o método do
deslocamento para a obtenção de um volume de um determinado sólido irregular.

Se o sólido possui uma forma irregular, o que torna impossível medir


suas dimensões, o seu volume pode ser determinado pelo método de
deslocamento. Esse método consiste em determinar a massa da
substância e transferi-la para um instrumento volumétrico graduado,
parcialmente cheio com água (ou algum líquido no qual o sólido não
flutue). O sólido deslocará um volume de líquido igual ao seu volume
(SAMPAIO & SILVA, 2007, p.39).

Nos turnos 185 a 202 têm se as discussões de como medir a densidade de


um líquido. Diferentemente do que sugere os discursos de AL1 nos T.186 e 189,
intercalado por AL4 (T.187), a densidade do azeite não pode ser medida em um
sistema heterogêneo cuja a outra substância seja a água, pois na interface desse
sistema, como pode ser verificado no esquema da Figura 38, uma pequena

132
quantidade do sistema azeite e água podem coexistirem.. Entende-se aqui que AL1
está tendo um discurso equivocado do conceito de densidade relativa pois esse
conceito se aplica em relação as densidades absolutas de duas substâncias
diferentes cujo os valores dessas são obtidas separadamente e não em um sistema
heterogêneo como sugere AL1. A densidade relativa é definida pela razão entre as
densidades absolutas de duas substâncias segundo a equação de número VIII.

𝜌1 (VIII)
𝜌1,2=
𝜌2

onde 𝜌2 é geralmente escolhida como padrão. É comum considerar a água como


tal padrão, pois além da conveniência de sua abundância, sua densidade absoluta
𝜌á𝑔𝑢𝑎 ≅ 1,00 g/cm3 para temperatura ambiente (25°C).
Nos discursos de Am1 e AL1 nos turnos T.195 e T.200 há a concordância
que, de fato, a massa do azeite tem que ser medida, no entanto Ad não obtém o seu
discurso resposta desejado a partir da pergunta feita nos turnos T.196 (Ad: sim,
sim! Mas como a gente faz para saber o volume dele?) e 198 (Ad [...] se eu coloco
água, o que eu sei da água?).
No turno T.201 Ad apresenta o picnômetro (Ad: essa vidraria aqui é um
picnômetro e é usada em medidas de densidade de líquidos). [Ad mostra um
picnômetro], frasco sob a balança nas fotos da Figura 41.

Picnômetros são frascos de gargalo capilar nos quais um volume de líquido


é pesado. A obtenção da densidade de líquidos pelo método do picnômetro
é de grande precisão, uma vez que o cálculo do volume é feito pela medida
da massa. Nesse método é necessário tomar algumas precauções para evitar
erros, como por exemplo, os causados por bolhas de ar formadas dentro do
líquido. (SILVA et al, 2017, p.22).

Ainda no turno T.201, Ad discute sobre a equação VIII, mostrada


anteriormente, onde a substância 1 é o azeite de dendê e a substância 2 é a água.
A Figura 37 mostra uma captura de tela do slide apresentado por Ad durante a IP.
Nesse experimento foi determinada a densidade relativa do azeite de dendê a 29
ºC através do método do picnômetro. Para isso inicialmente foi pesado picnômetro
vazio e seco. Em seguida pesou-se o picnômetro com água destilada e depois com

133
o azeite. A Figura 41 apresenta a sequência de fotos da realização de um dos
experimentos realizados para o cálculo de densidade do azeite de dendê.

Figura 41 - Sequência de fotos do experimento realizado para a determinação de densidade

O picnômetro nas fotos 2; 3 e 4 da Figura 41 é o mesmo, os valores de


mostrados no visor da balança são em gramas o que vai resultar num valor de
densidade do azeite menor do que o da água.
Após o experiemento, novamente nota-se os três aspectos do conhecimento
químico defendido por Mortimer, (2000). O fenomenológico, aqui apresentado
pelo ato de pesagens e manipulação do picnômetro, o teórico que é o conceito de
densidade e o representacional que é a equação matemática derivada da teoria e da
fenomenologia. O cálculo de densidade relativa foi feito segundo a Equação VIII:

𝑚(𝑎𝑧𝑒𝑖𝑡𝑒)
𝜌𝑎𝑧𝑒𝑖𝑡𝑒 𝑉(𝑝𝑖𝑐𝑛ô𝑚𝑒𝑡𝑟𝑜)
= 𝑚(á𝑔𝑢𝑎) ∴ 𝜌 𝑚(𝑎𝑧𝑒𝑖𝑡𝑒)
𝜌á𝑔𝑢𝑎 𝑉
(𝑎𝑧𝑒𝑖𝑡𝑒)= 𝜌
𝑚(á𝑔𝑢𝑎) (á𝑔𝑢𝑎) (VIII)
(𝑝𝑖𝑐𝑛ô𝑚𝑒𝑡𝑟𝑜)

Equação VIII - Cálculo de densidade do azeite de


dendê.

onde o valor da densidade da água a 29 ºC é igual a 0,99597 g/cm . Com isso 3

encontrou-se um valor médio de densidade igual a 0,90688±0,004 g/cm3, para o


azeite de dendê.
O discurso de Ad em T.205 termina com um questionamento: (Quem já fez
físico-química?). A intenção de Ad nessa pergunta é saber se os SI possuem o que
Machado (1999), chama de atmosfera do já-dito, onde se procura extrair dos/as
estudantes aspectos conceituais e epistemológicos que eles /as já trazem consigo.
Quando Ad faz essa indagação no final de T.205 ele está procurando orientar o

134
seu discurso para um discurso resposta, do que ainda não foi dito sobre o conceito
de viscosidade, mas que algum aluno e/ou aluna poderia já carregar consigo.
Machado (1999), cita Bakhtin e diz:
O discurso [...] ao se constituir na atmosfera do ‘já-dito’, o discurso é
orientado ao mesmo tempo para o discurso-resposta que ainda não foi
dito, discurso, porém, que foi solicitado a surgir e que já era esperado.
Assim todo discurso é vivo. (p.91)

Nos turnos T.206 e T.208 a aluna AL2, que diz já ter cursado fisico-química,
disciplina onde costuma estudar esse conceito no curso de cursos de licenciatua em
química da UFG, segundo a enunciação da ementa de Físico-Química Experimental 1:

Efeito da temperatura e da pressão sobre as propriedades dos gases.


Determinação experimental de propriedades físico-químicas como
densidade, índice de refração, capacidade calorífica, tensão superficial de
líquidos e de soluções, bem como a verificação dos fatores que afetam essas
propriedades. Reologia de sistemas líquidos. Determinação experimental
de entalpias de dissolução e de reações químicas. Verificação experimental
das propriedades coligativas das soluções. Osmometria. Preparação de sóis,
géis e emulsões e estudo das propriedades físico-químicas desses sistemas.
Determinação das leis de velocidades de (Grifos do autor).

Em que pese na ementa não aparecer o termo viscosidade, esse conceito é


estudado no tópico grifado na enuciação da ementa da disciplina de Físico-Química
Experimental 1. Em seu discurso AL2, no turno 208, faz uma relação entre viscosidade
e ligações intermoleculares, e diz, (Quanto mais viscoso, maiores são as ligações
intermoleculares que um líquido tem). De fato, segundo Benvenutti (2011), a
viscosidade de um líquído será tanto maior quanto maior for a intensidade das forças
intermoleculares que agem sobre suas moléculas, (p.155). Note-se que, o termo
intensidade das forças não é o mesmo que o valor númerico de energia envolvida por
mol em relação aos tipos de força de interação intermolecular de um líquido, cujo
valores estão apresentado na Tabela 2.

135
Tipo de Força Representação Energia
envolvida (KJ/mol)

Íon-dipolo 40-600

Ligação de 10-40
hidrogênio

Dipolo 5-25
permanente

Íon-dipolo 3-15
induzido

Dipolo-dipolo 2-10
induzido

Dispersão de 0,05-40
London
Tabela 2 –Valores típicos das forçãs de interação intermoleculares.
Adaptado e compilado de: http://web.ccead.puc-
rio.br/condigital/mvsl/Sala%20de%20Leitura/conteudos/SL_interacoes_intermoleculares.pdf)

O termo intenso aqui, faz relação a algo que se manifesta com vigor, com
abundância. Será mostrado, por exemplo, mais adiante ainda nesse capítulo, que a
viscosidade do azeite de dendê é maior do que a viscosidade da água, ainda que
faixa de valores de energia envolvida por mol dos constituintes do azeite, cujo tipo
de força intermolecular predominante em suas moléculas, o Dipolo-dipolo
induzido, seja cerca de 4-5 vezes menor do que a força de interações
intermoleculares predominante em suas moléculas seja a ligação de hidrogênio.
No turno 211, AL4 diz que vem o termo fluidez à sua cabeça, quando
responde a uma indagação feita por Ad a AL3 em T.209. Ad: AL3, [...] quando
fala viscosidade, o quem vem a sua cabeça? E, em T.213 Ad corrobora: é tudo
isto que vocês falaram, resistência ao fluido. Quanto mais resistência ao fluido o
líquido possui, mais viscoso ele é. Claro, falando grosso modo. Essas enunciações
onde a palavra viscosidade se remete a fluidez dos líquidos é corroborada por

136
Benvenutti (2011), que afirma, portanto, pode-se definir viscosidade como sendo
a resistência que os líquidos apresentam para fluir (p.155).
Quando Ad diz em T.213 que o termo viscosidade é resistência ao fluido e
usa a expressão, “claro, falando grosso modo, isso se justifica devido ao conceito
mais minuncioso desse termo, pois viscosidade

é a propriedade dos fluidos correspondente ao transporte microscópico de


quantidade de movimento por difusão molecular. Ou seja, quanto maior a
viscosidade, menor será a velocidade em que o fluido se movimenta. A
viscosidade pode ser definida como a resistência de um fluido ao fluxo, ou
a uma alteração da forma. Ela é uma medida de atrito interno de um fluido.
Viscosidade é a medida da resistência de um fluido à deformação causada
por um torque, sendo comumente percebida como a “grossura”, ou
resistência ao despejamento. A viscosidade descreve a resistência interna
para fluir de um fluido e deve ser pensada como a medida do atrito do
fluido. Assim, a água é “fina”, tendo uma baixa viscosidade, enquanto o
azeite de dendê é “grosso”, tendo uma alta viscosidade. (SILVA et al, 2017
p.26)

No turno 212, AL3 faz a relação do conceito de viscosidade com o de


densidade. AL3: você pode observar a diferença do óleo para a água quanto a
densidade, bem eu acho que sim. A água flui com uma velocidade bem diferente do
óleo, o óleo é mais pesado ou algo do gênero. Com efeito, a viscosidade realmente se
relaciona com a densidade, mas não pelo fato do azeite ser mais “pesado”, como
sugerido. Aqui há uma confusão, por parte de alunos e alunas, entre os termos massa,
peso e densidade. Esses termos serão melhores discutidos no subcapitulo
A viscosidade, ou o coeficiente de viscosidade, se relaciona com a
densidade através da equação de Poiseuille, equação IX.

𝜋𝑟 4 𝜌𝑔ℎ (IX)
µ= 8𝑉𝑙

Equação de Poiseuille

onde r é o raio do capilar; g é a aceleração da gravidade; h é a diferença de altura


entre as superfícies do líquido nos reservatórios superior e inferior; ρ é a densidade
do líquido; t é o tempo gasto para o líquido fluir através do tubo capilar entre os
dois reservatórios; V é o volume do reservatório superior e l é o comprimento do
tubo capilar.

137
Neste experimento foi determinado o coeficiente de viscosidade com o
emprego do viscosímetro de Ostwald. A utilização do viscosímetro de Ostwald
baseia-se na observação do tempo gasto para o líquido fluir, sob a influência da
gravidade, através de um tubo capilar de raio e comprimentos conhecidos
escoando de um reservatório superior (ponto A na Figura 42) de volume definido
para um segundo reservatório inferior (ponto B na Figura 42).

Figura 42 - Sequência de fotos do experimento de determinação de viscosidade.

A determinação direta da viscosidade absoluta é muitas vezes difícil de


ser feita. O procedimento usual é o de se determinar a viscosidade do líquido em
relação a uma substância de referência em uma dada temperatura. A viscosidade
relativa de um líquido é definida como sendo a razão entre a sua viscosidade
absoluta e a da água à mesma temperatura. Para obtê-la, mede-se em um
viscosímetro os tempos de escoamento de volumes iguais do líquido em estudo e
da água a uma dada temperatura. Como os valores de r, g, h, V e l na equação IX
são os mesmos para ambos os líquidos a razão entre os coeficientes de viscosidade
do líquido e da água é dado pela equação X.

µ𝑎𝑧𝑒𝑖𝑡𝑒 𝜌𝑎𝑧𝑒𝑖𝑡𝑒 𝑡𝑙í𝑞𝑢𝑖𝑑𝑜


= (X)
µá𝑔𝑢𝑎 𝜌á𝑔𝑢𝑎 𝑡á𝑔𝑢𝑎

Equação X – Equação da razão entre os coeficientes de viscosidade do líquido e da água.

Assim, conhecendo o valor da viscosidade da água, o que pode ser obtido


através de valores tabelados, calcula-se a viscosidade do azeite de dendê em

138
estudo. A unidade da viscosidade é o poise P que equivale a um pascal por
segundo, Pa s-1, e um cP centipoise equivale a um centésimo de poise.
Nesse experimento o tempo de escoamento do ponto A até o B (Figura
40) foi medido cinco vezes para o azeite e água (tmédio = 5,7s) em um mesmo

viscosímetro. O valor médio da densidade do azeite de dendê calculada no item


anterior foi igual a 0,90688±0,004 g/cm3, a densidade da água a 29°C = 0,99597
g/cm3 e a viscosidade da água nessa mesma temperatura e de 0,8180 cP aplicando
esses valores na equação X encontra um coeficiente de viscosidade médio igual a
34,16±0,14 cP para o azeite de dendê.
Após o experiemento, novamente notou-se os três aspectos do
conhecimento químico defendido por Mortimer, (2000). O fenomenológico, aqui
apresentado pelo ato de escoamento do azeite de dendê pelo viscosímetro, o
teórico que é o conceito de viscosidade e o representacional que é a equação
matemática de número X derivada da teoria e da fenomenologia.
No tópico 3.4 serão tratados e analisados os resultados obtidos relativos ao
iten da ementa de NL imtitulado “abordagem etnobotânica acerca de plantas utilizadas
nas religiões de matriz africana”.

139
3.4 ABORDAGEM ETNOBOTÂNICA ACERCA DE PLANTAS UTILIZADAS
NAS RELIGIÕES DE MATRIZ AFRICANA21

“Ki Ntoo bò Orìsà à è. Portanto, adorarei as minhas origens”.


Os Povos e Comunidades Tradicionais em todo o território nacional são
constituídos por:

[...] quilombolas, ciganos, seringueiros, castanheiros, quebradeiras de


coco-de-babaçu, comunidades de fundo de pasto, faxinalenses, pescadores
artesanais, marisqueiras, ribeirinhos, varjeiros, caiçaras, praieiros,
sertanejos, jangadeiros, açorianos, campeiros, varzanteiros, pantaneiros,
caatingueiros (BRASIL, 2016, p. 1).

Esses são hoje, aproximadamente, cinco milhões de brasileiros/as que


ocupam ¼ do território nacional (SEPPIR, 2007) e foram reconhecidos em 2007
através do decreto Decreto 6.040. Este decreto instituiu a Política Nacional de
Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais (PNPCT) e os
define como:

[...] grupos culturalmente diferenciados e que se reconhecem como tais,


que possuem formas próprias de organização social, que ocupam e usam
territórios e recursos naturais como condição para sua reprodução cultural,
social, religiosa, ancestral e econômica, utilizando conhecimentos,
inovações e práticas gerados e transmitidos por tradição (BRASIL, 2007,
p.1).

Por sua vez, os Povos Tradicionais de Matriz Africana


se “reconhecem como unidades de resistência africana no Brasil e se
caracterizam pela manutenção de um contínuo civilizatório africano,
constituindo territórios próprios marcados pela vivência comunitária”
(p.35).
E é a partir do texto “Povos Tradicionais” construído por lideranças do
segmento de todo o país e de todas as matrizes, durante a III Conferência Nacional de
Igualdade Racial (III CONAPIR), que se definem:

Povos Tradicionais de Matriz Africana: conjunto dos povos africanos


para cá transladados, e às suas diversas variações e denominações
originárias dos processos históricos diferenciados em cada parte do país, na

21
Este trabalho é uma versão publicada do texto apresentado pelos/ as autores/as intitulado “Dai-me agô
(licença) para falar de saberes tradicionais de matriz africana no ensino de química” na Revista Química
Nova, São Paulo, v. 42, n. 5, p. 570-579, 2019, assim optou-se pelo título mais específico, em questão.

140
relação com o meio ambiente e com os povos locais;
Comunidades Tradicionais de Matriz Africana: Territórios ou Casas
Tradicionais – constituídos pelos africanos e sua descendência no Brasil,
no processo de insurgência e resistência ao escravismo e ao racismo, a
partir da cosmovisão e ancestralidade africanas, e da relação desta com as
populações locais e com o meio ambiente (BRASIL, 2013, p.1).

Os Povos e Comunidades Tradicionais de Matriz Africana constituídos de


territórios próprios, incluindo os chamados “terreiros” e “roças”, se caracterizam pelo
acolhimento e a vivência em comunidade (cooperativismo), ressignificando aqui no
Brasil conhecimentos e valores civilizatórios trazidos de África, tais como a oralidade,
a corporeidade, a ancestralidade, a circularidade, a musicalidade, a memória, a energia
vital (axé) e a religiosidade (A COR DA CULTURA, 2013) o entanto, esses valores
civilizatórios Afro-brasileiros e Africanos são reduzidos, por vezes, a religiosidade e
a relação com o sagrado.

Esse reducionismo das práticas tradicionais de matriz africana


apenas a “religião”, nega a real dimensão histórica e cultural
dos territórios negros constituídos no Brasil, e, ainda nos
coloca diante de uma armadilha, a do Estado Laico, que na
prática ainda está longe de ser real, mas o é quando está em
“risco” a hegemonia cultural eurocêntrica no país (BRASIL,
2013, p. 1).

Seguindo essa linha do tempo na qual o estado brasileiro tenta integrar e


ampliar as ações voltadas aos Povos e Comunidades Tradicionais de Matriz Africana
tivemos a promulgação do Decreto 6.040 em 2007, a III Conferência Nacional de
Promoção da Igualdade Racial - CONAPIR em 2011, passando pelo lançamento do I
Plano Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades
Tradicionais de Matriz Africana em 2013 (BRASIL, 2013) culminando em 09 de maio
de 2016 com a instituição do Conselho Nacional dos Povos e Comunidades
Tradicionais – CNPCT, integrado ao Ministério do Desenvolvimento Social e
Combate à Fome que em seu §2º afirma na I competência “[...] vistas a reconhecer,
fortalecer e garantir os direitos destes povos e comunidades, inclusive os de natureza
territorial, socioambiental, econômica, cultural e seus usos, costumes, conhecimentos
tradicionais” (BRASIL, 2016, p.1). Por fim, entre os dias 27 e 30 de maio de 2018 foi
realizada a IV CONAPIR com a temática – “O Brasil na década dos afrodescendentes:
reconhecimento, justiça, desenvolvimento e igualdade de direitos”.

141
Entendemos aqui ser esse um reconhecimento tardio, pois entre os séculos
XVI e XIX mais de sete milhões de homens e mulheres africanos/as foram
arrancados/as à força de sua terra mãe para ter aqui, do outro lado do Atlântico Sul, a
sua mão de obra especializada escravizada. “Trouxeram para o país mais que sua força
de trabalho, trouxeram tecnologias agrícolas e de mineração, suas culturas, saberes,
tradições e valores civilizatório” (BRASIL, 2013, p.1) que muitas das vezes são
reduzidos apenas à religião e ao culto ao sagrado.

Não se entende aqui nenhum demérito em estudar as religiões de matriz


africana em todas as suas nuances, pois elas, segundo Ferretti são consideradas como
“foco de resistência cultural e de preservação da identidade étnica” (1995, p.95). Deste
modo, seguem “como sendo os locais de manutenção e preservação da cultura
africana” (COSTA NETO, 2010, p.19). Contudo, historicamente têm sido vistas como
cercadas de mistérios e seus ritos não são conhecidos pela grande maioria da
população, o que por certo contribui para o processo de intolerância religiosa (COSTA
NETO, 2010).
A mistificação da religiosidade de matriz africana as torna vítimas de
violações de seus direitos sociais, políticos, econômicos e culturais (BRASIL, 2016).
Segundo o dossiê, “a situação dos direitos humanos das mulheres negras no Brasil”:

A cada três dias, o Disque Direitos Humanos – Disque 100, recebe uma
denúncia de intolerância religiosa. Este serviço telefônico e de internet que
tem se dedicado à recepção de denúncia de violação de direitos humanos
no Brasil, percebeu um aumento de 273% nas denúncias no período 2013-
2014. No ano de 2013, 20% dos casos denunciados envolveram violência
física. Os ataques envolvem também ofensas, perseguições, injurias
difamação, chegando até incêndios provocados em templos religiosos
(WERNECK e IRACI, 2016, p.35).

Nesse sentido, a mistificação se dá pelo desconhecimento da cultura Africana


e Afro-brasileira causando, assim, diversos vilipêndios a esse grupo social. Entender
suas religiões e participações no contexto social do Brasil de hoje se faz necessário à
compreensão do passado (COSTA NETO, 2010). Entre as religiões de matriz Africana
praticadas em território nacional estão a Umbanda e o Candomblé, sobre as quais se
apresentará, neste estudo, uma breve e despretensiosa descrição.
A Umbanda é citada por diversos autores/as como a única religião
genuinamente brasileira. No entanto, percebem-se em suas características vários

142
elementos de religiões africanas, do catolicismo e do espiritismo. A mesma surgiu nos
subúrbios da cidade do Rio de Janeiro, no início do século passado, com a abertura dos
centros espírita kardecistas para os cultos afro-brasileiros e da influência, sobre estes,
das ideias do espiritismo e dos valores do mundo branco (NOVAES, 2015).
Suas cerimônias podem ser realizadas nos mais diversos locais, em casa,
terreiros, praças públicas, em meio à natureza, à beira de um rio ou numa praia. Elas
são presididas por um “pai” ou uma “mãe” que são as lideranças que comandam os
ritos e são responsáveis por ensinar os seus preceitos aos seus discípulos/as
(BEZERRA, 2019).Trata-se de uma religião que cultua elementos de personificação
ligados a natureza e as suas energias chamados de Orixás. Exemplos de Orixás
encontrados na Umbanda são: Oxalá (ligado à fé), Xangô (ligado à justiça), Iemanjá
(ligada à geração), Ogum (ligado à Lei), Oxóssi (ligado ao conhecimento), Oxum
(ligado ao amor), Iansã (ligada à direção), Omulú (ligado à estabilidade) e Nanã
(ligada à decantação).
A palavra Candomblé é de origem Bantu (do Kimbundu) e vem de uma
junção das palavras Kandombe-Mbele que tem o significado de: pequena casa de
iniciação dos negros (NASCIMENTO, 2010). Já a religião Candomblé é de origem
africana monoteísta e o Deus único para a Nação Ketu é Olorum, para a Nação Bantu
é Zambi, para a nação Jeje é Mawu, que são nações independentes na prática diária
(BEZERRA, 2019). Seu surgimento no Brasil foi marcado, entre outros fatores, pela
necessidade de diferentes grupos negros/as de reelaborarem sua identidade social e
religiosa sob as condições adversas da escravidão e, posteriormente, do desamparo
social (BEZERRA, 2019). Seus rituais são praticados em casas, roças ou terreiros por
meio de cânticos, danças, batidas de tambores, oferendas de vegetais, minerais, objetos
e, às vezes, o sacro-ofício de alguns animais e podem ser de linhagem matriarcal,
patriarcal ou mista. Por conseguinte, as celebrações são dirigidas pelas lideranças
religiosas que são nomeadas "babalorixá" e "iyalorixá"; “Tata Nkisi” e “Mametu
Nikisi”; e Doté e Doné, respectivamente, de acordo com as três macro-nações: nação
Ketu que cultua os Orixás, Angola que cultua os Inkices e a Jeje que cultua os Voduns.
Os Orixás (nome genérico das divindades Yoruba, intermediários entre
Olorum, o Deus supremo e os seres humanos) são os ancestrais, os antepassados
simbolicamente divinizados e ligados a natureza, uma recriação Afro-brasileira da
religião tradicional Africana reelaborada no Brasil. Os/as africanos/as e seus

143
descendentes transpuseram fronteiras territoriais e culturais e hoje é um patrimônio de
todo povo diaspórico (SIQUEIRA, 1998). Os Orixás não são uma ideia abstrata, eles
fazem parte da vida das pessoas ligadas a um terreiro. Por exemplo, se diz nos terreiros
que “O Xangô de Obaraym disse que está contente”; “Oxóssi de Mãe Stella deu flores
a Oxum de Dona Pinguinho”; “Oxum da Mãe Rosa dançou com muita graça”; a “Yansã
de mãe Sofia veio no dia da ‘obrigação’ de José Félix para Ossanyin e, como sempre
dançou muito bonito” ((SIQUEIRA, 1998, p.43).
Assim, como na Umbanda, no Candomblé, conforme foi dito, cada Orixá está
ligado a um elemento da natureza e possui o seu próprio significado. O chamado
Panteão dos Orixás do Candomblé, segundo (Siqueira, !998), é liderado por Exu,
seguido por Oxalá, Iyemanjá, Xangô, Ogum, Oxum, Logum Edé, Oxóssi, Yansã, Nanã,
Omolu ou Obaluayé, Oxumaré, Ossayn, Euá, Obá, Iroko, Ibeji e Erê. Dentre esses,
Ossayn é o Orixá das folhas e ao lado de Ifá que tem o poder de prever o futuro, poder
este também associado à força das plantas. O conhecimento do nome de cada planta,
do poder que lhe é atribuído, bem como sua utilidade e o uso que dela deve ser feito
constituem uma das riquezas essenciais do Candomblé. Siqueira (1998), afirma que
Pierre Verger designa esse conhecimento sob os termos de “farmacopeia africana”.
Nessa pesquisa esse assunto foi discutido no seminário que foi um dos
elementos de avaliação da disciplina de NL. Tais seminários foram apresentados em
forma de mini-aulas dialogadas, nos quais os/as alunos/as teriam que mostrar como
fariam as abordagem cultural e conceitual, como mostradas no Quadro 14 e na ementa
da disciplina de NL, em uma aula de Ciências/Química na educação básica ou superior,
simulando estas aulas com a turma.
As escolhas dos componentes de cada grupo para apresentação dos
seminários se deram de forma livre, todavia foi sugerido que ficasse pelo menos um/a
aluno/a de Química (licenciatura/bacharelado/engenharia) ou licenciatura em cada
grupo. Os/as alunos/as ficaram livres para trazerem outras referências diferentes das
que foram apresentadas no plano de ensino do curso. Dessa maneira, emergiram os
seguintes temas: a) Metais em África e as Transformações Químicas; b) Congadas em
Goiás e suas implicações na extração de nióbio em Catalão-GO; c) Animais em África
e o elemento ferro e; d) O uso de plantas em religiões de matriz Africana e suas
contribuições fitoquímicas.
Nesse subcapítulo serão analisados os dados obtidos da avaliação do tema d

144
intitulada, “Conhecimentos tradicionais de povos e comunidades de Matriz
Africana”. Os assuntos, as abordagens (conceitual e cultural) e os cursos de cada
aluno/a estão sumarizados no Quadro 14.

Quadro 14 - Assunto, abordagem cultural e conceitual para alguns tópicos da disciplina.


Abordagem
Abordagem Cultural -
Assunto conceitual de Aluno(a)
conhecimento científico
matriz Africana
A2: Agronomia (mulher
negra).
Funções químicas
O uso de plantas A4: Licenciatura em Ciências
presentes nas
em religiões de As plantas em rituais Biológicas (homem branco).
estruturas dos
matriz Africana religiosos de matriz A10: Bacharelado em
princípios ativos
e suas Africana. Comunicação Social (homem
das plantas e as
contribuições negro).
principais reações
fitoquímicas. A11: Bacharelado em
de cada função.
Biblioteconomia (mulher
negra).

O corpus total de análise foi formado pela transcrição de 3h05min


provenientes de gravações em áudio e vídeo dos discursos produzidos.
A religiosidade de matriz Africana brasileira é atualmente uma
ressignificação dos cultos praticados no continente Africano por diferentes grupos
étnicos. Segundo Lemos,
“as populações negras trazidas ao Brasil pertenciam a diferentes
civilizações e provinham das mais variadas regiões Africanas. Suas
religiões eram partes de estruturas familiares, organizadas socialmente ou
ecologicamente a meios biogeográficos” (LEMOS, 2014, p.10).
Todavia, com o tráfico negreiro,
“sentiram-se obrigadas a decifrar um novo tipo de sociedade, baseada na
família patriarcal, latifundiária e em regime de castas étnicas (sistemas
tradicionais, hereditários ou sociais de estratificação, baseados em
classificações como raça, cultura, ocupação profissional)” (LEMOS, 2014,
p.4).
Mais do que um choque entre culturas e tradições com a religião cristã houve
também muitas acomodações e adaptações, além de negociações e conflitos, marca da
resistência Africana no Brasil. Isso porque, no Brasil de extensões territoriais imensas
e de interiores sem estruturas físicas e materiais soluções foram criadas para acomodar
as necessidades recíprocas e a magia dos/as negros/as foi um substituto a medicina
(BITTAR, 2011). E nesse contexto, o conhecimento que o/a negro/a escravizado/a
tinha sobre plantas e folhas no combate as suas doenças e males foi de importância
considerável.
Nesse sentido, as plantas e as folhas foram incorporadas ao cotidiano das

145
pessoas, povos e comunidades tradicionais de matriz Africana como remédios
caseiros, em forma de chás para aliviar dores, reanimar o estado físico e incluindo a
disposição para a vida (SIQUEIRA, 1998). No extrato 13 mostramos os discursos
produzidos sobre o uso da arruda, da jurema, do alecrim, do algodoeiro e do juá-de-
capote em religiões de matriz Africana. Este momento discursivo se deu sobre a
constituição identitária brasileira a partir dos conhecimentos trazidos para o Brasil por
Africanos/as escravizados/as. O extrato a seguir teve uma duração de 44 min e
produziu 58 turnos de discurso (T) e, passamos a apresentar a análise de trechos do
extrato.

Extrato 13: Discursos sobre plantas utilizadas em religiões de matriz Africana.

T. 84 – A4: Bom gente, queremos falar sobre o uso de plantas em religiões de matriz
Africana. Nós buscamos muita coisa sobre o tema, o aspecto social e científico e
queremos falar do poder medicinal das plantas que elas usam. Para uma melhor
compreensão do uso das plantas dentro das religiões abordadas vamos primeiro falar
brevemente sobre cada religião em si para que possamos ter uma noção do que vamos
trabalhar ao longo da aula e após isso vamos abordar questões religiosas, medicinais...
Bem aqui nós observamos o uso da arruda e rosa branca para a preparação em um ritual
lá no terreiro.
T. 94 - A2: As plantas, como a gente pode observar, há muito tempo são utilizadas como
aplicação medicinal. Lá na África, nos países Africanos, eles utilizam tanto na forma de
ritual mesmo, pra benzer, pra fazer um ritual pra Deus ou eles usam como forma de curar
alguma doença, pra fazer chá entre outras coisas. Essas plantas, antigamente, eram
muito utilizadas em todo o lugar. Quem tem parentes que moram no interior sabe que
quando está com uma doença o vô já fala, o tio já fala, vamos pegar umas folhas pra
fazer um chá pra curar a gripe.
T. 95 - A4: Fitoterapia.
T. 96 - A2: Então, essa Fitoterapia, ela advém da África, das religiões de matriz africana.
Agora as pessoas estão usando muitos remédios, mas agora tem muita gente preocupada
com formas de vida saudável, estão pensando mais no lado verde da vida, estão vindo,
provavelmente, junto com essas religiões de matriz Africana. Então, é uma cosia que a
gente tá vendo muito presente na nossa sociedade.
T. 98 - A2: Aqui, a gente está vendo o uso de Jurema como bebida e fumo para defumação
no ritual. Mestre Canindé acostado em Pai Rivas durante rito no Centro de Cultura Viva
das Tradições Afro-brasileiras.

Fonte (ROCHA, 2011).


T. 108 - A4: [...] E vai se estendendo a outras religiões, igual a gente vê lá na lavagem

146
da escada de Nosso Senhor do Bonfim que eles realizam e vocês podem observar as
baianas lá do Candomblé lavando com ervas de manjericão, alecrim... Eles usam a
lavanda pra dar um perfume que elas vão limpar, para os católicos é uma coisa realizada
com o Nosso Senhor do Bonfim para as baianas já têm outra significação e elas estão
comemorando um outro aspecto dentro da religião delas.
[...] E o alecrim de horta, a atividade são os caboclos, o uso das folhas no preparo de
chá para tosse com leite e ovos de galinha e também para banhos, preparação de cama
de Ìyàwó e preparação de água (macerado) para lavagem de cabeça.
T. 109 - A4: Aqui nós podemos observar o algodoeiro. Eu vi muita planta que eles usam
e eu nem tinha noção que poderia ter um poder espiritual pra eles. O algodoeiro, o uso
das folhas nos rituais de iniciação e em banho, trata-se de uma folha muito quente e
poderosa. Ela é usada e a associação religiosa é a Oxalá e a Orumilá.
T. 114 - A3: Você falou muito de jurema e ela não é usada só em defumação. Ela é
alucinógena e produz uma substância psicoativa, também a mesma da Iouasca, e elas
são usadas no sertão de Pernambuco, pelo menos eu conheço de lá, têm umas tradições
que usam por seu efeito psicoativo.
T. 118 - A4: [...] Eu fiz trabalho com os Calungas lá em Cavalcante com Etnobotânica
que é uma área da Biologia dentro da Botânica. Nós trabalhamos esse vínculo da
religiosidade com a Ciência e tem uma vertente dupla. [...] o que a gente geralmente
trabalha, ah! Isso daqui é bom pra tirar inchaço. E o que a gente faz? Vai pro laboratório,
faz um histoquímica dela (planta) retira os extratos essenciais e vê o que tem ali na
planta. Faz todo o trabalho mesmo pra ver se a planta realmente tem poderes curativos.
[...] a gente fez, publicou um artigo sobre o boldo, eles usam o boldo nos trabalhos. E
aqui, todo mundo já tomou chá de boldo pra curar uma ressaca alguma vez? E tem um
detalhe, o boldo é amplo, mas o boldo verdadeiro só vai ter o poder curativo, aquele da
folha pequeninha que é o boldo chileno. O boldo baiano não tem poder curativo e esses
boldos achados em beira de rio também não têm.

Inicialmente, nota-se em nossos resultados uma predominância dos discursos


de A4 sobre os demais membros do grupo. Isso se justifica pelo fato do mesmo ser um
aluno do curso de licenciatura em Ciências Biológicas que já leciona na educação
básica e que trabalhou com Botânica em sua iniciação cientifica. Portanto, “ele já
possui seu discurso, o discurso de outrem” (BAKTIN, 2006, p.150), entendendo aqui
como o discurso de outrem o discurso já estabelecido, de certa forma, a “atmosfera do
já dito” pela Botânica, objeto de estudo da Biologia.
No turno 84, A4 se refere às duas plantas utilizadas nos rituais de terreiro: a
arruda e a rosa branca. A arruda tem nome científico Ruta graveolens L, Rutaceace, e
é uma planta associada ao Exu, o Orixá intermediário entre Orum e Ayé
(correspondente ao céu e a terra, no catolicismo) fazendo referências a elementos como
o fogo e o feminino. Utilizada em banho, sacudimentos na Umbanda e nos
Candomblés de Angola com a função de afastar a má sorte, tem o seu uso proibido nos
terreiros Jêje-Nagôs da Bahia e do Rio de Janeiro por ser considerado “um ewó da
nação”, (interdito) (BARROS e NAPOLEÃO, 2015). Apesar de “ser considerada
tóxica e abortiva, possui propriedades terapêuticas que combatem a clorose, paralisias,
nevralgias, flatulências e incontinências urinária” (BARROS e NAPOLEÃO, 2015,

147
p.103). Nas folhas da arruda “são encontrados princípios amargos, resinas, gomas,
taninos, rutina, psoraleno, quercetina, alcalóides, ácidos orgânicos, alantoína,
saponinas triterpênicas e mucilagem” (ORLANDA, 2011, p.9). As estruturas químicas
dos principais constituintes da arruda estão apresentadas na Figura 43.

OH
OH

HO O

OH

A) OH O

B)
OH

HO O
OH

O
OH O

HO O
CH3 O

OH

OH OH HO

B) OH

O O O
C)

H O
N O

O NH2
N NH
D) H

Figura 43 - Estrutura química dos principais constituintes químicos presentes nas folhas de arruda:
(A) quercetina (C15H10O7); (B) rutina (C27H30O16); (C) psoraleno (C11H6O3) e; (D) alantoína
(C4H6N4O3)

A Figura 43a representa a quercetina, substância a que são atribuídas às


propriedades analgésicas; a rutina, Figura 43b, facilita a absorção da vitamina C pelo
organismo; o psoraleno, Figura 43c é usado no tratamento do vitiligo e da psoríase e;

148
por fim, alantoína, Figura 43d, tem efeito cicatrizante e possui ação anti-irritante
auxiliando o sistema de defesa da pele no processo de proliferação de novas células.
A atividade química/biológica de uma planta “[...] não decorre de um só
elemento químico presente, mas da ação sinérgica de todos os componentes presentes
na planta podendo, porém, estarem mais concentrados em uma ou mais partes dela,
como: na raiz, no caule, na casca, na folha, na flor, no fruto e na semente”
(CAMARGO, 2014, p.10), tal como descrito no Quadro 15 das utilidades da arruda e
os constituintes químicos, tal como apresentado na Figura 44.

Quadro 15 – As utilidades da arruda: Ruta graveolens Linneau (RUTACEAE).


Partes utilizadas Propriedades Medicinais Utilização Religiosa
No meio popular é considerada
planta protetora contra mau olhado
Anti-helmintica, anti-hemorrágica,
e quebranto. Dizem que basta tê-la
anticoagulante, anticonvulsiva,
Folhas e flores. em casa para afastar maus
antireumática, digestiva, emenagoga,
elementos, usa-se ainda em
fortificante dos nervos, febrífuga.
defumador para “descarregar”
ambientes.
Constituintes Químicos: Furanocumarinas: (bergapteno xantotoxina, psoraleno) (Figura 44);
Alcalóides: graveolinina (Figura 45); Outros: ácido anísico; Flavonóides: rutina; Taninos: ácido
gálico.
Fonte: (BERNARDES e FERREIRA, 2007).

R1
R1 = R2 = H (psoraleno)
R1 = -OCH3 , R2 = H (bergapteno)
R1 = H, R2 = -OCH3 (xantotonina)
O O O
R2
Figura 44 - Estrutura química do bergapteno, xantotoxina e psoraleno (C 11H6O3)

A Química se interessa pela “relação estrutura-atividade” que compreende o


estudo dos efeitos que a estrutura de um composto (ligante), tal como apresentado na
Figura 45, pode causar durante sua interação com o receptor biológico e,
consequentemente, racionalizar os principais fatores que governam esta interação
(ARROIO, HONORIO e SILVA, 2010).

149
N O

OMe
Figura 45 - Estrutura química da graveolinina (C17H13NO3)

Essa interação receptor-ligante foi verificada nas enunciações de A3, turno


114, quando fala sobre a jurema: “você falou muito de jurema e ela não é usada só em
defumação. Ela é alucinógena e produz uma substância psicoativa, também a mesma
da Iouasca, e elas são usadas no sertão de Pernambuco, pelo menos eu conheço de lá,
têm umas tradições que usam por seu efeito psicoativo” (grifos nossos).
Quando se considera os componentes químicos responsáveis pelas atividades
biológicas contidas nas plantas utilizadas nos rituais das religiões de matriz Africana
passíveis de verificação empírica, diz-se que essa planta possui um papel funcional.
Além desse papel, o funcional, as plantas também desempenham um papel sacral que,
de acordo com Camargo, é
“de valor simbólico, subjetivamente construído no mito e legitimado no
rito, capaz de impregnar as plantas de poderes curativos emanados de
forças sobrenaturais, segundo ditam os sistemas de crença dos quais fazem
parte o doente, o curador e seu grupo familiar e social” (CAMARGO, 2014,
p.10).
O elemento interdiscursivo – família citada no discurso de A2, no Turno 94,
uma mulher negra do curso de Agronomia – “quem tem parentes que moram em
interior sabe, [...] o vô já fala, o tio já fala, vamos pegar umas folhas pra fazer um chá
pra curar a gripe” anuncia o tecido social que compõe e caracteriza A2 e suas relações,
pois quando falo se manifesta em meu discurso o que trago em mim. Ainda que o
interdiscurso (para Bakhtin, um discurso dentro de outro discurso) de A2 seja um
discurso que celebre as figuras masculinas tio e avô, nota-se a referência a
ancestralidade (A COR DA CULTURA, 2013) um dos valores civilizatórios Africanos,
pois A2 atribui ao conhecimento popular vindo de África a aplicação medicinal que
algumas plantas utilizadas em religiões de matriz Africana possuem “as plantas, como
a gente pode observar, há muito tempo são utilizadas como aplicação medicinal, lá na
África, nos países Africanos”.
No Egito, um país do continente Africano, as plantas eram utilizadas em
rituais religiosos, para curar doenças, embalsamar corpos, em preparações aromáticas,

150
antissépticas, cosméticas, purgativas etc. (BARSA, 1998). As plantas que são
utilizadas em religiões dos povos e comunidades de matriz Africana e que possuem
algum princípio ativo ou substância capaz de prevenir, aliviar ou curar uma doença
são também plantas medicinais (DAVID e DAVID, 2002). Esse termo foi
“oficialmente” reconhecido durante a 31ª Assembleia da Organização Mundial de
Saúde (OMS), sendo então definido como “aquela que administrada ao homem ou
animais, por qualquer via ou sob qualquer forma, exerce alguma espécie de ação
farmacológica” (DAVID e DAVID, 2002, p.71).
Nessa ocasião, a OMS criou o Programa de Medicina Tradicional que
recomendou aos estados-membros o desenvolvimento de políticas públicas para
facilitar a integração da medicina tradicional e da medicina complementar alternativa
nos sistemas nacionais de atenção à saúde, por considerar que “grande parte da
população dos países em desenvolvimento depende da medicina tradicional para sua
atenção primária, tendo em vista que 80% desta população utilizam práticas
tradicionais nos seus cuidados básicos de saúde e 85% destes utilizam plantas ou
preparações desta” (BRASIL, 2006, p.11).
Tal prática correspondia na época, aproximadamente, 5 bilhões de pessoas e
ainda 85% dessa medicina tradicional envolvia o uso de extratos vegetais
(FARNSWORTH, 1988). Entendemos que o conhecimento científico não é saber
tradicional, mas com ele se comunica. Nossos resultados mostram como é possível
trazer esta temática para a aula de Química, pois em consonância com Botelho, pode-
se dizer que
“[...] o ensino e a aprendizagem que ocorrem nas salas de aula representam
uma das maneiras de construir significados, reforçar e conformar interesses
sociais, formas de poder, de experiência que têm sempre um significado
cultural e político” (BOTELHO, 2011, p.166).

Com o intuito de manter, minimamente, a sua cultura o/a negro escravizado/a


adotou uma postura política em relação à religião praticada na sua terra mãe. Esse/a
passou a associar os seus Orixás e as suas divindades aos santos da Igreja do/a seu/a
colonizador/a. No texto intitulado “A Umbanda em julgamento” Alfredo d’Alcântara
afirma:
“não era a óstia uma semelhança da pedra de Xangô? Jesus Cristo morava
na óstia, como Xangô morava na pedra de raio; apenas esta não podia ser
engolida. O rosário de Nossa Senhora era bem igual à guia de contas
vegetais de Yemanjá e ao Opelê-Ifá de que serviam os Babalaôs”
(ALCÂNTARA, 1949, p.67).

Essa prática deu origem ao sincretismo religioso, prática muito comum nas

151
religiões cultuadas por povos e comunidades tradicionais de matriz Africana. Esse
sincretismo é evidenciado quando estes povos e comunidades fazem uso da jurema em
seus cultos. De nome científico Acacia jurema Mart, Leguminosae-mimosoideae, a
jurema tem o seu uso associado aos Orixás do Candomblé, Ossaim Orixá “das folhas
e da saúde, que é considerado o curandeiro, porque conhece o segredo das plantas que
curam” (BOTELHO, 2011, p.7) e Oxossi, divindade da caça que vive nas florestas e a
Caboclos (entidades da Umbanda), fazendo referências a elementos como a terra e o
masculino. A jurema era utilizada ainda pelos indígenas brasileiros que a utilizavam
“segundo suas crenças, para excitar os sentidos, provocando sonhos,
estados de êxtase e de encantamento nas pessoas. A casca dessa árvore é
adstringente, febrífuga e narcótica, aconselhada contra úlceras, cancros,
flegmões e erisipela. Suas sementes, segundo alguns manuais de
fitoterapia, são tóxicas” (BARROS e NAPOLEÃO, 2015, p.398).
O sincretismo presente em algumas religiões de matriz Africana é verificado
também nos discursos de A4, no turno 108, quando em suas enunciações quanto ao
uso das ervas na lavagem das escadas da Igreja de Nosso Senhor Bonfim, Santo da
Igreja Católica, pelas baianas do Candomblé. Segundo A4, “para os católicos é uma
“coisa” realizada com o Santo Nosso Senhor do Bonfim para as baianas já têm outra
significação e elas estão comemorando outro aspecto dentro da religião delas”. A4 cita
ainda a utilização do alecrim, umas das ervas utilizadas na lavagem das escadas da
Igreja de Nosso Senhor Bonfim, nas atividades dos caboclos (Umbanda) através do
“[...] uso das folhas no preparo de chá para tosse com leite e ovos de galinha e também
para banhos, preparação de cama de Ìyàwó e preparação de água (macerado) para
lavagem de cabeça”.
O alecrim, de nome científico Rosmarinus officinalis L, Labiatae, associado
a Oxalá, divindade do céu e da procriação, o pai de todos os Orixás, é utilizado em
banhos e em defumações. Medicinalmente como chá, pode ser usado no caso de má
digestão. Se conservada em álcool pode combater o reumatismo e a encefalia por meio
de fricções locais (DAVID e DAVID, 2002). Seu
“óleo volátil é antibacteriano, enquanto que, a infusão da planta é usada
para o tratamento sintomático de problemas digestivos, devido as suas
propriedades antiespasmódicas e coleréticas, dada a presença de compostos
fenólicos” (SOUSA e LIMA, 2011, p. 11)

No Quadro 16 estão descritas as utilidades do alecrim e os seus constituintes


químicos.

152
Quadro 16 – As utilidades do alecrim: Rosmarinus officinalis L. Labiatae (LAMIACEAE)
Partes utilizadas Propriedades Medicinais Utilização Religiosa
Antimicótico, antifúngico, anti-helmíntico,
Ele é muito utilizado em
antiséptico, antiinflamatório, analgésico,
defumações, juntamente com
bactericida, colagogo, cicatrizante, colerético,
Talo, folhas, flores outras plantas, indicado
diurético, estimulante do sistema nervoso,
e óleo essencial. contra mal olhado. Em
estimulante do couro cabeludo, emenagoga,
Portugal, usava-se para livrar
expectorante, fungistático, hidrocolerético,
criança de quebranto.
hepatoprotetor, tônico, rubefaciente.
Constituintes Químicos: Tanino: ácido gálico (Figura 46); Flavonóide: apigenina (Figura 47);
Outros: Diterpenóides: ácidos ursólico; Óleos essenciais: mirceno.
Fonte: (BERNARDES e FERREIRA, 2007).

HO CO 2H

HO

OH
Figura 46 - Estrutura química do ácido gálico (C17H6O5)
OH

H3C O

CH3 O

Figura 47 Estrutura química da apigenina (C15H10O5)

No turno 109, A4 se surpreende mesmo sendo um estudante do curso de


Ciências Biológicas e que tenha feito a sua iniciação científica em Botânica: “Eu vi
muitas plantas que eles usam e eu não tinha nem noção que poderia ter um poder
espiritual pra eles”. Essa invisibilidade no uso das plantas pelos povos e comunidades
de matriz Africana, notadas por A4, é reflexo da pequena quantidade de pesquisa sobre
esses povos. Até o ano de 2015, quando da publicação do I Plano Nacional de
Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais de Matriz
Africana, “apenas sete levantamentos haviam sido realizados por instituições públicas,
privadas e universidades que buscaram cadastrar, inventariar ou mapear territórios
tradicionais de matriz africana” (BRASIL, 2013, p.18).
Também no turno 109, A4 se refere ao uso do algodoeiro, nome científico
Gossypium barbadense L, Malvaceae, associada ao Oxalá e a Orumilá, divindades do

153
conhecimento e da sabedoria e faz referências a elementos como a ar e o feminino. De
grande prestígio entre os Jêje-Nagôs é utilizado no combate a enfermidades próprias
da mulher, tais como: desordens menstruais, hemorragias pós-parto, inflamações e
dores no útero, retenção da placenta e para provocar contrações uterinas. Segundo
Barros, o algodoeiro é usado também nos “casos em que as senhoras que amamentam
não têm leite ou este é escasso, quando ele promove e faz aumentar a secreção das
glândulas mamárias” (BARROS e NAPOLEÃO, 2015, p.204).
No entanto, o algodoeiro que é utilizado no tratamento de vários “problemas
da mulher” (BARROS e NAPOLEÃO, 2015) não é capaz de aliviar a dor da
vulnerabilidade social imposta pela sociedade brasileira às mulheres em geral e, em
especial, à mulher negra moradora das comunidades tradicionais de matriz Africana.
Os resultados publicados na pesquisa Mapeando o Axé – Pesquisa Socioeconômica e
Cultural das Comunidades Tradicionais de Terreiro (2010/2011) (BRASIL, 2013)
corroboram essa assertiva. Das 7.582 casas de povos e comunidades tradicionais de
matriz Africana pesquisadas, 72% das lideranças se autodeclararam negras e 55,6%
são mulheres. Mesmo com esse protagonismo as mulheres negras vivenciam o mais
alto grau de vulnerabilidade social.
O Quadro 17 apresenta dados coletados em 2013 e apresentados em 2015 da
Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) do IBGE (BRASIL, 2015).
Entre as mulheres, que representam mais da metade da população brasileira (51,5%),
as negras são metade, ou seja, representavam em 2015 52,7 milhões de brasileiras.
Segundo essa pesquisa o rendimento médio de uma mulher negra é o menor do Brasil.
Os dados referentes à situação de pobreza, por sua vez, indicam que 7,4% das mulheres
negras brasileiras vivem em situação de extrema pobreza.

Quadro 17 - Dados Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) do IBGE (2015).

Indicativo Mulher Negra Homem Branco


Rendimento médio R$ 655, 70 R$ 1.675,10
Situação de pobreza 13,4% 5,6%
Situação de extrema pobreza 7,4% 2,9%
Fonte: Adaptado de (BRASIL, 2015).

Esses dados significam, de fato, que o rendimento médio de um homem

154
branco é 2,5 vezes maior do que o rendimento de uma mulher negra. Indicam, também,
que o número de mulheres negras em situação de pobreza extrema é 2,5 vezes maior
que o número de homens brancos na mesma situação e, ainda, que o número de homens
brancos em situação de pobreza é 2,4 vezes menor que o número de mulheres negras.
A possibilidade de ressaltar a importância dos conhecimentos de
comunidades tradicionais Afro-brasileiras sobre ervas e plantas medicinais em aula de
Química representa uma alternativa de combate às violências sofridas por estas
comunidades. Pois, conhecimento científico e saber tradicional são formas de procurar
entender e agir sobre o mundo, formas de produzir cultura e, também, obras inacabadas
e em constante negociação entre as respectivas comunidades científica e tradicional.
Estabelecer o diálogo entre essas diferentes formas de se relacionar com o mundo é
necessário para romper com o epistemícidio que atinge nossas salas de aula.
No tópico 3.5 serão tratados e analisados os resultados obtidos numa IP, que
foi ministrado em aulas de Química Geral Prática, para turmas de engenharia. Serão
tratados das técnicas estudadas em disciplinas de química analítica que ajudam a
discutir a arqueologia da África e, consequentemente, recontar a história daquele
continente de uma maneira mais positiva, assim como apregoam as diretrizes e
orientações para a ERER já citadas nesse trabalho.

155
3.5 LEITE EM “MAMA” ÁFRICA E A EDUCAÇÃO PARA AS RELAÇÕES
ÉTNICO-RACIAIS (ERER) NO ENSINO DE QUÍMICA22
Apresentaremos neste subcapítulo os dados a investigação uma Intervenção
Pedagógica (IP) que versou sobre a descoberta de produção leiteira em África no
século V antes da era Cristã (a.C.), bem como o papel da Química na validação dessas
descobertas por meio de suas técnicas analíticas e a partir desses temas, de maneira
multidisciplinar, como isso se relaciona com os conteúdos contemplados na ementa de
um curso de graduação. Avaliamos, também, a existência ou não de autoria nos
textos/discursos produzidos pelos sujeitos da investigação (SI) em forma de
seminários e relatórios.
A disciplina cujo título é Química Geral Experimental possui a ementa
disposta no Quadro18.
Quadro 18 - Ementa da disciplina Química Geral Experimental.
Experimentos de laboratório relacionados aos seguintes temas: correlações entre
propriedades elétricas da matéria (sólidos, líquidos e soluções) e comportamento/estrutura química,
equilíbrio químico, reações de óxido redução, células galvânicas e equação de Nernst.

A IP tratou sobre “As primeiras produções leiteiras no continente africano e os


testes qualitativos para a detecção de fraudes no leite” e se deu em cinco momentos.
O Quadro 19 mostra as etapas desta IP.

Quadro 19 - Etapas e desenvolvimento das Intervenções Pedagógicas/Pesquisa.


Etapa Desenvolvimento

Disposição por parte de PF e PFD do artigo intitulado: “First dairying in green Saharan

Africa in the fifth millennium BC” e do roteiro experimental.
Divisão dos SI em quatro grupos para a realização, discussão e produção de vídeos dos

experimentos.

Criação de um grupo em rede social para gerir dúvidas sobre os conceitos envolvidos, a

produção de vídeos e a formatação dos seminários.

Apresentação de seminários contendo os seguintes itens: i) resumo/resenha do artigo; ii)



apresentação dos vídeos e; iii) discussão dos experimentos.

Avaliação dos discursos produzidos pelos alunos, tanto em áudio como escritos, segundo a
5ª análise de discurso (AD) de Bakhtin e verificação de existência ou não de autoria nos textos
produzidos pelos SI.

Este trabalho é uma versão publicada do texto apresentado pelos/ as autores/as intitulado “Leite em
22

“mama” áfrica e a educação para as relações étnico-raciais (erer) no ensino de química” na Revista
Química Nova, São Paulo, 2019, assim optou-se pelo título mais específico, em questão (no prelo).

156
O corpus de análise foi formado pelo planejamento da IP e pela transcrição de
2h:17min provenientes de gravação em áudio e vídeo. Os dados obtidos foram
agrupados por unidades de significação e analisados segundo a técnica de Análise do
Discurso (AD) de Bakhtin. O Quadro 20 mostra o planejamento simplificado da aula.

Quadro 20 - Planejamento simplificado da aula.

Contextualização/Abordagem
Tema Conteúdo/abordagem conceitual
Cultural
Surgimento da produção leiteira
Reações químicas com o Separação de substâncias, reações ácido- no norte da África e sua
leite. base e reações de óxido-redução. ressignificação na diáspora
africana no Brasil.

Os experimentos foram adaptados da Apostila de Aulas Práticas de


Farmacognosia (UFBA, 2012). O Quadro 21 mostra o procedimento experimental.

Quadro 21 - Procedimento experimental.

Realizar testes qualitativos para verificação de substâncias


Objetivo
estranhas no leite.

Chapas de aquecimento, tubos de ensaio, béquer de 250 mL,


Materiais provetas de 10 mL, bureta de 25 mL, erlenmayer de 125 mL e pedaços de
pano branco.

Solução de lugol, cloreto férrico a 1% m/v, NaOH 0,1 mol/L, KI


0,5 mol/L Glicerina PA. Formol PA, Vinagre comercial e solução alcoólica
Reagentes
de fenolftaleína a 1% m/v, leite previamente contaminado com amido,
ácido salicílico, ácido bórico e Pb2+.

Coloque 5 mL de leite em um tubo de ensaio e aqueça-o


Teste para
ligeiramente. Adicione 5 a 6 gotas de solução de lugol. Se o leite contiver
amido
amido, aparecerá uma coloração que pode ser azul, roxa ou quase preta.

Acrescente de 4 a 5 gotas de solução de cloreto de ferro III em 10


Teste para
mL de soro obtido no teste para extração da caseína. O aparecimento de
ácido salicílico e
uma coloração que vai do rosa até o violeta indica a presença do ânion
salicilatos
salicilato.

Em um erlenmeyer acrescente 3 gotas de fenolftaleína em 5 mL


de leite. Adicione NaOH 0,1M, gota a gota, até o aparecimento de uma leve
coloração rósea. Acrescente, então, 1mL de glicerina. Se a cor rósea
Teste para o
desaparecer pode ser indício da presença de ácido bórico. Isso porque o
ácido bórico
H3BO3, que é um ácido muito fraco em soluções aquosas, apresenta maior
grau de ionização em glicerina, o suficiente para fazer desaparecer a
coloração rósea.

Identificação
Adicione gotas de KI até formação de um precipitado amarelo.
de Pb2+

157
Cabe ressaltar que o que se pretende nesta investigação não é uma repetição
de testes qualitativos para a verificação de substâncias estranhas ao leite. Trata-se de
uma pesquisa sobre como o/a professor/a do ensino superior de Ciências, em especial
o de Química, a partir de elementos diaspóricos, neste caso, a produção leiteira no
norte da África por volta de cinco mil anos antes da era cristã (a.C.), pode fazer o
deslocamento epistêmico do currículo e tecer representatividades sobre quem se é e
para quem se ensina.
No Brasil e em alguns países da América espanhola e Caribe o colonizador
sempre fez questão de invisibilizar os conhecimentos e as culturas dos povos
colonizados. Os povos pré-colombianos que aqui existiam antes da chegada do
colonizador e os escravizados/as africanos/as já possuíam, ainda em suas terras,
conhecimentos em diferentes áreas antes de serem arrancando a força para terem aqui,
do outro lado do Atlântico, as suas mãos de obra especializadas exploradas e
escravizadas no desenvolvimento destas terras.
Sobre isso, a Química tem contribuído sobremaneira com os arqueólogos para
que as histórias dos povos que viviam no continente africano antes da chegada do
europeu naquele lugar sejam recontadas. Um exemplo consiste nos discursos sobre a
produção leiteira praticada pelos povos do norte da África, região da atual Líbia, no
século V (a.C.), mostrado no extrato 14 que corroboram com essa assertiva. Cabe
ressaltar que os extratos aqui apresentados significam partes dos discursos produzidos
pelos SI tanto na forma falada como na forma escrita, durante a pesquisa, e que cada
fala corresponde a um turno representado no texto por T que são enumerados de acordo
com a sequência da IP.

Extrato 14 - Discursos sobre a produção leiteria em África no século V (a.C.)


T.29 – A5: A produção de cerâmica começa cedo no norte da África. Esse potencial surgiu para
suprimir as práticas alimentares e de subsistência. Foram utilizadas análises moleculares e
isotópicas.
T.44 – A6: [...] a gente estuda pegando o ponto de vista europeu. [...] surge primeiro a agricultura
e depois o pastoreio. E do pastoreio, o leite e a própria carne. Mas no estudo falou que na África
elas (as comunidades), inicialmente, eram sedentárias, a prática comum de usar o pastoreio,
apesar de não ter o registro do uso da carne. Eles acharam registro de consumo do leite [...].
T.62 – A8: [...] foi possível demonstrar a existência da criação de gado, porque eles guardavam
os produtos advindos do gado dentro dessas cerâmicas. Essas cerâmicas conservavam muitas
partes das proteínas e gorduras de leite animal por vários anos e quando essas cerâmicas foram
encontradas, através de alguns experimentos realizados, acabou de distinguir que essas proteínas
eram de leite de vaca ou outros animais ruminantes.
T.63 – A9: [...] foram extraídas 81 amostras de cerâmicas para passarem por diversas técnicas
de análises, por presença de gordura. E destas, 29 passaram por análises de cromatografia

158
gasosa, infravermelho e espectrometria de massas, onde 18 apresentaram evidências de gorduras
de origem animal e 11 tinham perfis de lipídios providos da mistura de gordura animal e vegetal.
T.65 – A9: E só para completar: a partir desses resultados obtiveram evidências que o leite era
praticamente a dieta deles, da população.

A cerâmica é citada nos turnos T.29, T.62 e T.63 como evidência da presença
humana no norte da África no século V (a.C.). Silva (2013) afirma que “a mais antiga
cerâmica africana datada provém do Saara Central de cerca de 6100 a.C.” (p.200). No
entanto, nesse mesmo trabalho Silva afirma que “em algumas regiões da África como
o Air, ao norte do Níger, a cerâmica tem mais de 9 mil anos” (p.207).
Nos resultados mostrados no T.63, A9 cita as técnicas de cromatografia gasosa
(CG), análise de espectroscopia na região do infravermelho (IV) e espectrometria de
massas (MS) usadas na confirmação da prática leiteira no norte da África. Ainda no
T.63, A9 afirma que de 29 amostras estudadas 18 possuíam evidências da presença de
gordura animal e 11 apresentavam perfis de lipídios oriundos da mistura de gordura
animal e vegetal. Sobre os diversos materiais arqueológicos existentes que ajudam a
recontar a história da África, “alguns deles, como alimentos, unguentos, resinas, óleos
e ceras, são totais ou parcialmente orgânicos. Outros, como metais, pigmentos,
cerâmicas, vidro e gesso, são inorgânicos” (ISKANDER, 2010, p.215).
Esses materiais são identificados e determinados por meio das técnicas
estudadas nas disciplinas de Química Analítica e Análise Instrumental nos diferentes
cursos de graduação em Química e afins, chamados pelos arqueólogos de
arqueometria, como a absorção atômica, a difração e a fluorescência de raios X, a
cromatografia, a ativação por nêutrons, a microscopia, a radiografia e outros.

Os materiais orgânicos são geralmente submetidos a combustão,


saponificação, dissolução, radiação infravermelha, análise térmica e
cromatográfica. Os materiais inorgânicos são submetidos às análises
normais em meio aquoso, à espectrometria, à fluorescência de raios X, à
difração de raios X ou à ativação por nêutrons, conforme o tipo de
informação procurada (ISKANDER, 2010, p.215).

As técnicas arqueométricas citadas anteriormente nos permitem dizer que


existiu no norte da África uma criação de gado para a produção leiteira, como mostrado
nos turnos T.44 por A6 ([...] mas no estudo falou que na África [...]eles acharam
registro de consumo do leite [...]), em T.62 por A8 ([...] foi possível demonstrar a
existência da criação de gado, porque eles guardavam os produtos advindos do gado
dentro dessas cerâmicas. Essas cerâmicas conservavam muitas partes das proteínas [...]

159
que essas proteínas eram de leite de vaca ou outros animais ruminantes) e no T.65 por
A9 (a partir desses resultados obtiveram evidências que o leite era praticamente a dieta
deles, da população.).
Importa dizer que a domesticação e o pastorialismo do gado “tiveram uma
função determinante em grande parte das culturas africanas redundando em
implicações sociais decisivas” (SILVA, 2013, p.221), para diferentes povos. Dentre
esses, podem ser citados: os Ba-ila do nordeste da Rodésia, atual Zimbabue; os Herero
de Angola, Namíbia e Botsuana; os Fula da Nigéria, Guiné, Senegal e Mali; e os Bigajó
da Guiné-Bissau. “Para alguns desses povos, por exemplo, os herero [...] o número de
cabeças de gado que um herero possui determina toda a sua vida social” (SILVA, 2013,
p.221-222). E isso não é diferente do que acontece, guardadas as devidas proporções,
com os grandes pecuaristas brasileiros e goianos, porém com um viés totalmente
capitalista. Os primeiros exemplares de gados que originaram essa grande expansão
pecuária conhecida hoje no nosso país foram provenientes de Cabo Verde, já no século
XVI (LOPEZ e MOTa, 2008 apud SILVA, 2013, p.223).

Mais tarde, em 1582, as duas ilhas principais, Fogo e Santiago, contarão


1600 brancos, 400 negros livres e 13700 escravos. A economia das ilhas
no século XVI baseava-se na criação de gado, na cultura do algodão e
na tecelagem através de técnicas africanas. Logo, não mais contentes
com importar escravos para uso próprio, as ilhas passaram a exportá-los
para a América (NIANE, 2010, p.356).

No entanto, a criação de gado em campo aberto típica de várias regiões


africanas, diferentemente do que acontecia nas regiões de mineração e nas
comunidades açucareiras no Brasil Colônia, não recebeu uma influência africana tão
expressiva por parte dos/as negros/as escravizados/as. Essa atividade, criação de gado
em campo aberto, era exercida por negros/as pobres livres. Isso se explica pelo fato de
ser muito mais fácil controlar o negro escravizado em um espaço circunscrito
(comunidade açucareira e região mineradora) do que em campos aberto de criação de
gado (SILVA, 2013, p.223). Mesmo assim, nota-se em todo o país influências diretas
e indiretas das tradições vaqueiras vindas de África. Passamos a elencar algumas:
i) nas tradições festivas brasileiras como os cordões, os ranchos, nas confrarias
negras, nos maracatus do nordeste e em elementos do bumba-meu-boi;
ii) o arado puxado por boi, comum ainda hoje em algumas regiões do Brasil,
tem origem egípcia, mas já era usado na África Central em cerca de 3 mil a.C.;

160
iii) conhecimento de técnicas de criação e manejo de gado;
iv) conhecimento popular e superstições diversas relacionadas ao aumento da
fertilização e contenção da prenha, aumento da produção do leite;
v) conserva e melhoramento do sabor da carne a partir de métodos tradicionais
de secagem, defumação e salga (SILVA, 2013).
Existem registros que vinculam as tradições africanas com a sertaneja brasileira
relacionada à criação de gado em ambas as culturas.

Sabe-se, por exemplo, que o esterco é utilizado como combustível de


fogueira para a preparação de alimentos, como fertilizante na agricultura
e no contexto de uso medicinal. Fala-se ainda na utilização da gordura,
banha e sebo contra queimaduras. As parteiras e benzedeiras sertanejas
e africanas fizeram uso de gordura animal a ser colocada na vagina para
facilitação do parto. Ainda dentro deste campo medicinal, o uso da pata
de porco e de vaca contra cólica infantil, febre, e etc, podem ser,
juntamente com a jóia protetiva da fita de couro usada com o colar no
pescoço e utilizada como proteção contra coqueluche, são alguns dos
exemplos de convergência cultural Brasil-África no quesito da tradição
vaqueira (SILVA, 2013, p.224).

No T.65, A9 afirma que sobre evidências do leite ter sido a dieta da população
do norte da África e essa dieta de consumo do leite caprino e bovino, como se sabe, é
um hábito há bastante tempo arraigado na cultura brasileira e africana. Em países como
a Tanzânia, onde a carne ou outras fontes de proteína são escassas, o leite bovino se
torna um dos principais produtos consumíveis de origem animal. No entanto, para que
esse leite sirva para o consumo, ele precisa ser resfriado. Para contornar tal problema
é realizada a sua liofilização, tornando-o pó. Pelo fato de existir apenas algumas
fábricas de leite em pó na África Subsaariana (onde se localiza a Tanzânia) esse
alimento é suprido pelo leite em pó importado (SAGER et al., 2018).

A demanda é tal que até 55% da produção mundial de leite em pó é vendida


para o continente africano a cada ano ( Organização das Nações Unidas
para Alimentação e Agricultura, 2013). [...] O leite em pó importado não é
apenas uma ajuda alimentar para milhões de africanos desnutridos, também
é recomendado como um substituto do leite materno para bebês saudáveis
de mulheres com HIV / AIDS. De forma alarmante, cerca de 30% a 50%
de todas as infecções por HIV em crianças africanas resultam
da amamentação de mães infectadas (WHO, 2010 apud SAGER et al.,
2018, p.366 ) tradução dos autores.

Essa alta demanda por leite importado fez com que surgisse na Tanzânia um
mercado informal de leite em pó e as mesmas técnicas analíticas citadas neste trabalho
que comprovam a produção de leite no Norte da África, acerca de cinco mil anos (a.C.),

161
têm sido usadas para detectar contaminantes no leite em pó vendido no mercado
informal na Tanzânia e em outros países africanos. Em artigo publicado por Sager et
al, (2018), por meio de técnicas de espectrometria de massas acoplada com plasma
(ICP–MS), verificou-se que 2,3% do leite em pó vendido no mercado informal na
Tanzânia estava contaminado a uma concentração de 240 µg/kg de peso seco de
chumbo, superior ao limiar europeu de 130 µg/kg de peso seco (SAGER et al., 2018).
No Brasil, a substituição do leite materno pelo leite bovino ou caprino fez com
que o leite se tornasse uma substância de importância considerável na cadeia produtiva
da economia. E com o intuito de aumentar a sua margem de lucro, tal como na África,
não é raro ver nos noticiários relatos de adição de substâncias estranhas ao leite com o
objetivo de fraudar ou mascarar algumas dessas fraudes por parte do empresariado da
indústria láctea brasileira. Segundo Souza (2005), “produtos lácteos inseguros, a partir
de leite cru, são encontrados a venda em todo o território nacional ameaçando a saúde
da população em geral, em especial as crianças e idosos” (p.18-19). O Extrato 15
mostra os textos produzidos pelos SI a respeito da adição de amido, ânion salicilato e
ácido bórico com o objetivo de fraudar o leite.

Extrato 15 - Discursos sobre as substâncias estranhas ao leite.

T.36 – A6: [...] o amido vem sendo utilizado na fraude do leite. Como esse composto
possui baixo custo, ele está sendo adicionado de forma fraudulenta com o objetivo de
aumentar o volume e o peso do alimento. No caso de leite fluido, ele pode ser usado com
finalidade de disfarçar a adição de água, pois corrige a densidade original do leite.
T.57 – A7: O ânion salicilato [...] é usado na dermatologia e tem a característica, também,
antimicrobiana. Essa característica é utilizada para fraudar o leite, pra deixar durar mais
e passar do prazo de validade. E ele está lá para o consumo. Em algumas indústrias pode
ser feita essa utilização para manter como conservante.
T.84 – A10: [...] o ácido bórico [...] é usado por causa do seu efeito antisséptico. A gente
vê isso em produtos antissépticos de uso de limpeza; a gente vê também até na limpeza
ocular, colírio; para determinadas reações, não são todas né, e por causa disso ele serve
na conservação do leite evitando a ação de microrganismos aumentando a longevidade.

No discurso de A6, retirado de um dos slides da apresentação do seminário


proferido pelo seu grupo, existe a afirmação que o amido é adicionado ao leite, após a
adição de água, com o objetivo de corrigir sua densidade original. Afirma ainda no
T.36 que o amido aumenta o volume e o peso do alimento.
Inicialmente, nota-se uma confusão bastante comum tanto nos discursos
científicos quanto nos populares sobre a substituição da palavra massa pela palavra
peso. Na realidade, o amido aumenta a massa do leite e com isso aumenta a sua

162
densidade fazendo com que essa atinja o valor próximo daquele que antecipa a adição
da água. E peso, como se sabe, é uma medida de força exercida por um corpo sobre a
atração gravitacional e é medido por meio da equação P = m.g, (XI) onde P é peso, m
é massa em gramas e g é a aceleração da gravidade que na Terra é de 9,8m/s2. Portanto,
o peso de um corpo vai depender da aceleração da gravidade de um determinado local.
Assim, uma pessoa de massa igual a 80 Kg terá pesos diferentes na Terra e na Lua.
Nota-se também que não existe autoria no texto produzido por A6 no T.36,
pois este é encontrado numa rápida busca na internet. A Figura 48 traz uma captura de
tela do texto copiado por A6 e colocado em seu slide.

Figura 48 - Captura de tela do texto copiado por A6.

Para além da preocupação ética que a universidade precisa ter para com seus
alunos/as quanto a plágios em seus trabalhos acadêmicos e científicos é preciso que
estes saibam utilizar a internet em prol de seus aprendizados. Hoje é muito comum
ouvirmos reclamações de professores/as que ministram aulas práticas quanto à
presença do chamado “Ctrl C” “Ctrl V” nos relatórios de seus alunos/as. Desta
maneira, em relação a ter a internet como fonte de pesquisa entendemos que:

[...] O leitor precisa traçar, frente a um universo de possibilidades, um


caminho coerente com seus objetivos que o permita dialogar com diferentes
textos para construir dialogicamente um novo texto [...]. Para que o espaço
digital seja produtivo para a pesquisa escolar é necessário que o leitor tenha
habilidade de ir além da cópia, ou seja, é preciso atualizar sentidos, revelar
autoria diante da produção materializada no gênero pesquisa escolar
(CARDOSO, 2017, p.23).

Entendemos, também, que numa construção dialógica A6 poderia e deveria sim


consultar o site referenciado na Figura 46, pois neste caso estaria presente a atmosfera
do “já dito”. Então, esse discurso poderia lhe orientar para um discurso-resposta
(BAKTHIN, 1993). Assim, seria possível a produção de um texto próprio marcado por

163
suas histórias, vivências culturais, seus pontos de vistas e sua subjetividade. Para
Bakhtin (2003), a subjetividade:

que perpassa a autoria não é uma subjetividade solitária, individual, uma


vez que, o sujeito falante é sempre um ser social, constituído
dialogicamente pelo outro(s). Assim, a autoria ao mesmo tempo em que é
marcada pela subjetividade também é marcada pelo social, pelo diálogo
travado por diferentes vozes, por diferentes pontos de vista (CARDOSO,
2017, p.26).

Nos T.57 e T.84, A7 e A10 falam da adição do ânion salicilato e do ácido


bórico como conservantes para que o leite fraudado se conserve por mais tempo.
Diferente do que aconteceu no discurso de A6, nos discursos de A7 e A10 notamos a
presença de autoria em seus textos já que ambos indicam, dentre outras referências, o
artigo “Experiências Lácteas” em que as enunciações que em relação ao ânion
salicilato e ao ácido bórico são de que servem para “conservar o leite, evitando a ação
de microrganismos” (LISBOA e BOSSOIANI, 1997, p.31).
No T.57, a autoria do texto de A7 é verificada quando este faz alusão às
características antimicrobianas do ânion salicilato com o uso deste ânion na fraude do
leite com a enunciação, omo mostrado no turno T.57 por A7 (A7: [...] é usado na
dermatologia e tem a característica, também, antimicrobiana. Essa característica é
utilizada para fraudar o leite, pra deixar durar mais e passar do prazo de validade.). Por
essa enunciação, ainda que truncada, pode se afirmar que o discurso (texto) de A7 foi
formado pela atmosfera do já dito (uso do artigo “Experiências Lácteas”) e outros sites
mencionados em suas referências bibliográficas e a partir daí forma o seu próprio texto
marcado pelo seu ponto de vista, por exemplo, como mostrado no turno T.57 por A7
(A7: pra deixar durar mais e passar do prazo de validade). Portanto ouve-se a voz de
A7 nas diferentes vozes presentes nos resultados dessa pesquisa. A Figura 49 é uma
captura de tela reduzida de um dos slides utilizado por A10 e seu grupo na apresentação
do seminário como parte da IP que originou essa pesquisa.

164
Figura 49 - Captura de tela de um dos slides apresentados nos seminários

Para responder a questão “porque adicionar ácido bórico no leite?”, as


enunciações presentes são em forma de enumeração e na transcrição da fala de A10
vemos que o mesmo utilizou essa enumeração apenas para “catalisar” o seu discurso,
ou seja, a produção do seu texto. Nas enunciações de A10, o mesmo fala dos diversos
usos do ácido bórico em produtos antissépticos e de limpeza, por exemplo, o colírio,
como mostrado no turno T.84 por A10 (A10: por causa disso ele serve na conservação
do leite evitando a ação de microrganismos aumentando longevidade). Portanto, assim
como no discurso de A7, houve autoria de texto, houve a formação de conceitos por
parte de A10 e de seus colegas de grupo quando da apresentação do seminário. Vemos,
novamente, a presença de diferentes vozes no discurso de A10, o que Bakhtin chama
de polifonia.
O ácido bórico e outras substâncias estranhas ao leite podem ser detectadas
qualitativamente em laboratório por meio de ensaios rápidos, eficientes e de baixo
custo e se presta a discussão de diferentes conceitos químicos e bioquímicos, tanto em
nível básico quanto no superior. O Extrato 16 mostra os textos discursivos referentes
aos testes de determinação do amido.
Extrato 16 - Discursos sobre a determinação de amido presente em amostras de
leite.
T.32 – A6: [...] O lugol é uma solução de iodo (1%) em equilíbrio com KI (2%), em água destilada.
Este reagente reage com o amido [...] formando um complexo [...] que se caracteriza por ser
colorido [...]. Com o amido a coloração típica é o azul escuro [...]. O aquecimento promove a
abertura da cadeia helicoidal da molécula de amido permitindo a adsorção do iodo à amilose. O
complexo formado possui coloração azul característica após o resfriamento.
T.33 – A5: Essa abertura da cadeia que ele fala é o que permite a reação do iodo, lugol, com o
amido presente no leite. Então, é necessário aquecer pra que haja a reação e ter o resultado
esperado do teste.
T.34 – A6: Bem, com o amido dissolvido observamos que ao adicionar gotas da solução de lugol
ocorre a formação de uma coloração azul escuro. Este azul é o produto da reação entre o íon
triiodeto e o amido formando um complexo que possui está coloração característica. E aí tem a
ionização do iodo que reage com o iodeto formando o I 3- e reage com o amido formando o
complexo.
I2+ I-⇌ I3-
I3-+ amido ⇌ complexo azul
T.35 – A5: Azul. Eu até procurei o nome e só achei complexo azul, esse dever ser o nome.

Baseados nos estudos de Johnstone (1993) sobre a classificação dos níveis do


conhecimento químico – macroscópico, microscópico e simbólico – Mortimer e
colaboradores (2000) redimensionam esses aspectos e passam a denominá-los de

165
fenomenológico, teórico e representacional, respectivamente. O nível teórico se refere
ao “conhecimento de natureza atômico-molecular, envolvendo, portanto, explicações
baseadas em modelos abstratos e que incluem entidades não diretamente perceptíveis,
como átomos, moléculas, íons, elétrons etc.” (MoRTIMER et al., 2000, p. 276). Esse
nível está presente nos nossos resultados na enunciação de A6 no turno T.34 (A6: E aí

tem a ionização do iodo, que reage com o iodeto formando o I3- e reage com o amido
formando o complexo.). O nível representacional compreende informações
características do pensamento e linguagem química, como as fórmulas e equações
químicas. Diante disso:

É possível pensar que a equação química e a linguagem química sejam


instrumentos para a elaboração do pensamento químico, ou seja, com e
pela linguagem química, no movimento de significação dessas
representações uma certa forma de pensar vá constituindo-se
(MACHADO, 2004, p.170).

Este nível também aparece nos nossos resultados na enunciação de A6, ainda

no T.34 (I2+I- ⇌I3- → I3- + amido ⇌complexo azul). No entanto, A6 não escreve a
fórmula química do amido nem a do complexo azul formado, como relatado no turno
T.35 por A5 (eu até procurei o nome e só achei complexo azul, esse deve ser o
nome). Ou seja, no seu material de pesquisa (o já dito) para resolver essa questão
não foi encontrado o nome do complexo formado (A5: complexo azul).
Todavia, se considerarmos que o amido é “constituído por dois polímeros
que diferem na estrutura da molécula: a amilose (10-20%) e a amilopectina (80-
90%)” (MAPA/SDA/CGAL, 2012, p.1) e fazendo uma extrapolação para a
nomenclatura dos complexos metálicos podemos inferir, salvo melhor juízo, que o
complexo tenha a nomenclatura de poliamilato de tri-iodo.
A coloração azul típica desse complexo de amido com o iodo, mostrados nos
discursos de A5 e A6 nos turnos T.32, T.33 e T.35, se refere a um dos aspectos do
conhecimento químico: o fenomenológico. Esse aspecto se refere ao campo
perceptível do nosso sistema sensorial quando da ocorrência de alguma reação
química, como a visualização de mudança de cor, a formação de um precipitado, a
percepção de um determinado odor, a liberação ou absorção de calor ou ainda a
interação radiação-matéria que não pode ser visualizada, mas que pode ser medida,

166
como a análise de infravermelho, medida de concentração de algum elemento por
emissão ou absorção atômica (AA), etc.
A técnica de (AA) pode, por exemplo, determinar a concentração de íons Pb2+
em amostras de leite, desde que esses íons estejam dentro da faixa de detecção.
Diferente do que aconteceu na Tanzânia, reportado por Sager e colaboradores (2018)
e já relatado neste trabalho, no Brasil a contaminação por chumbo se dá pela
intoxicação de bovinos por exposição ambiental ou ingestão de ração contaminada
com esse metal (Okada et al., 1997). Uma análise desse tipo é trabalhosa para se fazer
em uma aula prática de química geral ou no ensino médio, que foram objetivos desse
subcapítulo.
No entanto, análises qualitativas de identificação de Pb2+ em amostra de leite
previamente contaminado com esse metal podem ser realizadas a partir de reações com
KI em excesso ou K2CrO4 (Oliveira et al., 2006, p.31). A título de ilustração, para essa
pesquisa fizemos a primeira reação. A Figura 50 mostra duas fotos com a amostra de
leite antes e depois da reação com o KI, bem como a equação que representa essa
reação química.

Figura 50 – Foto de uma amostra de leite contaminado com Pb2+ antes e após reação com o KI

Nessas duas situações ocorrerão as formações de precitados amarelos de PbI2


e PbCrO4. Discussões sobre os conceitos de Kps, de reagente limitante (ensino
superior) ou de reações de precipitação (ensino médio) podem ser suscitadas a partir
desses experimentos. Importa ressaltar que a coloração amarela desses precipitados
caracteriza o aspecto fenomenológico do conhecimento químico que está presente,
também, nas relações sociais que se estabelecem por meio da química. Assim:

[...] falar sobre o supermercado, sobre o posto de gasolina é, também, uma


recorrência fenomenológica. Neste caso o fenômeno está materializado na

167
atividade social. E é isso que vai dar significado para a Química do ponto
de vista do aluno. São as relações sociais que ele estabelece através da
Química que mostram que a Química está na sociedade, no ambiente
(MORTIMER et al., 2000, p.276).

Por isso defendemos que ao falar da produção leiteira que aconteceu no norte
da África há cinco mil anos, que foi comprovado através de ensaios químicos e que
ensaios químicos também podem ser usados para detectar substâncias estranhas
presentes no leite e, a partir dessas análises poder explorar e desenvolver vários
conceitos químicos, estamos dando outro significado para o/a aluno/a que estuda
química em nível superior e na educação básica.
No tópico 3.6 serão tratados e analisados os resultados obtidos numa IP cujo
título foi “sobre o Apartheid e a platina: utilizando o cinema na aplicação da lei
10.639/03 no currículo da química”, que foi ministrado para a turma de NL. Essa IP
foi ministrada em cumprimento ao tópico da ementa “produção de diamantes e metais
nobres em alguns países do continente africano e suas implicações nas guerras civis
em África da disciplina de NL.

168
3.6 O APARTHEID E A PRODUÇÃO DE METAIS NOBRES NA ÁFRICA DO
SUL. 23
Considerando que a sociedade brasileira é multirracial é possível notar uma
omissão da diversidade cultural, étnica e racial nos currículos escolares (PEREIRA e
CORDEIRO, 2014). Concordamos com Lopes que

“[...] a cultura dominante efetiva é transmitida na escola como sendo fruto


de uma tradição, o chamado conhecimento universal sistematizado. Assim,
somos levados a acreditar que o tempo expulsou conflitos e interesses da
cultura, selecionou o que havia de melhor” (LOPES, 1998, p. 34).

Desta forma, “identificamos o currículo oficial em prol de uma cultura


burguesa, descaracterizadora das outras culturas que fizeram e/ou fazem parte da
construção da sociedade brasileira” (PEREIRA e CORDEIRO, 2014, p. 8). Importa
ainda, evidenciar que nos colocamos do lado daqueles que defendem que o currículo,
[...] “não é uma seriação de conteúdos criados para serem “decifrados” ou
“decodificados”, pois, nesses moldes, o currículo mantém-se conservador, recheado
de valores etnocêntricos próprios da cultura europeizada” (PEREIRA e CORDEIRO,
2014, p. 9).
Defendemos que “falar em educação e currículo é necessariamente falar em
como a sociedade compreende cultura e conhecimento, quais processos a sociedade
utiliza para legitimar determinados saberes em detrimento de outros” (LOPES, 1998,
p. 33). A sala de aula de química é ambiente dinâmico e complexo no qual se integram
ferramentas culturais à ação mediada. Baseados em Setton (2004), defendemos que
os produtos da ficção midiática (como qualquer outro produto da cultura), tal como o
cinema, têm o poder de transcodificar discursos, sendo também documentos que
contam a história, os anseios e os conflitos de um povo.

O CINEMA EM SALA DE AULA


Desde muito tempo, o ser humano dialoga com a produção cinematográfica.

23
Este trabalho é uma versão publicada do texto apresentado pelos/ as autores/as como capitulo de livro
intitulado: O papel do currículo sob a ótica cinematográfica de Sarafina: uma experiência com a Lei
10.639/03 ensino de química. In: BENITE, A. M. C.; CAMARGO, M. J. R.; AMAURO, N. Q (Orgs.)
Trajetórias de descolonização da escola: o enfrentamento do racismo no ensino de Ciências e
Tecnologias. Belo Horizonte: Nandyala, 2019 (prelo), assim optou-se pelo título mais específico, em
questão.

169
Conforme Cunha e Giordan (2009),

“a história do cinema pode ser contada a partir da busca do homem em


reproduzir a imagem em movimento. Há 12 mil anos, o homem das
cavernas já desenhava animais com oito patas na tentativa de representar o
movimento” (p. 14).

A utilização de filmes na sala de aula tem sido incentivada nos últimos anos,
especialmente pelo aspecto tecnológico da questão, (CUNHA e GIORDAN, 2009, p.
14). Para Santos e Aquino (2011),

“seu uso em sala de aula insere-se no campo das chamadas mídias-


educação, ligadas às tecnologias de informação. Diferentemente das outras
mídias (áudio, vídeo, internet), o cinema permite um envolvimento do
espectador com o filme a que assiste, relacionando situações e experiências
vividas” (p. 160).

Por sua vez, desempenha indiretamente um papel educacional relevante,


enuncia discursos e estabelece diálogos entre diferentes comunidades (ARROIO e
GIORDAN, 2006). Por isso a escola precisa mediar criticamente os aspectos da cultura
cotidiana no contexto escolar, no sentido de intervir positivamente na interpretação
dos meios de comunicação (CUNHA e GIORDAN, 2009, p. 16).
Ao se selecionar um filme para trabalho em sala de aula é preciso [...]
considerar seu alcance, o que pode ser discutido [...] “e em muitos deles, encontrar
dados da realidade que são interpretados pelos realizadores dos filmes. Levar essa
discussão para a sala de aula é importante, pois não há obra que não carregue as marcas
do autor, suas intenções” (CUNHA e GIORDAN, 2009, p. 16).
Sendo assim, para a utilização do cinema em sala de aula é necessário retirar o
filme de seu espaço de circulação imediato, ou seja, do seu contexto normal de
exibição (usado como entretenimento) para, posteriormente, submetê-lo ao debate
estabelecido a priori (SETTON, 2004, apud CUNHA e GIORDAN, 2009, p. 16). Por
essa razão, [...] o professor deve ter em mente, quando utilizar recursos audiovisuais,
qual é a matriz cultural a partir da qual foi construída a obra que será exibida, qual é a
matriz cultural da sala de aula, e as possibilidades de relação entre elas (ARROIO e
GIORDAN, 2006, p. 9).
Deste modo o ponto chave é tornar os alunos/as mais crítico/a em “[...] quanto
à sua posição de espectador, formar uma opinião crítica e argumentada a respeito do

170
que a mídia produz como um todo e como elemento específico da sua educação
informal” (CUNHA e GIORDAN, 2009, p. 16).
Segundo Rosa (2000), um filme causa uma “quebra de ritmo provocada pela
apresentação de um audiovisual e é saudável, pois altera a rotina da sala de aula”
(ROSA, 2000, p. 39). Já para Santos e Aquino (2011) apud Marcelino-Jr. et al. (2004)

“[...] pode ter um impacto inicial maior que um livro ou uma aula expositiva
por permitir a associação da atividade escolar a um conceito de
entretenimento, e que, quando utilizado de forma correta, exerce função
motivadora, informativa, conceitual, investigadora, lúdica, metalinguística
e atitudinal” (p. 160).

E nesse sentido Ferrés (1996) afirma que, um bom filme pode servir para
introduzir um novo assunto, para despertar a curiosidade, a motivação para novos
temas. Pois “[...] trabalhar com o cinema em sala de aula é ajudar a escola a reencontrar
a cultura ao mesmo tempo cotidiana e levada, pois o cinema é o campo no qual a
estética, o lazer, a ideologia e os valores sociais mais amplos são sintetizados numa
mesma obra de arte” (NAPOLITANO, 2004, p. 11-12). Portanto, “o professor deve
levar em conta o problema da adequação e da abordagem por meio de reflexão prévia
sobre os seus objetivos gerais e específicos” (NAPOLITANO, 2004, p.16).
Todavia, a utilização do cinema na educação, “[...] traz para a escola aquilo que
ela se nega a ser e que poderia transformá-la em algo vívido e fundamental:
participante ativa da cultura e não repetidora e divulgadora de conhecimentos
massificados, muitas vezes já deteriorados, defasados” (ALMEIDA, 2001, p. 48).
Esse recurso imagético é um elemento que, consegue dizer muito mais do que
captamos, chega simultaneamente por muito mais caminhos do que conscientemente
percebemos (GUTIERREZ, 1978). Parte do concreto para o abstrato, do imediato para
o mediato, da ação para a reflexão, da produção para a teorização (MORIN, 1995).
Veicula continuamente informações interpretadas, apresenta modelos de
comportamento, ensina linguagens coloquiais e multimídia, privilegiam alguns valores
em detrimento de outros (MACHADO, 1988).
Assumidos esses pressupostos o objetivo desta investigação é discorrer sobre
uma proposta de implementação da lei 10.639/03 no ensino de química utilizando uma
produção cinematográfica apenas como argumento para contextualização. Importa
considerar que, fazem parte do BRICS - Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul -
sendo este um importante grupo político de cooperação econômico. Desse modo, a

171
importância desse filme é o contexto do Apartheid na África do Sul. Os conceitos
abordados na aula de Química não foram apresentados no filme, mas apoiamo-nos no
acordo econômico para abordar a grande importância da África do Sul na produção
dos metais platínicos.
Nesse trabalho apresentamos uma discussão sobre extração e comércio de
metais nobres em alguns países do continente africano e suas implicações a partir do
Apartheid como contexto para trazer a discussão a química dos metais platínicos. A IP
versou sobre “Sobre o Apartheid e a platina: estudo sobre metais e guerra civil” e se
deu em três momentos: 1º a reprodução do filme Sarafina! O Som da Liberdade
(ROODT, 1993); 2º discussão sobre currículo a partir da ótica do Apartheid na África
do Sul e 3º a química dos metais platínicos (exemplos: o paládio (Pd), e a platina (Pt)
que fazem parte da chamada família 8B da tabela periódica) (Quadro 22).

Quadro 22 - Ementa e organização da IP - “Sobre o apartheid e a platina: utilizando


o cinema na aplicação da lei 10.639/03 no currículo da química”.
Tempo utilizado 02 aulas, de 1 hora e 40 minutos

No primeiro momento reproduzimos o filme


“Sarafina! O Som da Liberdade” (Roodt, 1993) para abordar
o contexto histórico e social que se passava na África do Sul.

Desenvolvimento

Figura 51 - Sarafina! O Som da Liberdade. Fonte:


http://br.web.img2.acsta.net/pictures/14/04/07/17/49/59077
8.jpg

No segundo momento iniciamos uma discussão


sobre currículo a partir da ótica do Apartheid na África do
Sul. Levantamos a questão dos mecanismos de manutenção
e controle de ideologia. Buscamos reflexões sobre como é
construída a matriz de ensino que é abordada nas escolas.

No terceiro momento apresentamos por meio de


recurso imagéticos, a tabela periódica, com o foco nos
metais platínicos, principalmente o paládio (Pd), e a platina
(Pt) que fazem parte da chamada família 8B da tabela
periódica. Posteriormente apresentamos o conceito de
catalisador e ressaltamos a importância do conhecimento
químico, para o exercício efetivo da cidadania considerando

172
o meio ambiente.

A intervenção foi gravada em áudio e vídeo perfazendo 2 horas e 17 minutos,


transcrita, e os dados obtidos agrupados por unidades de significado. Nesta IP foram
produzidos 632 turnos (T) e passaremos a analisar os extrados considerados mais
relevantes.
Extrato 17: O papel do currículo escolar

T.69 - Ad: Pessoal, então vamos lá. De acordo com esse filme, como o Estado faz para
manter a sua ideologia.
T.70 - A4: Opressão
T.71 - Ad: Opressão, e o que mais?
T.72 - A4: Violência e medo, através da polícia, é isso que eles usam.
T.73 - Ad: E a escola? Como que o estado faz através da escola para manter a ideologia?
T.74 - A4: [...] neste caso entra o currículo como algo para que os alunos sejam
oprimidos pelo governo, pelo exército.
T.78 - A10: Na verdade, o Estado não quer um indivíduo pensante.
T.80 - A1: Aí entra a matriz, a lei de ensino.
T.81 - A3: Não tem a questão só do professor, no caso do filme o próprio diretor não
aceita que a professora ensine algo como ela ensinava, a escola é uma forma de
repressão, ela impede os alunos de certa forma...
T.83 - A3: Isso é tão conflitante, a escola oprime o aluno de ser uma mente pensante, e
no caso você tem que concordar que é o caso da professora, ela foi lá e bom... é mais
fácil eliminar um ponto do que a escola toda inteira, eliminar ela, substituiu e pronto e o
próximo professor ia seguir as regras ...
T.84 - A4: É o medo que lhes impede de discordar. Se não tivesse aquele regime lá, ... E
não teria só uma professora contra o sistema, poderia ter mais. Na verdade, todos os
professores trabalhando a partir de diferentes construções culturais.
T.85 - Ad: Mas como? A1 chamou a atenção aqui a matriz?
T.86 - A1: A matriz curricular
T.87 - Ad: A matriz curricular, agora vocês está falando de currículo, e o que é?
T.89 - A4: Ela (a professora) estava na verdade atuando como um meio de libertação né,
usando o currículo para isso.
T.107 - Ad: Todos conhecem

Figura 52 – Tabela periódica. Fonte: http://www.tabelaperiodica completa.com/wp-


content/uploads/2011/08/tabela-periodica-imprimir11024 x556.png Acesso: 03/11/2016

173
T.110 - Ad: [..] os chamados metais platínicos são, os elementos ruténio (Ru), o ródio
(Rh), o paládio (Pd), o ósmio (Os), o irídio (Ir) e a platina (Pt) eles fazem parte da
chamada família 8B da tabela periódica abaixo do ferro, cobalto e níquel, eu fiz um
recorte e eles estão aqui.

As semelhanças horizontais existentes entre estes elementos são maiores que em qualquer
outro conjunto (grupo) da tabela periódica, excetuando-se os lantanídeos. O que eu
quero dizer é o seguinte. Na tabela periódica os elementos aqui pertencentes aos grupos
são muito parecidos [...] as propriedade deles são tão parecidas que um substitui o outro
[...]
T.111 - Ad: [...] os metais platínicos possuem excelentes propriedades catalíticas, o que
é um catalisador, o que é propriedade catalítica?
T.112 - A4: Acelerador de reação
T.113 - Ad: Eles aceleram a reação. Os Metais dos Grupos Platínicos devido a suas
propriedades específicas tem sido explorado nas mais variadas aplicações e devido a sua
escassez gera um alto valor de mercado, mas eu vou mostrar mais pra vocês da platina
e do paládio, pra vocês terem uma ideia, os preços eles variam, mas os preços da platina
pra vocês terem uma ideia é 50x maior que o ouro, o paládio e em torno de 30 a 40x
maior que o ouro.
A ocorrência na natureza, eles são escassos, além deles terem essa química diferenciada
de ser resistente a corrosão, de formar grandes números de complexos eles são poucos
na natureza, eu vou usar o exemplo da platina ele tem cerca de 5 ng/kg, na crosta
terrestre e os outros são menos abundantes ainda, imagina 5 ng é 10 -9 então em cada
quilograma da crosta terrestre ele possui 10 -9 g, então é bem escasso. Onde eles são
encontrados a maioria dos metais platínicos eles estão na Rússia, África do Sul, Estados
Unidos e Canadá, aqui no estado de Goiás tem um estudo na mesma região de
Niquelândia eles fazem um estudo lá e é tão pouco que eles não podem elevar para uma
escala industrial ainda mais o Brasil tem alguma coisa de platina.
No caso da platina a África do Sul fornece ¾ da produção mundial então veja o que deixa
essa platina cara, ele é escasso, aonde ela e produzida o pais agora que está dando uma
melhorada em termo político, as minas de platinas da África do Sul elas são de empresas
ou Americanas ou Inglesas, muita das vezes nesse jornal que nós assistimos não chega
ali pra nós as greves que a população negra faz nessas minas de platina, mas existe
muitas greves por que nessas minas continua a opressão e faz com esse metal fique mais
caro, no caso do paládio a Rússia é o principal produtor África do Sul possui a maior
reserva, no caso do paládio eles exploram mas exploram menos do que a Rússia, e se
vocês lembram bem, a Rússia também não é esse calmaria política né, lá eles tem briga
com outros países vizinhos.
T.116 - Ad: Então a platina, vamos falar dela, é um metal branco-cinza, que possui uma
estrutura cúbica compacta, e quando combinada o seu estado de oxidação que vão de 0
a +6, esses estados daqui, os estudantes da química vão entender e quem não estudou
lembra lá do ensino médio; os estados de oxidação +2 e +4 sejam os mais comuns.
Agora vou falar da aplicação da platina e do paládio, a maior aplicação, a maior parte
da platina e do paládio produzidos no mundo é utilizada na produção de catalisadores
para escapes de veículos automóveis.
T.117 - A5: Eu já vi.
T.118 - Ad: Você já trocou no seu carro A1?
T.119 - A1: Eu já
T.120 - Ad: Já trocou? você foi lá e comprou um bonitinho ou só tirou? Você sabe que
isso e crime ambiental?
T.121 - A1: Era na cerâmica

174
T.122 - Ad: Daqui a pouco eu vou falar mais do catalizador, e a maior parte da platina
é utilizado em catalizador, os outros são usados em joias nas ligas, na indústria
petroquímica aqui no caso como um catalizador de reações, na indústria eletrônica aqui
é como um dispositivo eletrônico e aqui por ser um metal resistente a corrosão é utilizado
na odontologia na formação de amalgamas para obturação, dentre outras aplicações.
O uso do paládio e da platina nestes setores pode ser explicado pelo fato destes elementos
serem muito resistentes à corrosão, mesmo a altas temperaturas, além de serem dúcteis
e maleáveis.

Figura 53 - Esquema de um catalisador automotivo Fonte: https://www.autonoc


ion.com/wpcontent/uploads/2015/01 /Catalizador_ MILIMA20140722_0041_1-
660x330.jpg

T.125 - Ad: A função de um catalizador automotivo, no motor da explosão do carro, e


produzido monóxido de carbono, e produzindo gases oxi hidrogenados o monóxido de
carbono e o CO, o gás oxi hidrogenados e o NO X nesse caso ele pode ter, esse x aí ele
pode ter NO2, NO5 e alguns hidrocarbonetos, o que esse catalizador faz, transforma o
monóxido de carbono que são gases venenosos em gases menos tóxicos. O N2, por
exemplo, nós temos na atmosfera e quem faz essa transformação no catalizador de
automóvel é o paládio, por isso que ele é caro, e se você pensar só na carcaça metálica
e só na cerâmica e só for aquilo seria barato.
T.136 - Ad: O uso na medicina vou me ater a cisplatina. A cisplatina é uma droga usada
no tratamento do câncer de ovário e de útero, ele e o mais eficiente o uso dele chega a
curar mais de 90% só que ele é muito venenoso para as outras células, e a cisplatina que
quando se trata de câncer além de matar as células cancerígenas mata as outras células,
cai o cabelo. A carbonoplatina que vocês podem ver que tem certa semelhança no caso
o nitrogênio aqui, a nedaplatina sempre tem essa semelhança do grupo NH 2 aqui e tem
estudo também de substituir a platina que é mais cara pelo paládio.
Quanto à utilidade destes metais na medicina, um complexo muito importante de platina
é o cis[(diaminodicloro) platina(II)], cis[Pt(NH3) 2Cl2], “cisplatina”, é atualmente muito
utilizada contra o câncer do testículo e do ovário onde se obtém até 90% de hipótese de
cura.

Nossos resultados mostram que os estudantes se referem aos mecanismos de


manutenção e controle de ideologia referente ao estado (turnos 70, 72, 80) e
reconhecem o currículo escolar (a matriz, a lei de ensino), tal como extensão destes
(turnos 80, 81, 83). Esses resultados corroboram nossos resultados anteriores
(ALVINO e BENITE, 2017), (SILVA e BENITE, 2017), (BASTOS; AMAURO e
BENITE, 2017), (BENITE; SILVA e ALVINO, 2017), (SILVA et al, 2017) (BENITE
et al, 2017), (BASTOS e BENITE, 2017) de que o currículo é um instrumento de
dominação, selecionando determinados saberes e omitindo outros.
Defendemos que “o currículo não é um elemento transcendente e atemporal –
ele tem uma história, vinculada a formas específicas e contingentes de organização da
sociedade e da educação” (MOREIRA e SILVA, 2006, p. 8). Segundo Malta (2013)

175
“os professores possuem responsabilidade no sentido de serem pessoas atuantes neste
processo, permitindo e instigando o aluno a participar e questionar, bem como
propondo‐lhe questões para reflexão” (p. 347). Desta forma, os alunos reconhecem
este fazer nos atos professora citada (turno 81 e turno 89).

“Numa pedagogia oposta à pedagogia do colonizador (que na falta de


melhor expressão chamamos de pedagogia do conflito), o educador
reassume a sua educação e seu papel eminentemente crítico: à contradição
(opressor‐oprimido, por exemplo), ele acrescenta a consciência da
contradição, forma gente insubmissa, desobediente, capaz de assumir a sua
autonomia e participar na construção de uma sociedade mais livre”
(GADOTTI, 1989, p. 53).

Esse resultado permite afirmar que os estudantes reconhecem o ato político que
é ensinar na atuação da professora em questão quando se remetem a sua atuação em
detrimento da expressão de currículo e seus mecanismos de manutenção das estruturas
de controle social (turnos 81, 84 e 89). No turno 83, A3 se refere a um momento do
filme onde a professora Srta. Massembuko começa a sua aula sobre A Guerra
Napoleônica, Figura 54:

“É o que o programa diz, e é o que vou ensinar. O exército de Napoleão, o


melhor equipado... o melhor treinado... o exército mais poderoso do
continente. Todos dizem que não pode ser derrotado. E o que acontece?
São derrotados. Por quê? Foram derrotados na Batalha? Não. Foram
derrotados pelo povo. O povo pode derrotar exércitos, a História provou
isso. O povo pode derrotar exércitos” (SARAFINA, 1993).

Figura 54 – O currículo escolar x currículo em ação.


Fonte: Captura de tela do filme Sarafina.

Essas ações da Srta. Massembuko foram analisadas por Fabris, (1999) e se

176
remetem a uma “pedagogia marcada por um discurso político e revolucionário e os
conteúdos desenvolvidos pela professora tentam falar do ponto de vista dos moradores
da África do Sul e do povo colonizado” (p.145).
Segundo Couteur e Burreson (2006) a derrota de Napoleão aconteceu por causa
de uma transformação química

“[...] Por mais surpreendente que pareça, a desintegração do exército


napoleônico pode ser atribuída a algo tão pequeno quanto um botão — um
botão de estanho, para sermos exatos, do tipo que fechava todas as roupas
no exército, dos sobretudos dos oficiais às calças e paletós dos soldados de
infantaria (p. 8)”.

Apoiados em Fiorucc et al., (2012) afirmamos que a desintegração do estanho,


se dá pelo fato da,

[...] transição ocorrer por um processo de nucleação e crescimento, e o


período de incubação pode ser longo, variando de poucos meses a vários
anos. Uma vez iniciado, o processo de transição não é controlado e se espalha
pelo estanho branco. No processo, surgem manchas ou erupções superficiais
como pontos iniciais de nucleação, chamadas de verrugas. Por essas
características, essa transição é referida como peste do estanho, praga do
estanho, doença do estanho ou mal do estanho (p.126).

Tal afirmativa explica o fato de que “[...] quando a temperatura cai, o reluzente
estanho metálico começa a se tornar friável e a se esboroar num pó cinza e não metálico
— continua sendo estanho, mas com forma estrutural diferente” (COUTEUR e
BURRESON, 2006, p. 8).

O Sn-β pode sofrer uma transição alotrópica para uma estrutura cúbica do
tipo diamante, conhecido como estanho cinzento (Sn-α), que é semicondutor,
não dúctil e sem aplicabilidade. A temperatura de equilíbrio da transição β
→ a é 13,2 ºC, mas para ela ocorrer, usualmente requer-se uma exposição
prolongada a temperaturas bem mais baixas.
13,2 ºC 161 ºC
Estanho Cinzento (Sn-α) ⇌ Estanho branco (Sn-β) ⇌ Estanho rômbico (Sn-
γ).
Quando a temperatura é diminuída em relação à de transição, o Sn-β
geralmente permanece em um estado metaestável. A existência de uma fase
metaestável e o fato de a transição ser lenta possibilita ao Sn-β ter suas
aplicabilidades para muitos fins, sem que seja convertido a Sn-α (FIOCURR
et al, 2012, p. 124).

Nossos resultados mostram que o estudante A4 ao se referir que “É mais fácil


eliminar um ponto do que a escola toda, inteira” turno 83 se remete a situação retratada
na Figura 55, quando a Srta. Massembuko é retirada de sua sala de aula, por forças

177
militares e em seguida é substituída. A Srta. Massembuko

“[...] não esconde seu trabalho a diversidade e diferenciação das


experiências históricas e culturais do sujeito. Contribui com essa pedagogia
para que a identidade desses sujeitos seja entendida como uma construção
histórica e não como uma determinação biológica. Procura desfazer a
concepção de que a falta de liberdade e opressão que enfrentavam fosse
entendida como um mal que adquiriram ao nascer naquele lugar que
viviam, a África do Sul” (FABRIS, 1999, p. 78).

Figura 55 – Retirada da Srta. Massembuko da escola.


Fonte: Captura de tela do filme Sarafina.

Quando o que se busca é uma educação que respeite as diferenças, a


preocupação com a prática docente se acentua, pois, lidar com as diferenças:

“exige sensibilidade diante de qualquer discriminação no trato cotidiano,


evitando que os próprios docentes sejam a fonte de juízos, atitudes e
preconceitos que desvalorizem a experiência de certos grupos sociais,
culturais, étnicos ou religiosos” (DINIZ e VASCONCELOS, 2004, p.
73).

178
Figura 56 – O Estado intervindo na escola, com a substituição de um novo professor.
Fonte: Captura de tela do filme Sarafina.

O novo professor, como mostrado na Figura 56 começa a aula com a seguinte


frase escrita na lousa: “1812 – O exército de Napoleão recua para Moscou”. A seguir
começa o seu discurso sobre a Guerra Napoleônica, pergunta: por que a Companhia
Russa fracassou? E o que os derrotou? Um aluno do fundo levanta-se e afirma: O povo!
(SARAFINA, 1993).
O professor querendo seguir o currículo oficial, responde: “Eu disse “o que”,
não “quem”. E prossegue dizendo: “O inverno. Napoleão não contou com o inverno
russo. Achou que estaria a salvo em Moscou, mas o povo de lá... havia incendiado a
cidade” (SARAFINA, 1993).
O novo professor mostra não ter uma visão crítica do assunto. Assim, apoiamo-
nos em Bulgraen (2010) para afirmar que os professores têm a responsabilidades de
ensinarem seus alunos/as a transgredir, sendo assim

“[...] consiste a intervenção e o papel do professor na prática educativa.


Sem dúvida, através de suas orientações, intervenções e mediações, o
professor deve provocar e instigar os alunos a pensarem criticamente e a se
colocarem como sujeitos de sua própria aprendizagem (p. 34)”.

Couteur e Burreson (2006, p. 8) questionam a supremacia do povo Europeu:

“Por que teria Napoleão permitido o uso desses botões nas roupas de seus
soldados, cuja prontidão para a batalha considerava tão importante?
Ademais, a desintegração do estanho é um processo razoavelmente lento,
mesmo a temperaturas tão baixas quanto as do inverno russo de 1812 [...]
os químicos gostam de citá-la como uma razão científica para a derrota de
Napoleão”.

179
A articulação que se dá com o currículo/conteúdo no uso do cinema de sala de
aula, se embasa por uma articulação entre três categorias básicas do ensino-
aprendizagem escolar: currículo, habilidades e conceitos.
a) Conteúdo curricular: os filmes podem ser abordados conforme os temas
e conteúdos curriculares das diversas disciplinas que formam as grades do
ensino médio[...] e temas que podem ter um enfoque interdisciplinar, sem
falar nos temas transversais definidos pelos PCNs, que encontram material
abundante no argumento, no roteiro e nas situações representadas nos
filmes; b) Habilidades e competências: tais como elaboração de textos;
aproximam a capacidade narrativa e descritiva; decodificam signos e
códigos não verbais; capacidade de crítica sociocultural e político-
ideológica. Pode exercitar a habilidade de aprimorar seu olhar sobre as
atividades culturais mais importantes do mundo contemporâneo; c)
Conceitos: retirados ou inferidos diretamente do conteúdo fílmico em
questão ou sugeridos pelos problemas e debates suscitados pelas atividades
com cinema em sala de aula e projetos escolares. (NAPOLITANO, 2004,
pág.18).

A utilização deste recurso imagético pode revelar “aspectos singulares da


representação e constituição da realidade, que levam autor e audiência a construírem
novas formas de pensamento” (CUNHA e GIORDAN, 2009, p. 10).
O grupo da platina é um nome dado a seis elementos metálicos que possuem
algumas propriedades físicas e químicas similares e que tendem a ocorrer juntos nos
mesmos depósitos minerais (ALVES; SILVA; GUERRA, 2010, p. 27). Estes possuem

“densidades muito elevadas (o irídio é o elemento mais denso conhecido)


e altas temperaturas de fusão (são refratários); são quimicamente inertes à
maioria dos agentes corrosivos até em altas temperaturas, e desenvolvem
extraordinária atividade catalítica” (FRIZZO, 1996, p. 6).

Suas principais características físicas e químicas são apresentadas no Quadro


23 (OLIVA & VIEIRA 1973; COUSINS & VERMAAK, 1976 e FARINA 1984) apud
(FRIZZO, 1996, p. 6).

180
Quadro 23 – Propriedades dos elementos do grupo da platina

Tais semelhanças são devidas principalmente da contração lantanídea. Todos


os platinóides são classificados como metais de transição, estão localizados nos
períodos 5 e 6, grupos 8, 9 e 10, no bloco d da tabela periódica (ALVES; SILVA;
GUERRA, 2010, p. 27). A partir disto, os turnos (110, 116 e 121) reforçam o diálogo
que, “[...] são sólidos metálicos lustrosos à temperatura ambiente, formam ligas uns
com os outros e possuem excelentes propriedades catalíticas. Além disso, são
resistentes a ataques químicos, estáveis em altas temperaturas e possuem boas
propriedades eléctricas” (ALVES; SILVA; GUERRA, 2010, p. 27).
A maior parte de platina produzida no mundo é usada na indústria de
catalisadores na produção de escapamento de veículos automotores, como conversores
catalíticos que reduzem a poluição emitida por automóveis, controlando assim a
qualidade do ar, tal como apresentado na aula para os estudantes nos turnos (111, 112,
117, 118, 119, 120).
Os catalisadores são substâncias que aceleram determinadas reações ou
tomam-nas possíveis, sem reagirem. Nos automotivos, as reações que são aceleradas,
são as que transformam poluentes (CO, NOx e CxHy) em compostos menos
prejudiciais à saúde (CO2, H2O e N2) (MORCELLI, 2004, p. 18). Essas reações são,
de acordo com (MORCELLI, 2004, p. 18) de oxidação e redução, como por exemplo,
as representadas pelas equações XII a XVII :
Equações que representam as reações de oxidação
2 CO(g) + O2(g)→ 2 CO2(g) (XII)
H2(g) + O2(g)→ 2 H2O)(g) (XIII)

181
CXHY(g) + (x + y/4) O2(g) → X CO2(g) + y/2 H2O(g) (XIV)

Equações que representam as reações de redução do NOx


2 CO(g) + 2 NO(g) → 2 CO(g) + N2(g) (XV)
CXHY(g) + (2x + y/2) NO(g) → x CO2(g) + y/2 H2O(g) + (x + y/4) N2(g) (XVI)
H2 + NO → H2O + ½ N2(g) (XVII)

Esses catalisadores “contém uma liga de platina/ródio suportada em uma


matriz cerâmica que converte os gases nocivos CO, NO, NO2 e hidrocarbonetos,
presentes nos gases do escapamento de automóveis, nos compostos CO2 e N2 que são
naturalmente encontrados na atmosfera (Figura 57)” (SILVA e GUERRA, 2010, p.
128).

Figura 57 – Captura de tela mostrando a representação da transformação de gases nocivos (CO, NO,
NO2 e hidrocarbonetos), utilizando platina como catalisador.

Segundo Shaikhzadeh (2003) aproximadamente 42% de toda platina produzida


é empregada como catalisador.

Desses, 90% são aplicados a sistemas de escape de automóveis, que


convertem monóxido de carbono e óxidos de nitrogênio em água, dióxido
de carbono e nitrogênio. Em ligas de platina e 10% de ródio, formado
através de operações em elevada temperatura, serve de catalisador na
reação entre amônia e ar, produzindo o óxido de nitrogênio e ácido nítrico
(SHAIKHZADEH, 2003, p. 7).

De acordo com Ricciardi (2014) as maiores reservas concentram-se na África


do Sul (87,5%), localizadas no Complexo de Bushveld, totalizando 10 minas em
atividade situadas em Merensky Reef, UG2 Chromite Layer e Platreef, conforme
dados apresentados no Quadro 24.

A segunda maior reserva mundial encontra-se na Rússia, em Noril’sk-


Talnakh, e representa cerca de 8,3% do total. A África do Sul foi o principal
produtor mundial de platina, tendo participado com 79% do volume total.

182
Segundo dados da Johnson Matthey Precious Metals Marketing, o
consumo mundial de platina teve como principais mercados consumidores,
em 2009, os setores de catalisadores automotivos com 25%, joalheria
(43%), e uso industrial, incluindo eletroeletrônicos, indústria química e de
vidros (20%) e investimentos (12%). Dados sobre o consumo global de
paládio, em 2009, destacam os setores de catalisadores automotivos (48%),
joalheria (12%), eletroeletrônicos (14%), demanda para fins odontológicos
(10%), investimentos (4%) e outros (12%) (RICCIARDI, 2014, p. 1).

Quadro 24 – Reserva e Produção Mundial

Devido ao fato de os metais do grupo da platina serem encontrados juntos na


natureza, as histórias das suas descobertas estão interligadas (turnos 113). Interessa
lembra que:

“[...] a história moderna da platina começa apenas no século XVI, ela foi
encontrada em objetos que datam de 700 a.C. Como exemplo, há o famoso
caixão de Thebes (da antiga Grécia) que foi decorado com hieróglifos
(sinais da escrita de antigas civilizações) em ouro, prata e uma liga
contendo platina. Esse metal também foi utilizado em joalheria por
egípcios, povos antigos do Peru, Equador e indígenas pré-colombianos”
(SILVA e GUERRA, 2010, p. 128).

Deste modo é permitido contar o desenvolvimento do conhecimento das


propriedades deste metal também a partir de África e suas sociedades “os complexos
de platina formam descobertos quase que de forma acidental e tem sido alvo de estudo
por muitos grupos de pesquisa como candidatos a fármacos no combate ao câncer (3)
particularmente ativa no tratamento do câncer de testículos e ovários” (PERUSSI et
al., 2003; REEDIJK et al., 1987) apud (BENITE; MACHADO; BARREIRO, 2007, p.
137)
Atualmente, a platina é usada como princípio ativo de drogas anticancerígenas.

183
E contribui também para o tratamento dos carcinomas de faringe e cervical, linfoma,
osteossarcoma, melanoma e neuroblastoma, entre outros (FONTES, CESAR e
BERALDO, 2004, p. 465). Os resultados dos turnos 110 e 136 exibem o diálogo a
respeito da utilização do complexo cis[(diaminodicloro)platina(II)], conhecido como
“cisplatina”, que é uma droga usada no tratamento do câncer de ovário e útero, ou seja,
a mobilização de ferramentas e símbolos do conhecimento químico que passam pela
utilização da linguagem química. Por fim, o resultado dos turnos 136 exibem o diálogo
a respeito das ações e propriedades que os tornam úteis como agentes terapêuticos.
Nossos resultados mostram que foi possível implementar a lei 10.639/03 no
ensino de química. Ainda é possível discutir em sala de aula a química e o papel que
o currículo, vinculada a formas específicas e contingentes de organização da sociedade
e da educação e sob quais formas ele é imposto em processos de dominação e de
subordinação, ele tem uma história. Podemos perceber que a cultura dominante efetiva
é transmitida na escola como um conhecimento universal sistematizado e somos
levados a acreditar que o tempo expulsou conflitos e interesses da cultura e selecionou
o que havia de melhor. Dessa forma as ciências podem contribuir para uma educação
antirracista.
A sala de aula de química é ambiente dinâmico e complexo no qual se integram
ferramentas culturais à ação mediada. A maior parte de platina produzida no mundo é
usada na indústria de catalisadores na produção de escapamento de veículos
automotores, como conversores catalíticos que reduzem a poluição emitida por
automóveis, controlando assim a qualidade do ar. Deste modo é permitido contar o
desenvolvimento do conhecimento das propriedades deste metal também a partir de
África e suas sociedades.
Ainda podemos pensar que os conteúdos referentes à História e Cultura Afro-
Brasileira precisam ser inseridos demandando mudanças na estrutura dos currículos
vigentes, isto é, que não se ensine apenas química a partir de ótica ocidental europeia,
sendo ela, branca, masculina, de laboratório e hegemônica.
Finalmente cabe ressaltar que essa IP foi realizada em uma disciplina de curso
superior, mas discussões desse tipo podem ser feitas em aulas de química também na
educação básica.

184
185
CONSIDERAÇÕES
FINAIS

186
Nas enunciações finais que se seguem entendemos e defendemos que sim! É
possível dentro de cursos superiores e, principalmente, em cursos de licenciaturas em
química, inserir disciplinas experimentais ou teóricas, que abordem conceitos
químicos em interface com abordagens culturais afro-brasileira e, com isso
implementar ações afirmativas para a população negra brasileira, tal como a lei
10.639/03, a Resolução CNE/CP 01/2004 e o Parecer CNE/CP 03/2004.
E isso foi verificado a partir de duas disciplinas oferecida por nós dentro de
um Instituto de Química no qual as ementas e os planos de ensino das referidas
disciplinas trouxeram conteúdos de maneira que os conceitos de química/ciência
foram sempre contextualizados com elementos diaspórica africana no Brasil.
Nos discursos produzidos pelos/as participantes da pesquisa, foi possível
verificar que durante a apropriação conceitual esteve presente quase sempre, os três
níveis dos aspectos do conhecimento químico – teórico, fenomenológico e
representacional - propostos por Mortimer e colaboradores (2000). Em algumas vezes
apareceram apenas dois desses conhecimentos e, em poucas vezes apareceu apenas um
desses conhecimentos.
A partir dessa pesquisa, que entendemos ser um tipo de ação afirmativa, foi
possível criar materiais bibliográficos e instrucionais e socializá-los em formas de
artigos, resumos expandidos e capítulos de livros e, a parir daí mostrar como a
educação em química pode oferecer respostas as demandas das populações
afrodescendentes e, assim como apregoa as DCNs para a ERER.
Em nossa pesquisa procuramos recontar a história dessa população de uma
maneira positiva, mostrando que sim, os/as negros/as em sua terra mãe e aqui em terras
estrangeiras onde vieram para cá a força para ter a sua mão de obra especializada
explorada e escravizada produziam conhecimentos químicos.
Recontamos essa história sem, contudo, deixar de lado os conhecimentos do
colonizador, assim como esses fizeram com o conhecimento do negro/a africano/a
escravizado/a. E isso foi tratado em todos os tópicos das ementas produzidas para as
duas disciplinas que compuseram essa pesquisa.
Em “A química do ferro e o papel do ferreiro africano nas sociedades centro-
africanas e no Brasil Colônia apresentamos uma proposta de um ensino de Química
descolonizado, a partir do reconhecimento do hibridismo da sociedade brasileira
multirracial. Procuramos recontar de uma maneira positiva a história do/a especialista

187
na forja do ferro que para cá veio quando da descoberta das minas de ouro e ferro no
sul e sudeste do Brasil. Por se tratar de aulas de laboratório foram feitas reações
químicas e assim, sintetizamos uma ferrita de ferro e discutimos as reações envolvidas.
Esse tema da importância do ferreiro africano pode ser contextualizado em
diversas situações como em aulas práticas de corrosão, aulas de eletroquímica que
envolva as reações com o ferro, em aulas de bioquímica que tratem da importância
desse elemento em organismos vivos, dentre outros.
Em “A herança cultural africana, indígena e portuguesa nas regiões de
mineração do estado de Goiás” continuamos a recontar de maneira positiva a história
do/a negro/a africano/a que vieram trabalhar nas minas de ouro em Goiás, mas
especificamente na cidade de Niquelândia. Os legados culturais, quais sejam as
Congadas, deixados pelos/as e negros/as que tiveram a sua mão de obra especializada
e escravizada nos garimpos de ouro daquela cidade, foram contextualizados com a
extração de extração de níquel, descoberto após a decadência do ouro, naquela região.
Nessa IP foram realizadas diversas reações químicas com o níquel mostrando
que aquelas reações acontecem quando da extração do metal dentro da mineradora.
Aulas desse tipo contextualizando as congadas com algum conhecimento que
africanos e africanas escravizados/as possuíam a época pode ser realizada em
diferentes regiões do Brasil, pois a prática das Congadas é comum em vários estados
do país.
Em “A química do dendê e a sua importância nas religiões de matriz africana
e na culinária afro-brasileira” e “ Abordagem etnobotânica acerca de plantas utilizadas
nas religiões de matriz africana” discutimos em sala de aula de Química as
contribuições dos povos e comunidades de matriz Africana (os saberes tradicionais) e
suas relações com o conhecimento científico: contribuições para a produção de
fitoterápicos, suas implicações físico-químicas e suas formas de ser transposta aos
estudantes do ensino superior.
Em “Leite em “mama” África e a educação para as relações étnico-raciais
(ERER) no ensino de química” contamos como as ferramentas da química analítica
ajudam os arqueólogos a recontarem a história da África. E fizemos isso a partir da
descoberta de produção leiteira ocorrida no norte da África no século V antes da era
cristã. Reações química com o leite foram realizadas e os motivos que levam os/as
produtores/as a fraudarem o leite foram discutidos.

188
E, por último, o parágrafo § 1o do “ Art 26-A da lei 10639/03 diz que “ O
conteúdo programático a que se refere o caput deste artigo incluirá o estudo da
História da África e dos Africanos, [...] Brasil (2003). Fazemos isso em “ O apartheid
e a produção de metais nobres na África do Sul”. Nesse subcapítulo apresentamos uma
discussão que se deu a partir da extração e comércio de metais nobres em alguns países
do continente africano e suas implicações, a partir da contextualização de um filme
que discutia o Apartheid, e guerra civil na África do Sul.

Várias vezes foi afirmado dentro dessa tese que a ciência ensinada nas
instituições escolares é branca, masculina, de laboratório, hegemônica e europeia
apesar de sermos hoje autodeclarados no Brasil 50,7% de população preta e parda
segundo a pesquisa do IBGE de 2010. Se consideramos a Pesquisa Nacional por
Amostra de Domicílios (PNAD) Contínua (2017) já somos 54,9% da população
brasileira autodeclarada negros/as, sendo 8,2% de pretos/as e 46,7% de pardos/as,
(IBGE, 2017). Além disso,

com a trajetória de melhora nos indicadores de adequação, atraso e


abandono escolar, estudantes pretos ou pardos passaram a compor maioria
nas instituições de ensino superior da rede pública do País (50,3%), em
2018. Entretanto, seguiam sub-representados, visto que constituíam 55,8%
da população, o que respalda a existência das medidas que ampliam e
democratizam o acesso à rede pública de ensino superior (IBGE 2018).

Por isso, as salas de aula, em todos os níveis de ensino clamam por uma nova
realidade. Os/as alunos/as descendentes dos escravizados/as precisam se verem
representados nos conteúdos escolares, eles/as necessitam que suas histórias sejam (re)
contadas de maneira positiva com vistas ao cumprimento da Resolução CNE/CP
01/2004 e o Parecer CNE/CP 03/2004.
Defendemos que a implementação da Lei 10.639/03 deva passar pelo seu co-
nhecimento e discussão em todos os níveis de escolarização. Especificamente, em
nosso caso, professores em formação inicial, continuada e professores formadores,
defendemos que essa lei seja discutida e implementada nas licenciaturas e
principalmente nas salas de aula de química.
Entendemos que a demanda pela introdução do ensino de História e Cultura
Afro-Brasileira nas instituições de ensino exige o questionamento das omissões e dos
silenciamentos dos currículos em ciências/química, dessa maneira exigimos mudanças
na estrutura dos currículos vigentes.

189
Defendemos que disciplinas como as que por nós foram ofertadas tanto nos
chamados núcleos livres, como nas chamadas optativas deveriam, em curso de
licenciaturas, serem ofertadas de maneira obrigatória. Nossos resultados mostram que
nossa proposta pode representar uma alternativa de descolonização da ciência quando
apresenta a química a partir de contextos da diáspora africana no Brasil.

Defendemos que IPs como as apresentadas em nossa tese possam ser


realizadas mesmo a partir de um currículo oficial. Por exemplo, nas habilidades e
competências específicas 1, da nova Base Nacional Comum Curricular (BNCC) da
área de Ciências Da Natureza e Suas Tecnologias para o ensino médio, traz a seguinte
“ementa”:

Dessa maneira, podem mobilizar estudos referentes a: estrutura da matéria;


transformações químicas; leis ponderais; cálculo estequiométrico;
princípios da conservação da energia e da quantidade de movimento; ciclo
da água; leis da termodinâmica; cinética e equilíbrio químicos; fusão e
fissão nucleares; espectro eletromagnético; efeitos biológicos das radiações
ionizantes; mutação; poluição; ciclos biogeoquímicos; desmatamento;
camada de ozônio e efeito estufa; entre outros (BNCC,2017, p. 540).

Entendemos que todos os termos sublinhados na citação acima são


contemplados nas nossa IPs que foram realizadas em disciplinas de curso superior,
mas que podem, sem prejuízos, desde que o/a professor/a adequem os conteúdos serem
feitas em aulas de química também na educação básica.
Nossos resultados permitem dizer que esta iniciativa denunciou a rigidez do
currículo da IES, o empobrecimento do caráter conteudista e a necessidade do diálogo
com a cultura negada por este modelo. Deste modo, a mudança estrutural proposta pela
lei abriu caminhos para construir intervenções baseadas em uma educação antirracista
que rompe com a epistemologia curricular quando apresenta a ciência de matriz
africana.
As articulações entre passado, presente e futuro sobre as construções,
experiências e produções do povo negro são uma alternativa para apresentar uma
Química não branca e eurocêntrica, pois a química é a ciência da transformação da
matéria e toda sociedade, quando se organiza culturalmente, é pelo trabalho e,
consequentemente, pela transformação.
Consideramos também que quando professores/as negros/as se sentem
convocados por sua condição étnica (construção social, histórica e econômica num

190
país colonizado) temos de fato a representatividade em ação.
Essa IPs, como já dito, foram realizadas em aulas práticas de nível superior,
mas elas podem ser realizadas, sem maiores problemas, na educação básica tanto em
aulas práticas como nas teóricas.

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