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na realidade local, tratando-as como próprias de uma tradição brasileira.

Assim, o espírito
cavalheiresco é enxertado no bugre, a ética e a cortesia do gentil-homem são trazidas para
interpretar o seu comportamento. A distinção pode parecer especiosa mas o seu fundamento
se encontra na atitude claramente diversa de um Basílio da Gama e de um José de Alencar.

Nela o A primeira composição em que o tema indígena aparece tratado ao modo romántico
embora de passagem, é a "Nênia" de Firmino Rodrigues Silva (1837), reconhecida por todos os
sucessores imediatos como ponto inicial do indianismo romántico. indio ainda não aparece
como personagem poético individuado, mas como alegoria, estabelecendo a passagem do
indio-signo, do fim do período neo-clássico, ao índio-per sonagem. Trata-se com efeito da
Musa brasileira, que lamenta a morte de um dos seus fiéis, Francisco Bernardino Ribeiro, em
tonalidade plangente e melancólica, num revelar do dilaceramento interior, que já é
romântico, e será copiado mais tarde no poema equivalente de Machado de Assis à morte de
Gonçalves Dias.

Apesar da doutrinação da Niterói, nenhum dos seus colaboradores praticou ime diatamente o
indianismo, que apenas no começo do decênio de 40 começou a ser versado de maneira
sistemática por Joaquim Norberto, em mediocres balatas (1843), onde procura transpor o
espírito popularesco e medieval dessa forma tão cara aos románticos. Versou-o sobretudo
Teixeira e Sousa, autor da primeira composição de fôlego a se enquadrar no tema: Os Três Dias
de um Noivado (1844). Seguem-se alguns poetas de valor pouco maior, como Cardoso de
Meneses, devendo-se mencionar, no fim do decênio, o belo "Gemido do índio", de Antonio
Lopes de Oliveira Araújo, estudante de São Paulo. Os Primeiros Cantos de Gonçalves Dias
(1846) decidiram favoravelmente o destino ainda pouco definido do indianismo, dando-lhe
categoria que o tornou, para os contemporâneos, a poesia brasileira por excelência. Daí por
diante, não houve mãos a medir: toda gente trouxe o seu poema, conto, crônica ou romance,
principalmente os poetas-estudantes, estimulados pela doutrinação apaixonada de Macedo
Soares - não se devendo esquecer que, ainda em 1875, Machado de Assis publicou um livro
inteiramente composto de poesias indianistas, Americanas. Os anos que vão de 1846 a 1865
assinalam contudo o momento decisivo, quando apareceram os outros Cantos de Gonçalves
Dias, Os Timbiras, O Guarani, Iracema, A Confederação dos Tamoios.

Não se pense, todavia, que a moda só encontrasse adeptos. Veremos no Capitulo VIII a atitude
reticenciosa de Porto-Alegre. Já vimos, há pouco, a francamente adversa de João Francisco
Lisboa, que falava sobretudo como historiador, e via no indianismo uma distorção da
realidade, que lhe feria o bom senso racionalista. Mas feria-lhe também os preconceitos. Lia os
cronistas com o mesmo etnocentrismo, e se escandalizava ante a barbárie e os maus costumes
dos selvagens... Num rasgo de maldade, chega a invocar "O Leito de Folhas Verdes" como
deformação idealizada das cenas de luxúria pecami nosa descritas por Gabriel Soares,
chamando-o de "rendez-vous no mato".

16. Ver o vol. I, cap. VIII da presente obra. 17. Ob. cit., vol. cit., pág. 221.
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