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ATITUDES, CRENCAS, CONHECIMENTOS E COMPETENCIAS DE PAIS, PROFESSORES E CRIANCAS DO 12 CICLO - APOS APLICAGAO DE PROGRAMA DE PREVENCAO DOS ABUSOS SEXUAIS DE CRIANCAS Paula Cristina Abrantes Henriques Orientador de Dissertagao: José Omelas Coordenador de Seminario de Dissertagao: José Ornelas Tese submetida como requisito parcial para a obtencdo do grau de: MESTRE EM PSICOLOGIA COMUNITARIA ‘Fn wil ll 2008 Dissertagio de Mestrado realizada sob a orientacao de Professor José Omelas, apresentada no Instituto Superior de Psicologia Aplicada para a obtengio de grau de Mestre na especialidade de Psicologia Comunitaria conforme o despacho da DGES, n° 6037 / 2007 publicado em Diério da Repiiblica 2° Série de 23 de Margo, 2007. Nao posso deixar de pronunciar algumas palavras de agradecimento a algumas pessoas da minha vida sem as quais nao teria sido possivel terminar este trabalho, Agradeco ao Professor José Ornelas pelo apoio, determinagao e optimismo sempre presente em todas as orientagdes de mestrado. Agradego A Professora Susana Maria pelo seu profissionalismo, competéncias, sensatez, e por todos as admirdveis sugestdes. ‘Aos meus Pais pelo infinito investimento e pa ciéncia, pelo amor incondicional e pela palavra certa em todos os momentos. Ao melhor Amigo e Companheiro do Mundo Carlos pela sua infindével ajuda, paciéncia e optimismo, e por fazer com que o mundo pareca sempre melhor. As Amigas e colegas que sempre pacientes foram fazendo deste trilho o mais saboroso de caminhar. A familia e restant s Amigos pelas intimeras palavras de conforto e amizade. E a todas as pessoas que ainda que distantes € menos presentes tiveram a sua responsabilidade na construcao deste trabalho e com quem ingressei numa longa viagem em prol da construcao de um mundo melhor. RESUMO Este trabalho tem como objectivo perceber quais as Atitudes, Crengas, Conhecimentos e Competéncias que os Pais, Professores e Criancas do 1° Ciclo possuem acerca da Prevengio do Abuso Sexual de Criangas em Idade Pré-Escolar apés a comparéncia de um programa de Prevencio. Trata-se assim de um estudo exploratério de carécter preventivo. Os instrumentos para Pais ¢ Professores que foram utilizados para a realizagao deste trabalho (Ver Anexo A) procederam do estudo: Sexual Abuse Prevention for Preschoolers: A Survey of Parents’s Behaviors, Attitudes, and Beliefs (Wuntele, Kvaternick & Franklin, 1992), publicado no Journal of Child Sexual Abuse. Com 0 intuito de complementar os questionérios originais, foram acrescentadas outras questées, , provenientes do Child Abuse Knowledge Questionnaire (Hibbard, R. A., & Zollinger, T. W., 1990), do Child Abuse Myth Scale (Collings, Steven, J., 1997), ¢ também do CAP — The Child Assault Prevention Project. Foram instrumentos adaptados pela Associagio Portuguesa para o Estudo e Prevencio dos Abusos Sexuais de Criancas (APPEPASC), para tomar mais enriquecedora a anélise e realizagio do presente estudo, Verificou-se que o Programa de Prevengio ao qual participaram os pais, professores ¢ criangas, foi de extrema utilidade na aquisigao de conhecimentos relativamente aos programas de prevengiio do abuso sexual de criangas em idade pré-escolar, nomeadamente nas competéncias importantes a ser ensinadas 4s criangas, no entanto, evidenciou-se ainda algumas diividas em questdes mais especificas, especialmente no que se refere a mitos sobre 08 abusos, evidenciando que é dificil desenraizar opinides formadas. Palavras-Chave: Abuso Sexual de Criangas, Programa de Prevengao do Abuso Sexual de Criancas, Empowerment, Prevengdo Primaria, RESUME The goal of this paper is to understand the Attitudes, Beliefs, Knowledge’s and Skills that Parents, Teachers and Children’s of Primary School, have about Prevention of Child Sexual Abuse, after they participate in a Prevention Child Sexual Abuse Program. It is an exploratory study of a preventive aspect. ‘The instruments for Parents and Teachers that were used for this paper (see Anexo A) came from the study: Sexual Abuse Prevention for Preschoolers: A Survey of Parents’s Behaviors, Attitudes, and Beliefs (Wuntele, Kvaternick & Franklin, 1992), published on the Journal of Child Sexual Abuse. With the intent to enrich the original questionnaires, other questions were added from the Child Abuse Knowledge Questionnaire (Hibbard, R. A., & Zollinger, T. W., 1990), the Child Abuse Myth Scale (Collings, Steven, J., 1997), and also from CAP — The Child Assault Prevention Project. These instruments were adapted by the Associago Portuguesa para o Estudo e Prevenc&o dos Abusos Sexuais de Criangas (APPEPASC), to improve the making and analysis of this study. It was clear that the Prevention Program in which the parents, teachers and children that participated, was of extreme usefulness on the gathering of knowledge about the sexual abuse on children on primary school prevention programs, namely on the important skills to be taught to the children but, there were some doubts on specific questions, specially the myths around the abuses, showing that some formed opinions are hard to change. Key-Words: Child Sexual Abuse, Child Sexual Abuse Prevention Programme, Empowerment, Primary Prevention. INDICE 1, INTRODUCA 2. ENQUADRAMENTO TEORICO 2.4, Abuso Sexual de Crianga 2.1.1. O Abuso Sexual de Criangas como um Problema Global 8 2.1.2. Definigao de Abuso Sexual de Criangas... 10 2.1.3. Assédio Online — Uma Nova Dimensio dos Abusos Sexuais de Criangas 113 2.1.4.Tipos de Abuso Sexual de Criangas... 16 2.1.5. Consequéncias do Abuso Sexual de Criangas ....o... 19 2.1.5.1. Efeitos Psicolégicos / Emocionais / Comportamentais dos 20 2.1.6. Os perpetradores dos Abusos Sexuais de Criangas......... 26 Abusos Sexuais de Criangas....... 2.1.7. Mitos sobre os Abusos Sexuais de Criangas. 2.1.8. Questdes da Meméria no Abuso Sexual de Criangas...... 30 2.2. Prevenciio dos Abusos Sexuais de Criancas. 2.2.1, Origem da Prevengio 2.2.2, Prevengio do Abuso Sexual de Criangas nas Instituigdes.38 2.2.3,Programas de Prevengdo do Abuso Sexual de Criangas nas Escola: 40 2.2.4, Envolvimento Parental na Prevenciio do Abuso Sexual de Criangas...... 1 2.2.5. Serio os Programas de Prevengao eficazes na redugio do abuso? 2.3. Estudos de Investigacio . 2.3.1. Efeitos de um Programa de Prevengao do Abuso Sexual de Criangas numa Escola Primaria ...cecnnnneennnn 52 2.3.2, Programas de Prevengaio do Abuso Sexual de Criangas: Diminuem a ocorréncia do Abuso Sexual’... 55 2.3.3. Participagdo dos Pais num Programa de Prevencao do Abuso Sexual de Criangas... 37 3. OBJECTO DE ESTUDO E QUESTOES DE INVESTIGACAO vl Sera METODO. 4.1. Delineamento....... 4.2. Participantes... 4,3. Instrumentos. 4.4,Procedimentos.... APRESENTACAO DOS RESULTADOS. ANALISE E DIS CONCLUSOES. REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS ANEXOS CUSSAO DE RESULTADOS. ANEXO A: Questionério Pais....... ANEXO B: Questionéri Professores... ANEXO C: Questionério das Criangas - Traducao do Children's Knowledge of Abuse Questionnaire Revised — II (CKAQ -RI)..... 200 ANEXO D: Anilises Est: oo 204 fsticas, vil LISTA DE TABELAS TABELA 1: Mitos ¢ Realidade sobre 0 Abuso Sexual de Criancas...... TABELA 2: Outros Mitos sobre os Abusos Sexuais de Criangas... sssenneee 29 TABELA intese dos Estudos de Investigacao TABELA 4: Distribuigdo das respostas & Questo “As criangas devem ser ensinadas de como denunciar se forem abusadas sexualmente” TABELA 5: Distribuigo das respostas & Questo “As criangas devem ser ensinadas que tm oe 7B © direito de se sentirem seguras, fortes ¢ livres”... TABELA 6: Distribuigao das respostas & Questio “As criangas devem ser ensinadas de que devem contar apenas aos seus pais se estiverem a ser vitimas de abuso” 2B TABELA 7: Distribuigio das respostas & Questéio “As criancas devem ser ensinadas a .78 TABELA 8: Distribuicio das respostas 4 Questo “As criangas mentem frequentemente 179 TABELA 9: Distribuigdo das respostas 4 Questo “A maioria dos abusos acontece em 80 das respostas A Questo “Hoje em dia acontecem mais abusos do que no pas: contar a alguém se forem abusadas sexualmente” .. acerca de terem sido sexualmente abusadas quando na verdade nao o foram” familias com problemas” TABELA 10:Distribui TABELA 11: Distribuigdo das respostas 4 Questio “Numa familia onde os pais se dedicam aos filhos é muito dificil ocorrer abusos sexuais” .. 81 TABELA 12: Distribuicdo das respostas 4 Questio “Se uma crianga revela que sofreu os abusos sexuais e em seguida o nega, provavelmente, o abuso no ocorreu” .. 81 TABELA 13: Distribuigio das respostas 4 Questo “Os efeitos dos abusos sexuais de crianga sdo sempre muito graves” 82 TABELA 14: Distribuigdo das respostas A Questo “A maioria dos agressores so desconhecidos” 82 TABELA 15: Distribuicdo das respostas 4 Questiio “As eriangas que provocam os adultos so 83 Distribuigdo das respostas 4 Questdo “Se um(a) aluno(a)/filho(a) meu/minha 83 TABELA 17: Distribuigdo das respostas 2 Questdio “Os familiares denunciam sempre os 84 responsdveis pelos abusos” . TABELA 1 for sexualmente abusado(a) eu seguramente me aperceberia” ... abusos sexu: vill TABELA 18: Distribuicdo das respostas Questo “Uma grande percentagem dos abusos sexuais implica violéncia fisica, contra a criangas” .. 84 TABELA 19: Distribuigdo das respostas A Questo “A maioria das criangas que sofrem abusos conta aos adultos” 85 TABELA 20: Distribuigo das respostas & Questio “Os abusos sexuais de criangas sio perpetrados tanto por homens como por mulheres”... 86 TABELA 21: Distribuigdo das respostas Questéio “Muitas criangas inventam histérias de abusos para se vingarem dos adults”... 86 TABELA 22: Distribuicdo das respostas Questdio “A maioria dos agressores s6 se sente .87 TABELA 23: Distribuicdo das respostas & Questo “Quando uma crianga quer ou gosta do .87 TABELA 24: Distribuicdo das respostas & Questio “Os agressores normalmente padecem de 88 TABELA 25: Distribuicao das respostas & Questéio “As criangas do 1° ciclo sio demasiado sexualmente atraido por criangas” .. contacto sexual com um adulto, este nfo é considerado abuso” ...... uma doenga mental” .. novas para aprenderem acerca de programas de prevenciio dos abusos sexuais de criangas” 88 TABELA 26: Distribuicgdo das respostas & Questo “Devido ao facto dos abusos sexuais de criangas ser tao raro, as criangas do 1° ciclo precisam de programas de prevencao dos 89 \s A Questo “As criangas que vivern em familias 90 TABELA 28: Distribuigdo das respostas A Questo “As criangas que vivem em familias abusos sexuais de criangas” TABELA 27: Distribuigio das respos catdlicas nao precisam de programas de prevengdo dos abusos sexuais de criangas” classe média/alta nao preci 1m de programas de prevencao dos abusos sexuais de criancas” 90 TABELA 29: Distribuicio das respostas A Questo “Apenas as raparigas precisam de 0 TABELA 30: Distribuicao das respostas & Questo “As criangas devem ser ensinadas de que 1 aprender acerca dos abusos sexuais de criancas e do que fazer para se protegerem” .. se alguém tentar abusar sexualmente delas, estas podem dizer “Nao” TABELA 31: Distribuigdo das respostas & Questo “As criangas devem ser ensinadas de que quando uma pessoa mais velha tentar tocar nos seus Srgdos genitais estas nunca devem 91 a Questo “As criangas devem ser ensinadas de que 2 guardar segredo” TABELA 32: Distribuigio das respos ninguém Ihes pode tocar de formas que as fagam sentir desconfortéveis” TABELA 33: Distribuigdo das respostas 4 Questo “Os programas de prevengao do abuso sexual de criangas devem ensinar &s criangas de que se forem abusadas a culpa nunca € delas” 92 TABELA 34: Distribuigdo das respostas 4 Questo “As criangas devem ser ensinadas a tentar fugir se alguém tentar abusar delas” 93 TABELA 35: Distribuigdo das respostas & Questio “As criangas devem ser ensinadas a gritar alto quando alguém tenta abusar delas” TABELA 36: “As criancas devem ser ensinadas de que as tinicas pessoas que abusam as 93 io estranh: criangas TABELA 37: Distr uigdo das respostas & Questio “As criangas devem ser ensinadas de que 94 tém o direito de dizer “Nao” a um adulto” TABELA 38: Di: ribuigdo das respostas & Questio “As criancas devem ser ensinadas de 94 TABELA 39: Distribuigio das respostas & Questo “As criangas devem ser ensinadas de que 95 quando € e no é normal uma pessoa mais velha tocar ou olhar os seus 6rgios genitais” . tém 0 direito de decidir sobre quem deve tocar nos seus érgdos genitais” TABELA 40: Distribuicio das respos 5 & Questo “As criancas devem ser ensinadas de que por vezes criangas mais velhas e adolescentes tentam abusar sexualmente de criangas mais novas”” 95 TABELA 41: Distribuicdo das respostas 4 Questo - “As criancas devem ser ensinadas sobre 08 termos correctos para os seus érgdos genitais (p.e Pénis, vagina)” . 96 TABELA 42: Distribuigdo das respostas & Questo “As criangas devem ser ensinadas a resistir Jutando contra o agressor (p.¢ bater, dar pontapés) quando alguém tenta abusar sexualmente delas” 96 TABELA 43; Distribuigdo das respostas & Questio * scriangas devem ser ensinadas de que alguém que elas amam e em quem confiam pode tentar abusar sexualmente delas, até mesmo 97 TABELA 44: Distribuigio das respostas & Questo “As criangas devem ser ensinadas a ouvir a mie, 0 pai, 0s tios, ou um/a vizinho/a” 0s seus préprios sentimentos e de como se sentem perante um determinado “toque”, se 7 TABELA 45: Distribuigdo das respostas A Questo “As criangas devem ser ensinadas acerca consideram normal ou nao” .. do significado dos termos relacionados com o abuso sexual, tais como molestar, violar € 1.98 TABELA 46: Distribuigio das respostas & Questo “As criangas devem ser ensinadas de que incesto” ..... por vezes quando contam a um adulto gue foram abusadas este poderé ndo acreditar nelas” 98 x TABELA 47: Distribuigdo das respostas & Questo “As criangas devem ser ensinadas de que, quando feito em privado, é normal estas tocarem nos seus proprios érgdos genitais” «99 TABELA 48: Distribuigdo das respostas A Questo “Deve-se explicar as criangas 0 que se entende por comportamentos sexuais (p.e relagio sexual) para melhor as preparar para 99 TABELA 49: Distribuigao das respostas 4 Questio “Se um contacto sexual entre um adulto e situagdes abusivas” .. uma crianca nao envolver forga, nem relagio sexual, este nio deixard sequelas psicolégicas para a crianga” .. 100 TABELA 50: Distribuigio das respostas 4 Questo “Se uma crianga ndo denunciar 0 contacto sexual, 0 mais provavel é ela querer que este continue” ... 100 TABELA 51: Distribuigdo das respostas A Questo “O meu filho no esté em risco de ser abusado sexualmente” 101 TABELA 52: Distribuicao das respostas & Questo “As criangas que forem vitimas de abusos sexuais, quando crescem podem tornar-se elas proprias abusadoras” .. 101 TABELA 53: Distribuigdo das resposte 8 Questo “Onde/ Como adquiriu essa informagai seve 104 TABELA 54: Distribuiggo das respostas a Questio “Para si que tipo de actos sto 104 TABELA 55; Distribuigio das respostas afirmativas & Questéo “Algumas Questées sobre a 104 considerados Abuso Sexual de criancas? Dé exemplos” .. ‘Temitica dos Abusos Sexuais de Criangas” .. TABELA 56: Distribuicdo das respostas que ambos os grupos assinalaram & Questio “Como identificaria uma crianga alvo de abusos sexuais?” 106 TABELA 57: Distribuigdo das respostas & Questio “Tem conhecimento de algum incidente de Abuso Sexual de Criangas que tenha ocorrido perto de si?” ..... seve 107 TABELA 58: Distribuicao das respostas & Questo “Suponha que denunciou uma situagdo de abuso sexual de criangas. Quais considera que terdo sido as razdes mais procedido & deniincia?” .. TABELA 59: Distribuigdo das respostas 4 Questio “Suponha que ndo denunciou uma situagiio de abuso sexual de criangas. Quais considera que terfio sido as razées mais 109 significativas para nao ter procedido & dendincii TABELA 60: Distribuigdio das respostas conjunta dos Pais ¢ Professores 4 Questio “O que ofa levaria a querer participar num programa de formagao sobre os abusos sexuais de criangas?” ...... a xl TABELA 61: Apresentagio dos Resultados da Média e do Desvio Padrao para 0 Grupo dos Professores, face &s 4 categorias criadas: a) Atitudes Preventivas; B) Agressores; C) Mitos; D) 112 Atitudes Programas de Prevengio.... erenetetee TABELA 62: Apresentagao dos Resultados da Média e do Desvio Padrao para 0 Grapo dos Pais, face As 3 categorias criadas: a) Atitudes Preventivas; B) Agressores; C) Mitos.......... 112 119 ou 125 TABELA 63: Percentagem de respostas das criangas: Sub-escala I TABELA 64: Percentagens de respostas das Criancas: Sub-escala A ....... XI LISTA DE FIGURAS FIGURA 1: Género dos Participantes Pais ¢ Professores .... FIGURA 2: Estado Civil Pais e Professores FIGURA 3: Grau de Parentesco Grupo dos Pais FIGURA 4: Nimero de Filhos Grupo dos Pais.. FIGURA 5: Habilitagdes Literdrias Grupo dos Pais FIGURA 6: Idade Pais ¢ Professores ... FIGURA 7: Ano que Leccionam Grupo dos Professores FIGURA 8: Niimero de Anos que Exerce a Profissao Grupo dos Professores. FIGURA 9: Género Grupo das Criangas. FIGURA 10: uuu. Idade dos Participantes Grupo das Criangas 102 FIGURA 11: Percentage de adesdo as perguntas abertas Pais e Professores FIGURA 12: Que nivel de informagio considera ter sobre os abusos sexuais de criangas .. 102 FIGURA 13: Representagao Grafica das Respostas feitas dos Pais 4 Questo “Gostaria de ter formagio para poder detectar e lidar com o abuso sexual com mais seguranga?” 110 Xill 69 “Cuidado implica 0 afecto, 0 ouvir, 0 alimento, a companhia, a presenga, 0 gesto, 0 outro corpo, a fala, 0 sorriso, 0 acalento. E para além do alimento. E 0 alimento e o gosto. A fala e 0 canto. A comida e o calor. O vestir ¢ 0 cobrir e o calor e a cor, 0 que nos dé colorido ao sentir, ao estar, ao ser diferente” Joaquim, T. (p.27, cit. in 1991, p.50) é um problema real, cada vez mais conhecido no mundo O Abuso Sexual de Criang inteiro. Segundo Bagley e King (1990) o abuso sexual de criangas constitui-se como o maior problema de satide mental, acarretando sérios riscos para a satide mental do individuo na fase adulta. © abuso sexual provoca consequéncias arrasadoras nas pessoas a melhor forma de reduzir esses efeitos € pela Prevengio. Ao ensinarmos estratégias de “empowerment” criangas estamos a reduzir a sua vulnerabilidade ao abuso e explorago e, desta forma, a contribuir para que estas crescam “seguras, fortes e livres”. Muitos programas de prevengao foram desenvolvidos nas tiltimas trés décadas, com 0 is objective de preparar as criangas para resistir e reportar os avangos sexuais de potenci abusadores (Carroll, L. A. 1992). Segundo Fluke, J. (2008), a avaliago de programas de prevengio dos abusos sexuais de criancas, constata que 0 envolvimento das criangas e das familias em programas de prevengio, reduz eficazmente a ocorréncia de abusos. Este trabalho de Mestrado pretende estudar as Atitudes, Crencas, Conhecimentos ¢ Competéncias que os Pais, Professores ¢ Criancas do 1° Ciclo detém sobre a Prevencao dos Abusos Sexuais de Criancas, apés terem participado num Programa de Prevengao sobre a temftica da Prevengdo dos Abusos Sexuais de Criangas - Programa de Prevengiio CAP (Child Assault Prevention). O estudo envolve uma amostra de 76 pessoas no total, distribuidos por trés grupos diferentes: a) 23 Pais; b) 29 Professores; c) 24 criangas do 1° Ciclo. Os instrumentos para Pais ¢ Professores que utilizamos para a realizagdo deste trabalho (Ver Anexo A eB pag. 171 € 187) procederam do estudo: Sexual Abuse Prevention for Preschoolers: A Survey of Parents’s Behaviors, Attitudes, and Beliefs (Wuntele, Kvaternick & Franklin, 1992), publicado no Journal of Child Sexual Abuse. Com 0 intuito de complementar os questiondrios originais, foram acrescentadas outras questdes, provenientes do Child Abuse Knowledge Questionnaire (Hibbard, R. A., & Zollinger, W., 1990), do Child Abuse Myth Scale (Collings, Steven, J., 1997), e também do CAP ~ The Child Assault Prevention Project. Foram instrumentos adaptados pela Associagao Portuguesa para o Estudo e Prevengio dos Abusos Sexuais de Criangas (APPEPASC), para tornar mais enriquecedora a andlise e realizagao do presente estudo. Este estudo tem um carécter preventivo pela forma como procura aferir os conhecimentos dos pais, professors e criangas sobre a temética e de como os programas de prevenciio se revelam eficazes na sua pratica. Para além de uma parte prética, o presente trabalho € constituido também por uma parte tedrica, onde sero enquadrados teoricamente alguns dos conceitos e caracteristicas relativas a0 abuso sexual de criangas. O enquadramento te6rico do trabalho iré compreender primeiramente um capitulo sobre 0 tema do abuso sexual de criangas onde iro ser abordados os temas da origem dos abusos; de seguida ird ser definido o conceito do abuso sexual de criancas, os tipos de abuso sexual, e as consequéncias do mesmo. A temitica sobre quem usualmente comete 05 abusos, € os mitos que estéio envoltos sobre este assunto, ird ser abordado de seguida. Posteriormente, no final do capitulo, seré dado uma atengio especializada & questio da Meméria nos Abusos Sexuais de Criangas onde serdo debatidas tematicas como: O Sindrome das Falsas MemGrias e a existéncia de Memsrias Recuperadas. Finalmente a recensio bibliogréfica terminard com um capftulo sobre a temética central deste trabalho: Os Programas de Prevenciio do Abuso Sexual de Criangas. Neste capitulo serao abordadas questdes sobre: a sua génese; sobre os programas de prevenciio dos abusos sexuais nas escolas; a temética do envolvimento dos pais nos mesmos, da sua importancia e eficdcia na prevengio dos abusos. No seguimento deste capitulo serdo caracterizados 3 estudos de investigagio, dois dos quais relatives ao sucesso dos programas de prevengo dos abusos sexuais de criangas nas escolas, sendo 0 iltimo centrado na participagio dos pais nos programas de prevencdo do abuso sexual de criangas. Estes estudos de investigacio funcionaram como elo de ligagio para a parte metodol6gica do nosso trabalho. © autor David Finkelhor foi extremamente influente no que se refere ao estudo destas teméticas dos abusos sexuais, segundo ele, as escolas e os programas de comunidade deram um asso em direcedo a ensinar e incutir nas criangas competéncias para que elas poss abuso (Finkelhor, 1990 cit in Bolen, 2003). um evilar 0 ‘A prevengio dos abusos sexuais de criangas passa mesmo por este ponto, incluir programas nas escolas de forma a que as criangas, pais e professores sejam envolvidos. Estes programas sfo essenciais pois promovem o desenvolvimento do empowerment nas criangas ensinando-Ihes estratégias e competéncias para que possam evitar e fugir de abusivas, da mesma forma que ensinam estas mesmas competéncias ¢ estratégias aos adultos. Esta formagio através dos workshops ira permitir que estes detectem precocemente 0 abuso sexual ¢ intervenham no mesmo. Os programas de prevencao dos abusos sexuais de criangas ao envolverem a nivel global os pail , as criangas, os professores e toda a comunidade, esto a aumentar globalmente o conhecimento sobre este tema, no sentido em que todas as pessoas envolvidas esto mais alerta, menos vulnerdveis, mais atentas € mais preventivas. Se as comunidades estiverem mais alerta, estiio. também menos vulnerdveis e consequentemente os abusos irio diminuir. Esta é a verdadeira e extraordinéria importincia da Prevengio. 2. ENQUADRAMENTO TEORICO “Claro que imensos progressos faltam para ser alcancados. Nao estamos ainda nem a metade do caminho de ld chegarmos. No entanto, estamos a caminho! Nao hé diividas de que a nossa dedicagao conjunta ajudar-nos- a aleancar esse objectivo!” Brisset, C. (2007) Lisbon, Novembro de 2007 The Convencional on The Rights od The Child Os Direitos das Criangas -— como refere a UNICEF — sao fundamentais, e os seus componentes bésicos sao sumarizados na Lei dos 3 “Ps”: “P — Proporcionar — Os adultos devem proporcionar As criangas os elementos béisicos que estas precisam para viver, tais como: comida, gua potdvel, servigos de satide, educacio, vestuério, abrigo, etc. Sem estes elementos a crianga nao pode crescer, nem mesmo sobreviver. P — Protecc&o — Protecco contra todas as formas de violéncia, incluindo conflitos armados, exploragio social ou econémica, violéncia dentro da familia em que vive. Protecc&io contra todas as formas de descriminagao, por exemplo: entre rapazes © raparigas, ou descriminagdo contra criangas com deficiéncia, criangas de minorias étnicas, criangas em conflito com a lei, etc. P — Participagao — As criangas tém o direito de participar na vida da sociedade de onde moram, por exemplo na vida cultural. As criangas tém o direito absoluto de serem consultadas em todas as decis es que Ihes digam directamente respeito, tal como tomar decisdes relativas & sua vida depois de uma separagdo dos pais, etc. “ Brisset, C. (2007). E importante e fundamental que todos nés, em toda a parte do mundo, lutemos para que as criancas serem respeitadas em todos os seus Direitos. E nossa responsabilidade conjunta. Tal como refere Amado, A. (2008), “fago-o pelos meus filhos.... fago-o por toda a comunidade”. 2.1. ABUSO SEXUAL DE CRIANCAS A violéncia contra as eriangas sempre se constituiu como uma realidade na hist6ria da humanidade, esta é uma ideia partithada por varios autores ao longo dos anos, Mahroos, Abdulla, Kamal e Ansari (2005) sao alguns dos autores que partilham desta ideia, Segundo estes a crueldade para com as criancas sempre existiu ao longo das civilizagdes. Uma dessas formas de violéncia é a Sexual e é sobre essa que se iré centrar este trabalho. Apesar de se tratar de um assunto proeminente desde os anos 60, altura em que adquiriu maior importancia por parte dos profissionais que lidavam com criancas e da populago em geral, s6 recentemente é que apareceu como sendo de facto um problema de satide e bem-estar para a crianga. Muitos autores escrevem acerca da temftica do abuso de criangas, e apesar de nem sempre estarem de acordo nas suas convicgdes hé uma ideia que parece convergir em todos eles: a ideia de que o abuso sexual de criangas é um tema delicado e complexo que se constitui como um inevitavel desafio. Gallagher (2001) vai ao encontro desta ideia, referindo que “quer os autores estejam a discutir as causas do abuso de criangas, a sua extensio, natureza ou prevengio, todos os autores so unfnimes em reconhecer a sua complexidade e 0 desafio que € esclarecer esta tematica” (p. 15). A atengio referente & problematica do abuso sexual de criangas que se tem observado nas iltimas duas décadas deveu-se a uma preocupagio crescente pelos maus-tratos de criancas em geral, pelo aumento da discussao sobre a violéncia sexual, e pela publicidade que os meios de comunicagao social tém dado aos casos de Abuso Sexual que se tm tornado piiblicos. Tem igualmente sido reconhecida a vulnerabilidade a acontecimentos negativos a que as criangas que sofrem abusos sexuais estio sujeitas na vida adulta. As criangas que sao abusadas deparam-se também com um aumento do risco de problemas de satide fisica na vida adulta, incluindo consequéncias a nivel sexual € reprodutor tais como gravidez indesejada, doengas sexualmente transmissiveis (como HIV) e violéncia sexual na vida adulta (Doll, Koening, & Purcell 2004, p. 3). E unanime o reconhecimento de que 0 abuso sexual de criancas foi um assunto oculto durante varios anos, s6 no inicio dos anos 80 € que se comegou a olhar para o abuso sexual de criangas noutros pais com mais atencdo e preocupacdo, altura em que o problema ¢ o nivel de conhecimento sobre 0 mesmo adquiriu uma maior dimensao, no entanto muito hé ainda a fazer de forma a prevenir a ocorréncia do abuso sexual de criangas. Em Portugal s6 recentemente se comegou a falar sobre esta problemética, ¢ a envolver as pessoas em Programas de Prevengio. Para Krugman e Jones, 1987 (citado em Helfen, & Kempe, 1987) o abuso sexual de criangas “constituiu-se durante séculos como um problema escondido. Agora 0 abuso sexual de criangas esté a ser largamente reconhecido” (p. 298). Os autores consideram assim que 0 abuso sexual de criangas se trata de um dos maiores flagelos a nivel mundial. A constatagio de um elevado niimero de casos de abuso sexual de criancas nfo se verificou apenas pelas dentincias existentes, esta situagdo foi comprovada por diversos estudos que aferiram a prevaléncia do abuso sexual de criangas em diversas populagdes. © primeiro estudo foi realizado em 1983 por Russell (cit in Bolen, 2003), neste estudo 38% de todas as participantes do sexo feminino revelaram ter tido contactos sexuais abusivos durante a infancia. Estes resultados provocaram, como refere Bolen (2003) uma “urgente preocupagao em relat aos abusos sexuais de criangas” (p. 174). Os autores Finkelhor, Hotaling, Lewis e Smith, 1990; Holmes e Slap, 1998; Molnar, Buka e Kessler, 2001; Rind e Tromovitch, 1997 (cit in Doll, Koenig, & Purcell, 2004), também realizaram estudos de prevaléncia do abuso sexual de criangas, tendo conclufdo que entre 12% a 53% de raparigas e 3% a 16% de rapazes vivenciaram alguma forma de abuso sexual durante a infancia, Outros estudos revelam que a prevaléncia do abuso sexual de criangas em raparigas é de tués a cinco vezes mais frequente do que nos rapazes, contudo sabe-se que os abusos reportados pelos rapazes podem ser menos frequentes devido ao facto de nestes casos existir uma maior estigmatizagdo aos olhos da sociedade, esta é uma ideia que vai ao encontro do que comprova 0 estudo realizado por Boney- McCoy e Finkelhor, 1995 (cit in Doll, Koenig, & Purcell, 2004). Segundo o U.S Department of Health and Human Services 2000 (cit in Renk, Liljequist, Steinberg, Bosco, & Phares, 2002) aproximadamente 12% de criancas sfio abusadas por ano nos Estados Unidos. Na Europa as percentagens no diferem, como demonstrou um estudo realizado em Inglaterra por Baker e Duncan (1985), 12% de raparigas e 8% de rapazes referiram ter sido sexualmente abusados antes de atingirem os 16 anos de idade. Segundo Bunting, L. (2007), na ultima década © assunto dos abusos sexuais de criangas tém permanecido no topo das prioridades da agenda politica da Inglaterra, que tem resultado em intimeras mudangas na legislagdo © no aumento do desenvolvimento de programas de estratégias nacionais de prevengio dos abusos e aumento da consciencializagio do piiblico em geral sobre este problema. Como referem os autores Speizer, I. $., Goodwinb M., Whittleb, L., Maureen C. & Rogersc J. (2008). © Abuso Sexual de Criangas na América Central é claramente um problema, cuja prevaléncia se encontra entre os 5% © os 8%. Face as consequéncias negativas que 0 abuso sexual de criangas pode ter a longo prazo e 0 impacto que tem na satide, os autores sfio da opinifio que so precisos Programas de Prevengao dos Abusos Sexuais de Criangas na América Central. Estes resultados demonstram, tal como chama a atengio Ward, 1984 (cit in Bagley, & King, 1990) que se torna claro que nenhuma cultura esté imune e que o abuso sexual de criangas existe um pouco por todo o lado. 2.1.1. O Abuso Sexual de Criangas como um Problema Global £ muito dificil para qualquer pessoa falar sobre 0 Abuso Sexual de Criancas, especialmente para as proprias criangas, e sabe-se que quando as criangas foram abusadas sexualmente se inibem a falar sobre 0 que passaram, torando-se mais dificil nao s6 protege- Jas, como proteger outras criangas pela Prevengao dos Abusos Sexuais de Criangas. Dai ser tio importante a implementagdo: de Programas de Prevencao dos Abusos Sexuais de Criancas, muito utilizados e descritos por Nibert, Cooper e Ford (1989), como sendo Programas que 8 passam por ensinar &s criangas, pais e outros cuidadores, estratégias a utilizar em situagées ameagadoras. Estas estratégias esto inclufdas em Programas que se destinam as criancas, pais, professores e profissionais da escola com quem a crianga tem contacto didrio. © Abuso Sexual de Criangas no € um problema que sé acontece em alguns paises, ¢ como problema global que €, € muito favordvel que jé se fale em Prevengao a nivel global. Segundo Hans, J., Marion, R., Cees, H., Willenswaard, V. & Elsa M. (2008), descrevem que a Holanda teve indmeras vantagens em providenciar uma estrutura a nivel nacional criando programas de prevengio da satide mental, sendo um dos programas \cluindo: formas de prevenir © abuso sexual de criancas na Holanda. Também a China tem vindo a desenvolver ao longo dos anos Programas de Prevengo dos Abusos Sexuais de Criangas, a forte necessidade destes programas tem vindo a fazer sentido pelo aumento exponencial do trabalho infantil, da prostituicao infantil e do abuso sexual de criangas. Sabe-se que o elevado crescimento econémico que se tem feito sentir na China, tem provocado 0 aumento destes sérios problemas, pelo que tém surgido varios autores, como Lumpur, K. (1994), com niimeros verdadeiramente assustadores da incidéncia do abuso da China, e referindo a importancia da implementagao urgente de Programas de Prevencao, Os autores Chen, J., Dunne, M. & Han, P. (2007), realizaram um estudo sobre os conhecimentos, as atitudes e as priticas de comunicagio em pais de criangas do 1° Ciclo na China, 0 estudo realizado indica que as pessoas estio muito receptivas e predispostas a participarem em programas de prevengao sobre os abusos sexuais de criangas, e pensa-se que este facto se prende com a evidente falta de conhecimentos que os pais demonstram possuir em relagio ao abuso sexual de criangas, mesmo aqueles que falam sobre estas questées com os seus filhos. Para uma maior compreensao da temética em estudo surge assim a necessidade de definir c esclarecer alguns conceitos e ideias relativas ao Abuso Sexual de Criangas. 2.1.2. Definicio de Abuso Sexual de Criangas N&o existe uma definigio universal de abuso sexual de criangas, existem varias definigdes com diferentes variantes entre clas, ha no entanto algumas caracteristicas comuns que parecem convergir em todas estas definigbes, nomeadamente 0 facto do Abuso Sexual de Criancas: - Ser qualquer contacto sexual entre uma crianga e um adulto; - Envolver forg: , ameaga, e/ou desigualdade de poder entre a crianga eo perpetrador; - Favorecer a estimulagao sexual do agressor. Nos anos 70 e 80 com as informagdes que iam surgindo sobre os Abusos Sexuais de Criangas, varios autores comegaram a tentar definir 0 conceito de abuso sexual de criangas. As primeiras definigdes inclufam o envolvimento de qualquer crianga ou adolescente dependente e sexualmente imaturo, menor de 16 anos em actividades sexu: que nao compreendiam inteiramente, com uma pessoa que exerce poder sobre estes, violando assim todos os tabus sociais e as regras familiares. Em 1988, surgiu uma definigio mais compreensiva sobre a temética defendida pelos autores Finkelhor e Korbin (cit in Smith & Bentovim, 1994), que se referiam ao Abuso Sexual como sendo: de Crianga Qualquer contacto sexual entre um adulto e uma crianga sexualmente imatura (maturidade sexual tanto a nivel social como fisiolégico), com 0 objective da satisfagiio sexual do adulto; ou qualquer contacto sexual com uma crianga perpetrado pela forga, ameaga, ou estratagema para assegurar a participagio da crianga; ou contacto sexual quando a crianga € incapaz de consentir em virtude da idade ou distingao de poder e da natureza da relagdo com 0 adulto, Com o aparecimento destas d efinig6es irrompeu uma forte quest © no que se refere & idade do perpetrador pois nenhuma definigfo havia inclufdo ainda o abuso perpetrado por adolescentes ou pares, nesta ordem de ideias Finkelhor e Hotaling, 1984 (cit in Smith & 10 Bentovim, 1994) sugeriram que a definigo de abuso sexual de criangas deveria incluir o facto do contacto sexual ocorrer em resultado de forca, ameaca, ou estratagema, independentemente da idade do perpetrador. As definigdes sobre 0 que era, ou no, considerado abuso sexual de criangas nao pararam por ai. Cohen, (2000) surgiu com a seguinte definicao para o abuso sexual de criangas: Uma exploragio sexual que envolve contacto fisico entre uma crianga outra pessoa. Esta exploragio implica a existéncia de uma desigualdade de poder entre a crianga e 0 abusador, tendo em conta factores como: a idade, tamanho fisico, e /ow natureza das relages afectivas. Por contacto fisico entende-se: contacto anal, genital, oral ou envolvendo os seios, p.450).. Esta ideia de Cohen difere por sua vez da definigao da APA (American Psychology Association) que defende que para existir abuso nao implica necessariamente a existéncia de contacto fisico. Mais recentemente, 0 U. S, Department of Health & Human Services, 2007, cit in Wurtele, S. & Kenny, M. (In Press), avangou com 0 abuso sexual de criangas como um tipo de mau trato a criangas que implica um “envolvimento da crianga em actividades sexuais, com 0 Jo sexual ou beneficios financ objectivo de propiciar grat 3's a0 perpetrador do crime”. Perante tais definigdes ha algo que ressalta a vista e que se prende com a ambiguidade e divergéncia que envolveu desde sempre a problematica do abuso sexual de criancas. Haugaard (2000) chama a atengao para trés obstéculos que dificultam 0 esclarecimento do que € 0 abuso sexual de criangas: - O primeiro obstéculo prende-se com a propria definigGo clara do que se entende por abuso € que difere consoante cada profissional de cada érea distinta. Haugaard (2000) acredita que o termo de Abuso Sexual de Criangas € usado em diferentes contextos e por profissionais de diferentes areas que podem ter diferentes ordens e objectivos quando trabalham com criangas sexualmente abusadas e as suas familias. - O segundo obsticulo relaciona-se com a diferenciagio do que é, ¢ nao € abuso e que se constitui como sendo o problema mais evidente na definico do Abuso Sexual de Criangas. Um exemplo caracteristico desta ambiguidade € 0 facto de poucas pessoas considerarem abuso sexual quando um pai toma banho com a sua filha de 2 anos, ¢ muitos considerarem abuso sexual quando um pai toma banho com a sua filha de 14 anos. A que idade deve um pai deixar de tomar banho com a sua filha para evitar abusar sexualmente dela? (Haugaard, 2000). - Finalmente 0 contexto onde 0 comportamento ocorre é frequentemente causa para decidir se este foi abusivo ou nao. facto de um pai massajar os joelhos da sua filha de 10 anos & noite na sua cama pode ter um significado diferente de quando o faz apés um jogo de futebol extenuante. O conjunto de caracteristicas contextuais decide se um determinado comportamento € ou nao abusivo (Haugaard, 2000). Assim acgdes como: propostas de cariz sexual, exibicionismo, ser beijado de uma forma sexual, contacto genital e nao genital e relacao sexual propriamente dita, so nos estudos referidos por Haugaard (2000) tidas em considerago na definigao do abuso sexual de criane: Esta questo levanta no entanto uma outra controvérsia que se prende com a seriedade do abuso em si. Como refere Macmartin (2004) alguns investigadores argumentam que as caracteristicas do abuso sexual so tidas em consideragio e usadas para amenizar Iegalmente a gravidade do crime de abuso sexual. Este facto vai ao encontro do que estudaram os autores Reener, Alksnis, ¢ Park, 1997 (cit in Macmartin, 2004) entre 1989 e 1993, que ao analisarem casos de julgamentos de abusos sexuais a criangas adultos na Nova Escécia concluiram que as mesmas caracterfsticas que constituem provas de acusago do abuso sexual, eram igualmente usadas para amenizar a gravidade das agressdes. Duas das caracterfsticas que poderiam ser usadas para diminuir a pena dos agressores consistiam: na auséncia de injirias fisicas para a vitima; © a existéncia de relagdes préximas, muitas vezes familiares entre a vitima e 0 perpetrador. Estes dois factores poderiam ser usados para reduzir as penas em tribunal consequentemente amenizar 0 crime de abuso sexual. Macmartin (2004) discorda que a auséncia de abuso fisico seja usada para amenizar as penas, defende pelo contrério, que talvez esteja a haver uma consciencializagio gradual nos tribunais no que se refere ao significado do abuso sexual de criangas. Este autor verificou através do seu estudo de andlise de sentengas judiciais na cidade de Ontario que o facto do abuso sexual ser perpetrado por familiares ou conhecidos da crianga leva & quebra da confianga que a crianga deposita no adulto, ¢ esta “traicdo” juntamente com a frequéncia da ocorréncia do abuso, sto factores responsfiveis pelas denuncias dos crimes de abuso sexual e pelo julgamento dos abusadores. Macmartin verificou que em varios casos a auséncia de danos fisicos na crianga foi usada nao para amenizar a pena mas para aumentar o trauma psicolégico que se debateu sobre a Esta questo remete para o facto de o abuso sexual de criangas ser mais do que um abuso fisico, € um abuso de poder, e uma violacdo da confianga que a crianca deposita no adulto, esses factores provocam consequéncias arrasadoras na crianga sé na sua capacidade de socializar com os outros como no estabelecimento de relagdes de confianga com os adultos. Esta € uma ideia defendida por varios autores, entre os quais se destacam Butler, 1985 (cit in Bagley, & King, 1990) que defende que “a consequéncia mais devastadora da imposigio da sexualidade de um adulto sobre uma crianga, ¢ a imepardvel perda da inviolabilidade da crianga e a confianga que esta deposita nos adultos na sua vida”, e Armstrong, 1978 (cit in Bagley, & King, 1990) que defende que “a violagdo perpetrada por um estranho € rdpida e brutal. Permite uma reacgo face a0 estranho do tipo - raiva e édio. Mas a sedugao ou coerco de uma crianga por parte de um adulto de quem esta esté dependente e em quem confia, é de longe mais complexa”, 2.1.3, Assédio Online - Uma Nova Dimensio dos Abusos Sexuais de Criancas Patrick conheceu uma rapariga de 13 anos: Georgie. Apés varios meses de contactos via Internet e telefone, resolveram encontrar-se. Georgie pensou que se ia encontrar com um rapaz de 15 anos. A mae da Georgie deu-the boleia e ficou a observa-los & distancia. Teve sorte intervindo no encontro mal se apercebeu que 0 rapaz de 15 anos era afinal um homem de meia-idade. Graven, S., Brown, S. & Gilchrist, E. (2007). Os relatérios da comunicagdo social e as mensagens de internet segura acerca dos predadores sexuais, sugerem que 0s encontros online entre adultos e jovens ¢ que acabam por resultar em crimes sexuais constituem uma nova dimensiio dos abusos sexuais de criangas (e. Bahney, A. 2006; Filosa, G. 2007; Manolatos, T. 2007 cit in Wolak, J., et al (2008). As hist6rias que ouvimos recorrentemente por parte da comunicagio social sobre os “predadores sexuais” que utili zam a Internet para chegarem facilmente As criangas e adolescentes, est a usar grande preocupagio um pouco por todo o mundo, entre pais, professores, educadores e profission: que lidam directamente com a area dos abusos de criangas. So varios os autores que referem que chegamos & altura em que os pedéfilos estiio a encontrar novas formas e novas oportunidades para, através da rede, contactar criangas e adolescentes, com 0 objectivo de as assediar, abusar sexualmente e até mesmo criar redes de exploragao sexual. Esta ideia € defendida por Malesky, A. (2007) referindo que os predadores sexuais tem utilizado a Internet para identificar e contactar com criangas para explorago sexual. Wolak, J., Finkelhor, D., Mitchell, K. J. & Ybarra, M. L. (2008), so da mesma opinio, considerando que nos encontramos perante um problema muito sério, para o qual é urgente prevenir, passando mensagens, envolvendo os pais para um maior controlo no acesso & internet dos seus filhos, € incutir nas criangas € adolescentes a prudéncia que € necesséria quando falam com pessoas online, especialmente quando pensam em divulgar informagGes de cardcter pessoal. A divulgagao da Internet como um espaco privilegiado de educagéo ¢ aumento de cultura devia ser sempre acompanhada com avisos de alerta, constituindo-se a necessidade urgente de Acces de Prevengao sobre os contactos que as criangas ¢ os adolescentes estabelecem com desconhecidos, ¢ um uso indevido na Internet. Como referem Mitchell K. J., et al (2008), a Prevengio sobre os Bloggings e © uso indevido da Internet exige a inclusio dos riscos de interagir com pessoas que se conhecem online, nomeadamente ao nivel da consciencializ: sobre 0 assédio sexual. Paralelamente & urgéncia de Prevengio nesta Area, € necessério aumentar as pesquisas os estudos sobre este assunto, Mitchell K. J., et al (2008), referem que esta urgéncia em estudarmos mais sobre 0 Assédio Online, se prende com o facto do mundo Online estar em constante mudanga (p.125), Com 0 objectivo de aumentar os conhecimentos das pessoas que lidam directamente com ‘os Abusos perpetrados contra criangas, e de os tornar mais competentes e atentos para lidar com © problema do assédio sexual através da Internet e consequente risco do abuso, Mitchell K. J., et al (2008), realizaram um estudo que pretendeu aferir os riscos das criangas ou adolescentes aderirem e participarem nos jomais online ou “blogs” Conclui-se que € importante as familias, e criancas, estarem alerta sobre o perigo do uso indevido da Internet, mas reflectiu-se sobre o facto de os blogs niio terem de ser necessariamente perigosos. O estudo realizado mostrou que os blogs podem inclusivamente ser promotores de uma maior partilha entre pais e familias, no sentido em que se provou existir, através do blog uma maior partilha de sentires entre pais ¢ filhos. Os adolescentes partilhavam, através dos blogs, e da escrita, 0 que sentiam e pensavam sobre imimeros assuntos. Contudo, estas informag&es a serem partilhadas com pessoas que se conhece através da Intemet, pode ser promotora da ocorréncia de abusos, pelo que é necessério alertar criangas, os jovens e os pais para os perigos do uso pouco cauteloso da internet. Mitchell K. J., et al (2008) sdo da opiniao que hé uma dificuldade acrescida no processo global de consciencializagao do uso da Web, dificuldade promovida em parte pela comunicagéo social, que diariamente deixa mensagens sobre a importincia para a formacao e educagdo do uso da utilizagdo da Internet, sem dar no entanto associada a esta mensagem, um feedback sobre os seus perigos, Da mesma forma que ha mitos relacionados com os Abusos Sexuais de Criangas, parecem existir também falsas crengas no que se refere ao assédio online. Segundo Wolak, J., et 15 al (2008), os estudos relacionados com os crimes sexuais que iniciam por contactos via internet, indicam que é imprecisa e inconclusiva a ideia de que os “predadores” usam truques e violencia para vitimizar a crianga, constituindo-se por essa razio um esterestipo. A maioria dos crimes sexuais contra criangas que se iniciam por contactos via Web.envolvem homens adultos que usam a internet (mensagens instanténeas, e-mail, salas de chat) para conhecer e seduzir para encontros sexuais jovens adolescentes. A maioria dos jovens e adolescentes sabem que estiio a conversar com adultos. A maioria desses abusadores so responsdveis por crimes de “statutory rape”, que envolve actividades sexuais nao violentas com vitimas que, como traduz a expres: “statutory rape”, sio demasiado jovens para consentir legalmente as relagdes de cariz sexual com 0 adulto. Wolak, J., et al (2008) sio da opinidio de que alguns jovens podem estar particularmente em risco, este grupo inclui: rapazes que sio homossexuais e pa: sam pelo processo de questionar a sua orientagio sexual; criangas e jovens que detém na sua histéria de vida episédios de abuso fisico € sexual; e os jovens que frequentam os chatrooms e que tém conversas sobre sexo na intemet, com pessoas que nfo conhecem. Estes sfio factores que tornam as criancas vulneraveis & ‘ocorréncia dos abusos. 2.1.4. Tipos de Abuso Sex de Criangas No seguimento do que referimos anteriormente faz-nos sentido a criagio deste subcapitulo respeitante aos tipos de abuso sexual perpetrados contra as criangas. J4 vimos que o abuso sexual de criancas € e envolve, na sua esséncia, uma violéncia fisica € psicolégica para a criang: |, rata-se de um acto que vai contra todos os direitos da crianga, uma forma de poder que a vai impedir de crescer saudavel e feliz. 6 uma violagio dos seus direitos basicos e como tal uma questo essencial a ser estudada. Smith e Bentovim (1994) sugeriram que o exibicionismo e caricias ou toques inapropriados so as formas mais comuns de abuso, usualmente seguidas de masturbagao e actos de penetracao. Jé para Forward e Buck (1989) 0 abuso sexual de criangas cobre muitos comportamentos ¢ relacionamentos. Estes incluem contacto ffsico com a boca da crianga, seios, genitais, anus, ou qualquer outra parte do corpo, que € feita com o objectivo de satisfagdo sexual do agressor. Ha ainda muitos outros comportamentos abusivos que apesar de nfo envolverem contacto fisico com as criangas sio extremamente penosos e trazem consequéncias devastadoras para as vitimas, estes incluem o agressor despir-se ou masturbar-se em frente & crianga, forga-la a ver pornografia ou submete-la a expor-se em poses que podem sugerir algo de cariz sexual, Esta ideia vai ao encontro da definigao de Forward e Buck (1989) que referem que as vitimas podem até nao ter sido tocadas, mas sentirem a sua privacidade violada em situagées especificas quando por exemplo, estilo a ser observadas a despir-se ou a tomar banho. Kunzman (1990) chama a atengao para 0 facto de 0 Abuso Sexual de criangas ocorrer sob diferentes formas, para este autor é considerado abuso sempre que o adulto: ~ Invade a privacidade da crianga quando esté a tomar banho ou vestir-se; ~ Manifesta comportamentos obses vos no que se refere aos érgdos geniais funcionamento corporal da crianga; ~ Acaricia a crianga; - Demonstra excessiva preocupagio em relagiio ao desenvolvimento corporal da crianga; - Mostra pornografia infantil & crianga; - Beija a crianga de forma abusiv: - Dé demasiados clisteres e é excessivo na higiene genital da crianga; - Pratica sexo oral com a crianga; - Pratica sodomia com a crianga; - Pratica relagdes sexuais com a crianga. Para este autor independentemente de qual destas formas estiver implicada no abuso, a dor envolvida por este & sempre muito forte e de longa duragao. Muitas definigdes do abuso sexual de criangas ndo especificam a natureza do contacto sexual abusivo, por esta raziio esta temética esté ainda envolta em algumas controvérsias. Se hé guem considere que para existir abuso sexual s6 & necessério o envolvimento numa relagdo sexual propriamente dita, outros hd ainda que defendem que 0 conceito de abuso sexual compreende uma nogio mais vasta incluindo no s6 actos de penetragao, como também exibicionismo e caricias suaves. No que diz respeito a este assunto Mrazek, 1980 (cit in Smith, & Bentovim, 1994), sugeriu a separagdo de actos sexuais em: exposigao dos 6rgdos sexuais, molestar, relagdo sexual e violagao. Por outro lado Peters, Wyatt, e Finkelhor, 1986 (cit in Smith, & Bentovim, 1994) distinguiu os actos sexualmente abusivos envolvendo 0 contacto (todos os comportamentos que envolvem relagio sexual, oral ou anal e caricias aos seios ou genitais) e aqueles que nao envolvem contacto (exibicionismo, exposi¢ao pornografia e solicitagdo no envolvimento em s). Outros investigadores tais como a Research Team, 1990; e Monck E., Bentovim A., Goodall G., Hyde C., Lewin R. e Sharland E., 1993 (cit in Smith, & Bentovim, 1994) por seu lado distinguiram actos sexuais: penetrativos e nao penetrativos; distinguiram relagio oral, anal e vaginal; e finalmente procederam a distingZlo entre a penetragao com objectos ou dedos e a masturbagao, caricias ou exibicionismo. Os autores Smith, & Bentovim (1994), baseados em diversos estudos realizados consideram que quanto mais préxima é a relago da crianga com 0 abusador; quanto maior & a diferenca de idade entre o abusador e a crianga; e quanto mais forte for o nivel de violéncia, e crueldade envolvida no abuso, maior € 0 sofrimento resultante do abuso sexual Kunzman (1990) defende no entanto que nao deve ser s6 tido em consideragio 0 facto de © abuso ser fisico, nao fisico, verbal ou visual. Para este autor o abuso sexual interrompe o desenvolvimento saudivel da crianga e 0 seu crescimento a véri s niveis, contribui para o desenvolvimento de uma baixa auto-estima, A crianga abusada terd tendéncia a possuir crengas distorcidas respeitantes & sua imagem corporal, 20 desenvolvimento da sua sexualidade, e teré uma falta de confianga nos p cipais cuidadores e no mundo em geral. Defendendo igualmente esta ideia encontra-se Ondersma (2001) que refere que invariavelmente 0 abuso sexual “causa mal; trata-se de um mal penetrante nas populagbes de pessoas com historia de abuso sexual; e tende a ser intenso”. Encontramo-nos assim perante uma série de consequéncias que o abuso sexual de criancas, pela sua intensidade e natureza, provoca nas criangas. 2.1.5. Consequéncias do Abuso Sexual de Criangas Na resposta & questo: “Porque € que 0 Abuso Sexual de Criangas é um factor de risco no desenvolvimento de problemas ao nivel da satide mental?”, varios autores tém e tiveram ao longo dos anos algo a dizer. Fergusson et al, (2008) cit in Noll, J. (2008), ¢ apés a realizagio de um estudo na Nova Zelindia com uma populagio de 1265 participantes, concluiu que o abuso sexual de criangas tém inicas e diferentes associagdes, relagdes ¢ implicagdes a longo prazo na satide mental das pessoas. Estes autores constataram que os efeitos e consequéncias dos abusos sexuais de criancas sto muito mais fortes e mais consistentes do que qualquer outro tipo de violéncia. A prova desta ocorréncia evidenciou-se pela elevada percentagem de participantes com distirbios mentais, que tinham passado por experiéncias de abuso sexual em crianga. Os participantes do estudo sujeitos a outros tipos de violéncia nao evidenciavam com tanta frequéncia perturbagSes mentais. Noll, J. (2008), escreveu recentemente sobre uma questio importante inerente as “consequéncias do Abuso Sexual de Criangas”, esta autora coloca em refle: © que considera estar a constituir uma controvérsia, se € apenas o abuso sexual de criangas que se constituiu como © mais sério dos problemas relacionados com o desenvolvimento infantil? Ou se estes problemas vém inerentes ndo s6 ao abuso, como as actuais desvantagens socioecondmicas, situagdes de disfungdes familiares, ¢ outros factores ambientais e contextuais que poderio servir como potenciais agentes de dificuldades de desenvolvimento das criangas, € que sao probleméticas comuns, Para autores como Cohen (2000) a resposta a essa pergunta é simples e prende-se com 0 facto de serem muitas as sequelas deixadas pelo abuso sexual, estas passam por consequéncias a 19 nivel comportamental, emocional e social. Alguns estudos revelam que as criangas abusadas sexualmente manifestam maiores dificuldades a nivel comportamental e emocional do que as criangas que n&o passaram por essa experiéncia. Desses comportamentos que resultam directamente de sequelas do abuso, observam-se: depressio, stress pés traumitico e sintomas de ansiedade, esta ideia & abordada por Cohen (2000) segundo o qual algumas sequelas clinicas aparecem como sendo comuns na maioria das criangas abusadas sexualmente. Paralelamente, os estudos indicam-nos que parece existir efeitos também ao nivel do desenvolvimento do cérebro. Como refere Glaser, D. (2007), a importdncia das experiéncias na infancia e em jovens idades sao claras mas envolvem mecanismos complexos. FE importante considerarmos ambos os efeitos, por um lado a falta de experiéncias (negligencia) ¢ os efeitos de experiencias negligentes, stressantes e traumatic: € as implicagdes que estas tém no processo de desenvolvimento do cérebro. 2.1.5.1, Efeitos Psicolégicos / Emocionais / Comportamentais dos Abusos Sexuais de Criancas Os autores defendem que a crianga abusada tende a sent e diferente das outras criangas. A responsabilizagio e culpabilidade pelo abuso sio também bastante visiveis nestas criancas, demonstrando-se zangadas, receosas € tristes, muitas adquirem comportamentos e regras inadequados a nivel sexual, e perdem a confianca nos outros. “I need you to restrain me... that’s the only way I know you care” M. 18 Anos Como refere Prior, S. (1996), cit in Chop, S. M. (2003), por vezes quando as criangas que foram abusadas jé so maiores exteriorizam este tipo de frases, a tinicas formas de terem uma relagio € através de violéncia, sexualidade ou uma combinagio das duas. Para Cohen (2000) as criangas abusadas sexualmente passam por sentimentos de vergonha intensa, baixa auto-estima, isolamento em relagdo aos outros, dificuldade em confiar, acharem que nao tém direito a s 1a privacidade nem a puderem querer ou no determinadas 20 coisas. Estas so algumas das sequelas deixadas pelo abuso, nestas incluem-se igualmente uma certa confusio entre 0 sexo e 0 afecto, por vezes na vida adulta sentem-se confusas em relacio a0 namorada/o quando sao inundadas/os com “flashbacks” da imagem do perpetrador. Muitos testemunhos de sobreviventes revelam no seu discurso uma personalidade dividida e fora do corpo, como se deixassem por momentos de ser quem siio ~ esta caracterfstica designa-se Di ‘ociagaio Cognitiva, Alguns autores, tais como Brewin et al. (1996), Ehlers & Clark, (2000), Horowitz, (1976) & Kolk & Fisler, (1995), cit in Halligan, S., Michael, T., Clark, D. & Ehlers, A. (2003), Preocuparam-se em estudar a forma como sfo desenvolvidas as memorias trauméticas, concluindo que a intensidade do trauma que as situagbes de abuso acarretam, resultam em rupturas dos proce: '$ Cognitivos. A dissociat 10 cognitiva é um desses efeitos e pode traduzir-se em diferentes sintomas: desrealizaciio, despersonalizagdo e reduco da capacidade de vigilia. Comportamentos de negligéncia e abandono, estigmatizagio, depressio, imagens corporais distorcidas, sentirem-se diferentes dos pares, a atribuicdo pessoal pelos acontecimentos negativos, sentimentos de traigio, perda de poder através da perda da credibilidade, so apenas alguns dos comportamentos que as criancas abusadas sexualmente demonstram ter em relagdo as que ndo o foram, Uma rapariga de 15 anos que um dia enquanto pratica exercicio fisico encontra um exibicionista no parque, iré ficar com poucas sequelas psicolégicas (apesar de provavelmente ela mudar a trajectéria da proxima vez que for corer). Pelo contrério, uma rapariga de 15 anos que em conversa com os pares na escola descobre que nio ¢ rotina para todas as raparigas terem relagdes sexuais com os seus pais hé 10 anos, iré trazer sequelas e problemas bem mais sérios (Krugman, & Jones, 1987). Para Smith e Bentovim, (1994) as sequelas possiveis para o abuso sexual podem ser consideradas em termos de : Efeitos na sexualidade — as criangas abusadas tendem a praticar uma elevada actividade sexual durante a adolescéncia e em vida adulta, esta ideia est em concordancia com diversos autores. Yates, (1982) e De Young, (1984) (cit in Smith, & Bentovim, 1994) reportaram uma hipersexualizacdo e comportamentos sexualmente provocatérios como consequéncia de terem sido erotizadas pelo abuso. James e Nasjheti, (1983), Bentovim e Boston, (1988) ¢ Kohan M. J., Pothier P. e Norbeck J. S. (1987) (cit in Smith, & Bentovim, 1994) descreveram uma série de criangas que apresentayam comportamentos sexuais, dando inicio a contacto sexual com adultos ou com outras criangas mais jovens, estarem envolvidas em jogos sexuais com outros e comportando-se de maneira sedutora perante os profissionais. - Como efeitos emocionais contam-se a culpa, a responsabilizagio pelo sucedido, impoténc ~ as criangas sentem uma total falta de poder e impoténcia em parar o abuso & sentem-se sobremaneira responséiveis por nao serem capazes de o fazer. Frequentemente o perpetrador ameaga as criangas dizendo-Ihes que se a mae souber vai ficar contra elas e que estas irdo para casas de adopgo, desta forma as c1 ingas néio conseguem deixar de sentir um enorme sentimento de perca. Em consequéncia deste dltimo sentimento esta associado o isolamento, ~ Sentimentos de depressio ~ estes sentimentos esto frequentemente associados a firia, ansiedade e efeitos comportamentais so outros factores inerentes a existéncia do abuso. Browne, A. & Finkelhor, D. (1986), so da mesma opiniiio que os autores supramencionados, também para estes autores as criancas abusadas experienciam efeitos na sexualidade, reacgdes emocionais e de auto-percepcdo, diferentes das criangas que nfo passam por esta experiéncia, estes efeitos podem traduzir-se em distirbios alimentares, de sono, medos fobias, depressZo, sentimentos de culpa, vergonha e raiva, Paralelamente, ocorrem aquilo que os autores chamam de “sequelas exteriorizadas” tais como problemas na escola, problemas de comportamento e fugas de casa. Para estes autores “o link entre abuso sexual de criangas e a depres 10 foi confirmado” (p.69). Muito tem sido estudado sobre as principais consequéncias do abuso sexual de criancas, io nefastas ¢ impedem que a crianca se desenvolva e cresca de forma saudavel. A ideia de 2 que sexo entre um adulto e uma crianga provoca inevitavelmente em todas as criancas independentemente do género um mal “intenso” e “penetrante”, € defendida por muitos autores. abuso sexual de criangas foi reconhecido como sendo 0 mais severo, se nao mesmo 0 mais sério dos problemas relacionados com o desenvolvimento infantil. Para Barnett (s.d) nfo existe outro factor de risco social com uma forte associagio com o desenvolvimento psicopatolégico, como o mau trato de criangas, No entanto nem todos os autores possuem a mesma ideia sobre os efeitos nefastos ¢ prejudiciais de que 0 abuso sexual de criangas tem para as mesmas, Rind, Tromovitch, e Bauserman, 1998 (cit in Dallam, 2001) sao alguns desses autores que sao da opiniao que estas ideias das consequéncias dos abusos nao esto suficientemente suportadas cientificamente, um destes autores defende claramente que as assungdes bisicas sobre o abuso sexual de criangas nao est4 comprovado, e 0 mal associado com as relagdes sexuais entre adultos e criancas, nomeadamente aquelas que envolvem rapazes, tem sido exagerada, Sobre este assunto muito ha a dizer, varias investigagdes esto documentadas sobre sequelas a longo prazo na populacdo de adolescentes, e estas revelam resultados bastante consistentes no que se refere aos efeitos do abuso sexual de criangas na vida dos jovens, problemas de ansiedade, depressfo, adicd0, comportamento e isolamento so alguns dos sintomas encontrados. Em suma, 0 abuso sexual é uma realidade presente na vida de muitas criancas, a falta de amor-préprio, dificuldade em estabelecer relagdes de confianca, culpa, tristeza, abuso de substincias e suicidio, sfio consequéncias to reais como o préprio abuso. Como referem Finkelhor, Ormrod, and Turner (2007) Cit in Leventhal, J. M. (2007), 0 Abuso Sexual de Criangas apresenta consequéncias gravissimas para a satide mental das criangas enquanto adultos, essas consequéncias focalizam-se em trés dominios: Ansiedade, sintomas Depressivos ¢ Raiva/Agres: Para além das consequéncias emocionais, hé também sequelas a nivel cerebral que a exposigdo a situagbes traumaticas originam. Esta provado que as experiéncias que as criangas tm nos primeiros anos de vida sao de extrema importncia para o desenvolvimento do cérebro. A luz da compreenséo que detemos sobre 0 desenvolvimento do cérebro, ha trés diferentes formas sobre as quais os maus-tratos podem exercer efeitos prejudiciais: a) Privagdio extrema; b) Experiéncias distorcidas; c) Stress intenso. (Glaser, 2007). Quando uma crianga nasce sem nenhum problema, o seu cérebro apresenta 100 bilides de neurdnios (células nervosas), cada neurénio encarrega-se de processar sinais para cada célula nervosa do corpo. Esse sinal € transmitido de neurénio a neurénio através das fendas sinfpticas pelos neurotransmissores. Como refere Glaser, D. (2007), a maior parte do crescimento do cérebro apés a criangas nascer, ocorre nos primeiros 4 anos de vida. E representado por uma massiva superprodugio de novas ligagdes sindpticas no cérebro da crianga. Estima-se que durante os primeiros anos de vida o mimero de sinapses nervosas atinja o dobro da actividade, do que acontece na vida adulta. Para que estes processos ocorram com eficiéncia e qualidade implica que © cérebro tenha estrutura e suporte para promover este processo. Apés esta sintética explicagao cientifica de como os processos cerebrais se processam, a autora Glaser, D. (2007) salienta o facto de ser extremamente importante os factores ambientais onde a crianga esté inserida, nomeadamente se recebe mais ou menos estimulago, se as suas imteracgdes com a familia e 0 mundo que a rodeia so de qualidade. Para algumas criangas, a insuficiénci: ‘ou mesmo abstengéo de interacgdes, ser crucial para existir uma falha no desenvolvimento das fungdes descrita anteriormente. Glaser, D. (2007), descreve que experiéncias de mal-estar e sofrimento na vida das criangas podem promover longos efeitos negativos no desenvolvimento do cérebro. Estudos realizados comprovam isto mesmo, que cr ingas que experienciaram vivencias negativas e de softimento, demonstram nao s6 significativas mudangas nos seus comportamentos e estados emocionais, como alteragdes neurobiolégicas — sabe-se que uma elevada exposi¢io a experiencias de stress levam a que 0 corpo responda com respostas de coping necessérias para sobreviver e envolvem no processo vérias sistemas organicos ~ o hipétalamo, o sistema nervoso, 24 © sistema neurotransmissor e o sistema imunol6gico ~ comparativamente com criangas que ndio passaram por estas experiéncias. © que a autora quer transmitir é que uma pessoa que apanhe um susto vai activar pontualmente estes sistemas, mas mal a situago de ansiedade passe, o organismo humano vai voltando ao seu estado de normalidade, o stress vai diminuindo, bem como a ansiedade. Uma crianga que viva constantemente sob situagdes de medo, angiistia e stress, vai revelar uma activaglio excessiva e continua da resposta de stress, repercutindo-se em desregulagdes do sistema cortisol e consequentemente a alteragdes neurobiolégicas graves. Browne, A. & Finkelhor, D. (1986), véo ao encontro desta ideia, referindo as consequéncit fisicas e queixas somati Ss, perante a ansiedade excessiva e o stress pelo qual passaram, que caracteriza estas criangas. E importante, contudo, referir que apesar de todas as consequéncias que o abuso sexual implica na vida de quem o sofre, hé a capacidade das vitimas se tornarem sobreviventes dos abusos. Segundo Rutter, M. (2007) o termo resiliéncia traduz 0 facto de algumas pessoas apés passarem por experiencias trauméticas, conseguirem encontrar estratégias para ficarem bem, € nao terem necessariamente de ficarem “presas” ao conceito de “vitima” irreversivelmente traumatizada, esta caracteristica segundo 0 autor implica uma resisténcia que algumas pessoas tém a experiencias de risco, Davis. T. B. (2005), apés realizar um estudo com mulheres sobreviventes de violéncia, concluiu que algumas mulheres utilizam estratégias muito positivas de recovery assentes em: espiritualidade, suporte comunitério, terapia, humor e estratégias de seguranga. Algumas mulheres utilizam as suas experiencias trauméticas € negativas como formas de ajudarem outras mulheres em experiencias similares. Nao obstante & capacidade de Recovery das pessoas que passam por experiéncias traumdticas dos abusos, e como referimos anteriormente, sabe-se que as consequéncias do abuso so muitas quando o perpetrador € conhecido da crianga, e se trata de alguém que detém um 25 papel importante na sua vida, em quem ela confia e de quem gosta, Segundo Mahroos et al. (2005), a maioria do abuso sexual de criancas é executado no seio do ambiente doméstico por familiares ou conhecidos das vitimas, estas vitimagdes continuadas no tempo provocam intimeras sequelas € consequéncias a nivel psicolégico. 1.6. Os Perpetradores dos Abusos Sexuais de Criangas “Nos meus sonhos mai terrificos nunca suspeitei que 0 meu irméo... 0 tio preferido dos nossos filhos... sempre a sugerir ficar com eles quando quiséssemos sair... Sempre fui uma mae super-protectora, garantindo sempre que alguém ia buscar os meus {filhos & escola a horas, sempre cautelosa com os estranhos, sempre inquirindo sobre os seus amigos, as suas casas e as suas familias. O que mais poderia ter feito?! Mie de uma Crianga Abusada pelo Tio Curran, D. (2003) ‘A maioria dos abusos so perpetrados por homens, no entanto € ao contrério do que comummente se pensa as mulheres também cometem abusos, ainda que em menor es estatisticas de Mrazek P., Lynch M. A. ¢ Bentovim A., 1983; Faller, 1990; Research Team, 1990; Kelly L., Regan L. e Burton S., 1991 (cit in Smith, & Bentovim, 1994) demonstraram que de 5 a 15% dos abusos so perpetrados por mulheres, estas abusam mais de rapazes do que de raparigas. Finkelhor e Russell, 1984 (cit in Smith, & Bentovim, 1994) revelam que as mulheres como perpetradoras so responsaveis por mais de 20% do abuso de rapazes. A maioria dos casos de abuso sexual de criangas que chegam a atencio dos profissionais € perpetrado dentro do seio familiar ou dentro da casa onde a crianga habita, As estatisticas revelam que 46% destes abusos é perpetrado pelos pais, 27% pelos padrastos, 85% das criangas conheciam 0 abusador, apenas 5% das criangas foram abusadas por um estranho. Desta forma a violéncia intrafamiliar é levada a cabo dentro da propria casa onde a crianga habita e mais comummente pelos pais. Os padrastos foram identificados como sendo um factor de risco, esta ideia vem ao encontro do que refere Russell, 1984 (cit in Smith, & Bentovim, 1994) que demonstra que uma rapariga a viver numa casa de um padrasto esti seis vezes mais em risco de 26 ser abusada do que uma rapariga que viva com o seu pai biolégico. As estatisticas revelam que criangas que vivam em casa do padrasto esto em maior risco de ser abusadas por outros homens. De acordo com esta ideia esta igualmente Mahroos et al. (2005) que chama a atencaio para o facto de a maioria dos abusos sexuais de criangas serem perpetrados pelos pais ¢ outras pessoas conhecidas das mesmas. Este é um dos estudos que confirma a ideia de que a maioria do abuso sexual de criancas € executado no seio do ambiente doméstico por familiares ou conhecidos das vitimas, estas vitimagdes continuadas no tempo provocam intimeras sequelas e consequénc 6 a nivel psicolégico. O abuso sexual por parte de conhecidos da crianga revela uma exploragao da inocéncia, ingenuidade, confianga e obediéncia da crianga. Muitos dos casos de abusos sexuais de criangas sto perpetrados por pessoas que so exemplares aos olhos de toda a comunidade envolvente, esta situaco no s6 toma mais dificil a demincia de abuso como também a credibilidade da prépria crianga, 0 mito de o abusador “ser to boa pessoa” € apenas um dos muitos que envolve esta problematica. 2.1.7. Mitos Sobre os Abusos Sexu: s de Criangas HA varios mitos relacionados com o abuso sexual de criancas, o facto de a ocorréncia do abuso sexual de criancas ser raro, de ocorrer apenas em meios socioeconémicos baixos, inerente a. uma psicopatologia do agressor, que as criangas mentem no que se refere ao abuso sexual, ou que so estranhos que abusam das criancas, so apenas alguns desses mitos. Estes mitos so descritos no ivro de Forward e Buck (1989) que reproduzimos na seguinte tabela: TABELA 1: Mitos e Realidade sobre 0 Abuso Sexual de Criangas MITO REALIDADE A ocorréncia do abuso sexual é rara_| 1 em cada 10 criangas é molestada por um membro de confianca da familia | antes de atingir os 18 anos 27 © abuso sexual ocorre apenas em familias pobres e sem educacio e isolados e em__bairros pouco desenvolvidos © abuso sexual atravessa todos os niveis socioeconémicos O agressor € socialmente sexualmente desviante © agressor pode ser qualquer pessoa, no ha um perfil de agressor © abuso sexual € uma reaccio & privagio sexual ‘A maioria dos agressores tem uma vida sexual activa, O abuso sexual de criangas ndo é uma questdo de sexo é uma questo de poder As adolescentes so sedutoras e até criangas especialmente certo ponto responsaveis pelo abuso ‘As criangas e adolescentes estiio a descobrir a sexualidade, isto néo dé direito aos pais de se aproveitarem dessa inocente exploragio do mundo para as abusar ‘A maioria das historias de abuso sexual nfo sio verdadeiras, elas estio na verdade a fantasiar devido a0 seus préprios desejos sexuais Esta ja foi criada por Sigmund Freud que explicou a prevaléncia de muitos casos de abuso sexual como sendo acontecimentos que ocorrem apenas na imaginagao dos pacientes. Ainda hoje e devido a esta ideia muitas vitimas de abuso sexual nao siio acreditadas ‘As criangas so abusadas mais frequentemente por estranhos do que por pessoas conhecidas ‘A maioria dos abusos sexuais de criangas sfo perpetrados por pessoas proximas da familia de quem esta gosta e em quem confia, membros da familia Dagui retiramos que 0 abuso sexual de criancas nao € um fenémeno pouco frequente no é, na maioria dos casos, perpetrado por alguém que a crianga ndo conhece, pelo contrério estudos revelam que I em cada 10 criangas é abusada por um membro da familia antes de 2% atingir a maioridade. O abuso sexual atraves percentagem de criangas mente em relag de agressor. E a maioria das histérias de abuso sexual si verdadeira TABELA 2: Quiros Mitos sobre os Abusos Sexuais de todas as classes socioeconémicas. O agressor pode ter qualquer idade, raca, religidi, partido politico, ou orientagao sexual, néio hd um perfil a0 facto de ter sido abusada sexualmente. MITO REALIDADE ‘Apenas as raparigas so abusadas sexualmente © abuso sexual de criangas pode ocorrer tanto em rapazes como em raparigas As eriangas que foram abusadas, vo tomar-se elas proprias abusadoras A maioria das criangas sexualmente abusadas, nao vai tornar-se abusadoras S6 os homens cometem abusos sexuais contra criancas Também ha mulheres a abusarem sexualmente de Criangas , apenas uma pequena ‘Tanto os rapazes como raparigas estéio em risco de serem sexualmente abusada que © abuso pode ocorrer tanto a rapazes como a raparigas, pensar o contrério é ser detentor de um Mito sobre os Abusos Sexuais de Criangas, Como referem Lillywhite, R. & Skidmore, P. (2006), pensar que “os rapazes nfo so sexualmente abusados” é infelizmente muito comum entre os profissionais que trabalham diariamente com rapazes vulnerdveis. E importante desmistificarmos estes mitos para reduzirmos a vulnerabilidade das nossas criangas, se considerarmos que apenas as raparigas so abusadas, vamos deixar os rapazes livres de qualquer preocupagio, e entio ai estaremos a contribuir para que estes fiquem mais vulnerdveis ocorréncia dos abusos. Um outro mito que esté nesta tabela e que € muito importante de desmistificar € 0 “Mito de que as Criangas que foram abusadas, vio tornar-se elas préprias abusadoras”. Como refere Stewart A., Livingston M. & Dennison S. (2008), a maioria das criangas sexualmente abusadas, nfo vio tornar-se abusadores. Para estes autores, compreender as diferengas da Natureza dos Abusos ¢ imprescindivel para tragar estratégia preventivas contra 0 abuso sexual de criangas. 29 Os abusos sexuais perpetrados por mulheres so mais comuns do que se pensa, ¢ trazem mais implicagdes emocionais e psicolgicas as criangas do que primeiramente se espera. Como refere a autora Bunting, L. (2007), apesar das atengdes da comunicacdo social e o interesse académico, 0 assunto sobre os abusos cometidos por mulheres permanece ainda sob um grande siléncio. Tanto os profissionais como o publico em geral, ainda pensa que o abuso sexual de criangas € um problema “masculino”. O facto de apenas 5% dos casos de abusos serem perpetrados por mulheres, faz com que o problema seja tio raro que parece que simplesmente nao existe. Hetherton, J. (1999) cit in Bunting, L. (2007), avanga com o facto de se pensar que as mulheres nao abusam pode ser influenciado por negagGes culturais, e Ievam a crer que muitas vitimas de abusos, especialmente do sexo masculino, nao denunciam o abuso por terem medo de nao acreditarem neles. Varios estudos indicam que os sobreviventes de violéncia sexual perpetrada por mulheres vivenciam o estigma, a vergonha ¢ um grande isolamento. 21 3. Questiio da Meméria no Abuso Sexual de Criancas Ainda no seguimento das falsas crengas referentes ao abuso sexual de criangas encontra- se 0 mito de que “as criancas mentem sobre terem sido abusadas sexualmente quando na verdade no o foram’ , é neste sentido que se encontra a criagdo deste subcapitulo sobre a questo da meméria no abuso sexual de criangas. O assunto da meméria no que se refere ao abuso sexual de criangas tem sido alvo de grande controvérsia. A temética tem vindo a piiblico através dos meios de comunicacdo e dos julgamentos em tribunal, locais onde se torna privilegiada a ideia de que os casos de memGrias recuperadas e de falsas memorias sao de facto frequentes. Esta polémica tem assombrado a sociedade em geral e tem dividido os profissionais de psicologia, ha autores que temem que esta problemética possa ter efeitos negativos nas criangas abusadas sexualmente. Esta € uma ideia defendida por Jenkins (1997) 30 que se refere a este assunto como um fenémeno problemético com sérias repercussées para a prética terapéutica e para a sua posigo na sociedade em geral. ir 0 maximo de E unfnime entre os autores a importancia do reconhecimento de exis entendimento possivel sobre o que € 0 abuso sexual, bem como a sua prevaléncia, e mais do que Para isso saber 0 predominio de casos reportados de memGrias recuperadas e falsas mem6ri uma correcta prética da psicologia, Palm e Gibson (1998) consideram de extrema importéncia conhecer-se 0 grau de prevaléncia das memérias recuperadas, das falsas memOrias e do abuso sexual de criangas de modo a que seja providenciada uma terapéutica apropriada. No seguimento desta ideia faz sentido definirmos 0 que se entende por “Falsas Meméri s”, Este conceito definido como uma recordacao de uma vivéncia do passado que no a conteceu, daf ser considerada falsa. O que acontece no processo € que a pessoa que a possui acredita veementemente que tenha acontecido, Em 1994, 0 autor Terr (cit in Jenkins, 1997) define Falsa Memoria como sendo uma historia fortemente imaginada, uma mentira ou uma impresso mal interpretada. Ideia partilhada pelo autor Johns Hopkins (cit in Jenkins, 1997) membro da Fundagdo do Sindrome de falsas memérias de Philadelphia, que acrescenta ao significado de falsa memGria uma condicao na gual a meméria de uma experiéncia traumética é objectivamente falsa apesar da pessoa acreditar fortemente que € verdadeira, Perante estas definigdes que Jenkins (1997) transcreve nos seus escritos, surge a questo do nivel de exactidao da definigo do conceito de falsas memérias, segundo este autor a questio das memérias esto assim presas por serem "objectivamente falsas" mas de acordo com qual critério? Com 0 object /0 de responder a esta questo e desta forma contribuir para a discussfio da temitica sobre as falsas memérias, o autor levanta 4 pontos essenciais segundo o qual tém de ser tidos em consideracdo quando se fala numa definig’o compreensiva do que se entende por falsas memérias, Estes so: 1. Que as memérias do abuso na infiincia sdo descontinuas. 2. Que estas so passiveis de serem recuperadas num serting terapéutico. 3. Que existe a auséncia de uma a evidéncia confirmativa. 4. E um facto de que a recuperacio da meméria do abuso sexual na infancia dado na terapia € seguida de uma dentincia e confrontagaio com o perpetrador que nega © abusi Existem assim duas situagdes distintas inerentes & temética das falsas memsrias que envolvem: a) Na eventualidade de uma pessoa ter sido vitima de abuso sexual em crianga poder 86 revelar 0 abuso na idade adulta; b) A possibilidade da pessoa recuperar a meméria do abuso na terapia, Inerente a0 ponto b) encontra-se outra controvérsi: designada “Sugestio” — nesta controvérsia cria-se um cenério em que os terapeutas se véem envolvidos pela forma como podem ou nao sugerir que determinados acontecimentos tenham falsamente ocorrido. Alguns autores defendem que as criangas podem ser sugestiondveis a reproduzirem sérias ¢ falsas acusagdes sobre alegadamente terem sido vitimas de abuso sexual. No entanto € apesar desta questtio polémica ter sido jf amplamente estudada, a frequéncia com que as criangas podem alegar abuso € algo que permanece ainda por clarificar. Em certos sos “bem publicados” ¢ agora alegado que algumas memGrias so as veres falsas, nomeadamente imaginadas ou fantasiadas pela vitima ou, pior, implantadas na mente da vitima pelo seu terapeuta, A implicagzio que isso tem é gue & A pessoa sobre o qual recairam as alegagdes que merece suporte reconhecimento: € o terapeuta que esta em falta, Terapeutas so alegadamente considerados irresponséveis, fora de controlo, destruidores de lares, e do voz as alegages nao fundamentadas (Jenkins, 1997). Para este autor como possfvel resultado desta discussdo podemos estar perante uma filha adulta que recupera a meméria de ter sido de facto abusada aquando em crianga, e dentincia 0 perpetrador. O que acontece é que a alegacZo nao pode ser confirmada e 0 perpetrador continua a negar a ocorréncia do abuso. Com o objectivo de tentar responder a esta problemftica e clarificar as discusses que sobre ela recaem, em 1996, um grupo de trabalho de investigago sobre as memsrias do abuso sexual na infancia da American Pshychology Association, constituido por uma equipa especializada em assuntos de meméria e trauma sumarizaram determinados pontos em que estavam em acordo e desacordo respectivamente sobre a temética. Apesar de niio ter sido efectuada uma publicagao dos pontos em desacordo, os pontos em acordo deste grupo descritos por Palm e Gibson, (1998) foram os seguintes: ~ As controvérsias sobre as recordacdes dos adultos nao deveriam ser admitidas para se tornarem pouco claras, © facto do abuso sexual de criangas ser um problema complexo e penetrante que permaneceu historicamente ignorado; - A maioria das pessoas que foram sexualmente abusadas em criangas relembram-se de todos os pormenores do que Ihes aconteceu; - E possivel as memérias de abuso que estiveram esquecidas durante um longo perfodo de tempo serem recordadas; - E igualmente possivel a construgio convincente de pseudo-memérias de acontecimentos que nunca tiveram lugar; - Existem falhas no nosso conhecimento acerca dos processos que levam & preciso e imprecisio de recordagdes do abuso sexual na inféncia. Apesar dos pontos discutidos ¢ acordados pelos membros de investigaciio sobre as memérias da American Psychology Association, parece ser dificil tragar a flexibilidade ¢ troca de ideias entre os autores, adaptada a cada caso e realidade. Desta forma surgem intimeros autores segundo os quais a crianga é, tal como os adultos, capaz de se ajustar & sugestionabilidade, integrando na sua vivéncia acontecimentos que de facto nfo aconteceram. Esta id vai ao encontro do que referem recentes investigagdes 3B efectuadas por Lamb, Sternberg, Orbach, Hershkowitz, e Esplin, 1999; Poole e Lindsay, 1998; Saywitz e Goodman, 1996 (cit in Hershkowitz, 2001), que revelam que a crianga pode reportar falsos testemunhos em relagio a ter sido alvo de toques corporais por parte de alguém. ‘Também os autores Belli e Loftus, in press; Lindsay e Read, 1994; e Loftus, 1993 (cit in Williams, 1994) esto de acordo com estas ideias, referindo nos seus estudos que 0 Laboratério Académico de Estudos sobre a Memoria tem sido utilizado para sugerir que os adultos sio sceptiveis de adquirir mem6rias de abusos sexuais na infiincia que nao ocorreram. Estes autores acreditam que na meméria se podem plantar experiéncias que nio existiram através da sugestdo. Sugestionados por alguma situagdo as pessoas comecam a acreditar que de facto aquele acontecimento teve lugar. A. sugestio €, segundo os mesmos, mais provével de acontecer quando existe uma atmosfera de acusagio, quando o alegado perpetrador j4 possui um historial incriminatério, ou quando € facilitada por uma figura de autoridade. A repeticdo insistente é, para Ceci, S. J., Loftus, E. F., Leichtman, M. D., e Bruck, M., 1994 (cit in Hershkowitz, 2001) um factor preponderante que pode levar a que eventos, ndo experienciados, conduzam a resisténcia, & sugestio © consequentemente evoquem falsas memérias, A ideia da sugestionabilidade é no entanto contestada por muitos outros autores levando a uma continuidade da discussio que tem sido debatida nos iltimos anos sobre a existéncia ou nio de falsas memirias no que se refere ao abuso sexual de criangas. Diversos estudos foram feitos para avaliar a prevaléncia do abuso sexual de criangas, mas quando se tenta, tendo em conta esses dados, aferir algumas conclusdes no que se refere &s falsas memérias, alguns autores consideram es estudos retrospectivos pouco precisos devido ao facto de existir um grande niimero de criangas que néo denunciam 0 abuso. Esta € a ideia a que chega Finkelhor, (1990) que demonstra que muitos dos casos de abuso sexual de criangas no so reportados is autoridades. 4 ‘A vergonha, 0 medo de denunciar, eo esquecimento desses acontecimentos traumiiticos sdlo possiveis razOes levantadas para justificar o facto de as criangas nao denunciarem o abuso sexual Aqui surge a tematica das memérias recuperadas, isto ¢ a possibilidade da crianga mais tarde através de terapia recordar a situago do abuso. Tal como as falsas mem6rias, também as memérias recuperadas dos abusos sexuais na infancia so alvo de persistentes controvérsias sendo que varios autores consideram-nas da mesma forma, falsas. O que se sabe pela experiéncia € que geralmente quando essas acusagdes de abuso sexual silo levantadas e levadas ao piblico passados alguns anos a sua credibilidade € posta em causa. As razées para tal acontecer prendem-se com variadissimos factores, alguns dos quais relacionados com o facto de por vezes a pessoa indicada como sendo potencialmente abusadora se tratar de alguém com grande influéncia na sociedade que leva de imediato a uma postura de incredulidade generalizada, Como referem Wakefield © Underwager, 1992 (cit in Williams, 1994): Frequentemente os individuos acusados que vém para a atengio do piblico sio ou membros influentes da comunidade ou tém prestigio e autoridade consideravel. E frequentemente dificil para os amigos, membros da familia ¢ o publico em geral aceitar a possibilidade de que esses individuos abusaram sexualmente de criangas, especialmente quando os acusadores so eles pr6prios altamente bern sucedidos e com um alto cargo. Varios estudos foram realizados de forma a ser comprovada a ideia de que uma larga percentagem de pessoas que foram abusadas sexualmente durante a infancia poderem nao se recordar do abuso. Um desses estudos € de Briere e Conte, 1993 (cit in Williams, 1994), estes autores constataram que 59% de 450 mulheres e homens em tratamento por dentincia de abuso sexual de criangas em certa altura nas suas vidas antes dos 18 anos, tinham de facto esquecido o abuso 35 sexual de que tinham sido alvo na infincia. Em conformidade com este estudo, est outro estudo de Herman e Schatzow, 1987 (cit in Williams, 1994) no qual se depararam com “sérios défices de meméria” do abuso, isto é, cerca de 28% de uma amostra de mulheres em terapia de grupo or abuso sexual na infincia, e aproximadamente 64% da sua amostra reportaram algum grau de amnésia, Estes dois estudos de Briere ¢ Conte, 1993, ¢ Herman ¢ Schatzow, 1987 foram dois importantes estudos de memérias de adultos de abuso sexual ocorrido na inféncia. Loftus, Polonsky e Fullilove, 1984 (cit in Williams, 1994) parecem discordar com estes estudos, demonstrando que apenas 31% de mulheres sexualmente abusadas revelam ter repressées parciais ou meméria incompleta devido ao abuso e 19% demonstram passar por periodos provissrios de esquecimento da ocorréncia do abuso, demonstrando que apesar de se tratar de uma minoria € possfvel o esquecimento parcial ou total do abuso. Em suma, e no que se refere As memérias recuperadas 0 facto de nfo se possuir mem@rias sobre a ocorréneia do abuso é uma situago comum. Esta ideia vai ao encontro do que refere Williams (1994) que revela no seu estudo que 39% de 129 mulheres nao reportaram © abuso sexual pelo qual passaram na infancia, a maioria por no se recordar, e as restantes por terem simplesmente decidido nao o fazer. Estas ocorréncias revelam que nao se ter meméria do abuso sexual ocorrido na infancia é uma situago comum nao apenas entre sobreviventes adultos em terapia pelo abuso mas também por amostras de mulheres na comunidade que reportaram terem sido sexualmente abusadas (Williams, 1994). 2.2, PREVENGAO DOS ABUSOS SEXUAIS DE CRIANCAS 2.2.1. Origens da Prevengio Com 0 aumento das dentincias de casos de abuso sexual de criangas e com uma crescente preocupagio dos profissionais (psicdlogos, psiquiatras, assistentes sociais, médicos, 36 enfermeiros, etc.) ¢ da populagaio em geral em relagdo a esta problemética, surgiram nos EUA nos finais dos anos 70 € principio dos anos 80 os primeiros Programas de Prevengio dos Abusos sexuais de criangas nas escolas, Estes pretendiam promover o interesse e conhecimento pelo tema e tinham como objectivo fomentar a prevenedo e o tratamento do abuso sexual de criangas. Esta é uma ideia confirmada por Renk et al, (2002), que refere que em resposta a um aumento de conhecimento ¢ interesse pelo problema do abuso sexual de criangas, os programe foram desenvolvidos para promover o conhecimento, prevencao ¢ tratamento do abuso sexual. Este conhecimento generalizado pelo tema deveu-se em grande parte a algumas escritoras feministas que sugeriram que a prevengaio dos abusos sexuais de criangas teria de passar por uma mudanga na sociedade. Estas acreditavam que se tratava do resultado do dominio e poder dos homens sobre as mulheres e criangas existente numa sociedade patriarcal. Como consequéncia do aparecimento destas ideias desencadeou-se um crescimento do interesse pUblico pelo tema. Esta ideia € descrita por Bolen, (2003) segundo o qual as feministas Florence Rush ¢ Judith Herman sugeriram que a dinamica da sociedade como um todo é a principal 1usa da prevaléncia do abuso, e que este é indicador de uma sociedade patriarcal na gual os homens detém o poder sobre as mulheres ¢ criangas. No final dos anos 70 e princfpios dos anos 80 o assunto da violagao originou uma série de movimentos de mulheres um pouco por todo o mundo, consequentemente ¢ inerente a esta problemdtica os assuntos relacionados com a violéncia sexual e a sexualidade adquiriram um peso importante tornando-se 0 foco central na teoria feminista, € as mulheres em todo 0 mundo organizaram-se com o objectivo de alertar e responder, organizando campanhas contra a vitimizago sexual de mulheres e raparigas © movimento feminista ocupou-se dos assuntos da violagio por trés razbes essenciais: a primeira devido ao facto da violéncia sexual ser uma das mais indecorosas e brutais expressdes de violéncia masculina contra as mulheres, segundo porque a violacdo e o “debate” histérico & volta dela revela uma grande problemética em tomo das relag6es sociais de reproducio. E por tiltimo a violagao 37 revela uma grande problematica acerca da forma como 0 corpo das mulheres é visto e representado na comunidade (Kelly, & Radford, 1998). E neste sentido que Smith e Bentovim (1994) referem que 0 movimento feminista foi um importante factor para © aumento de dentincias de abuso sexual de criangas, no qual o interesse e abertura geral por assuntos relacionados com a sexualidade tiveram um papel desencadeante. 2.2.2. Prevengio do Abuso Sexual de Criancas nas Instituiges Os autores Colton, M., Vanstone, M. & Christine W. (2002), debrugaram as suas atengGes te6rica sobre o abuso sexual de criangas perpetrado em instituigGes residenciais. Para estes, a abordagem do abuso sexual de criangas em instituigbes, 6 um assunto indispensavel, sobre 0 qual todos os profissionais deveriam reflectir quando falam em Prevenco. Os autores enaltecem a importincia de se realizarem programas de prevencio dentro das instituigées, onde deveriam ser abordados temas como: s estratégias que os abusadores utilizam para as criangas manterem segredo e como actuam para silenciar todos os profissionais da instituigdo, os autores referem que estes programas devem servir essencialmente para desmontar 0 poder que os abusadores tém dentro das ins igdes. O abuso sexual de criangas dentro das instituigées constitui uma quebra horrivel e impensével da confianga humana, Os efeitos podem ser devastadores para as criangas e funcionérios das instituigdes. (Bloom, 2002) O Abuso Sexual de Criangas dentro das Instituigdes onde as criangas se encontram durante 24 horas é muito comum, Segundo o autor Bloom, R. (1992) 0 abuso pode ocorrer 0 dobro das vezes que ocorreria normalmente dentro da familia. Durkin, R. (1982) cit in Bloom, R. (1992), refere que quando ocorre a deniincia de uma situagio de abuso sexual dentro de uma instituigao, procede uma série de situagées dentro da prépria instituigao que dificultam a propria queixa. A dentincia é vista como um ataque a toda a instituigfo. A resisténcia a esta dentincia tende a ser forte, senda que as instituigdes néio gostam 38 de ter percentagens elevadas de abusos, dai estas situagdes de violéncia nem sempre serem reportados ao exterior. As reacgdes das instituigOes por vezes so idénticas as reacgdes das familias nucleares das criangas: negam, encobrem a deniincia ou assumem comportamentos defensivos. A acusacao vai mexer com a dinamica da instituigdo, vao surgir medos de punigdes e/ou repreensées, as pessoas vio querer proteger ao maximo as suas reputagdes e carreiras, todos estes factores dificultam a protecedo das criancas abusadas neste contexto. A Prevengdo dos Abusos Sexuais de Criangas em Contexto Institucional é, por todos estes factores, muito importante. Bloom, R. (1992), avanga com alguns t6picos a serem abordados nesses programas de prevencdo,. Muitos abusadores conseguem manipular os outros que trabalham com ele, no sentido de evitar a dentincia, € importante sensibilizar os membros da instituigo para este facto. E importante que todas as pe as que trabalham na instituigao levem sempre, ¢ em qualquer circunstancia, a acusagdo da crianga a sério. ‘A prevenco comeca com uma clara politica de que € missio da instituigGo proteger cuidar de todas as criangas nela residentes, e que qualquer abuso sexual de criangas perpetrado por qualquer funcionério da instituicao € crime ¢ deverd ser de imediato denunciada. E fundamental dar Informagio, conscienci gue € 0 abuso sexual de criancas, desmistificando todos os mitos ¢ mentalizar que & possfvel acontecer ali. Informar que a dentincia é um dever que compete a todos, e como tal devem faze-lo para todas as situacGes abusivas. Vitimas escondidas levam a dores escondidas, é 0 que nos diz Nelson S. (1998), alertando para o facto de o siléncio ser a arma mais potente dos abusadores. Quebrar o siléncio foi visto como o primeiro e crucial grande pas $0 para a mudanga dos abusos nas instituigbes, ara as criangas permanecerem em ambientes seguros nas mesmas. Quebrar o iléncio dos abusos dentro das instituigGes € um passo complicado até para os profissionais que 1é trabalham, segundo Nelson S. (1998), normalmente estes so alvo de presstio e thet intimidat6rias. O abuso nas instituigdes pode paralisar e intimidar todo um sistema. importante, para o bem-estar e a seguranca das criangas, que os profissionais denunciem, que 39 terminem com a sua vulnerabilidade, o siléncio levanta em si muitas preocupagdes sobre os direitos e a liberdade das eriangas 2.2.3. Programas de Prevengao do Abuso Sexual de Criangas nas Escolas Perante as sequelas que o abuso sexual acarreta para as criangas e de todos os factores inerentes aos mesmos a melhor forma de reduzirmos a sua ocorréncia é pela Prevencfio. Esta encontra-se a frente de todas as tentativas de reduzir os efeitos nefastos do abuso sexual de criangas, e € segundo Renk et al. (2002) a forma mais eficaz de limitar as consequéncias negativas do abuso. A Prevencio dos Abusos Sexuais de Criangas insere-se no Conceito de Prevent Primari |, um dos seus objectivos principais ¢ dotar as criancas, pais, professores e comunidade de conhecimentos, informagao e competéncias para lidarem com os abusos sexuais de criangas, esta ideia € defendida por Anderson, J. F., Mangels, N. J., & Langsam, A. (2004), cit in Wurtele, S. & Kenny, M. (In Press), que refere que o objectivo da prevencio priméria é prevenir 0 abuso antes deste ocorrer, ¢ uma forma eficaz de prevenir que 0 abuso ocorra € educar os pais, as criangas, as escolas € as comunidades sobre os abusos sexuais de criangas, Segundo Daro, 1994 (cit in Rank et al. 2002), a maioria dos programas de prevengio so efectuados nas escolas € tem como object 0 ensinar as criancas de como se podem proteger. Da mesma opinio € o autor Finkelhor, 1990 (cit in Bolen, 2003) que refere que as escolas € 05 programas de comunidade deram um passo em direccdo a ensinar e incutir nas criangas competéncias para que esta s possam evitar 0 abuso. Os programas de prevencao dos abusos sexuais nas escolas revelaram-se extrema importdncia na prevencdo dos abusos sexuais de criangas e impres da incidéncia do abuso. ‘Como referem os autores Whatley. M. H. et al (1988), em conjunto com um Programa de Prevencao dos Abusos Sexuais dirigido as criancas, e aos pais, também faz sentido abordar estas teméticas preventivas junto dos professores, educadores, auxiliares de educ: 40 profissionais em geral que lidem com criangas. A necessidade de criarmos “parcerias” entre a escola e a comunidade, e de vermos os adultos como parceiros € crucial para reduzir a incidéncia dos abusos. :xistem intimeros Programas de Prevengdo dos Abusos Sexuais de Criangas, e apesar de poderem diferir uns dos outros no nimero de sesses implementadas, na duracdo dos programas, na profisso do formador, e nos materiais audiovisuais utilizados, todos estes Programas sio comuns nos pontos essenciais dos seus objectivos: permitir que as criancas sejam capazes de distinguir os diferentes tipos de toques por parte dos adultos, reconhecer quando estes so invasivos e impréprios, e serem capazes de contar a alguém a ocorréneia do abuso. Os objectivos dos programas de prevengio passam igualmente por aperfeigoar as capacidades das criangas em reconhecer toques inadequados por parte de adultos, passam por criar contextos para a promogio do desenvolvimento do “empowerment” nas criancas, de forma a que as criancas intam que tém poder, nao s6 para se protegerem de situagdes abusivas, como denuncia-las (Rank et al. 2002). Rappaport, 1987 (cit in Macleod, & Nelson, 2000), define empowerment como um processo, um mecanismo através do qual cada pessoa, organizagao e comunidade ganham dominio conhecimento profundo / aprendizagem sobre algo relacionado com a sua vida. Bas do Empowerment seja possivel: © sujeito participar activamente em todos as decisdes do im urgente que existam dois elementos fundamentais para que 0 desenvolvimento programa que seja realgado a construgio das forgas do sujeito e nao as suas fraquezas. Segundo alguns autores uma das principais causas do abuso sexual de criangas parte em grande medida pela falta de educag#o sexual nas escolas, como refere Minard (1993) um desenvolvimento sexual saudavel & um pré-requisito para que os jovens evitem ou lidem com situagdes abusivas. Desta forma é mais provavel que as criangas que sabem o que & normal ¢ saudavel compreendam quando alguém Ihes toca de uma forma abusiva. 41 Apesar dos programas de prevencio existentes actualmente virem em diferentes formatos — os programas podem utilizar filmes, apresentagdes em role-play, discusses © leituras, materiais escritos e treinos comportamentais que melhor ajudem a proceder aquando (0 de abuso — a informacdo passada nesses programas é similar e transversal a varios programas. Segundo a autora Carroll, L. A. (1992), estes programas incluem o tema de “quem é dono do proprio corpo”, “tipos de toque”, a palavra segura “nao”, e competéncias para as criangas saberem como agir se passarem por situagdes abusivas. Em todos os programas se passa a ideia de que a crianga tem que contar a alguém se alguma dessas situacdes tiver acontecido. Para Vernon e Hay, 1988 (cit in Minard, 1993) existem 4 elementos bésicos que necessitam de ser inclufdos num programa de educacdo sobre o abuso sexual de criancas, sio este conhecimento sobre as partes do corpo — sobre 0 que é o “bom” e 0 “mau” toque, as criancas devem ser ensinadas de que existem toques que as fazem sentir-se mal ou as deixam confusas, este € 0 chamado “mau” toque; outro elemento é 0 desenvolvimento em relagio as competéncias de tomadas de decisio — muitas vezes as criangas so ensinadas a respeitar a autoridade do adulto, € necessario que estas percebam que por vezes tomar decisdes contrérias as vontades do adulto 6 as vai proteger de serem exploradas, aqui torna-se importante abordar © conceito de segredo, como refere Minard (1993) 0 conceito de segredo pode ser explicado as criangas pequenas de uma forma muito compreensivel por exemplo, um segredo é algo que nunca as faz sentir mal como uma festa surpresa; treino assertivo — 0 facto da crianga poder dizer “no” a um adulto de forma assertiva, segundo Vernon & Hay 1988 cit in Minard (1993), muitos abusadores param a investida se a crianga disser “no” ou protestar gritando ou lutando. Em todas as situagGes a crianga deve ser ensinada de que a culpa nunca é dela. A crianga deve ainda ser ensinada de como e onde pode obter ajuda. Segundo Kraizer, 1985 (cit in Minard, 1993) as criangas devem ser encorajadas a procurar um adulto em quem possam confiar, e se 0 primeiro adulto a quem procuraram ajuda nfo acreditou nesta, devem ser encorajadas a procurar outro adulto de confianga Estes programas permitem também que a crianga saiba que o abuso pode ser perpetrado por membros da familia, amigos ou “babysitters” 42 Os programas de prevencao detém assim na sua especificidade vérios alvos de acco e objectivos, estes passam por ensinar & crianga conhecimentos sobre 0 abuso sexual de criancas aumentando as suas competéncias através de aprendizagens sobre defesa e proteccao pessoal num contexto educacional, ¢ procuram também alertar os pais ¢ professores sobre o que € 0 abuso sexual de criangas ¢ a melhor forma de © prevenir, fornecendo-Ihes informago sobre 0 abuso de forma a que estes discutam 0 assunto com as criangas. Este envolvimento pode afectar indirectamente o sucesso dos programas de prevengiio do abuso sexual de criangas nas escolas no apenas em relag&o aos pais, como também aos professores, permitindo que detenham nao s6 maior conhecimento sobre o tema como mai: confianca para o abordar com as criangas. Esta ideia é defendida por Burgessa e Wurtele, 1998; Wurtele, Kvaterernick, e Franklin, 1992 (cit in So-kum Tang, & Chi-wai Yan, 2004) que referem que pais que participaram nestes programas de prevencio do abuso sexual de criangas discutem 0 abuso sexual de criangas com os seus filhos. Também os profissionais como psicélogos, enfermeiros, assistentes sociais, e psiquiatras se demonstram mais capazes de lidar com a tematica apés a participagio nos programas, No proceso de recovery do abuso sexual de criang a crianga tem de passar por varias etapas até ser capaz de denunciar o abuso, em primeiro lugar esta tem de ser capaz de reconhecer que passou por uma situagdo abusiva, de seguida tem de acreditar no facto de poder denunciar, e por iltimo a crianga tem de possuir competéncias de auto-protecgdo, e & aqui que os programas de prevenciio dio o primeiro passo. Este passa primeiramente por ensinar & crianga 0 que € 0 abuso sexual, € neste ponto as opinides divergem devido & complexidade do que € definir 0 abuso sexual. Se as definigdes so vagas, muitas criang: s sobretudo as mais novas podem sentir- se confusas e sem ideia do que € esperado delas, por outro lado muitas situagdes que no so abusivas podem ser reportadas, causando confusio as criancas. 43 Segundo MacIntyre e Carr (2000) de uma revisio de trinta estudos conclufram que os programas de prevenciio do abuso sexual de criancas pode levar a ganhos, conhecimentos e competéncias significativas nas criangas, pais ¢ professores. Neste sentido Sanchez (2001), pretendeu estudar os conhecimentos ¢ atitudes dos pais, criangas e professores em rela a0 abuso sexual de criangas, foram encontrados resultados bastante surpreendentes ¢ reveladores, nfo s6, de uma grande falta de informagio acerca dos abusos sexuais como da profunda convicgao em crengas que se revelaram absolutamente err6neas em relaggo & tematica. Questées como o facto de os abusadores preferirem as meninas como principal alvo de assédio, que s6 acontece em baixos estratos sociais, do abusador como sendo alguém estranho &.crianga, que a crianga acaba sempre por contar aos pais a situagao traumética pela qual passou, de que as criangas mentem aos pais sobre terem sido abusados para se vingarem dos adultos, ¢ de que 0 abuso sexual envolve sempre violencia fisica, so algumas das crengas que os pais e profissionais possuem acerca dos abusos sexuais de criangas. O que este estudo veio revelar é que de facto € urgente trabalhar-se sobre a melhor maneira de prevenir 0 Abuso Sexual de Criangas, este passa nfo s6 pelas criangas mas também pelos pais, professores ¢ profissionais, comegando por desmistificar os falsos mitos que estes possuem acerca da problemética do abuso sexual. 2.2.4, Envolvimento Parental na Prevengiio do Abuso Sexual de Criancas “Sem uma familia feliz nao somos adultos felizes, e sem adultos felizes, néio temos adultos com qualidade.” Leandro, A. (2008). ‘A familia assume-se como detentora de um papel determinante neste processo de assegurar os Direitos das Criangas, tendo como suporte os diferentes suportes da Comunidade. A rede de suporte é fundamental para promover o desenvolvimento da crianga € 0 seu bem-estar. Na comunidade este papel também pode ser assegurado, cabe ao estado com as suas 44

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