Leonid Andreiev - Os Mais Belos Contos Russos Dos Mais Famosos Autores - Silêncio (1944)

You might also like

Download as pdf
Download as pdf
You are on page 1of 24
‘Os ia BECBS Sontag) huss gs DOS MAIS | FAMOS } a 1 Scanned by CamScanner Esta publicagao foi digitalizada por. Milton dos Santos como um esforgo de preservacao e divulgacao da obra do escritor russo Leonid N. Andreyev (1871-1919) publicada em Portugués (Brasil e Portugal) eooe This publication has been scanned by Milton dos Santos as an effort to preserve and disseminate the work of the Russian writer Leonid N. Andreyev (1871-1919) published in Portuguese (Brazil and Portugal) 1 Scanned by CamScanner 4 bp- Se este trabalho é util ou de interesse para vocé, agradecemos seu apoio em divulga-lo! Nota: nao ha nenhuma inten¢ao de se trans- gredir eventuais direitos autorais existentes sobre esta obra. Para qualquer esclarecimento ou questionamento, favor entrar em contato pelo e-mail Inandreyev@gmail.com. eee If this work is useful or interesting for you, we'll be thankful for your help to promote it. Note: there is no intention to infringe any existing copyright on this work. For any inquiry or question, please contact by email Inandreyev@gmail.com. eoeoe Para mais informag6es sobre este autor: For more information about this author: Go leonid-andreyev.blogspot.com.br Fi facebook.com/andreyevieonid Scanned by GamScanner | | } . Scannex ae al MAIS f BELOS (= O ntos DOS MAIS FAMOSOS AUTORES DOSTOIEVSKI_ — KOROLENKO KUPRIN — CHEJOV — GORKI AVERTCHENKO — ANDREIEV GOGOL—TURGUENIEV— EHRENBURG GARIN — DOROCHEVITCH SURGUCHOV-—SCHOLOCHOV-DIMOV PUSHKIN — TOLSTO! — ARTZIBACHEV MEREJKOVSKI—TASIN—SOSULIA,— ete. CASA EDITORA VECCHI LTDA. Rua do Resende, 144 RIO DE JANEIRO y CamScanner os MAIS BELOS CONTOS. = RUSSOS =" MARINA SALLES GOULART DE ANDRADE FREDERICO DOS REYS COUTINHO MANUEL R. DA SILVA ENEIAS MARZANO GAMA E SILVA Printed in Brazil. Scanned by GamScanner re SILENCIO Uma noite enluarada de maio, enquanto cantavam os rou- xindis, a mulher do Paj Indcio entrau no quarto déle. Sua fi- sionomia expressava sofrimento, e tremia o pequeno candeeiro que ela sustinha na mao. Ao aproximar-se do marido, tocou-o no ombro e esforgou-te por dizer-lhe entre solugos: — Pai, vamos ver Verochka. 0 Sem volver a cabeca, Pai Inacio olhou s2veramente para a espdsa, por cima dos éculos, e ficou fitando-a muito tempo, até que ela agitou a mfo desocupada e atirou-se num diva. — Como podem ser eruel um para o outro! — murmurou lentamente,gacentuando a pelavra “cruel”, e seu bondoso rosto rochunchudo contorceu-se numa careta de dor e desespéro, como Se désse modo quisesse exprimir como eram austeros um para © outro: seu marido ea filha, Pai Indcio sorriu levantou-seo Depois de fechar o livro, retirou og 6culos, guardou-os no estojo e meditou, Sua barba comptida, negra, entrelacada de fios prateados, caia-Ihe com dig- nidade sobre o peito, e ondulava suavemente a cada respiragao mais forte. ; — Esta bem, yamos! — disse. Olga Stepanovna ergueu-se rapidamente e suplicou, com voz timida e ansiosa: — Mas ni a ultraje, pai! Vocé sabe como é ela. . © quarto de Vera cra na Agua-furtada, e a estreita escada de madeira rangeu sob o passo forte de Pai Inacio. Alto e grave, baixou a cabeca para entiio tocar com ela o teto do iiltimo seattba by CamScanner SILENCIO 175 — Pata que vieram? — perguntou Vera, ocultando os olhos em 0 braco. O outro brafo repousava sdbre um cobertor branco difici'mente diferencavel do lencol, tio branco, transparente ¢ frio era o seu aspecto. — Verochka! — comegou sua mie, mas calou-se solugante. — Vera! — disse-the o pai, esforcando-se por abrandar a vor nica ¢ dispera — Vern, dign-nos que a incomoda? ‘Vero estava quieta, . ~~ — Vera, no merecemos, sua mie e eu, a sua confian- ca? Mao a amamos? Haveré alguém mais chegado a vocé do que nés? Conte-nos as suas mégons, ¢ crein-nos que se sentiré mo- Thor com isso. E nés também. Olhe para a sua velha mie, como sofre tanto! — Verochka! — Ecu... — Tremeu-lhe voz s8ea; em verdade algo se partira nela — E eu... acha que me sinto bem? Coma se nio visse que um desgésto qualquer a atormenta; que é isso? E eu, seu pai, nio sei de que se tmta. E justo que assim seja? ‘Vera estava quicta. Cautelosamente Pai Inicio cofiou a barba, como se temesse que involuntariamente seus dedos se emarenhassem nela e continuou: — Contra a minha vontade, vocé foi para Sao Petersbur- Ro; amaldicoe'-a por me ter desobedecitio? Ou no ghe dej di- nheiro? Ou, como vocé talvez pense, niio fui carinhoso? Entio, Por que se cala? Pronto, jf foi a Sao Petersburgo! Calou-se Pai Inicio, e acs seus olhos surgiu a imagem de algo enorme, de granito, mgionho, cheio de perigos. invisiveis © pessoas extranhas e indiferentes, E no meio de tudo isso, 56 e desampareda, estava a sua Vera, e li a perdera. Um édio terrivel contra a grande e misteriosa cidade cresceu no espi- rito de Pai Inécio, ¢ raiva contra sua filha, calada, obstina- damente calada. —— Sao Petersburgo nada tem a ver com isso, — disse Vera, morosamente, ¢ fechou os olhos. — E eu nfio tenho nada. E’ melhor irem Para a cama, j& 6 tarde — Verochka — choramingou a pobre mae — Minha fi- Ihinha, confesse-me. — Ora, mamie! — interrompeu-a Vera, com impaciéncia. Pa: Indcio sentou-se numa cadeira e sorriu. — Muito bem, entiio nfo ¢ nada? — Perguntou irénica- mente, | ! Scanned by CamScanner 176 LEONIDAS ANDREIEV — Pai — replicou Vera com rispidez, recostando-se no travesseiro —o senhar sabe que eu 8 amo ¢ a mamie. Bem, sinto-me um pouco indisposta. Mas isto passa. Vio dormir, ¢ eu dormirei também. E amanhi, ou noutra ocasifio qualquer, falaremos Pai Inécio ergueu-se impetuosamente, de modo tio brusco que a cadeira foi de encontro 4 parede, e afestou a muther pela mao. — Vamos, — Verochkal — Vamos, j4 disse! — gritou Pai Indécio — Se ela esque- ceu Deus, nés... Quase a fdrca @le retirou Olga Stepanoyna do quarto, ¢ a0 descerem a escada disse-the a mulher, encurtando o passo, num sussurro fispero: — Foi vocé que a féz assim. Ela tem os seus modos. E vocé € culpado disso. Ab, infeliz crjatura sou eul E chorou, e com os olhos cheios d’égua falseou o pé num degrau e deixou.se cair bruscamente, como se estivesse an- sicsa por despenhar-se num abismo que devia existir por baixo, dela. Desde ésse dia Pai Infcio deixou de falar com a filha, mas ela parecia nao dar por isto. Como sempre, permanecia ‘fo quarto, ou caminhava dentro de casa, continuamente a es fregar os olhos com as palmas das mos, como se os irri- tassem qualquer corpo extranho. E, esmagada entre estas duas cviaturas caladas, a jovial e brinchihona espésa do padre de sanimava-se ¢ parecia perdida, sem saber que fazer ow dizer. As vézes Vera dova um passeio, Uma semana depois da entrevista, saju a noite, como era seu costume. Nido mais a veriam viva, porque nessa noite ela sé jogou debaixo de um trem, que a cortou em dois. O mesmo Pai Indcio dirigiu o funeral. Sua mulher nio esteve presente na igreja, porque com a noticia da morte de Vera sofrera um duro golpe. Perdeu 0 dominio dos pés, das mios e da lingua, e conservou-se imével no quarto penumbroso enquanto badalaram os sinos da igreja. Ouviu cantarem aS pessoas que salam do templo e passovam peln sua porta, ¢ esforcou-se por erguer a mao, e fazer o i lal da cruz, mas o io Ihe recusou obediéncia; quis dizer: Adevs, Veral mas a lingua |he permaneceu rija e inchada dentro da boca, E sua SILincroa 177 atitude era tio calme, que dava a impresséo de repouso ou de sono. Sémente seus olhos continuavam abertos. No funeral, comparéteram a igreja muitas pesscas que co- nheciam Pai Inécio, e muitos estranhos, e todos deploraram a morte horrivel de Vera, e prccuraram descobrir nos movimen- tos e na voz de Pai Indcio sinais de mfgoa profunda, Nao gos- tavam de Pai Inécio por causa de sua severidade e de seus modos orgulhosos, seu desprézo pelos pecadores, pelo seu es- Pirito implacdvel, sua inveja ¢ ambigiio, seu habito de aprovei- tar-se de toda oportunidade para extorquir dinheiro de seus pa- Toquiancs. Queriam todos vé-lo sofrer, vér’o espirito déle par- tido, vé-lo conciente de sua dupla culpa pela morte da filha — como pai cruel e mau padre — incapoz de poupar a propria carne no pecado. Atiravam-lhe othares perscrutadores, e éle, sentindo nas costas ésses olhares, esforgava-se por conservar-se erelo © arrogante, @ sous pensamentos no se referiam 4 morte da filho, mas a sua prépria dignidade. — Padre insensivell — disse, meneando a cabeca, Karze- nov, carpinteira a quern Fei Inécio devia cinco rublos de mol- duras. E assim ereto e severo, Pai Indcio chegou ag cemitério, & do mesmo modo éle voltou. $6 ao chegar 4 porta do quarto da espésa relaxou um pouco a espinha, mas isto talvez por ser a altura da porta infericr a sua estatura, A mudanca da luz intensa do dia para o quarto escuro tornow-lhe dific! distinguir © rosto da mulher, mas apés cuidadoso exame admirouse de vé-la tio calma, com os olhcs sem lagrimas. E néles nfo se podia observar raiva, nem mégoa; estavam mudos, e permane- ceram iméveis, dificilmente, relutantemente, ccmo seu corpo gordo e debilitado a comprimir-se contra o colchiio. — Entio, como se sente? — perguntou Paj Inacio. ‘Os labios, porém, estavam mudos; e iméveis também os olhos. Pai Indécio pés-Ihe a mio na fronte; estava fria ¢ umi- da, e Olga Stepanovna nao mostrou de modo algum sentir aquéle contacto. Quando Pai Infcio retirou a mio, ela fitou néle oa olhos iméveis, dois profundos clhos cinzentos, que pa- 1eciam inteiramente negros nas pupilas dilatadas, e néles nio havin tristeza, nem raiva, — Vou para 0 meu quarto — disse Pai Inacio, que come- cava a sentir frio e pavor. Passou pela sala de estar, onde tudo parecia limpo, © em ordem como sempre, @ ali cobertas de capas brancas, avistou 23 Scanned by GamScanner 178 LEONIDAS ANDRBIEV cadeiras de alto espaldar, que pareciam caddveres amortalha- dos. Sob a janela estava pendurada uma gaiola vazia, com porta aberta. é — Nasiasyal — gritou Pai Infcio, e sua voz pareceu-lhe rude; desgostou-se por té-Ia alterado tanto no aposento deserto, e logo depois do entérro da filha. — Nastasya! — chamou em tom mais moderado, — onde est4 o canério? — Fugiu, sim senhor. — E porque o deixou fugir? Nastasya pés-se a chorar, e a enxugar as légrimas com ao Ponta do lenco de algodio, c disse lamuriosa: — Era a alma da patroazinha. Seria justo prendé-ln? E pareceu ao Pai Inécio que o canério mindsculo, amarelo, feliz, sempre a cantar com a cabeca pendida para o lado, era realmente a alma de Vera, e se nfo tivesse fugido seria impos- sivel dizer que ela morrera. Irritou-se ainda mais com a criada, © gritou: — Saia! . E ao ver que Nastasya custava a encontrar a porta: . . * « Desde o dia do funeral reinou naquela casa o siléncio. Nao era a quietude, porque a quictude é apenas a auséncin de rufdos; era o siléncio, porque era gvidente que as pessoas si- lenciosas podiam mas nfo queriam falar. Era o que pensava Pai Indcio cada vez que entrava no quarto da espésa para en- contrar o mesmo olhar obstinado, de aspecto tio pesado que © proprio ar parecia de chumbo, a pesar sdbre a cabeca ¢ a espinha, Isso pensava éle ao examinar as misicas da filha, que continham as notagées de sua voz como também seus livros, eo retrato que ela trouxera de Sao Petersburgo. Pai Inacio acostumara-se a escrutar com vagar aquéle retrato: Olhava pri- meiro para a face, fortemente iluminada pelo pintor; na sua imaginagdo descobria-lhe pequeno ferimento, que notara tam- bém no rosto dela quando Ihe trouxeram 0 caddver, e cuja ori- gem desconhecia. Pensava entio em diversas causas; racioci- nava que se tivesse feito o trem, téda a cabega teria sido eam!- Scanned by GamScanner SsILkNc1o 179 galhada, ao passo que a cabega de Vera nem sequer féra to- cal Era possivel que ,alguém tivesse esbarrado nela com o pé, quando removeram o corpo, ou até acidentalmente com a unha de um dedo da mio. ' Afinal, cansava-se Pai Inicio de meditar s6bre os porme- ' ores da morte de Vera, e passava aos olhos. Eram escuros, { bonitos, de longas pestanas, que projetavam sombras espéssas | e faziam parecer mais luminogo o branco da esclerética, ambos come se fdssem encrustados em negras molduras lutuosas. Ex- tranha expresso thes dera o desconhecido mais talentoso artis- ta. Era ccmo se no espaco entre os olhos e o objeto fitado houvesse uma pelicula fina e transparente. Parecia-se com 0 efeito obtido com uma imperceptivel camada de pé em cima do um piano, a embagar o brilho da madeira envernizada. Onde quer que Pai Inicio colocasse o retrato, aquéles olios pa- reciam segui-lo insistentemente, mas nada lhe diziam; estavam silenciosos, e éste siléncio era tio evidente que era como se 0 ouvisse, Aos poucos Pai PRdcio comegou a pensar que ouvia o ' siléncio. Téda manha. depois do café, Pai Inécio ia para a sala do répido olhar para a gniola vazia e outros objetos seftava-se numa cadeira, e fechava oa olhos para ouvir o siléncio da casa, Havia algo de grotesco ex? tudo isso. A gaiola continuava cilenciosn, imével © tranqiila, e no seu si- léncio havia magoa e lagrimas, e a gorgalheda distante da morta. O siléncio de sua mulher, abafado pelos paredes continuava in- sistente, pesado como chumo, « terrivel, téo terrivel que num | dia tepidissmo Pai Inicio chegou o sentir arrepios de frio, Con- tinuo e glacial como um sepulcro, e misterioso como a morte, era 9 siléncio de sua filha. Até o siléncio em si mesmo parecia gustiar-se, e lutar com 0 terrivel desejo de falar também, muito embora algo forte e incémodo, uma espécie de méquina, man- tivesse imével e tenso como uma corda. E num ponto qual- quer de sua extremidade o corda agitava-se ¢ soava delicada, ; suave © lasiimosamente. Com alegria, embora com terror, Pai Inacio ansiava pelo som misterioso; apoiava-se no brago da ca- deira, inclinava o cabega para a frente, d espera que chegasse até al{. Mas o som se dilufa em ailéncio, Que coisa estdpidal — resmungava, zangado, @ erguia-se da cadeira ainda ereto e altivo, Vie através da janela, banhada Scanned by GamScanner 180 LEOMIDAB ANDREIEV de juz solar, a rua pavimentada de pedros arredondadas e irre- gulares, ¢ do outro Isdo © muro sem jqneles da oficina. Na es- ina estava um cocheiro, com aspecto de estdtua de barro, e dificil era compreender sua permanéncia all, porque durante ho- ras ¢ horas ninguém passava por tal lugar. . s 6 Fora de casa Pai Indcio tinha indmeras ocasiGes para falm . Falava com o clero, com as ovelhas do seu rebanho; falava quando oficiava as ceriménias, e muitas vézes nas reiinides sociais; nio obstante, ao voltar para casa sentia-se invariavel- mente como ee tivesse passado todo o dia em siléncio. Era por- que com ninguém podia falar no assunto que mais o interessava, e no qual passava ns noites a pensar: Por que morrera Vera? Pai Indcio parecia compreender gue isto agora jamais seria tespondido, e continuava a pensar ser possivel saber. A noite — suas noites eram de vigilia — rememorava o instante em que éle ¢ a mulher, perto da meia-ncite, foram ver a filha, « the suplicaram: “Diga-nos!” E quando sua lembranca chegava a estas palgvras, o resto parecia-lhe como se niio [ésse reali- dade. Fechava os olhos, preservando na obscuridade o quadro vive e iluminado daquola noite, ¢ via a filha levantar-se da cama, sorrir e precurar dizer alguma coisa, Que tera querido dizer? Aquela palava que Vera nijo pronunciara, ¢ que teria solucionado tudo, parecia-lhe tho perto, que se alguém se ti- vesse curvado, e contido as palpitagdes do préprio coracaio, a teria ouvido; e no mesmo tempo sentia-se tao infinitamente, tho desesperadoramente distanfel Pai Indcio entio saltava da cama, esfregava ¢ apertava as miios extendidas, a exclamava: — Veral E 06 o siléncio lhe respondia. Uma noite entrou Pai Inacio no quarto de Olga Stepa- novna, a quem nic procurava fazia uma semana, e sentous® ao lado da cabeceira do cama, ¢ afastando o olhar daqueles olhos insistentes © esgazeadoa disse: . — Mil Queria falar-lhe a reapeite de Vera. Esth ou- vindo? Scanned by GamScanner stL’ncro 181 Os olhos dela estavam parados, e"Paj Infcio, com voz mais alta falou severa e fortemente, como se acostumara a falar com ca penitentes. > Sei que vocé conserva a impressio de que fui cu a causa da morte de Vera, Mas, reflita; por ventura a amei menos do que voc} a amou? Vocé pensa absurdamente. Tenho sido severo; e com isso impedi que ela fizesse o que quis? Perdi a dignidade de pai, curvei humildemente a cabeca, quando ela desafiou 2 minha maldi e salu... de nossa casa. E vocé... nao lhe cuplicou que ficasse, até a mandar colar-ce? Fui eu quem a ensinou a ser cruel? Niio a ensinei a respeltar a Deus, a ser humilde, a amar? Pai Inécio fitou de soslaio os préprios olhos nos olhos da expésa, e afastou-os. ~ Que me restava fazer quando ela nio nos quis revelaz a causa de sua angistia? Niio a ordenei? No supliquei? Creio que, na sua opiniiio, eu devia ter-me atirado de joelhos aos pés da menina, ¢ gritado como uma velbal Como poderia saber o que se passava na cabeca dela? Filha crucl ¢ sem coraghol Pai Inécio golpeou o& joelhos com o punho. — Nio nos amave... cis tudo! Pelo que me diz respeito, esti decidido, e claro... sou um tiranol Talvez a amasse, a vocé, que chorou e se humilhou? Pai Inacio soltou um riso cavo. — Era éste o amor que lhe dedicaval E pay consolé-la, que mcrte escolheu? Morte estipida e ignominiosal Morreu no pé, na imundicie... como um... um cio escorragado a pon- ta-pés. Era agora baixa e roya a vor de Pai Indcio. — Sinto-me envergonhado! Tenho vergonha de sair! Ver- gonha diante do altar! Vetgonha na presenca de Deus! Filha cruel e indigna! Amaldigoada seja no préprio tamulo! Quando Pai Inécio olhow para a mulher, ela estava incon- ciente, ¢ muitas horas depois foi que voltou a si. Mas seus othos continuavam iméveis, e era impossivel dizer se se lem- brava ou nao do que Pai Inicio dissera.. Nessa mesma noite — noite enluarada de maio, calma, té- pida, e mortalmente sossegada — Pai Inécio, caminhando nos pontas dos pés, para nfo str ouvido pela espésa, nem pelo enfermeira, galgcu a escada e entrou no quarto de Vera, Desde a morte de Vera conservara-se fechada a jantla da 4gua-furte- da, e a atmosfera ali era séca e quente, com um leve odor de Scanned by GamScanner 182 LEONIDAS ANDRBIBYV qucimado que vinha do calor acumulado durante o dia no te- Thndo de ferro. Um ar de abandono e auséncia de vida peno- trava o apartamento, durante tanto tenfpo sem ser visitado, © as vigas das paredes, a mobilia e outros objetos exalavam um cheiro ativo de ccntinua putrescéncia. Um ralo de Ivar entrou pela fresta da janela, projetou-se sébre o chi ¢, rofletindo pelas tabuas claras, cuidadosamente Iavadas, irradiou uma luz opaca por todo © aposento, onde a cama limpa e branca, com os dois travessei- ros, um grande, outro pequeno, parecin um fantasma. Pai Inf- cio abriu a janela, e com isso [éz entrar no quarto considerdvel corrente de ar fresco, que cheirava a pé, e rescendia o perfume das (ilies em flor da margem do rio préximo, Um som de in- distintas vores em céro entrou com a rajada fresco, evidente- mente de jovens a cantar em folguedo. Caminhanda com os pés descalgos, com o aspecto de um {ontasma branco, aproximou-se Pai Indcio,da cama alva, deserta, curvou-se de joelhos 20 Indo dela, o face nos travesseiros, abragcu-os, como se pousadn néles oinda estivesse a cabeca de Vera. Ali ficou muito tempo; a cantiga aumentou, depois mor- reu; mas éle continuava all, longos Cabelos prétos espalhados wébre os ombros e a cama. A lua moveu-te no espago, e o quarto ficou mais escuro, « entio Pai Inécio levantou a cabega e murmufou, na sua yor téda a férga do amor inconciente, havia muito reprimido, como $e nao Ale, mas Vera o ouvisse. — Vera, filha minhal Sabe vocé o que significa para mim, filha? Filhinhal Meu cora meu sangue, minha vida! Seu pai... seu velho pai... ja esté encanecido, e sente-se alque- brado. . Tremiam os ombros de Pai Indcio, convulsionou-se-Ihe todo © corpo enorme. Reprimindo a prépria agitacio, Pai Inicio mur- murou ternamente, como a uma crianga: — Seu velho pai suplica-lhe. Nao, minha pequena Vera, éle implora. Ele chora, Ele nunca chorou, Suas mfgoas, {i- Ihinha, seus sofrimentos tio meus também. Sio maiores do que os meus. Pai Indcio mencou a cabeca, — Maicres, Verochka, Que é a morte para um homem como eu? Mas vocé... se soubesse como é delicada, fraca, tl mida! Lembra-se da vex em que machucou a dedo, o sangue espirrou, e voch ehorou um pouquinhe? Minha filhn! Sei que veocé mc ama, que me ama intensamente, Tédas os manhie l Scanned by GamScanner sILincio 183 vocé me beija a mio. Diga-me, diga-me, que é que preocupa Sua cabecinha, c cu —,com estas miios — arrancarei dela a sua afligéo. Elas ainda séo fortes, Vera, as milos de seu pai. Estremeceram os cabelos do Pai Infcio. — Diga-me! Pat Inécio ftou o olhar, na parede, e esfregou as mios. — Diga-me! S6 havia quietude no aposento, ¢ ao longe ouvia-se o apita prolongado e logo interrompido de uma locomotiva. Pai Inacio, os olhos dilatados nas érbitas, como se tivesse surgido & sua frente o medonho fantasma do cadaver mutilado, Pés-te Ientamente de pé, e num impulso de credulidade levou as miios n cabeca, com os dedos crispados. Deu um passo para a Porta, © sussurrou com vor entrecortada: — Diga-mel E 36 0 siléncio the deu resposta. * 2 8 No dia seguinte, depois de matutina e solitarin refeigio, Pai Indcio foi ao cemitério, pela primeira vez depois da morte da filha. Estava deserto, sossegado ¢ quente; parecia mais uma Noite iluminada. Obediente ao hdbito, com esférg> Pai In&cio endireitou a espinha, olhou severamente ao redor e pensou que ainda era o mesmo; nao sentja a nova e terrivel fraqueza das Pernas, nem percebia que suas longas barbes tinham embran- quecido inteiramente, comg se coberta de genda. O caminho para a necrépole, compreendia uma comprida rua, suavemente ingreme, a cuja extremidade aparecia o portio do cemitério, em arco, como negra béca perpétuamente escancarada, a exibir os seus dentes brilhantes. Situado num socaleo, onde terminavam os pequenos cami- nhos de areia, ficava o timulo de Vera, e considerdvel tempa errou Pai Inécio pelos estreitos intervalos abertos, monticulos verdes abandonados e esquecidos de todos. Aqui e ali, esver- dinhados pelo tempo, sepulcros inclinados, gradis quebrados ¢ pedras enormes ¢ plantadas no chiio, aparentemente a esma- gé-lo, com um despeito velho e cruel. Perto de um déstes es- tava a campa do Vera. Cobria-a uma camada de turfa, agora amarelada; a sua volta, contudo, florescia a vegetagio. Os frei- os entrelagavam-se pelaa fimbrias, e uma copada aveleira eaten- Scanned by GamScanner a 4 184 LEONIDAS ANDREIEV | dia sébre a sepultura seus curvos galhos cobertos de folhagem felpuda e dspern. Depois de sentar-se num dos timulos vizinhos | ce de acalmar a respiragao, Pai Infcio cifcunvagau o olhar, ¢ ele- | vou-o para o céu deserto e sem nuvens, onde absolutamente ' imével parara o ofuscante disco do sol — e s6 sentiu ali a calma | profunda e incomparivel que teina em as necrépoles quando | nio corre o venta e as {élhas dormentes cessam a sua agitncao. Veio-the outra ver o pensamento de que no era aquilo a calma, e sim o siléncio. Siléncio que abrangia o muro de tijolos do cemitério, ga!gava-o e ocupava a cidade. E ia terminar simen- te... naqueles olhos cinrentos, obstinada e reluntantemente imo- bilizados. Pai Inécio sentiu um arrepio e baixou o olhar para o ti- mulo de Vera. Ficou a ofhar as pequeninas moitas d2 grama desarraigadas de algum descampado varrido pelo vento, ¢ in- capazes de se adaptar em solo estranho; nfo pedia imaginar gee all, sob aqusla grama, a poucos pés absixo dile, jazia Vera. Esta proximidade parecia incompreensivel, e trouxe con- fusdo © estronha agitagdo a seu esprijo. Elo, de quem se acos- tumara Pai Inécio a pensar como para sempre perdida nas pro- fondas da eternidade, estava ali, tio perto, e a0 mesmo tempo era doloroso convencer-se de que, néio obstante, ja niio existia mem nunca mais poderia ser vista. E ao espirito imaginoso de Pai Inécio parecia que se pronunciasse uma Gnica palavre, j& quase nos éeus labios, ou se fizesse um movimento qualquer, Vera surgiria do seu tamulo_e voltaria a ser a mesma bsleza qve féra um dia. E nio 96 ela surgiria, mas todos os mortos, profundamente sensiveis no seu siléncio solenemente glacial. Pai Inécio retirou o chapéu prito de aba larga, consertou os cnbelos desalinho, ¢ murmurou: — Verat Pai Inécio nio te sentiu & vontade, com receio de ser ou- vido por um intruzo, e inclinando-se pera a campa, olhou 20 | derredor. Nao havia ninguém por all, e desta vez repetiu em tom mais forte: — Vera! Era a voz de um homem de idade, rispida © autaritérla, ¢ } era estranho que desejo tio poderosamente manifestado ficasse sem resposta: | — Vera! \ Alta e insistentemente repetiu o chamado, © quando se calou pareceu-lhe por um momento que de um ponto. impre- ciso, de sob a terra, vinha uma resposta incoerente. Pai Ingcio, Scanned by GamScanner ~ Scanned by CamScarner ~ BILENCIO 185 removendo de cima do ouvido, os cabelos soltos, encostou-o & turfa aspera, e espinhosa. — Vera, diga-me! * Aterrorizado, sentiu Pai Inacio que Ihe entrava pelo ou- vido alguma coisa gélida, sepulcral, que lhe gelou a medula; Vera parecia estar falando... falando todavia, com o mesmo si- Jéncio ininterrupto. Este sentimento eta agora mais torturante e terrfvel, e quando afinal Pai Indcio se esforgou por afastar a cabeca, tinha o rosto pélido como o de um cadaver, e imagi- Nava que téda a atmosfera tremia e palpitava de siléncio res- sonante, ¢ que aquéle terrivel mar estava sendo varrido por tre- mendo furacio, O siléncio estrangulava-o; em ondas geladas rolava-lhe por sébre a cabeca a embaragar-Ihe os cabelos; cas- tigava-lhe o peito, que despedia lamentos. Trémulo da caboca, fos pés, sempre a olhar em térno com o mesmo olhar severo, lentamente Pai Indcio pés-s> de pé, e com esférco prolongado tentou esticar a espinha e dar ao corpo convulso a costumeira dignidade orgulhosa. Conseguiu. Com inclinagao estudada, sa- cudiu 0 pé dos joelhos, qlocou na cabega o chapéu, féz trés vézes o sinal da cruz, e afastou-se com porte talvez mais altivo, sem reconhecer, entretanto, o cemitério que Ihe era familiar, ‘8 trocar os caminhos. — Ora, entrei no atalho errado! — sorriu Pai Inicio, de tendo-se numa encruzilhada. Ali ficcu algum tempo ¢, irrefletidamente, envéredou pela esquerda, porque the parecia impossivel ficar parado a esperar. Dirigia-o o siléncio. Brotava das oampas verdes; era o hdlito das melancélicas cruzes cinzentas; em camadas finns, sufocan- tes, subia de todos os poro$ da terra, saciado dos mortos, Pai Inacio acelerou o passo. Tonto, pervagou pelos mesmos cami- nhos, saltou tumulos, tropegou nas grades, agarrando.se as gri- naldas metilicas e espinhosas, a despedacar nelas o tecido de- licado de sua roupa. Sé pensava em fugir. Afastava-se de um lugar pare outro, rapido, e acabou por correr qlucinadamente, parecendo invulgarmente alto com a batina esvoacante e os cabe- los flutuantes ao vento. Um defunto que se levantasse de sua tumba néo causeria mais paver aos transeuntes do que aquélo homem corpulento, a correr e saltar como um louco, os braces convulsos, a fisionomia contorcida de paver, ¢ a béca aberta a exalar suspiros rouccs e entrecortados. Com um salto mais violento, Pai Infcio encontrou-se numa ruazinha, em cuja cx- tremidade avistou a capola, construida no cemitério, A porta 186 LEGNIDAS ANDREIRV dela, num banco baixo, dormitava um ancifio, com ares de fo- rasteiro, e ao seu lado, em discussfig, duas pedintes rixentas, que enchiam o ar com suas pragas. J& era noite, quando Pai Inécio chegou em casa, ¢ havia luz no quarto de Olga Stepanovna. Sem se despir, sem sequer lirar o chapéu, empoeirado e réto, Pai Inacio acercou-se da mulher e ajoelhou-se aos pés dela. — Mie... Olga... tenha piedade de mim! — chorou — Eu enlouqueca. Bateu com a cabesa na beira da mesa, e chorou com angis- fia, como alguém que chorava pela primeira vez. Depois er- gueu a cabega, confiante no esperado milagre, que gua mulher falasse, por compaixiio déle. — Meu amor! Atirou-se com todo © seu corpanzil para junto da espésa.. . e deparou com o olhar imével daqueles olhos cinzentos. Néles. niio havia compaixio, nem rancor, Era possivel que o tivesse perdoado, mas no olhar dela nao encontrou piedade, nem ressen- timento, Estavam mudos e sossegadgs. E sossegada estava téda n caso, escura e deserta. Scanned by GamScanner A. PusBKIN (1799-1837) A camponesa disfargada Tradugig de Manuel R. da Silva Leon Toxstor (1828-1910) Tradugo de Marina Salles Goulart de Andrade ‘Vrapmar G. KoroLenxo (1853-1921) Qs murmirios da selva ... ‘Tradugio de Marina Salles Goulart de Andrade NIcotar V. Gocon (1809-1852) . Memorias de ur 10uco ... 1.6.06 e neces onsen rene ‘Traducio de Marina Salles Goulart de Andrado IVAN TuRGUENIEV gcep ‘Biriuk Traducio de Manuel R da ‘silva Fiopor Dostorevskt (1821-1881) Um ladrao honrado - : Tradugio de Manuel Il. da Silva Axton (CHEJOV ee, | Uma boa mulher eases ees eee ‘te Marina Salles Goulart he ‘MAxrmro Gorn (1868-1936) Um incidente Traduglo de Marina Salles Gepiact de Andrade WNicouar Garm (1851-1915) Ua muther esquisita ae Traduefo de Marina Salles Goulart do Andrade ‘Le6nmas ANDREIEV per Ta) Siléncio "Tradogsa a atin Maraano Arcipro Aveercinexo (1881-1925) Diarra clea (1865-1941) Um quadro de histéri Tradugly de egal Osir Dnaoy (1878) A Faléncia ‘Traduca de Marina Salles Goulart, de Andras Navexupa Terri (1888) O Poquir * Tradugho de Frederico dow Reys Coutinho ‘Viass DorocneviTcH Be IE7S-1920) (Os calcanhares siio _— Traductio ca Frederico dos Reys Coutinho ‘Mika. ARTZMACHEY (1878-1921) ‘Tradugio de Manuel N. da Silva ide Marina Salles Goutastide Andrade ELiAs EHRENBURG (1891) (Dlcachimbo de Josué ....... 0. c.cccceesenteensens QIL Tradugho do Manuey R. da Silva A. Bourkov (1882) ‘Regras de conduta para uso alh@io ........ 0.0 eee eee 281 , Traduclo de Frederico dos Reys Coutinho iv JeFIM Sosutia (1899) PO rctemerte 8 VIdA oes een ans gets « OY sie 288 “Tradugio de Manuel R. da Silva -MIKAIL ScHoLocHov (1901) Os grandes pelos pequenos ..........seee er eeeeeee 306 Tradugho de Manuel R. da Silva ‘OS IRMAOS KARAMAZOY fcho que Thuncd escrevi nada mais novo, mais cumpleto e miis original do que meu romance OS IRMAOS KARAMAZOV. ° Dostoievski Dostoievski... o tinico que me ensinou alguma cousa de psicologia. Sua descoberta foi para mim ainda mais importante do que a de Stendhal. Nietzsche OS IRMAOS KARA- MAZOY oi o livro de ca- beceira de Tolstoi, em seu leito de “morte. Dostoievski era désses raros génios que se adian- © tam de obra em obra, numa espécie de pogressio con- tinua, até que a morte vem taoaa interrompé-los. bruscamente. Nao ha nenhuma_hipocri- sia nesta fogosa velhice, do mesmo modo qua nfo hf ha de Rembs ; Com 05 quais gosto de compard-lo; man ~ S€gura gravidade de pensamento, Sem condescendéncia alguma para consigo mesmo, sem cessar insatisfeito, exigente até o impossimel — plenamente conciente de Seu valor, cofitudo — antes de abordar OS IRMAOS KARA: 5 MAZOV um tecreto estremecimento de alegri legria o prevenia de que se achaya, afinal, diante de um assunto adequado ao seu porte, di snio. [ ‘ao porte de seu génio. Daria , UNICA EDICAO COMPLETA EM LINGUA PORTUGUESA, £ TRADUZIDA DIRETAMENTE DO RUSSO Bor BORIS SOLOMONOY DOIS VOLUMES DE NUTRIDA LEITURA, ELEGANTE APRESENTAGAO, COM ARTISTICAS CAPAS DO PINTOR RAMON HESPANHA _ Or# 15,00 CADA VOLUNE demos pedidos pelo Servtco de Reembdlso Postal RA VECGUT LTDA. — Ruy do Resende, 144 — MO randt ou na de Beethoven, tém sempre uma enérgica, e Tolstoi cra uma porta que se obria para © imiefiso universo, "revelagdo da Vida. } Wunca uma Voz-semelhafite A sua havin. 'ressoado antes ud mundo. Como vexplicarmos, ‘dp outa | Feet a primeird esta misica que esperdvamos havia tanto | las Po eda qual tanta neccisidade tinhetnos? Para nés era pouco admirar a obra de Tolstoi: vivermo-la ae | s¢ fora nossa. 1 L poderoso ‘lito Joyita pelaypulsagao ‘cordial dé ico; por sua clayivid@mem desapiedada © yun fa. mis co A morte; fae ere par eae FS poe ae agentret mauisitgia, contra as E por seu réalismo, ©,por seu mistiisma) oll ee fundo das or a e mundo, Por imutfvel‘em favor COM DEUS, . ; Méxmid Gonxt iawn". avaot PAGINAS POR cx 20,00 WAS LIVRARIaS “Atendemos pedides pelo Servico, je Reembélss Postal CASA EDITORA -VECCHI LrDa. Run do Resende, 144 — _ Rio dé Janeiro

You might also like