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Parecer Desenvolvimento Urbano
Parecer Desenvolvimento Urbano
Parecer
Consulta que se refere à competência da União para legislar
sobre desenvolvimento urbano, quanto à constitu-
Os dados estatísticos do Brasil mostram que cionalide de alguns dos dispositivos propostos e
2 /3 da população em 1980 vive nas cidades. Os pro quanto à jurisdicidade de inclusão de normas pro
blemas urbanos, tradicionalmente cobrados aos mu gramáticas no texto da lei, m otivo porque, buscan
nicípios, tomaram tal dimensão e extensão que apre do respaldo às decisões do Conselho sobre a m até
sentam hoje facetas que fogem às possibilidades de ria, form ulamos os seguintes quesitos:
ação dessa esfera de poder. Entre as formas de atua
ção do governo federal com relação às cidades, res 1. Possui a União competência implícita para
salta como imprescindível a instituição de legislação legislar sobre normas gerais de desenvolvimento
geral, a nível federal, que oriente o desenvolvimen urbano?
to urbano em sua escala e disponha sobre instru Comentário
mentos básicos para uso pelos estados e municípios Estas normas seriam aquelas constantes do ca
em sua escala de atuação, embasando a ação dos pítulo II "D a urbanização” e o capítulo III "D a pro
mesmos. moção do desenvolvimento urbano".
O Conselho Nacional de Desenvolvimento Ur As críticas recebidas ao capítulo II têm se fi
bano — CNDU —, órgão do Ministério do Interior xado na impropriedade da existência de definições
responsável pela proposição e implantação da polí em lei e nas limitações à definição de área urbana
tica nacional de desenvolvimento urbano, está ela e de expansão urbana constantes da mesma. Quan
borando um anteprojeto de lei de desenvolvimento to ao capítulo III, coloca-se como privativa da Cons
urbano, a partir de estudos feitos por sua Secreta- tituição a definição de áreas de ação para as diver
ria-Executiva. O estudo em questão recebeu inúme sas esferas de poder, em desenvolvimento urbano.
ras críticas e sugestões, quer de órgãos governa Os elementos em anexo dão uma visão mais
mentais, quer de entidades privadas, especialmen clara dessas críticas.
te as ligadas ao setor imobiliário urbano. Apresen 2. Há no anteprojeto algum dispositivo que
tadas as críticas e sugestões ao CNDU, determi ofenda o direito de propriedade garantido no art.
nou-se esse em reunião de 7 de abril deste ano a cria 153, § 22, da Constituição federal?
ção de um grupo de trabalho constituído por repre
sentantes dos ministérios e empresas que o inte Comentário
gram, bem com o pelos conselheiros de nomeação As críticas básicas dirigem-se aos novos ins
do presidente da República, com a finalidade de dis trumentos jurídicos propostos, relativas ao direito de
cutir os documentos existentes e regidir e apresen superfície que estaria separando o direito de cons
tar nova minuta do anteprojeto e as posições diver truir do direito de propriedade, à edificação com pul
gentes, para posterior deliberação do Conselho. sória e ao direito de preempção. Quanto a estes úl
tim os, que se baseiam na função social da proprie
Durante as dicussões sobre o projeto no gru dade, são ditos inconstitucionais pois deveriam, se
po de trabalho e no plenário do CNDU surgiram dú gundo as críticas, ter menção expressa na Consti
vidas quanto à constitucionalidade do mesmo, no tuição com o a desapropriação.
Da mesma forma que no quesito anterior, os zes mesmas da Constituição nacional, as órbitas e
documentos anexos dão maiores elementos para círculos de competência atribuídos à União, aos
análise. estados-membros e às comunas (nesse sentido,
3. A inserção de dispositivos referentes a ob conforme Miguel Reale — O município na estrutu
jetivos e diretrizes de desenvolvimento urbano no ra do Estado Federal Brasileiro, em Nos quadrantes
texto do anteprojeto é admissível do ponto de vista do direito positivo, São Paulo, 1960, sobretudo p.
4 6e seg s.).
jurídico?
Comentários Peço vênia para transcrever o seguinte tópico
Diversas manifestações ocorreram no sentido do mencionado livro: " A discriminação dessas três
de não caber em lei dispositivos programáticos e em esferas de competência obedeceu, evidentemente,
defesa de sua manutenção tem sido mostrada a ne a um critério, ou melhor, a um sistema de critérios.
cessidade de haver diretrizes para as entidades pú No delicado plano distintivo das atribuições privati
blicas ou privadas que atuam na área. vas, seguiu-se, em linhas gerais, esta regra: à União
reservam-se os problemas que interessam indistin
Para que o CNDU possa manifestar-se devida tamente a todos os brasileiros (daí a unidade da le
mente informado, incluiu-se o quesito acima. gislação civil, penal, comercial, processual, etc.; a
4. A integração de órgãos estaduais e muni competência para fixar as diretrizes gerais da políti
cipais em um sistema Nacional de Desenvolvimen ca educacional, sanitária, etc.; a defesa do territó
to Urbano, na forma proposta pelo capítulo V do an rio, a representação internacional, etc.); aos Estados
teprojeto, constitui ofensa à autonomia dos estados cabem as questões atinentes à sua administração
e municípios? própria, para execução e aplicação in concreto do
que ingenere houver a União fixado para todos, em
Comentários
obediência aos princípios do regime vigente; aos
A proposta do anteprojeto de lei está apoiada Municípios atribui-se o cuidado de seus peculiares
em outras legislações, como a lei n? 6.938 de 31 de
interesses, o que implica em autonomia de iniciati
agosto de 1981, que estabelece sistemas semelhan
va na esfera do que lhe é própria, e em com petên
tes, uma vez que a diretriz de atuação do Ministério
cia complementar e supletiva em tudo que, por sua
do Interior é a utilização das entidades existentes em natureza, seja comum aos membros dos demais Mu
qualquer nível da administração pública e não a cria nicípios e se enquadre, por sua generalidade, no âm
ção de novos organismos. O entrosamento de ações bito da competência federal ou estadual" (obra ci
seria obtido através do sistema aqui proposto, o que tada, p.48).
evitaria concentração de ações da área urbana no
governo federal. Como bem observa Santi Romano, em sua
clássica monografia L ‘ordinamento giuridico, em um
Brasília, 9 de setembro de 1982
sistema federativo há vários ordenamentos jurídicos
(a)Militão de Morais Ricardo coexistentes, cada qual com o seu centro de inte
Secretário-Executivo do CNDU resses e de atributividades normativas, de tal maneira
que a distribuição de competências, que se opere em
um deles, torna-se 'irrelevante' para os demais: "in
Parecer generale, gli effetti o I'efficacia, chedir si voglia, di
un ordinamento si esplica nell'ambito che gli é pro-
As ordens de competência no prio e si arresta invece davanti ali' ambito dominato
da un diverso ordinam ento" (Santi Romano, obra
estado federal brasileiro citada, Florença, 1945, p. 149).
As diversas questões suscitadas na presente Igual é a conclusão do insigne Hans Kelsen,
consulta têm sua raiz primordial no problema da dis embora partidário de um rigoroso monismo jurídico,
tribuição das competências entre as unidades polí- absolutamente infenso à teoria pluralista de Santi
tico-administrativas que compõem o Estado brasi Romano: "Som etim es — assevera o mestre da Es
leiro.
cola de Viena — the central administrative authori
Costumo dizer que a estrutura federativa no ties are competent to supervise the activity of the au
Brasil é tridimensional, não no sentdo filosófico- tonomous bodies; they may annul norms issued by
jurídico desse termo, mas sim para salientar que, ao autonomous organs which violate central statutes is
contrário de outras federações que se mantêm ape sued by the legislative organ o f the State, but they
gadas ao binômio 'União-estados' - ficando os mu may not replace such norms by norms created by
nicípios na dependência dos poderes que lhes forem themselves” (Kelsen, General theory o f law and Sta
conferidos pelos estados —, a nossa se distingue pe te, Harward University Press, 1946, p.315).
lo fato de já se encontrarem delimitadas, nas matri Relembrados esses princípios, cabe ponderar
que, na complexa distribuição das 'ordens de com via: "T h a t a power to create implies a power to pre
petências', o nosso legislador constituinte distingue serve. That a power to destroy, if wielded by a d if
as seguintes espécies de poderes: a) poderes da ferent hand, is hostile to, and incompatible w ith, the
competência exclusiva da União; b) poderes da com se power to create and to presèrve. That where this
petência exclusiva dos estados; c) poderes da com repugnance exist, that authority w hich is supreme
petência exclusiva dos municípios; d) poderes con m ust co n tro l, n ot yield to th a t over w hich it is
correntes ou suplementares, isto é, suscetíveis de suprem e".
exercício pelas três 'Unidades', ou só por duas de
las; e) poderes residuais que cabem, de maneira ex E mais adiante: "It is o f the very essence o f su
clusiva, aos estados da Federação. premacy to remove all obstacles to its action w ithin
its own sphere, and so to m odify every power ves
Na terceira das hipóteses supradiscriminadas, ted in subordinate government as to exempt its own
cabe distinguir duas possibilidades: às vezes, o po operations from their own influence". (Marshall, The
der da Unidade federativa inferior é meramente sub constitutional decisions, vol. I, p.334 e 335).
sidiário ou suplementar, subsistindo até e enquan
to não disciplinado o assunto pela Unidade superior, Com idêntica fundamentação, assim declara
exercendodo-se, por assim dizer, nos claros norma va também o chief justice Hughes, consubstancian
tivos deixados por esta; ou, então, conserva seu ca do a opinião da Corte Suprema dos Estados Unidos
ráter complementar, desde que as regras emanadas da América: "Congress has not only the power to
não conflitem com as do órgão eminente. create a corporation to facilitate the performance of
governmental functions, but has the power to pro
tect the operations thus validy authorized. A power
Poderes implícitos da União to create implies a power to preserve" (84 Law
ed. 11).
É pacífico, em direito público, que quando a
norma constitucional confere determinado poder, Em bela página sobre a amplitude da excecu-
im plicitam ente outorga o emprego de todos os ção das normas de competência, Francisco Campos,
meios adequados necessários à consecussão dos invocando clássicos ensinamentos de Marshall e ou
fins visados, desde que não conflitem com outras re tros insignes mestres de direito constitucional, refere-
gras constitucionais. se a poderes implícitos - ou seja, àqueles que logi
camente resultam dos poderes expressos, ou que se
Se a Constituição federal confere à União põem como seus meios adequados de ação, ou, se
competência para legislar ou prover sobre dada ma gundo suas próprias palavras: "Em torno da parte
téria, de tais poderes expressos outros resultam, ló coagulada ou nuclear dessa competência, constituí
gica e necessariamente, com o poderes implícitos: da pelos poderes expressos ou enumerados, com o
entre estes o da escolha dos meios idôneos à con reserva indispensável à sua nutrição, ou com o fim
secução dos fins reclamados pelos interesses gerais de evitar-lhes o endurecimento e, por conseguinte,
do país. a ineficácia, coalesce o plasma, ou a matéria difusa
De longa data prevalece em nossas cortes de e insuscetível de ser configurada por antecipação,
justiça a tese que Araújo Castro assim compendia dos poderes implícitos, daqueles poderes que se têm
com clareza: "A competência privativa da União não de haver com o envolvidos, necessariamente, nos
é limitada ao que está enumerado na Constituição. poderes expressos, e que estão para estes com o o
Esta, escreve Rui Barbosa, não estatui somente o meio para o fim, o acidente para a substância, a cláu
que reza em termos explícitos o seu texto, senão sula circunstancial ou subordinada para a cláusula
também o que nele implicitamente se abrange e o que modifica ou especifica, os processos de produ
que necessariamente se segue da essência de suas ção de um resultado para o resultado que eles se
disposições. Regra é de interpretação, dizem os Jui destinam a produzir (...)" direito constitucional, Rio-
zes americanos, que o que está implícito numa nor São Paulo, 1956, vol. I, p.31 e segs.).
ma legislativa, dela tão realmente é parte quanto o Reconhecida a existência de 'poderes implíci
que na sua letra está exposto. Em virtude dos po tos', com o sendo da natureza mesma do 'poder po
deres implícitos que lhe com petem , a União pode lítico', na realização de seus fins, e, por conseguin
usar de todos os meios necessários próprios ao per te na determinação e emprego de meios idôneos à
feito exercício dos poderes expressos. E ela é o úni obtenção dos resultados que lhe cabe realizar, é de
co árbitro da escolha desses meios sem outra razão grande importância esclarecer qual o critério que de
senão a de não serem os mesmos contrários à m o ve vincular a norma expressa à 'norma implícita'
ral, à Constituição ou aos fins essenciais do Estado". apresentada com o conseqüência daquela.
(Araújo Castro, A nova Constituição brasileira, p.83).
Poderá parecer à primeira vista que, em se tra
Essa orientação prende-se, com o se sabe, ao tando de um problema de distribuição de competên
antigo ensinamento do grande Marshall, que escre cias, só poderia ser considerado implícito um poder
quando lógica e 'estritamente' subordinado ao que Reconhecendo embora, e com razão, que não
é expressamente conferido pela Carta Maior, mas es há poderes implícitos quando há poderes expressos
se rigorismo formal seria incompatível com a ação em sentido contrário (doutrina consagrada pelo re
política do Estado, cujos objetivos se põem pronta ferido aresto) diz Caio Tácito que os poderes da
mente, não por serem fins do Estado Federal, mas União: "Compreendem por igual, os meios neces
antes da coletividade global que nele juridicamente sários ao exercício satisfatório de suas atribuições,
se ordena. ou, segundo a terminologia do Estatuto norte-ame
ricano, a competência de criar as leis necessary and
É em virtude das exigências do bem social ge proper à execução de seu encargo". (Loc. cit.)
ral em jogo que os constitucionalistas norte-ameri
canos têm acordado em reconhecer que o critério
de ligação exigível entre a norma expressa e a nor Poderes da União em matéria de
ma implícita é o critério de razoabilidade na fixação
dos meios que habilitem o órgão estatal, como acen direito urbanístico
tua Marshall, a agir da "maneira mais benéfica ao No que se refere ao amplo aspectro do direito
povo". urbanístico (conforme José Afonso da Silva, Direi
Esse eminente magistrado da Suprema Corte, to urbanístico brasileiro, São Paulo, 1981 e Hely Lo
a cujo nome se liga a modernização social do Com pes Meirelles, Direito de construir, 3.ed., 1979) e vi-
mon law, põe em destaque qual a correlação que de dando a determinar a competência da União para
ve existir entre meios e fins adequados para tornar editar normas gerais do desenvolvimento urbano, é
legítimos os poderes implícitos que dela defluem, ou mister proceder-se, de início, a uma análise dos pre
verbis: "Let the end be legitimate, let it be within the ceitos constitucionais que ou explicitamente disci
scope of the constitution, and all means are appro plinem a matéria ou, por sua natureza, contenham
priate, which are plainly adapted to that end, which em si, implicitamente, disposições pertinentes a tal
are prohibited, but consist w ith the letter and spirit assunto.
of the constitution, are constitutional" (vide The Antes, porém, de proceder a essa análise, im
constitutional decision o f John Marshall, vol. I, p.308 porta esclarecer que os poderes implícitos não são
e segs.). determináveis caso por caso, de tal modo que eles
Nesse sentido, Robert E. e Robert F. Cush só possam resultar de um preceito expresso isola
man, com base em vários julgados da Suprema Cor damente objeto de interpretação. Penso eu, ao con
te norte-americana, precisam que essa "correspon trário, que poderes implícitos podem ser 'conseqüên
dência à letra e ao espírito da C onstituição", a que cia de um conjunto coordenado de normas expres
se referia Marshall, para legitimar os problemas im sas, tendo em vista os objetivos comuns que as
plícitos, veio sendo cada vez mais entendida, não co interligam'.
mo uma correspondência linear, mas como uma cor
Parece-me que as regras federais de direito ur
respondência razoável (conforme Robert E. e Robert
bano se situam nesse tipo de construção normativa
F. Cushaman, Leading constitutional decisions, No
fundada sobre um 'com plexo' unitário e congruen
va York 1966,13.ed., p .10, em comentário ao famo
te de disposições constitucionais. Seria grave equí
so Case M c.Culloch versus Maryland).
voco supor, com efeito, que os poderes implícitos
Acrescentava Marshall que, excercendo o go devam resultar, um por um, de determinados pre
verno federal poderes no interesse geral da nação, ceitos constitucionais atomicamente considerados,
é segundo o critério de razoabilidade que deve ser ou seja, desvinculados uns dos outros: eles podem,
aferido o emprego por ele dos meios julgados neces ao contrário, decorrer da complementaridade de di
sários à execução de objetivos comuns, que não po versas normas, mesmo porque a Constituição, co
dem sofrer embaraços além daqueles que a Consti mo ensinava Rui Barbosa, representa um lucidusor-
tuição estabelece: "L et be the end be legitimate, let do, um ordenamento cujas regras não só se interli
it be w ithin the scope of the Constitution, and all gam mas se explicam e compreendem umas pelas
means which are apropriate, which are plainly adap outras.
ted to that end, which are not prohibited, but con
sist w ith the letter and spirit o f the Constitution are A essa altura, uma outra questão merece bre
co nstitutional..." (Loc. cit.) ve reparo. Refiro-me à necessidade de distinguir-se,
na esfera das 'leis federais' duas distintas categorias.
Sobre esse assunto, merece lembrado o acór Em primeiro lugar, temos aquelas que são, por as
dão do Surpremo Tribunal Federal, com judiciosos sim dizer, interna corpore, isto é, cuja validade e efi
comentários de Caio Tácito fixando o conceito e os cácia se exaure na órbita privativa da União mesma,
limites dos poderes implícitos, (conforme Revista Di tendo como seus destinatários os seus órgãos ou au
reito Adm inistrativo vol. 36, 1954, p.62 e segs.) toridades e, concomitantem ente, os elementos da
sociedade civil que se lhe subordinam, e são as 'leis Tudo está, todavia, em saber fixar a natureza
federais' stricto sensu. Ao lado dessas normas fe e o alcance dessas diretrizes, a fim de que a União
derais, outras há — 'e são as de caráter nacional', não imponha normas exorbitantes aos estados, e,
que alguns tratadistas denominam leis nacionais — sobretudo, não se 'substitua ào município' em tudo
que se põem como 'normas eminentes', cujos des aquilo que constitui questão de seu "peculiar inte
tinatários são a 'sociedade civil brasileira' no seu to resse" e diga respeito, à "organização dos serviços
do, implicando, é claro, os órgãos da União, dos es públicos locais" (Constituição, art. 15, n? II, e sua
tados e municípios, de conform idade com a natu letra b).
reza do assunto.
Não me parece, pois, possa haver dúvida
Esclarecidos esses dois pontos, já estamos em quanto à competência da União na matéria em exa
condição de verificar quais são as 'normas federais me. Na realidade, sendo de 'direito civil' o cerne do
de caráter nacional' que, de maneira explícita ou im desenvolvimento urbano, que é o 'direito de cons
plícita, digam respeito ao problema geral do desen truir no Código civil mesmo, em razão da proprie
volvimento urbano, dando lugar a um corpus juris dade individual e das relações de vizinhanças, já se
que, completado por disposições estaduais e m uni contém um núcleo de regras que, por serem comuns
cipais, se denomina 'direito urbanístico'. Este é, em a toda a coletividade nacional, não é deixada à com
suma, o Direito cujas fontes são de tríplice emana petência das autoridades locais.
ção, cabendo à União editar as regras ou modelos
É a razão pela q ua l, s o b re tu d o desde o
jurídicos genericamente aplicáveis em todo o terri
decreto-lei n° 88, de 10 de dezembro de 1937, e sem
tório nacional.
regulamento (decreto n? 3.079, de 15 de setembro
No que refere, propriamente, à competência de 1938), tivemos, sem que lhes argüísse a incons-
da União, é mister partir, penso eu, não deste ou da titucionalidade, uma seqüência de normas federais
quele artigo constitucional isolado, mas sim de um que, passando pela lei 649, de 11 de março de 1949,
quadro preceituai formado de disposições que po e pelo decreto-lei n° 271, de 28 de fevereiro de 1967,
deríamos enumerar da seguinte forma, obedecida a veio culminar na lei n° 6.766, de 19 de dezembro de
ordem em que se acham enunciadas no texto da 1979, estabelecendo disposições 'civis e penais' que,
Carta Magna, a saber: longe de conflitarem com as atribuições municipais,
Normas que implícita ou explicitamente con vêm assegurar-lhes condições de eficácia.
ferem competência à União em matéria de desen Se algo caracteriza esse evolver de atos nor
volvimento urbano: mativos federais é a crescente compreensão de que
art. 8? - V — planejar e promover o desen a competência municipal não elide, mas antes exi
volvim ento e a segurança nacional; art. 8? — XI — ge um sistema de normas federais que confira aos
estabelecer o plano nacional de viação; art. 8? - XIII poderes locais os 'instrum entos de ação' indispen
- organizar a defesa permanente contra as calami sáveis à execução fiel dos planos urbanísticos que
dades públicas, especialmente a seca e as inunda cada um município elabora em função de suas pe
ções; art. 8? — XIV — estabelecer e executar pla culiares circunstâncias.
nos nacionais de educação e de saúde, bem como 'Sanções civis' e 'sanções penais' (ambas da
os planos regionais de desenvolvimento; art. 8o - competência exclusiva da União) foram estabeleci
XVII — legislar sobre: a) direito civil e direito penal; das para atender a duplo objetivo: a tutela do direi
c) normas gerais de proteção da saúde; f) desapro to individual de propriedade e o adimplemento efe
priação (art. 153, § 22); i) águas e energia; n) tráfe tivo das exigências urbanísticas locais. Longe, pois,
go e trânsito nas vias terrestres; art. 160 - III - prin de haver invasão de competências, o que há é uma
cípio da fundação social da propriedade; art. 164 - conjugação lógica de providências normativas de na
previsão de 'regiões metropolitanas'; art. 180 - pro tureza manifestante 'com plem entar'.
teção especial aos locais de valor histórico, ou ‘a rtís
tico, aos monumentos e paisagens notáveis bem co Aperfeiçoando o sistema do decreto-lei n? 58,
mo às jazidas arqueológicas. a lei n? 6.766/79, que "dispõe sobre o parcelamen
to do solo urbano e dá outras providências", con
A meu ver, dessas regras constitucionais, tém todo um capítulo — o de n? IX (arts. 50 usque
'consideradas em seu conjunto e em sua lógica com 52) — que estabelece rigorosas sanções penais aos
plementaridade', resulta uma série de normas sus infratores do que nela se dispõe ou seja consagrada
cetível de ser entendida como sendo da 'com petên em leis dos estados e municípios, cada qual no âm
cia exclusiva da União', não obstante a falta de tex bito de suas faculdades normativas. Quem afirm a
to constitucional que lhe confira, expressamente, rá que tais sanções, de interesse primordial para o
poder para legislar sobre direito urbanístico e, mais desenvolvimento urbano, extrapolam da competên
especificamente, sobre diretrizes gerais de desenvol cia da União, somente pelo fato de dizerem respei
vimento urbano. to, por exemplo, a falsas afirmações dos loteadores
sobre a legalidade de loteamento ou desmembra 'plano nacional de viação', para não falar na facul
mento do solo para fins urbanos, com desrespeito dade de desapropriar para fins de 'utilidade social',
de disposições municipais? Essas e outras infrações confesso que não escondo minha perplexidade
são consideradas "crimes contra a Administração quanto às descabidas limitações a que pretendem
Pública", de tal sorte que as entidades comunais re alguns submeter as atribuições da União quando es
cebem da órbita federal a proteção legal que só ela ta, em boa hora, se propõe a fixar "os objetivos e
lhes podia conferir. a promoção do desenvolvimento urbano".
É óbvio que, se à União cabe fixar as sanções Nem poderia ser de outra forma, visto como
penais, na hipótese de transgressão, não lhe pode o problema do 'desenvolvimento urbano', por sua
recusar o poder-dever de determinar quais os requi própria natureza, é daqueles que envolvem e pos
sitos de que deve normalmente se revestir o 'proje tulam a 'cooperação', de todas as entidades de nos
so direito público interno, além de exigir o empenho
to de loteamento', e quais os 'pressupostos mínimos'
global da sociedade civil. Numa época em que a 'em
a que deve atender a legislação da prefeitura muni
cipal ou do Distrito Federal, quando for o caso. presa industrial', por exemplo — apesar de ser ex
pressão por excelência da iniciativa privada — dei
Pois bem, em complemento às diretrizes fede xa de ser uma questão apenas do interesse do ho
rais que defluem do corpo do Código civil ou do Có mem de negócio, para sofrer restrições de ordem sa
digo penal, outras há que decorrem, por exemplo, nitária e para fins de proteção do meio ambiente, e
do poder-dever que tem o governo federal não só passa a depender até de parâmetros de caráter
de estabelecer "norm as gerais de proteção da saú econômico-social, visando a não se perturbar a eco
de", mas de traçar e executar "planos nacionais" vi nomia geral de mercado, creio que as questões li
sando a realizar o mesmo fim. gadas à vida e ao progresso das cidades assumem
Não se pode, pois, estranhar que o legislador tão vasta e poderosa relevância, que é natural que
federal, ao elaborar a citada lei 6.766/79, haja 'im se transcendam certas pretensões de um localismo
perativamente' proibido o parcelamento do solo: - anacrônico, para situar-se o assunto segundo uma
"em terrenos alagadiços e sujeitos a inundações, an visão integrada, na qual os poderes das partes se
harmonizam com os do todo.
tes de tomadas as providências para assegurar o es
coamento das águas" (art. 3o, parágrafo único, II); É claro que essa integração, que não pode ser
— "em terrenos que tenham sido aterrados com ma indiscriminada e granítica, implica esferas distintas
terial nocivo à saúde pública, sem que sejam previa de ação, e 'limites recíprocos de poder', tal como irei
mente saneados" (art. 3?, parágrafo único, III). enunciando, ao longo do presente Parecer.
Na mesma ordem de idéias, a proteção espe
cial que a Carta Maior prevê, em seu art. 180, para
certas áreas, ou, ainda imperativos de saúde públi Definições legais e normas
ca legitimam que, na mesma lei, 'se vedem' (e a proi programáticas
bição tem como destinatários tanto os municípios
como os munícipes) edificações: "em áreas de pre Segundo é referido na Consulta, teriam sido
servação ecológica ou naquelas onde a poluição im movidas críticas ao texto do Projeto de lei submeti
peça condições suportáveis, até a sua correção". do a meu exame (texto aprovado pelo grupo de tra
balho, a 31 de agosto de 1982) focalizando os se
Poderia continuar a enumeração de outros pre guintes pontos: a) impropriedade da existência de
ceitos da lei n° 6.766/79 e, outrossim, da lei n? 6.938, definições em lei; b) inadmissibilidade de fixação de
de 31 de agosto de 1981, que fixou a política nacio critérios em lei federal, sobre o que se deva enten
nal do meio ambiente, pára demonstrar que é ine der por área urbana e suas discriminações.
gável uma 'ampla faixa de competência privativa da
União em matéria de desenvolvimento urbano'. Quanto à primeira questão já se acha, há muito
tempo, superado o preconceito contras as definições
Emerge, desse modo, do bojo da legislação legais, mesmo no sistema do direito pátrio. Uma das
pátria um 'sistema nacional de normas' que torna o características da legislação do Estado intervencio
'desenvolvimento urbano' uma das expressões, e nista consiste, exatamente, em se contrabalançar es
das mais relevantes, daquela ampla competência se poder de interferência com a precisa determina
que, no art. 8 o, V, da Constituição, se enuncia co ção conceituai dos termos empregados pelo legis
mo sendo a de "planejar e promover o desenvolvi lador.
mento e a segurança nacional", completada, no item
XIV do mesmo artigo, com expressa referência a Nos Estados Unidos da América, em virtude
"planos regionais de desenvolvimento". de um objetivo racional de precisão tecnológica, alia
do ao propósito de uma clara salvaguarda da inicia
Se, além disso, invocarmos a previsão de um tiva deixada aos particulares, já se tornou usual um
rol de 'definições legais', cuja finalidade, destarte, é cia de 'modelos abertos' tem como conseqüência
atender a imperativos de ordem técnica e jurídica. igual relevância quanto às 'normas programáticas',
No Brasil seria fácil invocar múltiplos exemplos de pedindo vênia para transladar o seguinte tópico: "Na
leis que obedecem à mesma orientação, bastando legislação de nossa época, estamos, por exemplo,
lembrar três exemplos recentíssimos: 1?) a lei n° atribuindo cada vez mais valor às normas programá
6.729, de 28 de novembro de 1979, que dispõe so ticas, cujo conceito muda de conteúdo na Técnica
bre concessão comercial entre produtores e distri Jurídica mais recente. Também há poucos anos,
buidores de veículos de via terrestre, cujo art. 2o se quando se falava em norma programática, havia
destina, exclusivamente, a enunciar o que se consi uma espécie de sorriso no jurista prático, quase que
dera 'produtor', 'distribuidor', 'im plem ento', 'com a dizer: norma programática é norma ética, é nor
ponente' etc.; 2o) a lei n° 6.766, de 19 de dezembro ma moral, sem nenhuma obrigatoriedade jurídica".
de 1979, já citada, cujo art. 2° distingue entre 'lotea-
mento' e 'desmembramento', dando os respectivos "N o entanto, hoje cresce dia a dia a importân
conceitos; 3o a lei n° 6.938, de 31 de julho de 1981, cia das chamadas normas programáticas, que são
sobre política nacional do meio ambiente — da qual aquelas que fixam diretrizes para todos, inclusive pa
o Projeto examinado é, no fundo, um complem en ra o legislador, se se trata de normas constitucionais;
to natural - , destinando-se o seu art. 3o a esclare mas que impõem vias de execução ao aplicador do
cer o que se entende por 'meio ambiente', 'degra Direito, se se trata de normas complementares ou
dação da qualidade ambiental', 'poluição' etc. ordinárias. Se a norma programática é de natureza
constitucional, dirige-se a todos, indistintamente,
Vê-se, por conseguinte, que a objeção não re desde o legislador até o juiz e o advogado; se ela se
siste à mais superficial análise. insere na legislação complem entar ordinária, repre
De outro lado, a asserção que às vezes se faz senta um limite, e, ao mesmo tempo, uma norma
de que as 'normas programáticas' não compõem de orientação, tanto no m omento da exegese como
propriamente o 'corpo das leis', é de uma inconsis no da aplicação do Direito, para superamento dos
tência alarmante, correspondendo a uma fase de su conflitos de interesses" (obra citada, p.63).
perado e estreito positivismo, unido a um falso con Tal fato já fora, aliás, notado por Pontes de M i
ceito de vigência e eficácia do direito. randa desde os seus Comentários à Constituição de
Podemos afirmar que, ao contrário, na socie 1946, com observações reproduzidas Comentários
dade contemporânea, dadas as suas freqüentes mu à Carta de 1967, onde se lê que o emprego de 'nor
tações e a complexidade dos problemas abrangidos mas constitucionais programáticas' tem suas raízes
pela norma legal, vem-se dando cada vez mais pre na Constituição alemã de Weimar, 1919, repercutin
ferência aos standards, ou ao que denomino 'm o do em todos os estatutos políticos brasileiros sub
delos jurídicos abertos' (conforme O direito como ex seqüentes.
periência, São Paulo, 1958).
A seu ver, o que as caracteriza é o fato de não
Se em matéria penal ou tributária, a salvaguar fixarem 'fins precisos', limitando-se a dizer "para on
da dos direitos da pessoa e de seu patrimônio exige de se vai e com o se vai". Após dar esse conceito,
modelos cerrados' ou precisos, visto não poder ha a meu ver por demais vago, o saudoso jurisconsul
ver pena nem tributo sem lei anterior que tipicamente to adverte que a programaticidade de algumas re
os determine, nos demais campos do direito, e so gras não as priva de validade e eficácia, ou, consoan
bretudo no direito constitucional e administrativo, te suas próprias palavras: "A s regras jurídicas pro
abundam as 'normas programáticas', equivalentes gramáticas são suscetíveis de cogência, desde logo,
a 'diretrizes de ação', ou destinadas a fixar a 'm edi se o contrário não se conclui da Constituição, que
da da competência adm inistrativa', segundo parâ as contém. Por isso mesmo, onde o princípio foi es
metros que, por relativa generalidade de seus enun tabelecido suficientemente, se há de entender já in
ciados, não fiquem expostas aos impactos de uma serto no sistema jurídico" (Comentários, cit., t. I
'sociedade em transformação'. (Nesse sentido, vi p. 127).
de W . Friedmann, El derecho en una sociedad en Isto que dizer que as disposições program áti
transform ación, tradução de Florentino M. Torner, cas são tão válidas e obrigatórias como as regras de
México - Buenos Aires, 1966; e Miguel Reale, Á fins precisos, das quais emanam desde logo obriga
dinâmica do direito numa sociedade em mudança, ções particularizadas.
e A sociedade contemporânea, seus conflitos e a efi
cácia do direito, em Estudos de filosofia e ciência do Biscaretti Di Ruffia, o ilustre constitucionalis-
direito, São Paulo, 1978, p.52 e segs. e 58 e segs.). ta da Universidade de Milão, oferece-nos conceito
mais nítido de 'normas programática', fazendo uma
Nesse segundo ensaio — reportando-me à distinção entre normas 'estritamente obrigatórias' ou
teoria dos modelos jurídicos exposta em O direito co 'de preceito' (precettive) - das quais resultam, di
mo experiência —, sublinho que a crescente exigên retamente, deveres a que correspondem ou não di
reitos ou interesses legítimos - e 'normas progra sidência, produção e serviços (urbanizações primá
máticas' que se limitam a 'enunciar a necessidade' ria, secundária e de infra-estrutura terciária) bem co
de serem aplicadas quando ocorrem eventuais ati mo ao planejamento territorial a nível intercomunal"
vidades futuras (Diritto constituzionale, 8.ed., Ná- (obra citada, p .139).
pole, 1968, p.88). Como se vê, o princípio da autonomia m uni
Biscaretti Di Ruffia dá exemplos aplicáveis aos cipal não é de empecilho à edição de regras gerais
objetivos que temos em vista esclarecer, quando sa que interessam à 'urbanística' em todo o território
liente que as 'normas programáticas' ou 'diretrizes' nacional.
podem ser emanadas para serem seguidas: a) quan
Tal constatação assume relevante significado
do forem editadas outras normas de grau subordi especialmente nos países de estrutura federativa,
nado; b) ou, então, quando um órgão executivo ve quando a Constituição atribui à União competência
nha a agir no exercício de um poder discricionário privativa para promulgar 'normas diretivas de cará
(loc.cit.). ter geral', cuja 'execução direta ou concreta', tais se
Trata-se, portanto, de normas jurídicas dota jam as circunstâncias, somente caberá no entanto
das de cogência, não se resolvendo em meros pro- aos estados-membros ou aos municípios, ou a am
positos ou conselhos deixados à discrição de seus bos, conjuntamente.
destinatários, operando no corpo da Constituição Mais adiante voltarei a esse assunto, analisan
como regras de aplicação imediata — afirmando Jo do o delicado problema dos 'campos de ação' de ca
sé Joaquim Gomes Camotilho, da Universidade de da pessoa jurídica fundamental de nosso direito pú
Coimbra, que, se lhes negássemos obrigatoriedade, blico interno. Por ora, o que desejo assinalar é que,
"estaríamos a esvaziar o 'princípio da efetividade' do por suas próprias características e fins, as 'normas
que ele tem de mais progressista: a efetividade dos
federais nacionais, pertinentes ao desenvolvimento
direitos econômicos, sociais e culturais dos cida
urbano, ou mais genericamente ao direito urbanís
dãos" (Direito constitucional, Coimbra, 1980, p.247).
tico, são predominantemente programáticas', m ui
Pode-se concluir, à vista do exposto, que as to embora, em termos de executoriedade, possam
'normas programáticas', além de fixarem 'diretrizes também ser previstas regras excepcionais de fins
gerais', configuram determinado 'padrão ou medi 'precisos e imediatos', o que me leva, mais uma vez,
da' de agir, destinados a serem obedecidos pelos in a alterar a ordem de resposta aos quesitos form ula
divíduos ou pelos órgãos estatais, 'toda vez que, no dos para passar logo a considerar a última questão
plano factual, tiverem de decidir algo correspondente proposta.
à hipótese nelas genericamente prevista'.
Pois bem, as categorias das normas programá
ticas não são privativas do direito constitucional mas
se estendem a todos os campos da experiência jurí
Limites do sistema nacional de
dica e, de maneira especial, aos domínios do direito desenvolvimento urbano
administrativo.
As conclusões desta parte de meu Parecer já
É, por sinal, na esfera do que os mestres ita estão implícitas no que acabo de expor, e se com
lianos denominam 'urbanística' que se faz notar a padece com o propósito exposto na Consulta no
exigência de regras de natureza programática, de sentido que "a diretriz do Ministério do Interior é a
conformidade com o que é ponderado pelo profes utilização das entidades existentes em qualquer ní
sor Gustavo Vignocchi, catedrático de Bolonha, o vel da administração pública e não a criação de no
qual, depois de assinalar o predomínio crescente do vos organismos".
poder central, nesse campo, distingue entre "planos
Se, todavia, esse objetivo se harmonizar ple
dotados de prevalecente natureza programática, tais
namente com normas programáticas ou diretrizes
como os planos reguladores gerais ou os programas
gerais, resta ver se, ao enunciá-las, o Projeto de lei
de edilícia (ao direito de construir, em geral, e suas
analisado não ultrapassou o campo da com petên
limitações, observo eu) e os planos de prevalecente cia federal, que, em última análise, se consubstan
eficácia executiva, tais como os planos particulari cia no poder de: a) editar normas gerais, visando os
zados e, sob vários aspectos, os planos de loteamen- fins todos lembrados ao tratarmos dos poderes ex
to " (Novissimo digesto italiano, verbete 'urbanísti plícitos e implícitos da União em matéria de desen
ca', 1957, vol. XX, p .142).
volvim ento urbano; b) cooperar com os órgãos es
O professor Vignocchi já esclarecera antes que taduais e municipais, para que as diretrizes nacionais
as normas programáticas têm, entre outras, a fina se concretizem, individualizando-se segundo as li
lidade de "fixar standards urbanísticos mínimos, des nhas de peculiar interesse de cada estado ou m uni
tinados a assegurar uma correta proporção entre re cípio; c) fiscalizar a aplicação das normas gerais es
tabelecidas; d) aplicar sanções, toda vez que suas quando, via de regra, evitaram enunciados genéri
diretrizes forem transgredidas. cos e criticáveis, tal como se.. dá ao conferir-se à
Consoante se vê, se os itens b, c e d supra União poderes para: "estabelecer (s/c) e regulamen
configuram certa forma de execução direta da lei — tar as aglomerações urbanas localizadas em mais de
nada impede, além do mais, que a União urbanize uma unidade da Federação, ouvidos os estados e
certas áreas, 'de seu dom ínio', para fins de desen municípios interessados" (art. 14,V).
volvimento e de seguranças nacionais —, verifica Na realidade, o que compete à União, e está
mos que o que prevalecem são normas programá no espírito do Projeto, é 'promover' o estabelecimen
ticas que constituem, por assim dizer, os 'macromo- to de tais aglomerações, só podendo fazê-lo com a
delos' a serem reduzidos aos 'concretos modelos anuência prévia dos estados e municípios interessa
municipais'. dos, salvo se as terras abrangidas forem devolutas
Cabe ponderar que entre a União e os m uni da União.
cípios se intercalam os estados, aos quais se deve O mesmo se diga quanto aos dispositivos que
atribuir os mesmos 'quatro poderes' acima discrimi conferem poder aos estados para análogas interfe
nados, substituídas, é óbvio, as 'normas gerais na rências (art. 15, IV e VI).
cionais' por 'normas gerais regionais'. No caso do
estado, porém, prevê a Constituição uma situação Além disso, é de toda conveniência que se ex
especial e definida, que é a das regiões m etropoli plicite sempre que possível a que 'poder público' o
tanas, em virtude das quais as comunas integradas legislador pretende se referir. Assim, por exemplo,
em um mesmo contexto urbanístico têm a sua 'au me parece que só possa caber ao município 'esta
tonomia enfraquecida', ou affievolita, consoante ter belecer' (ou seja, 'executar' e 'aplicar', in concreto,
minologia dos administrativistas italianos. É que, em os critérios gerais postos pela União) os diversos ti
razão de interesses superiores comuns, cada m uni pos de áreas discriminadas no art. 12. Por sinal que,
cípio deve conform ar o seu modo de agir às ativida segundo me parece, é a esse artigo e seus itens II
des dos demais, sob a supervisão do estado, o qual, e III que se reportam o item V do art. 14, e, parale
desse modo, passa a interferir em assuntos origina lamente, o item V do art. 15, ambos consagradores
riamente 'de interesse peculiar local' que se torna de interferências, no meu entender, desnecessárias
ram, por força das circunstâncias, de 'interesse pe e indébitas no plano municipal.
culiar transmunicipal': é que 'desenvolvimento urba
Nesta matéria, em suma, não devemos olvidar
no' tem, visto esse exemplo expressivo, como con
essa precisa lição do ilustre Francisco Campos: "Im
sequência superar estruturas tradicionais para que,
plícita ou expressa, é consubstanciai a ele [ao regi
através de órgãos e providências comuns, se salva
me federativo] a regra de que nenhum dos poderes
guardem novos interesses e direitos
ou dos governos, de cuja associação se compõe a
Basta, todavia, lançar os olhos para outras sua unidade, deve interferir nas atividades legítimas
áreas, não enquadráveis no modelo constitucional do outro, nem diretamente, nem por vias indiretas,
das regiões metropolitanas, para dever-se indentifi- oblíquas ou furtivas, poderá criar óbices, embaraços,
car a existência de situações — como por exemplo tropeços, ou empecilhos ao exercício das suas fu n
a da Praia Grande, ou a de certas cidades contíguas ções constitucionais, e, sobretudo, onerar, de qual
do Vale do Paraíba — para se ter de reconhecer que quer maneira, dim inuir ou destruir a eficácia dos
se casam à letra e ao espírito da Constituição vigen meios ou instrumentos necessários ou adequados à
te, operacional e socialmente interpretada, providên ação dos seus órgãos na órbita constitucional da sua
cias legislativas federais e estaduais que, de um pon competência". (Direito constitucional, citado, p. 19
to de vista transmunicipal e transestadual, fixem cri e seg.)
térios e_padrões de desenvolvimento urbano que, re
Feitas as ressalvas supra-indicadas, parece-me
pito, não é senão uma das modalidades do desen
que o Projeto atende a esses mandamentos.
volvimento em geral.
Á luz desses princípios, o que dispõe o Proje Essa orientação comedida prevalece ao ser
to de lei examinado, em seus capítulos II e III, obe proposta a instituição de um Sistema Nacional de
dece de maneira geral às linhas de 'distribuição de Desenvolvimento Urbano, no capítulo V do Proje
competência', que, em última análise, se reduzem to, tanto assim que os seus elaboradores, m uito ju
a uma graduação entre 'níveis de programação' e ní diciosamente, conferiram aos seus órgãos superio
res, 'não funções propriamente de execução direta',
veis de execução', devendo esta ser preservada ao
mas sim as de "I - 'propor' a Política Nacional de
município toda vez que a aplicação das diretrizes ge
Desenvolvimento Urbano e de 'acom panhar sua
rais tiver de adequar-se às peculiaridades de seus in
teresses, segundo poder discricionário próprio. execução'; II — 'prom over' (ou seja, diligenciar) no
sentido do cumprimento das diretrizes da política na
Andaram bem, pois, os redatores do Projeto cional de desenvolvimento urbano (art.37)".
É pela mesma razão que me parece damasia- É essa a razão pela qual o antigo instituto da
do amplo o objetivo inicial do item I do art. 1?, com desapropriação por 'utilidade pública , subordinado
o emprego da expressão vaga "sistema nacional de a fins precisos cuidadosamente enumerados, veio a
cidades", quando o que se quer dizer, acorde com ser completado pelo da expropriação por 'interesse
os lineamentos básicos do Projeto, é apenas e tão social', como reza o § 22 do art. 153 da Carta Mag
somente "I - adequada distribuição espacial de sua na. É exatamente esse amplo conceito de 'interes
população e de suas atividades econôm icas e se social' que veio progressivamente se explicitan
culturais". do, com configurações diversas ditadas pelos fatos
e valores sociais.
Não creio que se tenha em vista subordinar es
É mais um aspecto da política do direito do Es
sa adequação a um modelo comum ou uniforme,
tado intervencionista, realidade inamovível de nos
pois o Brasil é um país plural na raiz de sua história,
so tempo, abstração feita de vinculação a esta ou
de seus fatores mesológicos e sociais, não com por
àquela outra diretriz socialista. O fenômeno é, a bem
tando o figurino de uma cidade ideal.
ver, mais genérico, brotando tanto da força das
Da mesma forma quando se põe, entre as di idéias como do impacto dos fatores tecnológicos
retrizes gerais, o "controle da valorização da proprie que promoveram a transferência em massa das po
dade urbana", na realidade o que se quer enunciar pulações dos campos para as cidades, e, dentro des
são "medidas tendentes a evitar distorções na va tas, a necessidade de se assegurar qualidade de vi
lorização da propriedade urbana". O termo 'controle da condizente com nosso estágio de civilização.
de valorização' dá ensejo a indébitas interferências
O que se nota é uma crescente ampliação do
no plano da vida econômica, extrapolando da temá
conceito de 'interesse social' como razão legitima-
tica urbanística, para invadir o campo da economia
dora da expropriação, excogitando-se sempre, po
e das finanças.
rém, meios e modos idôneos a assegurar 'justa in
denização' a quem seja obrigado a privar-se de um
bem integrado em seu patrimônio.
Limites ao direito de propriedades
Destarte, o Projeto examinado não inova em
decorrentes do desenvolvimento vários pontos, mas antes segue vias jurídicas já tran
urbano qüilas, como a que assegura ao poder público a ca
pacidade de desapropriar áreas urbanas ou rurais,
É pacífico, hoje em dia, tanto na doutrina co
não para executar serviços públicos de sua alçada,
mo na jurisprudência, que, além das limitações já es
mas para fins de reurbanização, com implícita e le
tabelecidas pelo Código civil quanto ao 'direito de
construir' por motivos de segurança ou em razão de gítima faculdade de revenda da área remanescente
interesses e direitos de vizinhança, 'outras restrições a terceiros, como forma não só de embelezamento
citadino, mas também de distribuição social do di
advieram' como exigências imperiosas ao desenvol
reito de acesso à propriedade.
vimento urbanístico. O 'direito de construir' está, ob
viamente, fora dos objetivos deste Parecer, tendo si Relembradas essas diretrizes de política do di
do a matéria versada com acuidade por Hely Lopes reito, cada vez mais consagradas nas iegislações ho
Meirelles, em conhecida monografia. diernas, bastará enumerar algumas das novas cate
A idéia da cidade como um 'bem cultural', e gorias jurídicas que, no seu conjunto, atendem às
não apenas como informe aglomerado de pessoas, atuais exigências urbanísticas, e que se acham dis
criminadas no art. 17, item III do Projeto.
em consonância com o princípio constitucional da
'função social da propriedade', teve como conse No que se refere ao direito real de 'superfície',
qüência a elaboração de institutos e figuras jurídicas, observo que se trata de antigo modelo jurídico do
cuja finalidade é adequar a propriedade individual à Direito Romano que, depois de ter caído em desu
nova imagem da realidade urbana, o que, natural so, ganha novamente foros de atualidade, pela ne
mente, não pode deixar de suscitar reações por parte cessidade crescente de separar-se o direito de pro
dos que se apegam a superadas prerrogativas priedade de um imóvel do direito de nele construir
individualistas. ou exercer atividades outras. Essa matéria, como é
lembrado num dos anexos, constitui objeto dos arts.
È natural que essa nova compreensão do di
1.401 usque 1.408 do Projeto de Código civil, com
reito de propriedade esteja presente e atuênte num
relatório geral já oferecido pelo ilustre deputado Er-
Projeto de lei, cujo escopo precípuo é estabelecer e
nani Satyro.
assegurar as linhas dominantes de nosso desenvol
vimento urbanístico, o qual não pode ser alcança Trata-se de matéria de direito civil e, a meu ver,
do sempre com a anuência ou a espontânea cola não se justifica a sua inserção numa lei destinada a
boração dos titulares do domínio. disciplinar o desenvolvimento urbano, mesmo por
que, sem razão, se restringe o uso da superfície ao de alienar, constituída em virtude de acordo entre as
direito de construir. A redação mesma não a julgo partes, cada uma delas no exercício da 'autonomia
feliz, pois, na superfície, o titular do domínio não ou da vontade', e é imposta ao comprador de um bem
torga, mas confere direitos a outrem , havendo ou a obrigação de oferecê-lo ao vendedor, se vier a ven
tras impropriedades, como a dispensável declaração dê-lo ou dá-lo em pagamento, para que o aliénante
de que a transferência aos herdeiros se dá "com o use de seu direito de prelação na compra, tanto por
os demais direitos reais, registrando-se a transferên tanto.
cia"
Bem diversa é a figura que o Projeto de lei visa
Se se julgar devam ser incluídas no Projeto de a estabelecer sob o nome de preempção. Não se tra
lei sobre desenvolvimento urbano regras sobre su ta de retorno do bem, num negócio jurídico condi
perfície, melhor será reproduzir, pura esim plism en- cionado, mas, antes, de um 'direito de preferência
te, as do Projeto de Código civil. Penso eu, todavia, estabelecido ex vi de lei municipal, quando o m uni
não seja aconselhável essa medida, porque o art. 17, cípio julgar indispensável determinado imóvel a 'fi
III, letra e da preposição normativa ora examinada nalidade de interesse público' e ele se situar dentro
já prevê "o direito real de concessão de uso". Ora, de área previamente delimitado.
este direito não é senão o 'direito de superfície' quan
do constituído por pessoa jurídica de direito públi O paralelismo com o ato de 'declaração de utili
co, e é a essa figura que faz alusão o art. 1.408 do dade pública' é palpável, só que este, de conform i
Projeto de Código civil, reproduzido como art. 27 no dade com a respectiva lei de expropriação, pode ser
Projeto de lei em apreço. objeto de decreto do Executivo, enquanto que, pa
ra que se constitua o 'direito de preferência' a favor
Como saliento na Exposição de M otivos do do município, haverá sempre necessidade de lei: em
P ro je to de C ód igo c iv il, um a das causas de ambos os casos, porém, o poder público limita o di
disciplinar-se o direito de superfície, além de suas vir reito de propriedade, instituindo ab extra uma situa
tudes próprias, foi das supedâneo de direito real a ção que altera a configuração do domínio e a dispo
'concessão de uso' tal como é regida pelo decreto- nibilidade econômica do bem.
lei n? 271, de 28 de setembro de 1967 e que, penso
eu, não foi revogado nessa parte pela lei n° 6.766/79. O referido 'direito de preferência' vem limitar, não
há dúvida, a livre disposição da coisa, por parte do
'Concessão de uso' é o termo adotado, por in proprietário, criando exceção ao princípio da livre cir
fluência do direito administrativo, para designar o 'di culação das riquezas, mas essa limitação resulta de
reito de superfície', quando o seu titular é uma pes 'interesse social', que a Carta Magna expressamente
soa jurídica de direito público. É mais uma emigra prevê, de maneira genérica.
ção de modelos jurídicos de um a outro campo do
direito, como acontece também com as chamadas 0 que talvez cause estranheza é o procedimen
'concessões comerciais'. to através do qual o direito de preferência se desdo
bra no tem po, mas — 'e este é o ponto nuclear' —
Por essas razões, tenho para mim ser dispensá 'ao proprietário não é imposta a obrigação de acei
vel disciplinar o direito de superfície no Projeto de lei tar o preço judicialmente arbitrado', o que ocorreria
aqui analisado. se o município optasse desde logo pela 'desapropria
ção por interesse social'. Vejamos com o a apuração
No que se refere aos dois problemas correlatos
se desenvolveria, consoante previsto no art. 33 do
— a 'edificação compulsória' e o direito de 'preemp-
Projeto: 1o) o proprietário, tendo comprador do imó
ção' — parece-me que ambos, da forma com o fo
vel por preço certo, notifica à prefeitura a fim de que,
ram concebidos, não padecem de eiva de inconsti- no prazo de trinta dias, manifeste sua opção de com
tucionalidade.
pra; 2?) se o município se desinteressar, realizar-se-á
A mim me parece que essas figuras jurídicas, pre livremente a alienação pelo preço convencionado;
vistas no Projeto examinado, correspondem a duas 3) se houver discordância quanto ao preço, proce-
formas distintas de aplicação de desapropriação por der-se-á o arbitramento judicial, podendo tanto o
utilidade pública ou por interesse social, pois é no município com o o proprietário desistir do negócio,
âmbito desses institutos que elas se contêm. cabendo àquele o pagamento das custas; 4?) se a
desistência fo rd o município, o proprietário, no pra
No plano do direito privado, conform e estatuído zo de um ano, poderá realizar a alienação pelo pre
nos artigos 1.149 usque 1.157 do Código civil, a ço judicialmente arbitrado, monetariamente corrigi
'preempção' ou 'preferência' resulta de cláusula li do.
vremente estipulada pelo vendedor e o comprador,
Como se vê, o que se estrutura é um processo
pela qual subordina a condição compulsória à vista
de evento futuro. condicionador do direito de preferência assegurado
ao poder público municipal, 'para fins sociais', pro
Trata-se pois de uma cláusula restritiva do poder cesso esse que, de um lado, salvaguarda o municí
pio, não o obrigando a aceitar preço excessivo, que lei municipal, em prazo que não poderá ser inferior
poderia ser maliciosamente majorado; e de outro sal a dois anos, sob pena de, não o fazendo, ser o ter
vaguarda o proprietário, não obrigado a concordar reno desapropriado, facultando-se sua alienação a
com o resultado do arbitramento. terceiro que se comprometa a cumprir a obrigação.
Embora me pareça constitucional o sistema en No fundo, é uma variante do já reconhecido po
genhosamente proposto, não devemos nos esque der que tem o município de expropriar áreas, reur-
cer que, em se tratando de restrição ao direito de banizá-las, e revender a terceiros, sem que ao pro
propriedade, ainda que por imperiosos motivos de prietário assista o direito de prelação previsto no art.
ordem social, o prazo de preferência deve ser limi 1.159 do Código civil.
tado. Dez anos me parecem excessivos, talvez sen
A presente hipótese, tanto como a anterior, im
do aconselhável fixar o prazo de cinco anos, previs
plica um 'balanceamento de valores', ambos sob
to para a validade da declaração de utilidade públi
proteção constitucional: de um lado, temos o direi
ca, proibida a prorrogação.
to de propriedade que abrange o de usar e dispor li
De outro lado, se arbitrado o preço o município vremente da coisa possuída; e de outro, o direito que
desinteressar-se pela compra, por que sujeitar o pro tem a administração de desapropriar por utilidade
prietário a vender: a) pelo preço arbitrado, se ele con pública ou interesse social, caso em que cede o di
seguir melhor oferta; b) a esperar o decurso do pra reito anterior ante a emergência do bem comum. O
zo de um ano? A recusa do município deveria im princípio que, em tais casos, opera como 'fator di-
portar ipso facto na livre e imediata disponibilidade ferenciador', é o da 'função social da propriedade',
do bem, consoante regra dominante, de valor tan diversamente entendida conform e prevaleçam ra
to jurídico quanto econômico. zões individualistas ou de socialidade. Se, há pou
cos anos, o art. 1.150 da Lei Civil assegurava o 'd i
Finalmente, no tocante à última questão ainda
reito de retrocessão', sempre que a União, o esta
não examinada, relativa ao 'parcelamento, edifica
do e o município não dessem ao imóvel "o destino,
ção' ou 'utilização compulsórios' de terrenos urba
para que se desapropriou", já hoje, consoante já o
nos vagos para atender a plano de uso do solo, apro
lembrei, a doutrina e a jurisprudência já traçaram jus
vado por lei municipal, conform e nesta se determi
tos limites a essa norma, fazendo prevalecer os im
nar (arts. 28 e segs.), parece-me que militam no sen
perativos do bem púb lico sobre os interesses
tido de sua constitucionalidade as mesmas razões de
individuais.
direito que, mutatis mutandis, foram evocadas no
parágrafo anterior. È sob esse prisma que deve ser recebido e anali
sado o Anteprojeto de lei de desenvolvimento urba
Trata-se, ainda aqui, de uma 'restrição ao direi
no submetido a meu exame.
to de propriedade', cuja legitimidade resulta não só
de sua 'função social', mas também dos objetivos É o meu parecer, s.m.j.
concretos de 'interesse social' que as inspira.
A bem ver, o que o Projeto propõe é que o pro São Paulo, 25 de outubro de 1982
prietário mesmo, sozinho ou conjuntamente com
terceiros, 'realize o plano urbanístico', aprovado por (a) Miguel Reale