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29112023, 16:17 Sobre Lukas ¢ a poliica ~ PCB — Partido Comunista Brasileiro (https://pcb.org.br/portal2/) = BUSCA Sobre Lukacs e a politica 3 de marco de 2011, Lukacs jogou todo o sentido de sua vida, a partir de 1918, quando ingressou no Partido Comunista htingaro’, na elaboracado de uma obra inscrita na vertente do que ele designou como marxismo ortodoxo, um marxismo visceralmente distinto do marxismo vulgar, entéo dominante e generalizado pela Segunda Internacional (a velha Internacional Socialista). O marxismo ortodoxo de Lukacs, na medida em que se funda numa particular articulacdo entre a teoria e a pratica’, implica de modo necessdrio uma dimensado imanentemente politica no conjunto da obra construida no seu marco; como Carlos Nelson Coutinho escreveu, [...mesmo a grande Ontologia - ainda que, de suas 1.200 paginas, somente cerca de 40 sejam dedicadas de modo explicito a analise Filoséfica da praxis politica — foi programaticamente concebida como um ato de intervencao politica; ao buscar liberar o marxismo de suas deformacées stalinistas e neopositivistas, a obra visava a contribuir para um” renascimento do marxismo”, para a retomada de um auténtico socialismo no mundo.? Entendemos que esse traco essencial vinca o complexo tedérico erguido por Lukacs em mais de meio século da atividade intelectual, ou seja: a sua obra Filos6fica e estético-critica elaborada a partir de 1918, sem prejuizo de suas especificidades tedéricas, esta saturada de entonacao politica. Duas referéncias, que tomamos aqui como simples ilustragGes, podem esclarecer esta determinacao. hitpsipc.org.briportl2s1258 8 29rt12028, 18:17 Sobre Lukdcs ea poltica - PCB — Partido Comunsta Brasileiro A partir da entrada dos anos 1930, quando Lukacs ja pensava — antes do VII Congresso da Internacional Comunista (1935), que superou intempestivamente o grave equivoco da palavra de ordem “classe contra classe” — tanto a luta antifascista quanto a estratégia de transi¢ao ao socialismo na ética da unidade (centralizada pela classe operaria) das Forgas populares e democraticas, a sua elaboracao estética e critica relativa ao romance revela-se fortemente enlacgada ao seu pensamento politico. Quer concebendo a forma romanesca como a estrutura particular, quer recuperando o significado do realismo burgués - v.g, O romance histérico (1937), Escritos de Moscou (1933-1944)* -, Lukdcs repée, no plano tedrico, as exigéncias da politica das frentes populares. Também nos anos 1930, quando Hegel era instrumentalizado mistificadoramente pelos idedlogos do fascismo, a interpretacao lukacsiana da sua obra (O jovem Hegel e os problemas da sociedade capitalista, concluido em 1938 e publicado dez anos depois) mostra-se solidaria com o empenho de resgatar os contetdos humanistas e democraticos do pensamento burgués anterior a 1848, quando a burguesia, enquanto classe, experimenta a inflexdo — analisada por Lukacs no aspero A destrui¢ao da razdo (1954) - que a conduzira a “decadéncia ideoldgica”. Nestes dois passos, ha a notar, enfaticamente que: 1) a critica literaria e Filos6fica lukacsiana no se reduz com essa dimensdo politica; se ela, sem duvidas, impés-lhe alguns limites, permitiu-lhe também ampliar e densificar categorias tedricas, enriquecendo o acervo analitico da forma literério-romanesca e de romancistas e o patriménio heuristico dos estudos hegelianos; 2) 0 fio da concepcao politica lukacsiana nao vulnerabilizou somente a(s) ideologia(s) burguesa(s), mas Feriu também a escolastica do dogmatismo da era stalinista que instaurava — seja problematizando a utilizagao pragmatica e rasteira do realismo socialista, seja demonstrando a inépcia da caracterizagao de Hegel como pensador reacionario. Em resumo: a obra marxista de Lukacs, em que pesem os giros efetuados pelo Fildsofo desde 1918, jamais esteve, do ponto de vista do seu contetdo essencial, alheia 4 dimensao politica. hitpsipc.org.briportl2s1258 2138 29rt12028, 18:17 Sobre Lukdcs ea poltica ~ PCB ~ Partido Comunsta Brasileiro Ha, todavia, no conjunto dessa obra, um estrato que, indiscutivelmente, pode ser caracterizado como eminentemente politico, refigurando um processo de evolucdo e acumulo que articularé a concepg¢ao politica madura de Lukacs. Constitui-o um elenco significativo de fontes (ensaios, conferéncias, artigos curtos, entrevistas) nas quais a atencao do filésofo volta-se diretamente para a problematica politica em sentido estrito, enfrentando até as “questées do dia”. Nao se trata de um elenco textual homogéneo, e uma avaliagao abrangente, fundada numa anilise inclusiva desse elenco, revelaria nele pelo menos trés momentos distintos. O primeiro momento abre-se com os textos elaborados por Lukacs entre a proclamagdo da Comuna hungara (marco de 1919)® e a “agdo de mar¢o” (1921) dos comunistas alemdes e a sua completa derrota em 1923’, periodo em que Foi presenga marcante na revista Kommunismus? e publicou Tatica e ética (sua primeira coletanea marxista, 1919) e Histéria e consciéncia de classe (1923). O messianismo revolucionario de que estava imbuido o filésofo® conduziu-o a um utopismo radical e a tomadas de posi¢ao tais que Lenin nao hesitou em considera-lo “esquerdista”; messianismo e utopismo, por outra parte, que se colavam teoricamente numa particular leitura da obra de Rosa Luxemburg. A época, Lukécs via a revolucdo proletaria como processo imediata e universalmente em curso’ e compreendia, neste processo, 0 Partido Comunista - expressao mais alta da consciéncia de classe do proletariado, tomado este enquanto o sujeito que introduziu um sentido na historia - como organizador demitirgico da passagem da “pré-histéria da humanidade” ao estagio da emancipagdo humana. Este momento da constitui¢ao do pensamento politico de Lukacs (nutrido, ainda, pelo principismo eticista préprio de um intelectual que, oriundo de Familia e educacao aristocratizadas e aristocratizantes, renuncia conscientemente a sua origem e condicdo de classe e corajosamente salta para a trincheira oposta nas lutas de classes) comeca a esbater-se a partir de meados dos anos 1920. O “esquerdismo” de Lukacs comeca a derruir-se. hitpsipc.org.briportl2s1258 3138 29rt12028, 18:17 Sobre Lukdcs ea poltica - PCB — Partido Comunsta Brasileiro Do ponto de vista ideolégico, a critica de Lenin impressionou-o profundamente - e, escrevendo um pequeno ensaio logo na sequéncia da morte do lider bolchevique (O pensamento de Lenin, 1924), Lukacs vé-se no inicio de um ajuste de contas consigo mesmo para defrontar-se com o antiutopismo leniniano -, conduzindo-o a repensar as suas tomadas de posi¢ao no sentido do que chamou de “realismo revolucionario”. Por outra parte, ja antes, o Ill Congresso da Internacional Comunista (junho- julho de 1921), de que Lukacs participou, em Moscou, pressionara claramente o “esquerdismo”, colocando na ordem do dia a “frente unica proletaria” e reconhecendo o refluxo da maré revolucionaria — nas palavras de Lenin, “ha que pér Fim a ideia de assalto {ao Estado burgués] e substitui-la pela ideia de assédio”", Mas é no seu IV Congresso (Moscou, dezembro de 1922), que a Internacional Comunista consolidou a nova orienta¢ao, realgando que o mundo capitalista experimentava uma “relativa estabilidade”. Foi,contudo, a pratica politica no interior do partido hingaro, na qual ele estara medularmente comprometido, com sua atividade dirigente, que responde pela rotacao das concep¢ées politicas de Lukacs.'2 Com efeito, entre a morte de Lenin e o II Congresso do Partido hingaro (1929), Lukdcs é um dos responsaveis pela dire¢ao do Partido, brutalmente reprimido e posto na mais dura clandestinidade pelo regime protofascita de Horthy. Na luta interna que irrompe no Partido, Lukacs — Blum era seu “nome de guerra” — alinha-se com a lideranga de Jeno Kun, respaldada por importantes segmentos da direcao da Internacional Comunista. A luta interna se trava com aspereza e a repentina morte de Landler’3 pée Lukacs a Frente da oposicao: cabe-lhe oferecer, no II Congresso do Partido (1929), uma alternativa a linha de Béla Kun"4, 0 que obriga 0 filésofo a um estudo exaustivo das realidades hingara e internacional. Dai resulta o documento que apresenta ao Congresso, as célebres Teses de Blum, nas quais propée, como objetivo do Partido, no combate pela derrubada da ditadura de Horthy, nao uma republica conselhista (tal como a Comuna hungara de 1919), porém uma ditadura democratica de operarios e camponeses, cujo conteddo imediato e concreto nao ultrapassaria os quadros econémicos da sociedade burguesa‘®. Essa proposta, produto de um acurado estudo econémico-social e hitpsipc.org.briportl2s1258 4138 29rt12028, 18:17 Sobre Lukdcs ea poltica - PCB — Partido Comunsta Brasileiro politico da Hungria, expressava também a matura¢ao politica da adesdo de Lukacs ao comunismo, fomentada pela sua pratica partidaria e pelo seu melhor conhecimento das relagées internacionais. A proposta, todavia, era formulada no momento mesmo em que a Internacional Comunista, numa viragem espetacular operada no seu VI Congresso (julho-setembro 1928), substitui de Fato a politica da “frente Unica proletdria” por aquela da “classe contra classe”, justificando-a pela alteracao da conjuntura: a “estabilidade relativa” do capitalismo sucederia um novo periodo (0 “terceiro”), marcado pela sua “crise geral”, o que repunha — segundo a interpretacao da linternacional — a luta pela ditadura do proletariado na ordem do dia’®. Em suma: Lukacs operava um giro politico no sentido diametralmente oposto aquele a que se dirigia a nova orientacdo da Internacional Comunista - de Fato, a proposta lukacsiana antecipava, individual e, na realidade, solitariamente, uma plataforma que sé teria guarida no movimento comunista tardiamente, apds a ascensdo de Hitler, somente sendo abracada pelos comunistas depois da palavra de ordem da “frente ampla” tal como a apresentou G.Dimitrov no VII Congresso da Internacional Comunista (julho-agosto de 1935)."7 O resultado no poderia ser outro: uma Fragorosa derrota das Teses de Blum no congresso do Partido hiingaro, que obrigou Lukacs a uma autocritica insincera (1929)'® e o recolhimento em face da atividade politico-partidaria. A derrota do filésofo na luta interna, porém, marcou especialmente a ruptura do préprio Lukacs com suas concepgées utdpico-esquerdistas (ele reconheceu, explicitamente, que as Teses de Blum constituem uma “conclusdo”'9) e o passo ao segundo momento evolutivo do seu pensamento politico. A cconcepgao politica esbocada nas malogradas Teses de Blum faltava um substrato teérico-filos6fico — substrato que permitiria a Lukacs assenté-la com solidez e desenvolvé-la consequentemente. E esse substrato que comeca a desenhar-se entre 1930 e 1931, quando, estagiando em Moscou antes de transferir-se para a Alemanha, tem a oportunidade de estudar manuscritos hitpsipc.org.briportl2s1258 5138 29rt12028, 18:17 Sobre Lukdcs ea poltica - PCB — Partido Comunsta Brasileiro ainda inéditos de Marx e Engels (que viriam a luz em 1932: os Manuscritos econémico-filoséficos de 1844 e A ideologia aleméa) e de iniciar uma sistematica analise da obra de Lenin. Aestancia de Lukacs na Alemanha, entre 1931 e a chegada de Hitler ao poder, confrontando-o diretamente com a politica de “classe contra classe” - dos grandes partidos comunistas, talvez tenha sido o alem&o aquele que implementou mais radicalmente a orientagao do VI Congresso da Internacional. Escaldado pela derrota de Blum e continuando primordialmente preocupado em nao ser alijado da luta antifascista por um afastamento qualquer do movimento comunista, Lukacs combate aquela politica nos estreitos limites da sua atividade como critico literario - donde os seus debates acerca do impressionismo e contra o vanguardismo sectario da esquerda alema.2° Mas é no duro exilio na Unido Soviética que 0 seu pensamento politico ingressa mesmo num segundo momento evolutivo: ai ele embasara teoricamente a concepcao politica que, nas Teses de Blum, se encontrava ainda em statu nascendi. Justamente nesses anos, que vao de 1933 a 1945 — mais de uma década em que se entrecruzam os horrores do Fascismo, a plena instauragao do stalinismo e do seu terror e a guerra -, Lukacs consolidaré a sua concepcao politica madura. Do ponto de vista tedrico-filoséfico, ele se apropriara intensivamente do conjunto da heranca de Marx e Engels, superando os vieses que marcaram parte da sua elaboracao dos anos 1920; em especial, seus estudos histéricos e econémico-politicos erodem definitivamente os residuos do seu utopismo inicial; e também o aprofundamento de sua investigacao sobre a obra leniniana the propicia uma visdo mais rica e abrangente do carater unitario do marxismo como concepcao de mundo. Cumpre assinalar que, desde entao, Lenin se inscrevera no universo intelectual de Lukacs com uma centralidade que vai muito além da referéncia teérica e politica - centralidade que, desenvolvida depois de 1956, redundaré na entronizagao de Lenin como emblema para configurar a construcdo do “homem novo” anunciado pelo comunismo.”" hitpsipc.org.briportl2s1258 6138 29rt12028, 18:17 Sobre Lukdcs ea poltica ~ PCB — Partido Comunsta Brasileiro Também nesses anos estao as raizes da perspectiva tedrico-filoséfica do marxismo que, nos anos 1960, depurada e afinada, Lukacs explorara ao limite, designando-a como ontoldgica e postulando-a como a Unica capaz de, simultaneamente, guardar a fidelidade ao espirito de Marx e assegurar 0 desenvolvimento critico-criador do marxismo (nas palavras do Ultimo Lukacs, “o renascimento do marxismo”). Ainda aqui, contudo, foram as duras ligées da historia que conduziram a reflexao politica lukacsiana - de uma parte, a derrota das forcas democraticas e populares em face da instauracao do Fascismo e, doutra, a terrivel experiéncia do stalinismo. Se a primeira Foi objeto da sua investiga¢ao e resultou numa série de ensaios publicados ao longo do periodo e mesmo ulteriormente, a segunda teve efeitos e impactos duradouros, porém sé explicitados no pés-1956. Lukacs, exilado na Unido Soviética de Stalin, ndo se dispés ao sacrificio Fisico para combater abertamente o stalinismo (0 que, diga-se de passagem, nao impediu que sofresse coercao direta2). A posicdo de Lukacs torna-se compreensivel se se leva em consideragao a sua anilise politica de Fundo: o Filésofo, no contexto da expansao do fascismo e da Segunda Guerra Mundial, estava absolutamente convencido de que a sobrevivéncia da Unido Soviética era um valor absoluto, que condicionava tanto a vitéria sobre a barbarie fascista quanto a possibilidade de evolver Futuro do socialismo; por isso, mesmo que intimamente desenvolvesse uma postura critica em Face de Stalin e de seus métodos desde 1938-1939, ele nado a exprimiu publicamente. Julgava, e nunca recuou desde julgamento, que fazé-lo equivalia a abrir o Flanco ao inimigo. L. Feuchtwanger, alias objeto de nota¢ées criticas em O Romance histérico, escreveu em alhum lugar que “ser martir é facil; dificil, muito dificil, & permancer entre luzes e sombras pelo bem de uma ideia”. Tais palavras caem como uma luva para a problematica posi¢ado assumida por Lukacs: ele se recusou ao martirio e travou contra o stalisnismo, nesses anos, o combate possivel, que caracterizaria como o “combate espiritual de um partisan” : hitpsipc.org.briportl2s1258 7138 29rt12028, 18:17 Sobre Lukdcs ea poltica - PCB — Partido Comunsta Brasileiro defendeu, no plano estrito da cultura, ideias colidentes com a doutrina oficial23, mas sempre proregendo-se com citacdes protocolares de Stalin e com uma intencional restricdo de seus juizos 4 esfera cultural.2+ O fato é que os siléncios de Lukacs, sua reveréncia Formal a Stalin e a limitagao da sua critica obliqua ao plano de cultura custaram-lhe o rétulo de “stalinista”: G. Lichtheim mensiona “a resoluta adesdo de Lukacs a Stalin” e, de Forma mais delicada, Y. Ishaghpour credita-lhe uma ” adesdo mais ou menos tacita ao stalinismo"; outros, como H. Rosenberg, assinalam a “sua patética resisténcia ao stalinismo”; na contracorrente, criticos como L. Kofler replicaram que “Lukacs e o stalinismo distinguem-se entre si como 0 socialismo democratico distingue-se do socialismo burocratico. Entre eles nao ha nenhuma ponte”.2> Entendemos que este ultimo juizo esta mais préximo da verdade - mas ele requer determinacées para tornar-se mais exato. De uma parte, é necessario analisar em que medida a op¢ao de Lukacs impés-lhe limitagées significativas no plano de suas avaliacées critico-filosdficas e estéticas®; de outra, no que diz respeito diretamente a sua concepcao politica, ha que investigar como. também a sua opcao pelo “combate espiritual de um partisan” no marco posto pela defesa do “socialismo em um sé pais” deixou sequelas que nao podem ser ignoradas.”” Lukacs retorna a Hungria em 1945, depois de mais de um quarto de século de auséncia forgada. Chega com a Libertacao propiciada pelas vitorias do Exército Vermelho e participa ativamente do processo de reconstruc3o nacional, no plano cultural (torna-se membro da diregdo da Academia de Ciéncias da Hungria, leciona na Universidade de Budapeste) e no plano politico (participa do Conselho Nacional da Frente Popular Patriética). Regressa a seu pais projetando sua inser¢ao na vida hingara a partir de duas hipsteses, intimamente vinculadas entre si: de uma parte, esta convencido de que a conjuntura mundial propiciara a continuidade, sobre novos Fundamentos, da “grande alianga” construida em 1941 entre as democracias ocidentais e a Unido Soviética, favorecendo um clima internacional de paz e hitpsipc.org.briportl2s1258 8138 29rt12028, 18:17 Sobre Lukdcs ea poltica ~ PCB ~ Partido Comunsta Brasileiro desenvolvimento progressista; de outra, acredita firmemente que a Teconstrucao nacional devera avancar mediante a unidade das forcas democraticas e populares (dai, entre outros, seu esforco de entendimento e uniao entre socialdemocratas e comunistas), na construgao do que sustentava ser a democracia popular ou, nos termos lukacsianos da época, a nova democracia.28 Estas duas hipoteses condensavam o que, linhas acima, designamos como sendo a sua concep¢ao politica madura, elaborada nos anos do exilio na Unido Soviética. De uma parte, Lukacs, mesmo convencido de que capitalismo e socialismo constituiam sistemas necessariamente mundiais, compulsoriamente demandantes do espaco planetario, tinha por vidvel a possibilidade da coexisténcia dos dois sistemas sem guerras destrutivas (por isso, inclusive, em sua sincera e apaixonada participagao no Movimento pela Paz, em que exerceu expressiva intervencao), o que depois de 1956 seria definido como coexisténcia pacifica — e que nao excluia a dinamica das lutas de classes por meios outros que nao a guerra — 6 um dos pilares da concep¢ao politica madura de Lukacs. O outro, constituiu-o a sua visdo da transigao ao socialismo: para Lukdcs, tratava-se de processo largo e complexo, que - se implicava ruptura e traumatismos no confronto com a reagdo e com os inimigos de classe - teria tanto mais sucesso se se operasse mediante as vias préprias do enfrentamento de ideias e cosmovisdes que envolviam o conjunto da sociedade, com o recurso sistematico ao debate franco, voltado para a Ppersuasao e o convencimento. A Forte interdependéncia entre os dois componentes elementares dessa concepcao é ébvia; um clima de paz internacional vincula-se diretamente a maior limitacdo possivel dos caminhos tevolucionarios e meios que dispensem a violéncia Fisico-material; e também é 6bvia a conexdo dessa concep¢do com a “politica Frentista” que Lukdcs antecipara em 1928.29 Esta é a concep¢ao com que Lukacs regressa 4 Hungria e com a qual intervém ativamente, por cerca de trés anos, na vida politica e cultural de seu pais, e, mais, na vida intelectual europeia — entre 1946 e 1949, viaja ao ocidente, participa de conferéncias e congressos, tem obras publicadas no pais e no exterior. Mas os supostos sobre os quais repousava a sua projecdéo ndo resistem a prova de curto prazo da historia: de uma parte, a Guerra Fria (e a hitpsipc.org.briportl2s1258 9138 29rt12028, 18:17 Sobre Lukdcs ea poltica - PCB — Partido Comunsta Brasileiro guerra a quente, como o demonstrara na sequencia a conflagragado coreana) liquida com a alternativa da coexisténcia sem belicismo; de outra, os aparatos de poder estatal-partidarios, controlados por grupos afinados com o stalinismo (sem contar o recrudescimento da ditadura de Stalin no final desses anos), destroem no Leste Europeu as possibilidades de uma transi¢ao socialista sem o recurso a violéncia e ao terror. Na Hungria, 0 sinal dos novos tempos é dado por Rakosi, maximo dirigente partidério e estatal: qualificando 1948 como “o ano da mudanga”, o ditador eliminou da vida politica a pluralidade partidaria e deu inicio 4 caga a seus adversdarios — uma repressao que atingiu tanto os ndo-comunistas como os. opositores dos seus métodos no interior do Partido. Como notou Mészaros, o primeiro passo desta cacgada Foi, no verdo/outono de 1949, o processo contra Rajk e sua execucao; e 0 regime avancou, simultaneamente, contra tudo o que significava a nova democracia: desencadeou-se uma cruzada publica (e internacional: na Unido Soviética, por exemplo, Fadeiev reclamou “severas medidas administrativas”) contra Lukacs.2° A partir de 1949, uma campanha de descrédito e calunias, orquestrada pela cupula do Partido, é dirigida contra Lukcds: aberta Formalmente, sob orientac¢ao pessoal de Rakosi, por L. Rudas em julho de 1949, sera conduzida subsequentemente por um grupo de intelectuais vinculados ao aparelho partidario (dentre os quais J. Révai, M. Horvath e J. Darvas?"), O ataque a Lukacs envolvia a sua intervencao como critico literario (a pretexto de seus livros publicados em htingaro depois de 1945: Literatura e democracia e Por uma nova cultura héngara) , retomava a condenacao as Teses de Blum e promovia um inquisitorial as suas ideias acerca do realismo socialista e da significacao da literatura russa. Porém, o alvo cebtral dos adversarios era a concepcao politica que — segundo eles, e corretamente - se vinculava as suas ideias acerca da cultura: a sua defesa de nova democracia. Indo diretamente ao né do problema, no mais longo dos seus derradeiros depoimentos, Lukacs relembra 0 que o antagonizava, nos Finais dos anos 1940, com o regime Rakosi: hitpsipc.org.briportl2s1258 10138 29rt12028, 18:17 Sobre Lukdcs ea poltica ~ PCB — Partido Comunsta Brasileiro Na minha opinido, que remonta as Teses de Blum, a democracia popular é um socialismo que nasce da democracia. Segundo 0 outro ponto de vista, a democracia popular é, desde o inicio, uma ditadura e, desde 0 inicio, aquela forma de stalinismo para a qual ela evoluiu apés 0 caso Tito.32 Acruzada anti-Lukacs se acentua em 1950, repercutindo no movimento comunista internacional. Sob Forte pressdo, Lukacs faz autocritica, de novo recusando-se ao martirio®, e é obrigado, em 1951, a recolher-se a vida privada. Mais uma vez, como em 1929, a intervenco politica do Filésofo redunda numa derrota. Ele e suas ideias politicas deixam a cena publica — contudo, nao sera por muito tempo. 5. 1956 6 0 ano do “outubro hingaro”"‘, Fazendo a sintese do que se passou naquele ano, um comentarista registrou: “revolta dos intelectuais, queda do stalinista Rakosi; retorno ao poder de Imre Nagy; ressurgimento de uma imprensa livre e de partidos politicos; desmoronamento do Partido Comunista; fim da coletivizacao; florescimento dos conselhos operarios; a revolugdo é esmagada pelas tropas russas”.>> O comentarista ndo mencionou que, na explosao da crise do regime de Rakosi, também entraram na arena forcas contra-revolucionarias, efetivamente reacionarias; porém, como assinalou um ex-marxista, [...]o dilema htngaro nao era entre um socialismo existente, por mais imperfeito que fosse, e a contra-revolucao, e sim entre uma realidade anti- socialista e uma possibilidade socialista. A imensa maioria dos operarios, estudantes e intelectuais nao combateria até a morte para reinstalar capitalistas nas Fabricas e sim instaurar uma democracia politica que tornasse real a posse das Fabricas pelos trabalhadores [...]. Diante do despertar das forcas reacionarias hUngaras, [...] a garantia eram os operarios hingaros organizados em conselhos [...], eram também os intelectuais e estudantes, que em sua maioria ainda acreditavam no socialismo e nado queriam passar de uma ditadura a outra.3© hitpsipc.org.briportl2s1258 11138 29rt12028, 18:17 Sobre Lukdcs ea poltica - PCB — Partido Comunsta Brasileiro O ex-marxista tem razdo: 0 que explode na Hungria — tendo como pano de Fundo a desestalinizagéo que fora posta em curso a partir do “relatério secreto” de Kruschev ao XX Congresso do Partido Comunista da Unido Soviética (PCUS), em Fevereiro de 1956 — é a demanda de profundas mudancas que levassem 4 realizacao de algo como a nova democracia que Lukacs Propusera no imediato pés-guerra. Por isso mesmo, 0 velho filésofo reingressa na cena politica com entusiasmo: em junho, pronuncia no “Circulo Petéfi” a conferéncia A luta entre progresso e reac3o na cultura contemporénea e, juntamente com Tibor Déry, Giulia Illiés e Istvan Mészaros?”, langa a revista Eszmélet (Tomada de consciéncia). De junho a novembro, seu ativismo parece juvenil: participa do processo de refundacgao do partido e torna-se Ministro da Cultura do efémero governo Nagy, cargo a que renuncia quando este propée a retirada da Hungria do Pacto de Varsovia.2® Na repressdo que se segue ao 4 de novembro (quando as tropas russas entram em Budapeste para liquidar o levante)?9, Lukacs — apds um breve refugio na embaixada da lugoslavia, que ele mesmo considerou um “erro brutal” — é deportado para a Roménia. No ano seguinte, obtém permissao para retornar. Exige-se-lhe uma autocritica, que ele rechaca frontalmente: “Lukacs, o velho Lukacs de 71 anos, Tecusa-se a fazer novamente sua autocritica, a reconhecer seus erros, a submeter-se novamente a autoridade e a burocracia que se pretendem socialistas. No terceiro canto do galo, o Pedro petrificado do marxismo se recusa a renegar e a renegar-se”.*° Concede-se-lhe uma espécie de otium cum dignitate, mas \he é negado o ingresso no Partido refundado“’ e se the impée a proibigdo de suas publicagées e atividades politicas, ao mesmo tempo em que nova campanha é oficialmente aberta contra ele.*2 Logo afinado com os novos tempos da desestalinizacao, o governo de Kadar, apds a “normalizagao” (ou seja, quando a oposic¢ao expressa em outubro de 1956 Foi desarticulada), orienta-se num sentido auto-reformista: promove significativas alteracées na ordem econémica e instaura um clima de tolerancia politica e ideoldgica. Em face deste novo rumo, Lukacs preocupa-se fundamentalmente em apoiar as mudangas que parecem progressistas e hitpsipc.org.briportl2s1258 12138 29rt12028, 18:17 Sobre Lukdcs ea pollica - PCB - Partido Comunsla Brasilovo democratizantes: definia sua postura no quadro hingaro como “nao oposi¢ao, mas reforma”, sublinhando que o essencial era a solucéo da questo basica: a questdo democratica.*? Ai reside o componente inédito que enriquece a concepcao politica madura de Lukacs e a eleva a um patamar mais alto: ainda que prosseguindo e prolongando as ideias que o conduziram a defesa da nova democracia, é legitimo afirmar que, no pés-56, 0 filésofo chega ao estagio culminante de sua reflexao politica, configurador do terceiro momento a que aludimos: a democracia defendida por ele, e qualificada como socialista, propde-se como a via para a reconversao das sociedades soviéticas e do leste em formacées societarias compativeis com o projeto emancipador que animou o pensamento marxiano e marxista antes da sua perversdo pelo dogmatismo e pelo sectarismo. De fato, apés o XX Congresso do PCUS e seu retorno da deportacao, Lukacs vistumbra a concreta possibilidade de uma auto-reforma do “socialismo real” (expresso, alias, estranha a Lukacs). Avalia o periodo que se abre como uma transigéo que pode resgatar as promessas emancipadoras do Outubro. vermelho de 1917, desde que se erradiquem as raizes do stalinismo e, a0 Mesmo tempo, mantenha-se e se aprofunde a critica da sociedade burguesa“ — que, para ele, volta a experimentar, nos anos 1960, uma crise profunda*>. No plano politico, pois, trata-se de um combate em duas Frentes: contra o stalinismo (que ele jamais reduziu ao cliché do “culto 4 personalidade”) e contras as falsas alternativas oferecidas a ele (no limite, a restauracao da democracia politica formal burguesa). Lukacs estava firmemente convencido de que este combate em duas frentes implicava uma profunda renovacao do pensamento marxista; donde o seu esforco tedrico para fomentar o que chamou de renascimento do marxismo, esforco do qual sdo testemunhos documentais a monumental Estética (cuja primeira parte, a Unica concluida, sai em 1963) e a Ontologia do ser social (publicadas, a “grande ontologia”, em 1976-1981, e a “pequena”, em 1986), bem como o seu estimulo as pesquisas de investigadores jovens, como aqueles que Ficaram conhecidos como membros da “Escola de Budapeste”.*6 hitpsipc.org.briportl2s1258 13938 29rt12028, 18:17 Sobre Lukdcs ea poltica - PCB — Partido Comunsta Brasileiro Neste periodo, Lukacs péde expressar livremente o seu pensamento politico*”, explicitando-o claramente, sem as restricdes e os compromissos a que se condicionara anteriormente. Os textos mais expressivos desta quadra s&o dirigidos a critica do stalinismo e suas sequelas e poem a questao da democracia socialista na ordem do dia. E neles se expressa, reiteradamente, a aposta na auto-reforma do socialismo, sempre sinalizada pelo apoio que Lukacs ofereceu a lideranca soviética de Kruschev. Esta aposta, como o desenvolvimento posterior da historia demonstrou, Foi perdida: as regress6es do regime soviético sob Brejnev reverteram a sua possibilidade e, no fim dos anos 1980, os tardios intentos de Gorbachov comprovaram que a auto-reforma era inviavel, do que derivoua insustentabilidade da experiéncia iniciada em 1917. Lukacs, porém, nao assistiu a este desfecho. Mas ha forte indicagdes de que ele pressentiu, com a queda de Krusckev (1965) e especialmente com a repressao a auto-reforma empreendida na Tchecoslovaquia (agosto de 1968“), que o projeto auto-reformador em que estava empenhado corria risco substantivo. Por isto, reagiu imediatamente a invasdo da Tchecoslovaquia, repudiando a intervencao das Forgas do Pacto de Varsévia*? e redigindo o ensaio em que sintetiza, clara e inequivocamente, este terceiro momento da sua evolucao politica, em formulagées que podem ser tomadas como conclusivas do seu itinerario comunista em texto que entregou a direcao do seu partido e so foi publicado postumamente (1985): Demokratisierung heute um morgen, integralmente traduzido nesse volume sob o titulo O processo de democratiza¢ao. Neste ensaio, coligido no presente volume e em que recusa simultaneamente © modelo stalinista (e todas as suas derivacdes) e a democracia politica de corte formal-burgués (ou suas variantes, que seduziram muitos daqueles que se opuseram ao stalinismo), Lukdcs pée, como tnica alternativa progressista as estruturas do “socialismo real”, a democracia socialista, que s6 pode ter efetividade se se constituir como democracia da vida cotidiana; mais exatamente: “uma democracia da vida cotidiana, tal qual apareceu nos conselhos operarios de 1871, 1905 e 1917 e tal qual existiu nos paises socialistas e deve ai ser novamente despertada”. Comentando essa passagem, hitpsipc.org.briportl2s1258 14138 29rt12028, 18:17 Sobre Lukdcs ea poltica ~ PCB — Partido Comunsta Brasileiro nota justamente um critico que Lukécs opde essa democracia dos conselhos operdrios “simultaneamente a burocracia arbitraria e 8 democracia burguesa, como um sistema de democracia auténtica e real, que surge cada vez que o proletariado revolucionario aparece no palco da Histéria”.°° De fato, no ultimo Lukacs, a transigdo socialista quase se identifica com um profundo e radical processo de democratiza¢ao, a ser perseguido sem concess6es se o horizonte da aco politica dos comunistas for mesmo a edificacao de uma sociedade sem exploracao, opressao e alienacao - isto é, a sociedade comunista. 6. Aconcepcao politica que Lukacs veio desenvolvendo desde a sua adesdo ao comunismo nao constitui o nucleo central da sua contribuicdo ao pensamento marxista: se, na sua obra, como salientamos, a dimensao politica esta sempre presente, conformando mesmo um estrato significativo da sua atividade intelectual e pratico-concreta, é preciso sublinhar que ela nao dispde do privilégio de que goza em marxistas cuja atencao prioritaria voltou-se para a politica enquanto esfera com estatuto, legalidade e relevncia especificos (como, por exemplo, em Antonio Gramsci). Nao é pertinente, nesta oportunidade, identificar as razdes teéricas e/ou Filos6ficas deste Fato. O que importa é ressaltar que, no conjunto da obra lukacsiana, a politica ndo comparece como um objeto auténomo, passivel de ser tematizado em suas peculiaridades. Em poucas palavras: ha, no conjunto da obra lukacsiana, uma - insistimos — inequivoca dimenséo politica; mas ndo se pode, legitimamente, considerar a existéncia de algo como que um sistema de teoria politica na obra lukacsiana: Lukacs Foi um pensador politico, nao um pensador da politica. Esta determinacao nao retira da sua concepcao politica a importancia, como tampouco minimiza a sua significagado; apenas permite apontar o espaco restrito em que decorre a sua reflexdo politica, subordinada nao a um tratamento sistematico, mas as exigéncias decorrentes das suas concepcées tedrico-filosdficas e a injuncdes do seu protagonismo como sujeito politico. hitpsipc.org.briportl2s1258 15138 29rt12028, 18:17 Sobre Lukdcs ea poltica - PCB — Partido Comunsta Brasileiro Nos textos recolhidos neste volume, o leitor certamente notard que o espaco restrito a que nos referimos acima, determinante do arsenal de categorias com que Lukacs trata os processos politicos®’, tem fortes incidéncias na analise politica lukacsiana: por exemplo, a sua critica de principio ao stalinismo frequentemente é viciada por uma reducao teoricista— ao colocar no centro de suas apreciagées, vigorosa e corretamente, a questao tedrico- metodoldgica (em especial, o contraste das concepcées stalinianas e stalinistas com as de Lenin), Lukacs nao apreende a referéncia hist6rico- concreta da experiéncia soviética (seus condicionantes econdmico-sociais, a contextualidade internacional, as transformacées politico-ideolégicas etc.) que aparece rarefeita e com pouco peso. Deriva dessa reducao teoricista um viés que pode induzir a avaliagées unilaterais, pouco aptas a apreender os nexos complicadissimos entre teoria e praxis, na suposi¢&o de que a correta imposic¢ao tedrico-metodoldgica conduz, pela Forca da sua verdade, a solucdes politicas adequadas. Poder-se-ia argumentar, num aprofundamento critico que escapa ao escopo desta introdugao, que a opcao de Fundo de Lukacs — que, paginas atras, sinalizamos como valor absoluto (a existéncia da Unido Soviética) e do qual ele nunca abriu mao —responde, centralmente, pelas limitag6es da analise politica lukacsiana, na qual, quase sempre, predomina um otimismo no suficientemente Fundado. Enfim, esse otimismo e mais aquela reducao teoricista poderiam ser responsabilizados pelas derrotas politicas que, independentemente da sua congruéncia tedrico-metodoldgica e da sua coeréncia ideolégica, Lukacs protagonizou, quer ao tempo das Teses de Blum, quer no periodo em que batalhou pela nova democracia, quer nos anos em que emprestou seu apoio 4 auto-reforma que Kruschev tentou implementar. Accritica cuidadosa e radical da concepcao politica de Lukacs ainda esta por Fazer-se e o primeiro passo para conduzi-la com rigor é conhecé-la, o que teclama imperativamente o estudo dos textos como os coligidos nesse volume. E, na condugao dessa critica, hd que nado perder de vista 0 espirito geral da obra lukacsiana pés-1918: Lukacs morreu afirmando que “o pior socialismo é melhor que o melhor capitalismo”.52 hitpsipc.org.briportl2s1258 16138 212023, 16:17 Sobre Lukas ¢ apoliica ~ PCB — Partido Comunsta Brasileiro 7. Cumpre, finalmente, lembrar ao leitor, em especial ao mais jovem, que a correta avaliagao dos textos aqui reunidos supde o conhecimento da contextualidade histérico-politica no interior da qual foram elaborados por Lukacs. Depois de mais de um quarto de século, que registrou uma profunda derrota politico-ideolégica da classe operaria e das camadas trabalhadoras em todo o mundo, que assistiu ao colapso das experiéncias pés revolucionarias, que testemunhou o redimensionamento da dominaco do capital e o descrédito das proposi¢ées socialistas — depois dessas quase trés décadas de reacionarismo politico e aviltamento cultural, o empenho de Lukacs na renovacao do socialismo e no renascimento do marxismo pode parecer algo anacrénico. Também no que toca a Lukécs, inclusive no que diz respeito & sua reflexéo politica, é preciso determinar “o que é vivo e o que é morto” na sua obra; porém entendemos igualmente que esta avaliagao nao pode excluir a temporalidade historica em que o fildsofo se moveu. Os textos aqui reunidos s&o historicamente determinados: trazem a marca da esperanca aberta com os primeiros passos para além do stalinismo (da expectativa de um socialismo com rosto humano), da crise da ordem capitalista (a luta pelos direitos civis ea rebeldia nos campi dos Estados Unidos; o crescimento dos partidos comunistas e do movimento sindical classista na Europa Ocidental; a rebeliao estudantil na Franca e Alemanha; a derrota do imperialismo na sua agressao ao povo do Vietna), da quebra dos grilhées colonialistas na Africa etc. Entéo, uma cultura anticapitalista se generalizava e um pensador do nivel e da audiéncia de Sartre afirmava com tranquilidade que “o marxismo é a filosofia do nosso tempo”. Esta temporalidade histérica esgotou-se. Mas é grosseiro equivoco supor que a histéria chegou ao fim: Clio, sabe-se, 6 uma deusa ardilosa. Reprimidas mas nao suprimidas, mistificadas ideologicamente e/ou manipuladas politicamente, as lutas sociais reais prosseguem e revelam, na sua essencialidade, o condicionalismo maior das lutas de classes: metamorfoseada, a ordem do capital nao perdeu suas caracteristicas estruturais de exploracado e opressao e continua produzindo e reproduzindo a hitpsipc.org.briportl2s1258 17138 29rt12028, 18:17 Sobre Lukdcs ea poltica - PCB — Partido Comunsta Brasileiro sua negatividade. Quando esta reunir as condicées para aflorar a superficie da vida social, colocar-se- em novo patamar a questo central da transformacdo desta ordem societaria — colocar-se-a abertamente o dilema entre uma alternativa socialista renovada e a cronificacao da barbarie capitalista. Nesta perspectiva, os textos politicos de Lukacs deixam de ser importantes documentos referidos a uma conjuntura histérica passada. Adquirem uma nova significado e uma extraordinaria atualidade: podem indicar, pela critica do passado, um rumo para o futuro. Esta é, alias, a razdo pela qual nos animamos a tornar acessiveis ao leitor brasileiro os textos que compdem o presente volume. Recreio dos Bandeirantes, marco de 2008 Notas: 1 Uma sintese bibliografica da longa trajetoria de Gyorgy Lukacs (1885-1971) esta disponivel em G. Lukdcs, O jovem Marx e outros escritos de Filosofia, Rio de Janeiro, UFRJ, 2007, p. 15-24 2 A concepcao lukacsiana do “marxismo ortodoxo” foi Formulada no ensaio de abertura de Histéria e consciéncia de classe (1923); releva notar que, posteriormente, ao criticar essa obra, Lukacs nao estendeu sua autocritica Aquela Formulacao, em que é central a relacdo entre elaboracao tedrica e praxis (ainda que tenha feito restrigées & concepcao de praxis que atravessa o conjunto do livro). Também importa observar que, em meados dos anos 1920 (1925 ou 1926), precedendo as autocriticas que realizou em relagdo a Histéria e consciéncia de classe, Lukacs redigiu um texto em que a defende das criticas que, imediatamente apés a sua publicacao, lhe foram dirigidas por A. M. Deborin (1881-1963) e L. Rudas (1885-1950), texto que sé veio a luz postumamente (1996), sendo vertido ao inglés pouco depois - ver G. Lukacs, A defense of History and class consciousness. Tailism and dialetic [Uma defesa de Histéria e consciéncia de classe. Reboquismo e dialética], Londres, Verso, 2000. hitpsipc.org.briportl2s1258 18138 29rt12028, 18:17 Sobre Lukdcs ea poltica ~ PCB — Partido Comunsta Brasileiro 3 CN. Coutinho, “Lukacs, a ontologia e a politica”, em R.Antunes e W.L. Rego (org.), Lukdcs. Um Galileu no século XX, Sao Paulo, Boitempo, 1996, p.23. 4 Para todas as referéncias bibliograficas aqui assinaladas, ver a bibliografia citada na nota 1. 5 Nao casualmente, uma cole¢ao brasileira dedicada as “Fontes do pensamento politico” Foi inaugurada com um estudo e uma seleta de textos politicos de Lukacs - trata-se do volume Lukdcs, preparado por Leandro Konder (Porto Alegre, L&PM, 1980) 6 Para uma aproximagao 4 Comuna Hungara, ver, entre outros, G.D.H. Cole, Historia del pensamiento socialista, México, Fondo de Cultura Econémica, 1961, v.5; Rudolf L. Tékes, Béla Kun and the Hungarian Soviet Republic, Nova York lorque/Londres, Praeger/Pall Mall Press, 1967; Pierre Broué, Histéria da Internacional Comunista, S40 Paulo, Sundermann, 2007, t.1, p. 121 ess. 7 Para uma simula dos eventos alemaes da “acdo de marco” (de 1921) até a derrora comunista de 1923, ver Isabel Loureiro, A revolucao aleméd (1918- 1923), Sao Paulo, Unesp, 2005; uma apreciacao, de viés trotskista, encontra-se em Pierre Broué, cit., t. 1, p. 268 e ss. ; uma visdo sintética e equilibrada do colapso da Republica de Weimar é Fornecida por Peter Gay, no apéndice a seu livro A cultura de Weimar, Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1978. 8 Entre 1921 e 1923, Lukacs também escreveu textos significativos para Rote Fahne (Bandeira vermelha), periddico do Partido Comunista alemao; tais textos, expressdo das suas concep¢oes tedricas e politicas 8 época, foram integralmente publicados por M. Lowy em G. Lukdcs, Littérature, philosophie, marxisme, Paris, PUF, 1978. ° Acerca do messianismo do “jovem” Lukacs, ver José Ignacio Lopez Soria, De lo trdgico a lo utépico. El primer Lukdcs, Caracas, Monte Avila, 1978; Leandro Konder, “Rebeldia, desespero e revolucao no jovem Lukacs”, Temas de ciéncias humanas, S40 Paulo, n. 2, 1978; Michael Lowy, Reden¢do e Utopia. O hitpsipc.org.briportl2s1258 19138 29rt12028, 18:17 Sobre Lukdcs ea poltica - PCB — Partido Comunsta Brasileiro judaismo libertdrio na Europa Central, Sao Paulo, Companhia das Letras, 1989; Carlos Eduardo Jordao Machado, As formas e a vida. Estética e ética no jovem Lukdcs (1910/1918), Sdo Paulo, UNESP, 2004. 10 Recordando esse periodo, Lukacs declarou, décadas depois: “Eramos todos sectarios messianicos. Acreditavamos todos na revolugao mundial como num Fato para acontecer amanha” (G. Lukacs, Pensamento vivido. Autobiografia em didlogo. S80 Paulo/Vicosa, Ad Hominem/UFV, 1999, p.77). 11 A citag3o é Feita conforme Annie Kriegel, Las Internacionales obreras (1864- 1943), Barcelona, Orbis, 1986, p.92. 12 Estudando esse periodo de formagao do pensamento politico de Lukacs, Michael Léwy (A evolu¢do politica de Lukdcs: 1909-1929, Sao Paulo, Cortez, 1998, p. 234-237), numa instigante interpretacdo - da qual divergimos -, aponta a relevancia do ensaio lukacsiano Moses Hess e o problema da dialética idealista (1926) na inflexao que, segundo sua anilise, levaria 4 “adesdo de Lukacs ao termidor soviético”. 13 Jeno Landler (1875-1928) desempenhou importantes funcdes durante a Republica HUngara dos Conselhos; membro do Comité Central do Partido hGngaro desde 1919, dirigiu-o durante a emigraco na Austria. 14 Ver, infra, a nota 1 do ensaio “Para além de Stalin”. 15 Excertos deste documento foram publicados no Brasil: “Teses de Blum (Extrato). A ditadura democratica”, Temas de ciéncias humanas, Sao Paulo, n. 7, 1980. 16 A ruptura de toda alianca com os socialdemocratas, nesta perspectiva, tornou-se inevitavel, uma vez que a socialdemocracia fora identificada como “irma gémea do Fascismo”. O cardter absolutamente irrealista e suicida desta politica, que contribuiu para facilitar a ascens8o do Fascismo na Alemanha, é Flagrante na apreciagdo que E. Thaelmann, principal dirigente comunista alemao a época, formulava da resposta 4 manifesta¢ao nazista de 22 de janeiro de 1933, realizada pelas tropas de assalto diante da Karl Liebknecht hitpsipc.org.briportl2s1258 20138 29rt12028, 18:17 Sobre Lukdcs ea poltica - PCB — Partido Comunsta Brasileiro Haus: “O 22 de janeiro desenvolveu-se sob o signo de uma viragem das Forcas de classe em favor da revolucao proletaria” (apud Annie Kriegel, cit., p. 111). A apreciagao de Thaelmann é de 1° de Fevereiro; mas, a 30 de janeiro, ja Hitler fora investido por Hindenburg no cargo de chanceler... 17 Ver as intervengdes de Dimitrov no referido Congresso em G. Dimitrov, Obras escolhidas em trés volumes, Sofia, Séfia-Press, 1982, v. 2, p. 22-135. 18 Sobre esta autocritica, quase quatro décadas depois Lukacs esclareceu: “Quando soube de fontes confidveis que Béla Kun preparava a minha exclusdo do partido na condi¢ao de “liquidador”, decidi renunciar a prosseguir a luta, pois sabia da influéncia de Kun na Internacional, e publiquei uma ‘ autocritica’. Embora naquela época eu estivesse profundamente convencido de estar defendendo um ponto de vista correto, sabia também — pelo destino de Karl Korsch, por exemplo - que a exclusao do Partido significava a impossibilidade de participar ativamente da luta contra o Fascismo iminente. Como ‘ bilhete de entrada’ para tal atividade, redigi esta autocritica, ja que, sob tais circunstancias, eu nao podia e nao queria mais trabalhar no movimento hungaro. Era evidente que esta autocritica ndo podia ser levada a sério: a mudanga da opinido Fundamental que sustentava as teses [...] passou a ser doravante o fio condutor para minha atividade tedrica e pratica”. Ver “Prefacio” (1967) em Histéria e consciéncia de classe, Sao Paulo, Martins Fontes, 2003, p. 36-37. 19 |bid., p. 37. 29 Quanto a isto, séo emblematicos os seus ensaios, de 1932, Tendéncia ou partidarismo?, Reportagem ou configuracao? Observacées criticas a propésito do romance de Ottwalt e Da necessidade, virtude.Esta linha de critica tera prosseguimento nas polémicas que envolverao, até 1938, a intelectualidade alema exilada na Unido Soviética, como o comprovam as intervengdes de Lukacs nos peridédicos Das Wort (A palavra) e Internationale Literatur (Literatura Internacional). Ver, sobre este ponto, Carlos Eduardo Jordao Machado, Um capitulo da historia da modernidade estética: debate sobre o expressionismo, S40 Paulo, UNESP, 1998. hitpsipc.org.briportl2s1258 21188 29rt12028, 18:17 Sobre Lukdcs ea poltica ~ PCB — Partido Comunsta Brasileiro 21 A nosso juizo, a relacdo do ultimo, a relacdo do Ultimo Lukacs com a figura de Lenin (e poder-se-ia pesquisar sua similitude com a relagao do Hegel posterior a 1805 com a figura de Napoledo) esta marcada por uma Forte idealizagao do maximo dirigente bolchevique, com implicagées que comprometem a anilise politica que o velho Lukacs realiza dos rumos tomados pela revolucgao de outubro. 22 Em 1941, Lukacs Foi preso pela policia politica stalinista e sé Foi libertado, apés alguns meses, gracas aos empenhos de G. Dimitrov, entao o mais alto dirigente da Internacional Comunista (ver |. Mészdros, Lukdcs’ concept of dialetic, Londres, Merlin Press, 1972, p. 142); esta prisdo é também referida por M. Lowy, A evolu¢do politica de Lukdcs: 1909-1929, cit., p. 244-245) e por Tibor Szab6, Gyérgy Lukdcs. Filosofo auténomo (Napoles, La Citta Del Sole, 2005, p. 51), que recorda que ingualmente seu enteado (Ferenc Janossy) esteve nos carceres stalinistas. 23 Sao exemplos bastantes, ademais da obra sobre Hegel (concluida em 1938 e publicada dez anos depois) e dos textos reunidos nos Escritos dos Moscou, dentre outros, os ensaios A fisionomia intelectual dos personagens artisticos (1936), Tribuno do povo ou burocrata (1940), Progresso e rea¢do na literatura alemée A literatura alemd na era do imperialismo (ambos de 1944-1945, reunidos depois num volume sob o titulo geral de Breve histéria da literatura alema). 24 Um exemplo emblematico dos procedimentos lukacsianos diante de Stalin aparece na entrada dos anos 1950. Em 20 de junho de 1950, o secretdrio-geral publicou, no Pravda, um longo artigo “O marxismo e os problemas da linguistica” em que criticava as teses do linguista N. J. Marr. (Sobre o contexto imediato em que Stalin preparou o citado artigo, ver o cap. 10 deZ.A. Medvedev, Um Stalin desconhecido, Rio de Janeiro, Record, 2006.) Pois bem: cerca de um ano depois (29 de junho de 1951), Lukacs pronunciou na Academia de Ciéncias da Hungria a conferéncia “Arte e literatura com superestrutura”, na qual, apds render homenagens formais ao texto de Stalin, realiza uma “interpretacao” do seu pensamento que 6, de Fato, uma refutacao das suas teses. hitpsipc.org.briportl2s1258 22138 29rt12028, 18:17 Sobre Lukdcs ea poltica - PCB — Partido Comunsta Brasileiro 25 Uma larga bibliografia trata da relagdo entre Lukacs e o stalinismo; a titulo meramente ilustrativo, ver George Lichtheim, “Lukacs and stalinism”, New Left Review, Londres, n. 91, 1975; Michael Léwy, “Lukacs and stalinism”, em Gareth Stedman Jones ET AL., Western marxism. A critical reader, Londres, Verso, 1978 (com modificacées, este ensaio foi concluido em Michael Lowy, A evolu¢ao politica de Lukdcs, cit.); José Paulo Netto, “Lukacs e a problematica cultural da era stalinista”, “Temas de ciéncias humanas, Sao Paulo, n. 6, 1979; Alberto Scarpono, “Lukacs critico dello stalinismo”. Critica marxista, Roma, v.17, n. 1, gennaio-febbraio 1979; Cliff Slaughter, Marxismo, ideologia e literatuta, Rio de Janeiro, Zahar, 1983, cap. 4; Eugene Lunn, Marxism and modernism. An historical study of Lukdcs, Brecht, Benjamin and Adorno, Bekerley, University of Califérnia press, 1982; Nicolas Tertulian, “G. Lukaécs eo stalinismo”, Praxis, Belo Horizonte, n. 2, set. 1994); |. Mészdros, Para além do capital. Rumo a uma teoria da transi¢ao, Sao Paulo/Campinas, Boitempo/UNICAMP, 2002; Arpad Kadarkay, Georg Lukdcs. Life, thoughs and politics, Cambridge, Mass., Basil Blackwell, 1991. Num pequeno texto de Nicolas Tertulian, “Lukacs hoje” (em M. O. Pinassi e Sérgio Lessa, org., Lukdcs e a atualidade do marxismo, Sao Paulo, Boitempo, 2002), também se encontram referéncias significativas sobre a relacao aqui sinalizada. 26 algumas apontadas em textos indicados na nota anterior e outras indicadas e diferencialmente problematizadas, por exemplo, em Marzio Vacatello, Lukdcs. Da Storia e coscienza di classe al giudizio sulla cultura borghese, Florenga, La nuova Italia, 1968; G. H. R. Parkinson, org., Georg Lukdcs. El hombre, su obra, sus ideas, Barcelona, Grijalbo, 1972; Ernst Bloch ET AL., Aesthetics and politics, London, Verso, 1980; Francisco Posada, Lukdcs, Brecht ea situacao atual do realismo socialista, Rio de Janeiro, Civilizagao Brasileira, 1970; Giuseppe Bedeschi, /ntroduzione a Lukdcs, Roma/Bari, Laterza, 1970; Helga Gallas, Teoria marxista de la literatura, México, Siglo XXI, 1977; Fredric Jameson, Marxismo e forma. Teorias dialéticas da literatura no século XX, Sao Paulo: Hucitec, 1985: George Steiner, Linguagem e siléncio: ensaios sobre a crise da palavra, Sio Paulo, Companhia das Letras, 1988; Terry Eagleton, A ideologia da estética, Rio de Janeiro, Jorge Zahar, 1993; Eva L. Corredor, org., Likdcs after communism. Interviews with contemporary intellectuals, Durham/London, Duke University Press, 1997; Celso Frederico, Marx, Lukdcs: a arte na perspectiva ontoldgica, Natal, EDUFRN, 2005; Carlos Nelson Coutinho, hitpsipc.org.briportl2s1258 23138 29rt12028, 18:17 Sobre Lukdcs ea poltica ~ PCB ~ Partido Comunsta Brasileiro Lukéacs, Proust e Kafka. Literatura e sociedade no século XX, Rio de Janeiro, Civilizagdo Brasileira, 2005. Criticas 4s concepgGes estéticas desenvolvidas por Lukacs a partir dos anos 1930 encontram-se também em Galvano della Volpe, Critica do gosto, Lisboa, Estampa, s.d., e em Theodor W. Adorno, Teoria estética, Lisboa, Edigdes 70, 1988. 27 Para além do debate frequentemente genérico e equivocado acerca do (ou nao) “stalinismo politico” de Lukacs, neste ambito a investigacao que aqui se Faz necesséria ainda é muito pouco substantiva; ademais de dois dos textos citados na nota 25 — o de Léwy, cuidadoso e sério; o de Slaughter, bilioso — 0 ensaio de Marco Maccié, “Las posiciones teéricas y politicas Del ultimo Lukacs” (Cuadernos de pasado y presente, Cédoba, n. 16, sept. 1970) eo artigo muito ruim de Francois Fejté, “Gyérgy Lukacs et la politique” (Esprit, Paris, n. 106, oct. 1985) mostram o quanto sao quase inexistentes estudos detalhados. Mesmo no que se refere a relaco tedrica entre as concepcoes gerais do Ultimo Lukacs (filos6ficas e politicas) e sua op¢ao pratico-politica, um debate mais denso ainda nao se realizou, embora ja haja contribuigdes iniciais que merecem citagao (como é o caso das contidas no livro de |. Mészéros referido na nora 25), inclusive no Brasil; vale referir as intervengdes de fato colidentes, de Carlos Nelson Coutinho, no ensaio “Lukacs, a ontologia ea politica”, cit., e de Sérgio Lessa, “Lukacs: direito e politica”, recolhido em Maria Orlanda Pinassi e Sérgio Lessa (org.), também citado na nota 25; Sérgio Lessa, alias, em um optisculo mais recente (Lukdcs. Etica e politica, Chapecé, Argos/Editora Universitaria, 2007) reorienta muito problematicamente a sua andlise anterior. 28 Ver “As tarefas da Filosofia marxista na nova democracia”, em G. Lukacs, O jovem Marx e outros escritos de Filosofia, cit., p. 55 e ss. 29 Lukacs mesmo reconheceu esta conexdo. Comentando a insinceridade da autocritica a que se submeteu em 1929, quando da derrota das Teses de Blum, escreveu, como se via na nota 18: “Era evidente que esta autocritica nado podia ser levada a sério: a mudanga da opiniéo Fundamental que sustentava as teses [...] passou a ser doravante o fio condutor para minha atividade teérica e pratica” hitpsipc.org.briportl2s1258 2438 29rt12028, 18:17 Sobre Lukdcs ea poltica ~ PCB ~ Partido Comunsta Brasileiro 30 Sobre os personagens aqui referidos, ver, infra, as notas 11,15e4edo texto “Para além Stalin”, O “processo” contra Lukacs Foi notavelmente narrado por I. Mészdros no seu artigo “El debate sobre Lukacs y sus consecuencias: Révai y El zdanovismo”, coligido em G. Steiner ET AL., Lukdcs, Buenos Aires, Jorge Alvarez, 1969; ver também M. Merlau-Ponty, As aventuras da dialética, Sao Paulo, Martins Fontes, 2006. Para uma reconstru¢ao do clima do “ano da mudanga”, nado sé na Hungria, cf. Fernando Claudin, A crise do movimento comunista, $40 Paulo, Global, 1986, v. 2, p. 511 ess. 31 Sobre Rudas, ver, infra, a nota 13 do texto “Para além Stalin”. Joseph Révai (1898-1959), publicista, antigo companheiro de lutas de Lukacs, exilado durante as duas guerras, tornou-se o principal idedlogo do regime de Rakosi, sendo ministro da Cultura de 1949 a 1953; suas acusacées a Lukacs encontram-se em seu livro La littérature et la démocratie populaire: 4 propos de Georges Lukacs, Paris, La Nouvelle Critique, 1950. Joseph Darvas (1913- 1973), romancista, ocupou cargos ministeriais no regime de Rakoi. Marton Horvath (1906-1987) foi membro do Comité Central do Partido hingaro de 1944 a 1956 e, na primeira metade dos anos 1950, seu responsavel por agia¢ao e propaganda. 32 G. Lukacs, Pensamento vivido, cit., p. 117. Recorde-se que, em 28 de junho de 1948, o Centro de Informacao dos partidos Comunistas (Komminform) divulgou a “condenacao” da dire¢ao comunista iugoslava, liderada por Tito (Josip Broz, 1892-1980). 33 Escrevendo em 1967, Lukacs afirmava ser esta sua autocritica “inteiramente Formal", Fato alias denunciado por seus oponentes (J. Révai, M. Horvath): ver 0 seu prefacio a Arte e societd, Roma, Riuniti, 1977, v. 1, p. 19. Mas admitindo, anos depois, que fez excessivas concessées nesta autocritica, o velho Fildésofo acrescentou: “Como justificagao posso dizer que, se Rajk Foi executado na Hungria, nao se podia ter uma garantia séria de que, no caso de haver oposigao, nao nos poderia acontecer coisa semelhante” (Lukdcs, Pensamento vivido, cit., p. 117). N. Tertulian, no texto ja citado na nota 25, “Lukacs hoje”, reproduz o comentario de Lukacs a um interlocutor em 1962, referindo-se a sua atitude em Face dos debates de 1949/1950: “Se naquela época eu nao hitpsipc.org.briportl2s1258 25138 29rt12028, 18:17 Sobre Lukdcs ea poltica - PCB — Partido Comunsta Brasileiro tivesse Feito a minha autocritica, estaria agora num tumulo sendo venerado. [...] Eu teria sido enforcado e logo em seguida reabilitado com todas as honras”. 34 Sobre a insurreicdo htingara de 1956, ver, para interpretacdes muito diferenciadas, |. Mészaros, La rivolta degli intellectuali in Ungheria, Turim, Einaudi, 1958; Francois Fejt6, La tragédie hongroise, Paris, Pierre Horay, 1958; Taméas Aczél e Tibor Méray, The revolt of the mind: a case history of intellectual resistance behind de Iron Curtain, Londres, Thames & Hudson, 1960; Jean-Paul Sartre, O fantasma de Stalin, Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1967; Fernando Claudin, A oposi¢ao no “socialismo real”. Unido Soviética, Hungria, Polénia, Tcheco-Eslovaquia 1953-1980, Rio de Janeiro, Marco Zero, 1983. 35 Kostas Papaionnou, Marx et les marxistes, Paris, Flammarion, 1972, p. 17. 36 Fernando Claudin, cit., p. 163-164. 37 Tibor Déry (1894-1979), Figura exponencial da literatura hingara, condenado a prisdo em 1957 e anistiado em 1960. Sobre Illiés, ver, infra, nota 43 do texto Testamento politico. Istvan Mészaros (1930), discipulo de Lukacs, emigrou na sequencia dos eventos de 1956, radicando-se na Inglaterra; muitas de suas obras foram publicadas no Brasil. 38 Sobre tais eventos, ver as evocacdes do filésofo em G. Lukacs, Pensamento vivido, cit., p. 131-137, 168-169. 39 Saldo da luta: “aproximadamente 2.000 mortos e 13.000 Feridos em Budapeste, 700 mortos e 1.500 feridos no resto do pais. Foram encarcerados milhares de combatentes, em sua maioria operarios jovens. A imprensa hungara informou, nos meses seguintes, sobre até 105 execucées” (F. Claudin, A oposi¢ao no “socialismo real”, cit., p.162). 40 K, Axelos, “Prefacio” a G. Likacs, Histoire et conscience de classe. Essais de dialectique marxiste, Paris, Minuit, 1965, p.3. hitpsipc.org.briportl2s1258 26138 212023, 16:17 Sobre Lukas ¢ apoliica ~ PCB — Partido Comunsta Brasileiro 41 Lukacs s6 é readmitido no Partido em 1967. 42 Parte do material dessa campanha foi publicada em portugués: de Béla Fogarasi (1891-1959, filosofo antes préximo a Lukacs), 0 artigo “As concepcoes Filoséficas de Georg Lukacs” (divulgado na edicao em portugués da revista internacional patrocinada pela Unido Soviética, Problemas das Paz e do Socialismo, n. 4, 1959), e de Joseph Szigeti (nascido em 1921, ex-aluno de Lukacs), “Relacao entre as ideias politicas e filos6ficas de Lukacs” (Estudos Sociais, Rio de Janeiro, n. 5, 1959). De Fato, a campanha contra Lukacs esgota- se na entrada dos anos 1960. 43 Ver Pensamento vivido, cit., p. 169. 44 Lukacs considerava que o stalinismo, ao promover a paralisia do pensamento marxista, respondia também pela auséncia de uma critica substantiva ao capitalismo contemporaneo - critica que deveria enfatizar o seu carater manupilatério. Na exigéncia de um “renascimento do marxismo”, Lukacs chegava a exagerar, afirmando que a Ultima pesquisa criativa sobre o capitalismo era 0 livro de Lenin sobre O imperialismo (1916) e insistia na necessidade de se escrever um O capital do século XX. 45 Ver G. Lukacs, “The twin crises”, New Left Review, Londres, n. 60, 1970. 46 Sobre esta “escola” (Agnes Heller, Férenc Féher, G. e M. Markus, M. Vajda), ver o prefacio de Jean-Michel Palmier a Agnes Heller, La théorie des besoins chez Marx, Paris, UGE-10/18, 1978; depois da morte de Lukacs, este grupo transitou para posigées teéricas e ideolégicas antagénicas as de Lukcs. E preciso nado identificar esta “Escola de Budapeste” com o que outros estudiosos vém designando como “escola de Lukacs” : cf. Tibor Szab6, Gyérgy Lukdcs. Filosofo autonomo, cit., p. 225-238. 47 E também o periodo em que suas ideias ganham crescente difusdo no Ocidente, com 0 inicio da publicagao de sua obra completa pela editora alema- ocidental Luchterhand e a ampla repercussao de versées de seus textos em hitpsipc.org.briportl2s1258 27138 29rt12028, 18:17 Sobre Lukdcs ea poltica - PCB — Partido Comunsta Brasileiro italiano, inglés e castelhano. Nos finais dos anos 1960, sua ativa participagao na campanha internacional em defesa da comunista norte-americana Angela Davis (nascida em 1944), torna-o ainda mais conhecido. 48 Sobre os eventos na Tchecoslovaquia, ver, entre outros: Roger Garaudy, La liberte em sursis: Prague, 1968, Paris, Fayard, 1968; ” intervention em Tchecoslovaquie, pourquoi?” , Cahiers Rouge, Paris, n. 5, 1969; Pierre Broué, A primavera dos povos comeg¢a em Praga, Sao Paulo, Kairis, 1979; Fernando Claudin, A oposi¢ao no “socialismo real”, cit. 49 M. Lowy, no texto ja citado (A evolu¢do politica de Lukécs, p. 252), anotou: “Jovens estudantes revolucionarios da Europa Ocidental, que visitavam Lukacs por volta de setembro de 1968, ficaram espantados com a severidade da sua critica quanto a URSS e, por outro lado, seu interesse profundo pelos acontecimentos de maio na Franca. Lukacs compreendia a relacao dialética entre as duas crises, a do stalinisno e a do mundo burgués”. 50 M. Lowy, cit., p.254; dai extraimos a frase de Lukacs citada pouco antes. 51 E notavel o fato de Lukacs, reconhecendo expressamente a necessidade de analises capazes de aprender os tragos contemporaneos da ordem capitalista, pensar as transFormacées préprias 8 auto-reforma do socialismo — elas igualmente contemporaneas — com as categorias leninianas, sem submeté-las a qualquer atualizagao e/ou critica. 52 AFirmacdo que, também ela, pode prestar-se a mal-entendidos: ver os apontamentos de N. Tertulian, no artigo citado na nota 25 (p. 30-32). [LUKACS, Gydrgy. Socialismo e democracia: escritos politicops 1956-1971. Organizacao, introducao e tradu¢ao Carlos Nelson Coutinho e José Paulo Neto. Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 2008, p. 7-31] Cronologia da vida e da obra de Lukdcs hitpsipc.org.briportl2s1258 2838 29rt12028, 18:17 Sobre Lukdcs ea poltica - PCB — Partido Comunsta Brasileiro 1885 Nasce em Budapeste, a 13 de abril, segundo filho de Jozef von Ludcs e Adél Wertheimer. 1902 Ingressa na Universidade de Budapeste, publica seus primeiros textos na imprensa hingara e frequenta reunides do “Circulo de Estudantes Socialistas Revolucionarios”, criados por Erwin Szabo. 1904 E um dos fundadores do grupo teatral Thalia. 1906 Doutora-se em direito pela Universidade de Budapeste. Colabora com a revista progressista hingara Huszadik Szdzad (Século XX). A leitura dos Uj Versek (Novos poemas), de Endre Ady, impressiona-o profundamente. 1908 Recebe, pelo seu texto ainda inédito Histéria do desenvolvimento do drama moderno, o Prémio Kristina, da Sociedade Kisfaluddy. Torna-se colaborador da revista Nyugat (Ocidente). 1909 Trava relagdes com Endre Ady e torna-se amigo de Béla Balazs, a cuja obra poética dedica um livro. Tem um tumultuado relacionamento amoroso com Irma Seidler, que se suicida algum tempo depois. Dedica a esta tragica experiéncia um ensaio intitulado “Sobre a pobreza do espirito”. Doutora-se em Filosofia pela Universidade de Budapeste. 1910 Viagens a Alemanha, Franca e Italia. Trava relagées com Georg Simmel e conhece Ernst Bloch. 1911 Publica a Histéria do desenvolvimento do drama moderno e, também em alemao, A alma e as formas. E um dos Fundadores da revista Szellem (Espirito). 1912 Vive em Florenga. Por sugestao de E. Bloch, transfere-se para Heidelberg. 1913-1915 Em Heidelberg, relaciona-se com Ferdinand Tonnies, Max Weber e Emil Lask. Estuda a obra de Hegel. Trabalha numa Estética, que deixou inconclusa e s6 Foi publicada postumamente; projeta um livro sobre hitpsipc.org.briportl2s1258 29138 29rt12028, 18:17 Sobre Lukdcs ea poltica - PCB — Partido Comunsta Brasileiro Dostoiévski. Conhece sua primeira mulher, leliena A. Grabenko. Publica Cultura estética (1913). 1916 Publica, em revista especializada, A teoria do romance. 1917 Em Budapeste, anima o “Circulo Dominical”, frequentado por Béla Fogarasi, Arnold Hauser, Karl Mannheim e Eugene Varga. Publica A relagao sujeito-objeto na estética. Recebe com entusiasmo as primeiras noticias sobre a Revolucao Bolchevique. 1918 Retoma o exame de Marx (que conhecia desde a preparacao de Histéria do desenvolvimento do drama moderno) e, sob a influéncia de E. Szabé, lé Rosa Luxemburg e Georges Sorel. Publica 0 ensaio “O bolchevismno como problema moral”. A 2 de dezembro, ingressa no Partido Comunista. 1919 Com a queda da monarquia dos Habsburgos e a proclama¢ao, em marco, da Republica Soviética da Hungria, torna-se Vice-Comissario do Povo para a Cultura e a Educacao Popular. Apés a derrota da republica, em agosto, soba violenta repressao de Horthy, é um dos dirigentes clandestinos do Partido Comunista. Em setembro, exila-se na Austria. Condenado & morte pelo regime de Horthy, é preso em Viena, em outubro; sua extradicao é evitada gracas mobilizacao de intelectuais alemaes. Publica Tatica e ética, seu primeiro livro de inspiragao marxista. 1920 Torna-se co-editor de Kommunismus (Comunismo), 6rgao tedérico da Internacional Comunista. Casa-se com a companheira de sua vida, Gertrud Bortstieber, vitva do matematico Imre Janossy. Sob a forma de livro, publica A teoria do romance. 1921 Na luta interna que se trava no Partido hingaro, alinha-se com a fragao de Jeno Landler, opositor de Béla Kun; representando esta fracao, participa, em Moscou, do Ill Congresso da Internacional Comunista. 1922 Aprofunda seus estudos sobre Marx e comega sistematicamente a leitura de Lenin. hitpsipc.org.briportl2s1258 30138 29rt12028, 18:17 Sobre Lukdcs ea poltica - PCB — Partido Comunsta Brasileiro 1923 Publica Histéria e consciéncia de classe. Estudos spbre a dialética materialista, coleténea de textos escritos depois de sua adeséo ao comunismo. 1924 Historia e consciéncia de classe recebe as primeiras criticas nas instancias oficiais do movimento comunista. Publica Lenin: a coeréncia de seu pensamento. 1926 Publica Moses Hess e o problema da dialética idealista. 1928 Com a morte de J. Lander, assume a lideranca da corrente anti-Béla Kun no interior do partido hingaro. Prepara documentos para 0 Il Congresso do Partido. 1929 Clandestino, permanece trés meses na Hungria, em tarefas partidarias. Apresenta, no Il Congresso do Partido, as “Teses de Blum” (Blum era o seu nome na clandestinidade); derrotado e ameagado de expulsao, faz autocritica e afasta-se de atividades diretamente politicas por quase trés décadas. 1930-1931 Vai para Moscou, onde pesquisa no Instituto Marx-Engels-Lenin, ent&o dirigido por David Riazanov. Conhece os ainda inéditos Manuscritos econémico-filos6ficos de 1844, de Marx. Estabelece relagées com Mikgail A. Lifschitz, a quem dedicara mais tarde, “com veneracao e amizade”, o seu O jovem Hegel. 1931-1933 Vive semiclandestino em Berlim (sob o pseudénimo de Keller). Tem ativa intervencao na revista Die Linkskurve (Giro 4 esquerda), 6rgao da Federacao de Escritores Proletarios Revolucionarios, vinculada ao Partido Comunista aleméo. Sao deste periodo ensaios que discutem a relacao entre realismo e “literatura proletaria”, tais como “Tendéncia ou partidarismo” e “Reportagem ou configura¢ao”. 1933-1940 Regressando a Moscou, desenvolve intensa atividade intelectual, de que resultam indmeros ensaios, entre os quais: “Friedrich Engels, teérico e critico da literatura”, “Tolstoi e a evolucao do realismo” e “Heinrich Heine como poetra nacional” (1935), “A fisionomia intelectual dos personagens hitpsipc.org.briportl2s1258 31/38 29rt12028, 18:17 Sobre Lukdcs ea poltica ~ PCB — Partido Comunsta Brasileiro artisticos”, “A comédia humana da Russia pré-revolucionaria” e “A tragédia de Heinrich von Kleist” (1936), “O escritor e o critico” (1939), “Tribuno do povo ou burocrata” (1940), quase todos pésteriormente coletados em livros. Torna-se membro do Instituto Filoséfico da Academia de Ciéncias da Unido Soviética e do conselho editorial de varias revistas culturais. Em 1937-1938, é figura cemtral nos debates em que se envolve a intelectualidade exilada (Ernst Bloch, Bertolt Brecht e Anna Seghers), nos quais critica o expressionismo alemdo e insiste na defesa de uma literatura capaz de assimilar a heranga cultural do realismo critico burgués. Comeca a pesquisar as relagdes entre o irracionalismo Filos6fico e o fascismo. Publica O romance histérico, em 1937, e, um ano depois, conclui seu estudo sobre O jovem Hegel, publicado em 1948. 1941-1944 Em 1941, a policia politica stalinista o prende, sob o Falso pretexto de, nos anos 1920, ter sido trotskista; é libertado gracas ao empenho de seu amigo de joventude Eugene Varga (que se tornara importante economista na Unido Soviética) junto a Gueorgui Dimitrov, entao dirigente maximo da Internacional Comunista. 1945-1949 Retorna a Hungria libertada e empenha-se na construcao da nova democracia: participa do Conselho Nacional da Frente Popular Patridtica, da direcdo da Academia de Ciéncias da Hungria, assume a cdtedra de Estética e Filosofia da Cultura na Universidade de Budapeste e Funda a revista cultural Forum. Realiza varias viagens 4 Europa Ocidental, participando de encontros internacionais, seminarios e coléquios. Recebe o Prémio Kossuth e é membro Fundador do Conselho Mundial da Paz. Em 1948, na Sui¢a, publica seu estudo sobre Ojovem Hegel. No Partido e no Estato hiingaros, polarizam-se posic¢des ideoldgicas, com a vitéria da corrente ligada a Rakosi, expressdo local do dogmatismo stalinista; desta vitéria resulta a execucao do lider da corrente opositora, Rajk. Publica, em 1947, Goethe e seu tempoe Crise da Filosofia burguesa (que, na tradugao Francesa parcial, tera o titulo de Existencialismo ou marxismo/. 1949-1951 Reflexo da vitéria de Rakosi, abre-se a “questao Lukacs": a intelectualidade oficial — L. Rudas, o ex-discipulo J. Révai, M. Horwath, J. Darvas — critica injuriosamente a sua obra. A revista Forum é fechadaea hitpsipc.org.briportl2s1258 32138 29rt12028, 18:17 Sobre Lukdcs ea poltica - PCB — Partido Comunsta Brasileiro campanha contra ele se desenvilve também na Unido Soviética (com o romancista Alexander Fadeiev reclamando até a adocdo de medidas adminstrativas). Pressionado, faz nova autocritica — considerada por Révai como “meramente Formal” e por ele préprio, em declaracgées posteriores, como “cinica” — e é obrigado a retrair-se a vida privada. Publica O realismo russo na literatura universal, Thomas Mann (1940) e Realistas alemdes do século XIX (1951). 1952 Publica Balzac e o realismo francés. 1954 Publica A destruicdo da razdo e Contribuicées 4 histéria da estética. 1956 Na sequéncia do XX Congresso do Partido Comunista da Unido Soviética, os Estados socialistas experimentam um periodo de efervescéncia politica, aflorando as aspiragdes democraticas, particularmente fortes na Hungria. Volta a cena publica, em junho, com a conferéncia “A luta entre o progresso e a reacao na cultura contemporanea”, pronunciada no “Circulo Petéfi”, e coma criagao (juntamente com Tibor Déry, Gyula Illés e Istvan Mészéaros) da revista Eszmélet (Tomada de consciéncia). Em meio a enorme mobilizacao popular, o Partido hingaro entra em crise aberta e Rakosi cai. A 23 de outubro, constitui- se um novo ministério, liderado por Imre Nagy, disposto a democratizar 0 pais, a0 mesmo tempo em que se cria um comité para a refundacao do Partido; no governo Nagy, assume 0 Ministério da Cultura; participa da comissao encarregada de dar nova forma a organizacao partidaria. Opde-se a proposta de saida da Hungria do Pacto de Varsévia, bem como ao apelo de Nagy a intervencdo da ONU. A crise tem seu desfecho na brutal invasdo soviética e obriga-o a asilar-se na embaixada da lugoslavia. E deportado para a Roménia, onde permanece prisioneiro. 1957-1961 Obtém permissao para regressar a Budapeste. E-lhe exigida nova autocritica; ante sua recusa, consuma-se a perda da catedra universitaria; ndo é admitido no Partido refundado e nova campanha de descrédito (iniciada por Joseph Szigéti e engrossada por Bela Fogarasi) é organizada contra ele. Em 1957, publica na Italia os Prolegémenos a uma estética marxistae A hitpsipc.org.briportl2s1258 33138 29rt12028, 18:17 Sobre Lukdcs ea poltica ~ PCB ~ Partido Comunsta Brasileiro significagéo presente do realismo critico. Até seu retorno ao Partido hingaro, ocorrido em 1967, sues livros deixam de ser publicados na Alemanha Oriental e passam a sé-lo na Alemanha Ocidental. 1962 A revista italiana Nuovi Argomenti divulga a sua “Carta sobre o stalinismo”. Na Alemanha Ocidental, a editora Luchterhand anuncia a publicagdo das suas Obras completas. Conclui a primeira parte da sua Estética e anuncia sua pretensdo de escrever uma Etica. 1963 Pela Luchterhand, sai a primeira parte (a Unica que redigiu) de sua estética, com o titulo Estética I: A peculiaridade do estético. Em abril, morre Gertud Bortstieber, sua mulher. Publica o ensaio “Sobre o debate entre a China e a Unido Soviética”, onde toma posicao a Favor da politica de paz da diregado kruscheviana da Unido Soviética. 1964 Sdo-lhe Feitos os Ultimos ataques pela intelectualidade oficial hingara. Publica 0 ensaio “Problemas da coexisténcia cultural”. 1966 Concede a Hans Heinz Holz, Leo Kpfler e Wolfgang Abendroth uma longa entrevista, publicada em livro, na Alemanha ocidenntal, sob 0 titulo Conversando com Lukécs. Decide, antes de empreender a redacao da Etica (projeto nunca concluido), elaborar um texto introdutério sobre a Ontologia do ser social, que se autonomizaria, adquirindo grandes dimensées e sendo publicado sé postumamente. A editora Grijalbo, com sede na Espanha e no México, inicia, com a Estética |, a edic¢do em castelhano das suas Obras completas, a qual, depois de varios volumes, restara inconclusa. 1967 Autoriza, pela primeira vez, uma reedicdo de Histéria e consciéncia de classe, como parte do volume III de suas Werke, para o qual escreve um longo prefacio. A seu pedido, é reintegrado no Partido hingaro. Com isso, volta a possibilidade de ser publicado em seu pais. Prepara uma densa antologia de seus escritos sobre arte, de 1910 até os anos 1960, publicada trés anos depois em htngaro sob o titulo Arte e sociedade. hitpsipc.org.briportl2s1258 4i38 29rt12028, 18:17 Sobre Lukdcs ea poltica ~ PCB ~ Partido Comunsta Brasileiro 1968 Critica, no interior do Partido hungaro, a intervengao das tropas do Pacto de Varsévia na Tchecoslovaquia, mas evita tornar publica sua posi¢ao. Com a primeira redagao da Ontologia do ser social praticamente concluida, dedica-se a um ensaio sobre a questao da democracia, que pretendia publicar na Italia, por Riuniti, editora entao ligada ao Partido Comunista Italiano. Concluido o ensaio, Lukacs submeteu 0 texto a direcdo do Partido hungaro, que lhe pediu que esperasse dez anos para publica-lo. O ensaio, com o titulo Democratiza¢ao ontem e hoje, sé foi publicado no original alemdo em 1985, quase quinze anos apés sua redagdo. Conheceu depois edicées em diferentes linguas (italiano, francés, inglés). 1969 Recebe o titulo de doctor honoris causa da Universidade de Zagreb. 1969-1970 O grupo intelectual que lhe era proximo, mas que depois romperia com sua orientagao (a entéo chamada “escola de Budapeste”: Agnes Heller, Ferenc Fehér, Gyérgy Markus e Mihaly Ajda), faz uma série de criticas ao manuscrito original da Ontologia do ser social. Embora sem aceitar tais criticas, mas insatisfeito com alguns aspectos deste original, inicia a redagao de um novo manuscrito para clarificar algumas de suas posigdes. Tal como o primeiro, também este segundo manuscrito sé sera publicado postumamente, com o titulo Prolegémenos a uma ontologia do ser social. Questées de principio de uma ontologia hoje tornada possivel. Na literatura kukacsiana, os dois manuscritos passaram a ser conhecidos, respectivamente, como “grande” e “pequena” ontologia. 1970 Recebe 0 titulo de doctor honoris causa da Universidade de Ghent e 0 Prémio Goethe. Publica o livro Soljenitsin, no qual assume claramente a defesa do escritor contra os seus opositores soviéticos. 1971 A 4 de junho, em consequéncia de um cancer pulmonar, falece em Budapeste. Pouco antes, jd consciente do carater terminal de sua doenga, escreve alguns apontamentos autobiograficos e concede uma longa entrevista a Istvan Eorsi, na qual explicita os temas sugeridos nestes apiontamentos. Estes Ultimos e a entrevista foram publicados, em 1980, com 0 titulo Pensamento vivido. Autobiografia em forma de didlogo. hitpsipc.org.briportl2s1258 35138 29rt12028, 18:17 Sobre Lukdcs ea poltica ~ PCB ~ Partido Comunsta Brasileiro 1973 E encontrado em Heldelberg um conjunto de cerca de 1.650 cartas, parte da sua correspondéncia entre 1900 e 1917. Muitas delas foram publicadas mais tarde, em diferentes linguas, com o titulo Correspondéncia de juventude 1908-1917. 1974 Divulgam-se, pela primeira vez no Ocidente, alguns rensaios sobre questées de teoria literaria, que redigiu em Moscou entre 1933 e 1944. Na edicao francesa, tais ensaios Formam um livro intitulado precisamente Escritos de Moscou. 1976-1986 Os dois volumes de Para a ontologia do ser social sao publicados na Italia, respectivamente em 1976 e 1981. Somente em 1986, como volumes 13 e 14 de suas Werke, a obra aparece no original alemao, precedida da chamada “pequena Ontologia”, que sera também publicada em italiano em 1990. Ha ainda uma edicdo hungara integral das duas “ontologias”. [LUKACS, Gyérgy. O jovem Marx e outros escritos de Filosofia. Organizacao, apresentacao e traducao Carlos Nelson Coutinho e José Paulo Neto. 2? ed. Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 2009, p. 15-23] CATEGORIA _ MARXISMO (HTTPS://PCB.ORG.BR/PORTALZ/CATEGORY/S10-INTERNACIONAL/AMERICA LATINA/SB-BRASIL/S4-PCB/S7-FORMACAO-POLITICA/C34-MARKISMO) 3 DE MARCO DE 2011 +— TKCSA: mais uma obra do PAC desrespeita LIBIA: 0 QUE A MIDIA ESCONDE as leis ambientais. (https://pcb.org.br/portal2/1260) > (https://peb.org.br/portal2/1258) MATERIAS RELACIONADAS: Livro PCB 100 anos de histérias e lutas (https://pcb.org.br/portal2/31108) A Turquia e a Revolugao Socialista (https://pcb.org.br/portal2/31033) Asatde publica na Russia pés-revolucionaria (https://pcb.org.br/portal2/30885) Democracia burguesa x centralismo democratico (https://pcb.org.br/portal2/30837) Sobre o planejamento econémico socialista: refutando Hayek (https://pcb.org.br/portal2/30779) hitpsipc.org.briportl2s1258 36138 2orv2023, 16:17 Sobre Lukdcs ea politica - PCB - Partido Comunsla Brasilovo OHIV sob uma otica marxista (https://pcb.org.br/portal2/30768) Lénin: “Sobre a unidade do Partido” (https://pcb.org.br/portal2/30714) Sistema de justica e luta de classes (https://pcb.org.br/portal2/30516) Marx, um pensador de Frente para a histéria (https://pcb.org.br/portal2/30386) Marx e 0 problema dos salérios (https://pcb.org.br/portal2/30358) Divida publica e acumulacdo capitalista no Brasil (https://pcb.org.br/portal2/30308) 175 anos do Manifesto Comunista (https://pcb.org.br/portal2/29997) Teoria econémica e desonestidade (https://pcb.org.br/portal2/29486) Direita e esquerda na histéria (https://pcb.org.br/portal2/29256) Aatualidade da critica anti-imperialista (https://pcb.org.br/portal2/28397) Lénin: as vésperas da Revolucao de Outubro (https://pcb.org.br/portal2/27984) Sobre a responsabilidade dos intelectuais (https://pcb.org.br/portal2/27878) Kollontai: marxismo e revolugao sexual (https://pcb.org.br/portal2/27736) Uma defesa da Teoria Marxista da Dependéncia (https://pcb.org.br/portal2/27106) Atransformacao de valores em precos (https://pcb.org.br/portal2/26987) NOTAS DOS EDITORES: S6 publicamos nesta pagina textos que coadunam, no fundamental, com a linha politica do PCB, a critério dos editores (Secretariado Nacional do CC). 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