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HISTORIA DA ARTE COMO HISTORIA DA CIDADE Giulio Carlo Argan 1 A HISTORIA DA ARTE A venerada memoria de Lionello Venturi e de Erwin Panofsky Uma vez que as obras de arte sdo coisas as quais esta relacio- nado um valor, ha duas maneiras de trata-las. Pode-se ter preocu- pacao pelas coisas: procura-las, identifica-las, classificd-las, conserva- las, restaura-las, exibi-las, compra-las, vendé-las; ou, entao, pode- se terem mente o valor: pesquisar em que ele consiste, como se gera € se transmite, se reconhece e se usufrui. Aplicando ao nosso caso a distincdo feita por Scheler em sua teoria geral do valor, digamos que, de um lado, esta o ‘“‘bem”’ ou a coisa que tem valor (Wertdin- ge) e, do outro, esta o valor da coisa (Dingwert), Para quem trata de coisas artisticas, estas tm um valor intrinseco, que o especialista reconhece a partir de certos sinais, como a pureza de um diamante, mas cuja esséncia nao procura saber, nem sustenta ser impossivel sabé-la. Para quem lida com o valor, a coisa ¢ apenas a oportunida- de de produzi-lo, a prova da sua existéncia, o meio pelo qual se co- munica. O interesse pelas coisas ocasiona um conhecimento empiri- co, mas extenso e diferenciado, dos fenémenos artisticos. O inte- resse pelo valor transcende os fatos isolados e generaliza 0 conheci- mento da arte em proposicées tedricas, leva a uma filosofia da arte. Essas duas maneiras de tomar posicao em relagdo aos fendmenos artisticos reproduzem, no plano da frui¢ao, os dois tipos de com- portamento de quem faz arte: ha artistas que depositam o valor es- tético na sensibilidade, no cuidado, na pericia da operacdo, que con- 1 4 preciosidad identificam- le de uma join: ntificam-no com uma idéia universal yt "0s, Se manifesta na real da arte, g lidade sensivel dao ue los com os quais se faz a arte. O método emp, do a citncia, © método tedrico a filosorin lle permite enquadrar os fendmenos artisticos n lizagao € a historia da arte. Faz-se historia da arte Porque se Pensa que se tenha de conservar ¢ transmitir artisticos, mas porque se julga que o tinico € explicd-los seja o de “historicizé-tos’ -€ uma historia especial uma vez que se linada série de fatos, mas nao é uma historia Peculiaridade dos seus métodos nao pode como materiais de uma construcéo aente, dlescartar que a pesquisa histsrica te- om conjeturas satisfatérias a falta de da. ‘tempo € as circunstancias em que de- % A informacao abundante ¢ aular mas ndo resolve 0 problema um fato. Pereebe-se isso com clare-. tempordnea: apesar da precisio da it0 de vista da interpretagio, resto, a distingao entre uma “que encontra os mo- ‘de quem, de uma estudo das obras de a ou erudita, AamstORia Da Ante 15 dos textos e das fontes, no seja um fim em si mesma, mas um elemento preparatério ¢ auxiliar da verdadeira pesquisa histérica, ‘que se propée a interpretacao dos significados e dos valores. To- dos também concordam em julgar que a distingdo é, na pratica, ‘apenas de tempos de trabalho, pois a pesquisa do fildlogo nao tem sentido se ndo for conduzida em vista de uma construgdo histéri- ca, da qual tenha jé tracadas as linhas gerais, e 0 proprio historia- ‘dor nao pode eximir-se da pesquisa direta pois, se 0 seu propésito € original, ndo pode deixar de exigir a incluso de novos documen- 405 ou uma interpretacio diferente das ja conhecidas. Portanto, néo ha razdo para por mais uma vez em discussio a velha questo da unidade ou diversidade de critica e historiogra- fia da arte. Nao se faz histéria sem critica, ¢ 0 julgamento critico do estabelece a ‘“‘qualidade’’ artistica de uma obra a nao ser na ‘medida em que reconhece que ela se situa, através de um conjunto de relagdes, numa determinada situacdo histérica e, em whima and- lise, no contexto da histéria da arte em geral. Ao contririo da andlise empirico-cientifica da obra de arte em sua realidade de coisa (andlise que nao se limita & matéria, & téeni ca, ao estado de conservacao, ao grau de autenticidade, destina- ‘gdo origindria ¢ aos acontecimentos sucessivos, mas pode estender-se ‘Atemitica, a iconografia e alé mesmo ao “estilo”, a pesquisa his- ‘Orica nunca é circunscrita 4 coisa em si. Mesmo quando, como ‘ocorre com freqtiéncia, se propée como objetivo uma nica obra, “Jogo uultrapassa os seus limites para remontar aos antecedentes, en- jirar os nexos que a relacionam a toda uma situagko cultural (nao apenas especificamente artistica), identificar as fases, os su- jivos momentos da sua formacdo. Na pesquisa, a obra é assim ida em seus componentes estruturais, e aquela que parecia er a stia unidade indivisivel aparece, ao contrério, como um con- de experiéncias estratificadas c difusas, um sistema de rela- ‘um proceso. De fato, cada obra nio apenas resulta de um ‘laces, mas determina por sua vez todo um campo fe relagBes que se estendem até 0 nosso tempo € 0 superam, uma oz que, assim como certos fatos salientes da arte exerceram uma 0 nesmo a distancia de séculos, também nao a fe mes fe excluir que sejam considerados como pontos de referénci ituro proximo ow distante, "Basta lembrar a arte pré-historica e primitiva, considerada le- | morta ou mero documento einiogrifico até época recente, quan ou a ser avaliada como fato artistico, ponto de referencia : da arte moderna e, ao mesmo tempo, estrutura niio pré-histéria, mas da histéria dos povos primitivos. Nio disse Mare Bloch, a nfo ser dos fendmenos que con, enas na medida em que se acredita que a arte nao seja do de fendmenos sem nenhuma coeréncia, mas uma das n nto da civilizagao, pode-se em si cons- cientificidade da histéria da arte encaixa- esente crise das disciplinas historico-humanisticas se chama conflito das duas culturas. As discipli- y Ae uals op atuals sistemas de poder garan- fungio axial, além de conside- hist6rico, tendem a estender suas me- ciéncias humanas, morais ‘9 modelo sera a historia, enfim, AuuistOnta pa ante 17 também, no entanto, que outro conhece as leis dos circuitos elétri 60s € as verificou cientificamente, o que, é claro, ele mesmo pode- tia fazer, se dispusesse dos meios para tanto. Com relacao as aces humanas (e é 0 caso da arte), nosso comportamento é bem diferen- te: nds as julgamos e, uma vez que sabemos poder juled-las, se re- nuncidssemos a fazé-lo nos disporiamos a sofré-las passivamente. Julgando, aceita-se ou recusa-se. Mas que finalidade pode ter 0 ace {ar ou o recusar se com isso nao confirmamos, nao eliminamos, nem modificamos a incontrovertivel, inapagavel realidade do fato? Evi dentemente toda ¢ qualquer coisa feita tem um sentido para quem ‘fez; mas, julgando-a possuidora de valor, afirmo que tem um sen- ‘ido para mim também, para os outros, para todos. Coloco-a como "um modelo para a minha ago e para a dos outros, reconheco sua utilidade para o empreendimento comum da cultura. Com 0 ato do julgamento, qualifico a coisa como algo que tem valor, objeto; e, paralelamente, me qualifico como aquele para o qual a coisa tem valor, sujeito. Quanto maior o valor que se reconhece no objeto, maior 0 valor do sujeito que 0 entende, 0 recebe, torna-o seu. O valor é, obviamente, um algo mais de experiencia da realidade ou da vida, pelo qual o objeto transcende a propria instrumentalidade e este algo mais ndo passa do objeto para o sujeito se a ‘no momento em que o recebe, nao reconhece que ele se situa além da esfera da contingéncia, na esfera dos valores per- Imanenies da civilizagao, da historia. __Nenhuma obra de arte jamais foi encarada por uma conscién- cia sem este juizo histérico, que pode ser certo ou errado, formula~ "do de acordo com procedimentos mais ou menos apropriados. O _ pequeno-burgués que admirava Cabanel e desprezava Cézanne jul- ‘gava certamente mal (como um juiz que ignorando a jurisprudén- ‘a erra a sentenca), mas ainda assim julgava; se tivesse conhecido _ a histdria da arte, teria entendido que a arte de Cézanne, nao a de ‘Cabanel, podia enquadrar-se num discurso hist6rico coerente. A fun- 40 do método € justamente fornecer ao juizo um fundamento de " experiéncia que reduza ao minimo a margem de arbitrio, o risco de introduzir um ndo-valor numa série de valores ¢ de construir, as- ‘sim, uma falsa histéria. ____ Ebem verdade que a arte de hoje, precisa mente em suas posi- avangadas, tende a tornar-se fruitiva sem a mediagao do juizo, ntando-se como hipétese experimental de atividade estética ntegrada num novo sistema cultural nao mais Fundamentado no jui- hhist6rico; mas, pelo que nos é dado ver, limita-se, por enquanto, minar (ou colocar entre parénteses) 0 objeto e a propor, como de julgamento, um modo de comportamento. Sé que, agindo EA CIDADE estético para solicitar um juizo mo- dois, a indisting4o fundamental ou moral, o juizo é sempre um juizo his- com base numa verdade cientifi determinada situagdo humana. Aqui za uma agdo, ¢ sempre 0 fato de estar | COMO OS Motivos € as fee bencias nceitos de bom e de mau, c ae aos aL ee aaa. ee Awustonis Da ante 19 sem narrac&o, nao hé narragdo sem linguagem: a unica ordem que a historia impde & realidade & a do discurso falado ou escrito. A realidade de um fato narrado 6, sem sombra de ciivida, diferente dda realidade do fato ocorrido, mas a narragdo que se faz hoje de fatos acontecidos no passado tem, pelo tipo de vida que se leva ho- je, um valor que o fato ocorrido, como tal, ndo pode ter. Mediante ‘0 discurso histérico, 0 passado é, digamos assim, adaptado as ne- cessidades do presente, vale como experiéncia. E & exatamente isso que nao se deseja de quem, visando identificar a existéncia com 0 ‘puro interesse da acdo presente, tende fatalmente a eliminar das re Tages humanas a persuasio ¢ 0 discurso, a substituir a linguagem hhist6rica por uma linguagem formulistica ou tecnocientifica ea des- truir, afinal, aquela liberdade do pensar e do agir humanos que, para Kida verificacdo objetiva e da dependéncia logica do efeito em rela- ‘goa causa, fundamenta a ordem moral da interpretacao, do juizo, da escolha. No ambito da civilizagao européia, classico-crista, a ar- te certamente teve um desenvolvimento histdrico correspondente & estratura historicista dessa civilizagao. Fez-se a arte com a intengao ea consciéncia de fazer arte e com a certeza de concorrer, fazendo arte, para fazer a civilizagdo ou a historia. A intencionalidade ea consciéncia da funcao historica da arte so, indubitavelmente, os _pincipais fatores da relagdo que se estabelece entre os fatos artisti- 0s de um mesmo periodo, entre os periodas sucessivos, entre a ati- vvidade artistica em geral e as demais atividades do mesmo sistema cultural. Todavia, como sabemos que, fora dessa area cultural, fendme- ‘nos que reconhecemos como artisticos se produiram em circuns- " tncias completamente diferentes, fica claro que essa intencionali- dade ¢ essa consciéncia nao so condigdes nevessarias & produczo os fatos artisticos, mas caracteristicas peculiares das poeticas que foram elaboradas no Ambito de uma determinada cultura. Uma hi _t6ria da arte s6 € possivel e legitima se explicar 0 fendmeno artistico em sua globalidade; nao se pode fazer uma historia da arte se n8o se admite a existéncia de uma relacao entre todos os fendmenos ar- tisticos, qualquer que seja a dimensao espago-temporal em que fo- "ram produzidos. Mas, entio, ¢ preciso optar: ou a relagio estd abaixo ‘OU esta acima das poéticas. A critica de postura idealista tem pro- " curado distinguir entre arte e poética, indicando nesta ultima um " Substrato cultural que pode se associar ou nao ao ato artistico, Em “conseqiiéncia, voltou-se com um interesse cada vez mais agudo pa- ‘@arte primitiva, em que tinha a ilusdo de encontrar, afinal, um fer artistico puro, imune de todo compromisso com a cultura. ‘que esta concepgdo meta-historica foi refutada pelos estudos et- 20 A HISTORIA DA ARTE E A CIDADE nolégicos que, procedendo com métodos rigorosamente cientiticos, destruiram a tradicional hierarquia de culturas avancadas e primit vas, como se estas tiltimas estivessem no inicio do mesmo caminlio que as primeiras j4 percorreram em boa parte. Uma vez que exis: uma pensée sauvage, estruturalmente diversa da nossa mas nao in ferior, também € possivel que existam poéticas da arte primitiva Nosso problema ndo € buscar qual a esséncia ou a estrutura pro funda e constante da arte, mas tentar estabelecer se, na atual condi 40 da nossa cultura, a explicagdo cientifica dos fatos artisticos ¢ a historia ou uma ciéncia da arte que avanga com métodos diferen tes dos da histéria. Nossa cultura substituiu 0 conceito de arte pela nogao de toda a série fenoménica da arte. Existe, portanto, um ple. no no qual todos os fendmenos que chamamos artisticos devem nos parecer ligados entre si por um fator comum e formar um sistema Trata-se de ver se, nesse plano, 0 processo que os explica é 0 discur- 50 histérico ou a verificacdo cientifica. Explicar um fendmeno significa identificar, em seu interior, as relagdes de que ele ¢ 0 produto e, fora dele, as relacdes pelas quais € produtivo, isto ¢, as que o relacionam a outros fendmenos, a pon to de formar um campo, um sistema oi rout se tient fem que tuo écoerente]. E praticamente impossivel definir os limites e 0 conte:i- do do campo fenoménico da arte. Nenhum critério empitico de agri pamento é aproveitavel: nao 0 stio a conformacio, a tipologia, « destinacao dos objetos; nao o soa materia, a estrutura, a técnica Por mais classes e subclasses de objetos se possam distinguir em re lagdio a estes e a outros fatores, nunca existiré uma da qual se possa dizer que todos 05 objetos que a compdem sejam objetos de arte, nem uma de que se possa dizer 0 contrario. Mesmo quando nos de- paramos com objetos produzidos com a intengao consciente de fa- zer objetos artisticos, nao se pode deixar de reconhecer que alguns (so € outros nao. Assim, um monumento, uma estétua, uma pin- tura no tém maiores probabilidades de ser obras de arte do que uma casa, uma cerdimica, um tecido. A propria nogao de objeto, no &mbito dos fatos estéticos, nao fornece um critério geral. Ainda que, com base na experiéncia, se possa dizer que todo fato artistico determina uma relagdo especial entre realidade objetiva c realidade subjetiva, isso nio significa que a cada ato artfstico corresponde @ producdo de um objeto material, Na atual condi¢do da cultura admite-se até (por exemplo, nas poéticas dadaistas) que 0 mesmo objeto possa ser, simultaneamente, arte néo-arte, bastando para ou desqualificd-lo como arte a intencionalidade ov a ati- tude da consciéncia do artista ou, até, do espectador. A MISTORIA DA ARTE 21 ‘A qualidade pela qual objetos pertencentes a eategorias empi- ricas to diversas sto considerados igualmente artisticos consiste, Geevidente, em algo que todos os objetos artisticos, e to-s6 eles, ossuem. Nao se pode distinguir essa qualidade com métodos em’ pitioos, nem com os métodos das ciéncias exatas. Ao dizer “isto & arte”, no colocamos o objeto numa classe ideal de objetos artist 05, simplesmente enunciamos um contra-senso: de fato, a propo: sigdo nfo pode ser verificada, nem em termos de fato, nem em ter- mos de principio. Mesmo que dispuséssemos de um ‘“conceito”” da arte, ele nao nos serviria como pedra de toque: 0s conceitos ¢ os fatox no sio entidades comparveis. O méiodo da identidade e da ‘analogia, amplamente praticado pelas ciéncias naturais, também & Jimpessivel de aproveitar: da identidade de dois objetos pode-se de- duzit apenas que um deles, com toda certeza, ndo é obra de a Masse quisermos explicar por que nao € obra de arte eo fizermos, dizerdo que néo pode sé-lo porque, na ordem estética, identidade Signi‘ica repeticao e a repeticao anula o valor, jé concluiremos toda luma série de operagdes mentais que nada tém a ver com a légica do método cientifico. De fato, assumiremos uma identidade apa- Fentecomo prova de uma ndo-identidade substancial, deduzindo dis 50 que um dos dois objetos semelhantes é artistico e 0 outro nao; afirmaremos que o valor artfstico consiste numa experiéncia que se faz, de modo que sua repeti¢ao ndo tem valor; enfim, acabaremos demonstrando que o valor ndo esta em nenhum dos elementos que. A umexame mais atento, resultam tao semelhantes a ponto de pare- erem idénticos Mas a celacdo de dependéncia nem sempre ¢ negativa. Pode hayer dois objetos cuja semelhanca indique, sim, uma relagao de dependéncia, sem que todavia dela resulte a nulidade ou a perda do valor. Portanto, devemos admitir que, quando processo nao & um ‘Processo de cépia, mas de aprofundamento ou de desenvolvimento dda experincia, a relacdo é positiva. Neste caso, porém, trata-se cla Tamente de uma relagdio historica que foge & averiguacao e A verifi- ‘cago, ¢ s6 pode ser reconstruida através do discurso Excluindo como um contra-senso 0 juizo do tipo “este objeto € arte”, podemos recorrer a uma forma diferente de busca do va- Jor. Quando falamos, por exemplo, “esta pintura é uma obra flo- rentina do inicio do Cinquecento”, afirmando implicitamente que, por si-lo, é uma obra de valor artistico, do ponto de vista légico dizemos um contra-senso pior até que o primeiro, mas, do ponto de vista histérico, a proposicdo ¢ legitima. De fato, nao nos limita- ‘mos a constatar uma analogia mais ou menos marcante com obras ee 22 A MISTORIA DA ARTE E A CIDADE conheciclas daquela época e daquele lugar, pois sabemos que a ar logia poderia ocultar uma eépia ou um falso, ou seja, uma auséncia de valor; reconhecemos, ao contrario, que, mesmo insistindo sot a exist@ncia de premissas culturais comuns, a obra em questio caracteriza-se por algo diferente e novo, e que esse modo de se ca racterizar ou de inovar em relagao a uma cultura determinada ¢ s melhante & maneira pela qual as obras florentinas da primeira me tacle do Cinquecento se earacterizam e inovam. Ou seja, 0 que liamos nao ¢ um tipo de obra, mas um tipo de processo, uma n neira dé relacionar-se; em outras palavras, 0 dinamismo ou a dis tica interna de uma situacdo cultural na qual a obra que estudame (ela é, de fato, a que pensamos ser) se insere naturalmente liga-s Aum contexto, funciona. E um juizo histrico que ndo encerra, mas abre a investigacdo. Depois de verificar as relagdes que concorre' € se estabelecem na obra, explicando a sua génese, verificar-se-in as que delas partem para diferentes direcdes e com aleance mais 0 ‘menos longo no espago ¢ no tempo. O juizo que se emite de obras estranhas & esfera da nossa ci! tura histérica também é um juizo histérico. Quando reconhecemos a qualidade artistica de uma escultura negra, partimos de uma n G40 global da importancia que a atividade artistica tem no sist ‘cultural das comunidades tribais da Africa negra, ou seja, nos portamos exatamente como quando reconhecemos a qualidade a tistica de um quadro florentino do Cinquecento. Muitos dos com ponentes culturais que entram em jogo na obra nos passarao des percebidos, 0 que no aconteceria se conhecéssemos melhor a cu tura que a produziu. Trata-se, porém, de incdgnitas as quais sem pre sera possivel substituir os valores que representam porque, por ‘mais profundas que sejam as herancas ancestrais (que, de resto, s brevivem também sob a limpida historicidade das obras classicas) jamais se chegard a descobrir, abaixo delas, 0 estagio pré-cultu: de uma peculiaridade original, biol6gica ou racial. Nao diremos, por tanto, que 0 fetiche negro ¢ o Juizo de Michelangelo se enquadram ae nia categoria da arte porque a arte est acima da contin ‘gencia histérica, universal. Seria como explicar os sistemas de pa rentesco dizendo que todos os homens sao irmaos no Senhor. O que interessa sdo as ligacOes reais, diretas ou indiretas, ocultas ov aoe ‘due se estabelecem entre os homens ¢ fazem de toda a h- uma sociedade historica. Diremos, portanto, que o feti- © 0 Jufzo de Michelangelo fazem parte de um mesmo sis: relagdes ou de um mesmo contexto histérico. Assim, nossa admitindo a coexisténcia dessas obras no mesmo campo fe Astonia DA ARTE 23 noménico da arte, deve lograr definir a sua relago, ou a razao pela qual ndo se pode entender uma sem entender também a outra Ao dizer que a “‘artisticidade”’ da arte forma um s6 corpo com 4 sua historicidade, afirma-se a existéncia de uma solidariedade de principio entre a ago artistica ¢ a acao hist6rica; e a raiz comun é, evidentemente, a consciéncia do valor da acao humana. Uma agao que determina um valor é uma ago dotada de uma finalidade e cu: Jo processo se controla: realiza-se no presente, mas pressupde a ex periéncia do pasado e um projeto de futuro. A acao artistica é uma ago que pressupde um projeto — portanto, o procedimento da c6- Pia, que substitui a experiéncia eo projeto pelo modelo, nfo ¢ arts fico. E 0 projeto ¢ uma finalidade que, realizando-se ho presente, assegura A aco um valor permanente, histérico... A relacao experiéncia-projeto reflete a relacio em que se fundamenta a idéia da agio histérica e, por conseguinte, da sua representacdo, a hist6- tia falada ou escrita. Ha culturas, precisamente as culturas que se dizem classicas, em que os artistas tém plena consciéncia da historicidade intrinseca da arte ¢ consideram sua a¢do como aco historica. A finalidade configura-se como teoria da arte, isto é, como projeto artistico uni versal; a praxis, por sua vez, coloca-se como processo que realiza a idéia superando a dificuldade, o obstaculo da materia. A empresa da arte aparece como uma empresa hersica e 0 verdadeiro objeto dia historia nao é tanto a obra quanto quem ousadamente a execu: ta. Vasari concebe a historia da arte como uma série de biografias de artists, indicando como vida-modelo a de Michelangelo, o artista- hherdi que, dramaticamente, a custa de lutas e de esforsos sobre- humanos, supera a natureza na histria e a histdria na idéia © problema que nos interessa, entretanto, ndo diz respeito a incontestével legitimidade de considerar os artistas como persona- ens histdricos e as obras de arte como significativas para a hist6ria Civil, politica, religiosa ou do saber, mas sim & possibilidade e a ne- eessidade de uma histéria especial da arte, que explique de maneira satisfaroria os fatos artisticos, ou seja, que descreva, através de uma ‘metodologia especifica, sua historicidade peculiar. Do ponto de vista do historiador, que utiliza os monumentos como provas ou teste munhos para a historia civil, religiosa ou da cultura, nao é muito importante que eles sobrevivam ou que deles se conserve apenas ‘meméria; entretanto, o historiador da arte, que deve explicar o si Rificado intrinseco dos fatos artisticos, ‘nfo pode limitar-se a proclamé-los memordveis, deve t8-Ios em mente. De fato, a histéria especiais, que é feita na A mistonia Da ARTE 25 evoci-los, reconstry , Meets da cacacterss ‘mas 0 seu continuo repropor-se, em termos sempre diversos, no hic bette i ef nunc de consciéncias diversamente condicionadas pelas mutagoes pemoriceratia da arte epelos desenvolvimentos da cultura — hoje falariamos da impossi- eeest0; 20 contrario, bilidade de obsolescéncia do valor artistico. Qualquer que seja a sua Fatos aos quiais se assis’ antiguidade, a obra de arte sempre ocorre como algo que acontece ede si um conjunto de tes ‘no presente, Aqui o que chamamos de juizos, sejam positivos ou -do evento que se prepa negativos, na verdade sao atos de escolha, tomadas de posicao. Dian- -versdes, avaliacdes, te de um acontecimento que se produz ndo podemos nos omitir © € suficiente pesar ¢ pronunciar juizos serenos e distantes; devemos decidir se prestamos lar 0 seu; deve cor ‘undo atenc&o, aceitamos ou recusamos. F 0 que se aceita ou se a perspectiva segundo reeusa é, na realidade, a coexisténcia com a obra, a qual esta fisica- Wiitsiem sua nar mente presente e, apesar de pertencer ao passado, ocupa uma por- fetta obra de arte ‘glo do nosso espaco e do nosso tempo reais. Nao temos alternati- vva: € um dado da nossa existéncia. Se Ihe reconhecemos um valor, devemos inseri-lo e justificd-lo em nosso sistema de valores; caso ipa Hppitirib,. deveraos nos livrar dele fingindo que nfo o vemos, ee scinals Femové-Ic ou, mesmo (como muitas vezes aconteceu e acontece), : nals a0 destrui-lo. ‘Sem sombra de diivida, a obra de arte nao tem para nds 0 mes- ‘mo valor que tinha para o artista que a fez ¢ para os homens da textos originais; sua época, A obra é sempre a mesma, mas as consciéncias mudam. a da do historia Entretanto, nao é verdade que algo dela perca valor e algo continue t a valer; mais precisamente, que os contetidos da comunicacao per- -caminho progres cam seu valor e 0s sinais com que sio comunicados continuem a 5 € as descoberias valer. Se assim fosse, a arte seria uma linguagem ¢ o historiador de ‘arte um glotlogo interessado apenas na mecénica dos sistemas lin- iiisticos. Se a historia da arte deve ser a ciéncia da arte, nio pode ecipagdes sur- ia da filosofia deixar de lado nenhum componente dos fendmenos que descreve, ‘mas deve descrevé-los da forma como sfio dados no fendmeno e nao ‘como se configuram no Ambito da cultura geral da época. Se, por ‘exemplo, reconhecemos a qualidade artistica de uma figuragao reli- ‘rie contra a burgusia que, ao subir a0 poder, renesos 3° ‘inert ehistoricta quehavia caraterizado, des emp. =» ‘ula. Tem azo, portant, os elicos marisa quart ‘am a arte moderna de pequeno-burgesa. Devries ellen, ands que com a dali iterna do sistema, 8 oposgdo thr peqvena grande bureveva capa, oo de Pe. {Coro avdae gad dede as ais eros origens (da pri fai no term, do clivador a ccadnt) 8 brauenia, uae ap eae como wna atividadetipicamente urbana Eko apena nee fevmasconsttuia da sdade ue, defo, fol considrada dur emul tempo (ata aualdegradscto do fendmeno urbano, dev ta justamente&rengasto © & ajuraho, por pare da burguesia fapialsta, do historicbmo buraut) a obra de ars por antonoms Sia: Asin era considerodaantgamcnte, quando vista da cidade fo coroumento da formagd cultural dos ovens destinados, por {dase ou por ens, a fungies de govern, Aprinir erstura a. Hsien (Pesta) erga epadagoaia. Admirando os mirbe Mia wis, omavaseconsciencia Sos sloreshstricos Que ox mo fumesos representa ¢sigicavan plsicamente. Conudo, eu Seradeirosigifiado consists no fata de que estavam aly a8 Teaidade iss, nto somo memerias ou marcas do para, esa, emo um pasado que permancce present, una Mtr Tea es soot ambiente concreto da vis. Nao apenas mbravam ese. vam srr psi do pssado, mas magnficwam oe sos da Acoriiana dx comonidade urban, asim como o senarioengran Bee netics os secs do or orcad no se dese entoner pe leo de um eiazo, uns dsb Eprinadas um conjunto de eiiosrepresentarivor eure, fle, espace rtano tem os seus inlores. Sto spare urbano 9 Pontico da basic, o toe as galerias do palcio pubico, ont Flor da ica. Taribem to espa urban ox amblents das cass Pamielaer eo rtabulo sobre sar da igri, a decorayto do ai de dori ou da dra sp eon Se ffi d cidade, Tambem so espao urbane, « no menos Ws Porserem mnemdrico-Imagindas, a exensoes da nul da Gade lim doses lites zona vrs, de onde chegam os mat fsuas propredaes, os bosques onde ele va eagar 0 lago ovo os Bde val psa ecnde os reigisos em seas mostetos,¢ 05 mil lates wae suai. O epazo figrativo, como demonstra mi Ho bem Franca no ¢ eto apenas dag que seve, mas de Fins cosas ques sabem eve lembram, de notion Ate mesmo as read regula ada de Tungoespubleas 44 a nusTORIA DA ARTEE A ‘CIDADE quando pinta uma paisager natural, um pintor esté pintando, n; realidade, um espace ‘complementar do proprio espaco urbano, () {epago também € um objeto due se pode possuir € que € possuidc ‘arante muito tempo, 0 poder de unt senhor foi medido pela quan Gade de espaco que cle tinh em sua Poo, Mas a arte, como fendime aearbano, nada tem a ver com a Ie imidade ou a arbitrarieciad Be users aoe w procunedinecesiuade Pare oe™ Th * dese ago, de representar de forma “autentica ov distorcida”” a s agao espacial em que age. © esPaco turbano, por fim, é a verda deira ideologia da burguesia, & “representacdo da situacao de fato Gar que age” Ey dizendo ‘de fator, diz “simaginario”, por do fazer que chama de volta ao presente, & urzéncia do que-se de-fazer, experiéncias passadas, muitas vezes remotas, as ver quecidas. E a ordem do fazer que dé ordem as recupera mOnicas, ao movimento'da imaginagao. Evidentemente, 30 «: ta de materiais elaborados. O dado mnemonico com frequcn: mosira-se incompleto, impreeiso, confuso; apenas na order 1° ca do fazer adquiriré um significado. O icondlogo sabe que nao de se dar ao luxo de trabalhar com materiais selecionados, de va artistico determinado; afinal, para estudar a génese da arte, partir de algo que ainda nao 6 (ou jd nao é) artistico. Reunc o nimero possivel de documentos, direta ou indiretamente relativ a0 tema da imagem que decidiu tratar. E como um wedgralo estuda um curso d’égua: ele precisa identificar sua nascente, « nnhar © pereurso, levar em conta todos os afluentes e, depois, des crever 0 comporiamento, que depende da massa ¢ da velocidad d: Aguas, da profundidade que varia de lugar para lugar, da conf maco do leito ¢ das margens, da tendéncia a transbordar, a prec pitar, @ empantanar. Pode decerto ocorrer que o tema icOnico se mostre enalteris A misronia pa ante 53 em alguma obra-prima famosa; contudo, com maior freqiéncia, sua [presenca ou siza passagem sao assinaladas por representacées artis ticamente pobres, por documentos de segunda e ‘ereeira mao como as ilustracdes, as gravuras populares, as medalhas, as moedas, as teartas de baralho ¢ coisas do género. Em alguns casos, pode tr sede documentos vicérios, provisdrios, cépias ou derivagdes de obras de arte perdidas; mas, sem diivida, é sintomatico que @ historiogra- fia de método iconolégico dé preferéncia exatamente a esta image- fie abundante c, 20 mesmo tempo. de baixa qualidade. A imagem desgastada, consumida, recitada pela milésima vez e deformada pe- To habito ou pela desenvoltura com que ¢ adaptada as mais diversas Gcasides muitas veres € bem mais elogiiente, para o historiador da imagem, do que a versio douta, depurada, vontrolada nas fontes, fixada com a estrutura lticida de um sistema formal. A imagem de sacreditada, as vezes contaminada por associagdes ou combinagdes ingénuas, as vezes por confuses banais, por asso1 com ou. tras imagens latentes na memoria, é 0 documento de uma cultura de imagem difusa, um “significance” ao qual podem-se atribuir, co: tmo As palavras da linguagem falada, diversos significados. Portan- fo, oiconologismo, muito mais do que o formalismo wélffliniano, aproxima a problemdtica da arte da problematica das estruturas lin @ilisticas: Panofsky, nio Wolfflin, é 0 Saussure da historia da arte Indtil dizer, além disso, que remontando & origem dos germes de imagem ¢ acompanhando seu crescimento no Fertil terreno. dey in. Consciente coletivo, capta-se a motivacao comum da produgao e da fruicdo do fato artistico, restabelecendo assim a unidade do ato es tético € a continuidade entre a historia genetica ¢ a historia fruitiva da obra de arte. Panofsky declarou-se diversas veres um historiador da arte quando muito um fildlogo no sentido humanista do termo, nao um Fecolhedor de documentos icdnicos. Seu objetivo continua sendo, Apesar de tudo, 0 juizo de valor, que ele prefere chamar, porém, de “'sintese recriativa’’. “Nao é verdade, que o historia: dor da arte constitua seu objeto, primeiramente, atraves de uma sin- ese recriativa e, depois, comece a sua investigacdo arqueolégica, da mesma forma que primeiro se compra a passagem e depois se sobe no trem. Na realidade, os dois processos nao ocorrem dle mo: do sucessivo, mas avancam entrelacados; nao s6 a sintese recriativa Serve de base para a investigagdo arqueologica, mas esta, por sua ver, serve de base para o processo de recriacao; ambos se qualifi- Gam e corrigem reciprocamente."” O trabalho do icondlogo difere €m tudo daquele do icondgrafo. Este tiltimo descreve as caracteris- ficas de uma figura como um entomologista descreve as caracteris- 54 A HISTORIA DA ARTE EA CIDADE ticas de um inseto; o primeiro faz obra de sintese, nao de anilise porque reconstréi a existéncia prévia da imagem ¢ demonstra a n cessidade do seu renascimento naquele presente absoluto que €a oba de arte ‘Muitos criticam © método iconologico, como também a his ria da critica, afirmando que ele tem uma utilidade puramente « xiliar. Supondo-se, objetam, que possa ser interessante explicar significado de uma obra cujo tema nos escapa (por exemplo, v1 composicao alegérica), 0 caso & que, na maioria das vezes, o ten no nos escapa e, desde a primeira olhada, sabemos se a pin que nos € apresentada representa a crucifixao ou Sao Jerdnimo nitente, ou um retrato, uma paisagem, uma natureza-moria a pena empreender laboriosas pesquisas para tracar, quando to, a historia da alegoria, das figurag6es mitoldgicas ou dos eine ros? Poderiamos responder que o método iconolégico deu exceie tes resultados, mesmo onde a obra de arte nao é um tema Tiguted como demonstram as contribuigdes iluminantes de Wittkower ¢ Krautheimer para a historia da arquitetura. Ou entdo poderiamo. pedir ao objetor que indicasse uma tinica obra figurativa que nao seja, de alguma forma, alegorica, sendo a alegoria um procedinicr to constante, constitutivo, estruturador da representacdio. Mest © mal-afamado tema nunca esta ausente € 0 critico que queira esi dar o fenémeno artistico em sua integridade no pod deixar de tras dele, Para encontrar uma obra de arte sem tema seria preciso che ‘gar aos nossos dias, as obras que o excluem por polémica, Mas, en 10, a propria falta de um tema definido constitui um tema, como naquelas vinhetas humoristicas sob as quais esta escrito ‘sem pals vras””. Se Rafael representa a Madona com 0 Menino de uma fori: diferente de Duccio, um motivo deve haver. Nao podemos resolver esse problema atribuindo toda a novidade iconogrifica a brilhant: inyengao do artista. De Duccio a Rafael a imagem da Madona com © Menino percorre um longo trajeto, cujas etapas nao podem, © claro, ser reduzidas as interpretagdes que o tema recebeu dos gran des mestres. Evidentemente, aquilo que uma critica facil atribui 20 arbitrio fantéstico de Rafael é um proceso de imaginacdo que po de ser investigado € reconstrufdo, com 0 infalivel resultado de des: cobrir que os materiais elaborados no decorrer desse proceso sin experincias culturais perfeitamente identificaveis. Pode-se fazer uma pesquisa iconoldgica até mesmo no caso dos retratos, das paisagens, das naturezas-mortas, Ela decerto nao if fru tos, ou flores, vemos representados. A iconologia de um retrato é @ AMIsTORIA DA ARTE 5S " atitude, a roupa, o significado psicolégico ou social que se atribut “i figura; a iconologia de uma paisagem ou de uma natureza-morta “@amaneira de apresentar, figurar, tornar significativos os lugares {OU as coisas representados. O retrato de Carlos V a cavalo, de Ti- 10, enquadra-se obviamente na classe iconografica dos retratos NI toecsnn cis excraa dos gucrtcros a cavalo. Mss € uma classificagao que nao serve para a histéria (a nao ser, fualimente, para estabelecer uma data), tanto como a ela nao a classificacio segundo a técnica, como pintura a éleo sobre Um historiador icondlogo como Panofsky, ao contriio, o re- i¢ionard-na série (ndo na classe) dos retratos com significado sl6rico-alegdrico. Depois, tratara de estabelecer aquele significa 9 ¢; levando em conta a ocasiao pela qual o quadro foi pintado vitGriade Muhlberg sobre os protestantes), explicara que 0 impe- aqui retratado como miles christianus. O seria ainda uma curiosidade histérica, se 2 escolha do tema nao influenciado toda a composicio do quadro, ineluindo-se ai sagem de fundo e a propria interpretagao psicoldgica do per- em, como € facil perceber confrontando com outros retratos los V pintados pelo proprio Ticiano, por exemplo 0 de Mu- ale, Basta lembrar tambem Poussin, Claude Lorrain, Corot, pa~ toda uma iconalngia dx paisagem, cil de encontrar na escolha do motivo, do corte, da perspectiva, {omponentes naturalistas (érvores, rochedos, dua, nuvens), da @stacdo, da hora. Tampouco adianta invocar a emogdo subita do lante do verdadeiro (se & que se trata de paisagens do natu: Duma vez que cle escolheu aquele verdaceiro ¢ ele fo! buscar aque: edo. Isso sem mencionar que a emogao ainda é um fato da ginagio-memoria, mesmo se suscitada por um estimulo exter- ‘Até mesmo na mais “‘objetiva’’ das naturezas-mortas holande- sdo século XVIII, a pesquisa iconoldgica demonstra que uma in- atividade da imaginagto acompanha a observagao: signif fos diversos, simbologias ocultas determinam a escolha dos obje- (ruta, flores, caca, peixes,cristais, instramentos musicais, etc.) evidencia das coisas. Se j4 nao soubéssemos que as naturezas- 12m muitas vezes significados alegéricos ou alusivos bem de- iados (0s cinco sentidos, memento mori, vanitas rerum, etc.), mos jgualmente de deduzir que a natureza-morta ainda é uma oria, Nao apenas as imagens provenientes do fildo inesgotavel do an- sensorial encon-

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