Download as pdf or txt
Download as pdf or txt
You are on page 1of 61

Mafioso Irresistível

Ela já estava destinada. Sua vida era uma completa mentira, até que o passado da sua família

foi revelado. Ana sempre quis vivenciar algo diferente, algo emocionante que fizesse o seu coração
bater mais rápido, mas, até aquele momento, nada tinha acontecido e isso a deixava com apenas uma
opção: trabalhar no restaurante da família.
Ana havia se formado em Administração sempre tendo a visão de que a sua vida era apenas

aquilo e nada mais. O que ela não esperava era ser filha de um poderoso mafioso e ter que ser
protegida pelo rival do seu pai. A vida de Ana Delmondes estava nas mãos dos mafiosos e não
importava em que lugar do mundo ela estivesse, sempre lembraria que tinha o destino marcado pelo
passado. Aquela vida pacata e simplória, que ela nem sempre apreciava, jamais teria de volta.
Copyright © 2021 Debby Scar

Capa: Debby Scar

Revisão: Angélica Podda

Diagramação Digital: Debby Scar

Esta é uma obra de ficção. Seu intuito é entreter as pessoas. Nomes, personagens, lugares e

acontecimentos descritos são produtos da imaginação da autora. Qualquer semelhança é mera


coincidência.

Todos os direitos reservados.

Nenhuma parte deste livro poderá ser reproduzida, transmitida ou gravada por qualquer meio,
eletrônico, mecânico, por fotocópia e outros, sem a prévia autorização, por escrito, da autora.

Criado no Brasil.
Capítulo 1

Trabalhar no restaurante da minha mãe tinha seu preço: ser um robô todos os dias da minha

vida. Não que eu odiasse, mas também não gostava de cozinhar. O pior de tudo era ter o dom, e
quando você nasce com isso, está ferrado duas vezes: uma por não gostar e outra por saber fazer bem
o que não se gosta. Minha família era famosa no bairro pela boa comida espanhola, pela beleza das
mulheres Delmondes e também por termos sangue quente. E não estou falando apenas de sermos
fogosas, mas o gênio forte era algo bem marcante na minha família. Sem contar que um dos meus
muitos orgulhos é pertencer a essa família alegre e cheia de vida.
— Ana! — Ouvi minha mãe gritar de dentro da cozinha do restaurante. Dona Inessa era a
minha mãe, paciente como um tornado, carinhosa quando necessário.
— O que houve agora? — perguntei, aborrecida, assim que cheguei na porta.

— Sua irmã Lolla precisa de juízo. Ela queimou a tortilla! — Todas as vezes que a minha
irmã queimava algo, dona Inessa me chamava.
Ao contrário de mim, Lolla amava cozinhar. Porém, não tinha o dom necessário. E por isso
nosso relacionamento não era dos melhores.
— Eu não preciso de juízo! Sabe o que eu preciso? Nascer de novo, mas dessa vez a senhora
tem que dar o dom para mim! — esbravejou toda chorosa para nós duas.
Queria muito que a minha irmã tivesse nascido tão boa cozinheira quanto eu, só assim não
brigaríamos tanto e nem ela cultivaria a raiva que sentia por mim. Só Deus sabe o quanto amo a
minha irmã.
— Lolla... — Tentei me aproximar, mas ela saiu correndo para os fundos do restaurante, aos

prantos. Nem sempre tinha sido assim, no entanto, desde a adolescência as coisas mudaram. Lolla

tinha apenas vinte e cinco anos e muito orgulho por ter se formado no curso de Administração, assim
como eu. No entanto, a sua paixão era querer aprender a cozinhar e tomar conta dos negócios.

Agora, eu estava com quase trinta anos, formada e no lugar que ela tanto queria. Não tinha
sido minha pretensão ser boa em algo que não gosto, porém, eu não poderia fazer nada contra isso. A
nossa mãe precisava das duas e eu jamais deixaria dona Inessa na mão, nem mesmo pela minha irmã.
No passado, quando eu tinha dezoito anos, tudo em mim aflorou. Meu corpo, minhas

habilidades culinárias e o meu sucesso entre os garotos da minha idade.


Foi aí que, sete anos depois, ela sentiu a necessidade que deveria ser melhor que eu em todos
os sentidos. Se eu achava que era inveja? Na verdade, tinha minhas dúvidas, no entanto, preferiria
acreditar que ela se espelhava em mim. Inveja é um sentimento muito forte para se carregar no
coração.
— A senhora não deveria me chamar todas as vezes para repreender a Lolla, mãe. Isso a
magoa muito...
— Não é por maldade, minha querida. Quando me dou conta, já chamei... — disse com o tom
de voz triste.

— Senhora Inessa... — Jane, uma de nossas funcionárias, chamou minha mãe. Por algum
motivo, ele sempre pedia que Jane a chamasse.
— Castello? — Não sei o porquê dela ainda perguntar se era ele.
Franz Castello conhecia a minha mãe desde que me entendo por gente. Sempre frequentou o
nosso restaurante, até onde consigo me lembrar. A família Castello era muito famosa na cidade por
seu tipo de negócio, assim como a família Mazzini: outra família que trabalhava com ilegalidade.
Volta e meia eles eram alvo de investigações que não davam em nada. Fazia apenas a polícia gastar
borracha dos pneus e sola de sapato. Não estou falando como se eles vendessem algodão-doce na
esquina... Se fosse isso, eu não ficaria tão preocupada com a amizade dos Castello com a minha mãe.
Durante todos esses anos eu sempre me perguntei como ela o tinha conhecido, e cada vez que

eu tentava pensar me dava um nó no juízo.

Sempre que ele chegava se dirigiam ao escritório para uma conversa particular. Não vou
mentir e falar que a curiosidade de ir na porta, e tentar escutar só um pouco, nunca passou pela

mente. Mas aí, eu conhecia a mãe que tinha. Se eu fosse pega no flagra, a minha pele arderia por um
mês inteiro sem direito a gelo para aliviar. Dona Inessa era uma mulher de pulso firme, que sempre
batalhou para conseguir tudo que temos. Ela era rigorosa e sempre conversou, no máximo, dava um
castigo. Mas eu nunca quis testar a paciência dela, vai que um dia eu fosse sorteada, até mesmo

depois de adulta!
Nos últimos dias, Franz estava vindo com mais frequência. E isso me deixava com a pulga
atrás da orelha. Duas horas depois, os dois saíram do escritório. Para mim, foram as duas horas mais
longas da minha vida. Lolla já tinha voltado ao seu posto na caixa registradora, tentando não queimar
mais uma tortilha, e estava sem falar comigo. Não sou o tipo de mulher que fica adulando. Se não
quer falar, não fale. Amava a minha irmã, mas nem por isso ficaria atrás dela como um cachorrinho.
Meus vinte e nove anos, já com alguns cabelos brancos, me permitiam ser assim.
— Ana, preciso que venha aqui... Franz quer conversar com você. — Até Lolla ficou
surpresa quando ela me chamou. Afinal, a nossa mãe nunca deixava que falássemos com o todo

poderoso Franz Castello.


Olhei para Lolla, que tinha o semblante ainda mais carregado de algo que não consegui
identificar, e segui obediente a minha mãe, junto com o seu amigo, para dentro do escritório. A
mobília era simples, no entanto, a decoração gritava que éramos espanholas.
Franz devia ter seus sessenta anos, por aí. Um homem bem conservado, moreno, alto e de uma
beleza incrível. O verde dos seus olhos era a coisa mais marcante nele, sem falar no sorriso
desafiador em seus lábios, quando me olhou atentamente.
— Você sabe quem sou eu, jovem? — A sua voz era macia e com uma leve rouquidão.
— Sim — respondi já me sentando em uma das cadeiras, no canto do escritório.
— Então, se me conhece, sabe o que faço. Certo?

— Vender algodão-doce na esquina é que não é... — ironizei, olhando para ele.

— Olhe como fala, Ana! — Minha mãe me repreendeu e logo me encolhi no íntimo.
— Ela me lembra você, Inessa. Se me recordo bem, o atrevimento está marcado no DNA da

família — brincou, sorrindo para minha mãe.


Eles pareciam ser bem mais que amigos, pela forma como ele olhou para ela. De alguma
maneira, me senti estranha com o jeito que ela retribuiu aquele gesto singelo de afeto.
— E olha até onde o meu atrevimento me trouxe, Franz... — A amargura em sua voz era

nítida. Minha mãe nunca falava sobre o seu passado, mesmo que eu tivesse perguntado inúmeras
vezes quem era o meu pai ou se ele estava morto.
— Sinto que tenha que fazer essa escolha, minha querida... — Eu não tinha escutado aquilo!.
Ele tinha mesmo chamado minha mãe de “minha querida”?
— Sobre o que vocês estão falando? Que escolha é essa que a minha mãe fez?
— Tudo que está acontecendo é culpa do meu passado, minha filha. — A seriedade em seu
rosto mostrava que o que ela tinha para falar não seria fácil. O passado dela sempre foi algo que
parecia machucá-la muito. Talvez por isso minha mãe o tenha guardado para si, até aquele momento.
— Você precisa sair o mais rápido da cidade, Ana. Seu pai está vindo buscá-la para assumir os

negócios da família... — Eu me senti tonta de repente. Meu mundo estava virado ao avesso.
— Como assim, meu pai quer que assuma os negócios da família? — perguntei confusa.
— Seu pai é Enzo Mazzini — falou Franz. A sensação que tive foi a da minha alma saindo do
corpo. Como eu poderia ser filha de um mafioso? Não fazia nenhum sentido o que eles estavam me
falando.
— Isso só pode ser mentira! Uma brincadeira sem graça... — Parecia que me faltava ar nos
pulmões. Ela sabia que eu sempre quis saber quem era o meu pai. Saber se ele estava vivo ou até
mesmo morto, para que eu pudesse ao menos falar que o queria em minha vida.
— Não tenho muito tempo para explicar com riqueza de detalhes, mas as famílias Mazzini e
Castello sempre foram inimigas. No entanto, a nossa família está ligada a nós duas por minha causa.

Há muito tempo escolhi seguir um caminho diferente do que seria se eu tivesse ficado com o seu pai,

Enzo. O fato é que acabei me apaixonando por outro e tive que fugir, quando ele pediu para se reunir
com o conselho. Seu pai sabe quem é o homem que me faria desistir de tudo... — Ela olhou de

soslaio para Franz, e com o olhar falou silenciosamente o que parecia um pedido de desculpas. —
Esse outro homem assumiria você como filha, porém, não achei justo. Não com você, nem comigo e
muito menos com ele... Tudo estava indo contra as leis que seguimos.
— Esse homem é o Franz, não é? — A pergunta saiu tão rápida quanto o meu pensamento.

— Sim. O único homem que já amei na vida. — Mas se ela fugiu, como o meu pai nos
encontrou? Não fazia sentido, já que ela não mudou de nome ou de endereço há quase trinta anos.
— Por que agora? — questionei, me levantando da cadeira. Eu andava de um lado para o
outro do escritório, tentando raciocinar sobre tudo que estava acontecendo.
— Sua mãe fez um acordo com o seu pai... — Era nítido ver o desconforto de Franz ao falar
sobre o meu pai.
— Que tipo de acordo? — Parei de ficar andando de um lado a outro e coloquei a mão na
cintura, ainda mais intrigada.
— Que assim que completasse trinta anos você assumiria os negócios da família. Todos os

seus estudos foram pagos pelo seu pai para seguir os passos dele. Desde então, não trocaram uma
palavra sequer, pois um acordo ou promessa, quando feita, precisa ser honrada.
Não. Eu não queria seguir o caminho de Enzo Mazzini. Na verdade, o que eu queria era
distância de tudo que envolvesse a máfia. Já que o negócio da família Mazzini era facilitar a entrada
de armas e drogas no país.
— A senhora deveria ter me falado, mãe. Eu teria ido para o mais longe possível daqui...
— Ana, eu sei disso. Sou uma mãe muito egoísta, que não quer sua filha longe. Só de pensar,
já me deixa de coração apertado...
— E agora veja onde estamos... Como vou resolver essa situação? Meu aniversário é em dois
meses! — resmunguei angustiada e enjoada. — Vim parar dentro de uma história inventada por algum

escritor doido por tragédias...

— Me ofereci para proteger a sua família, Ana... — Franz começou a falar, mas logo rebati:
— Como um chefe mafioso vai me ajudar com o meu pai, que também é mafioso? Isso soa tão

irônico e engraçado... — Eu não sabia se sorria ou se chorava.


— Digamos que farei isso por sua mãe... E pelo que tivemos no passado.
— Ana, eu preciso que você esteja em segurança... — Minha mãe começou a falar.
— Mas... E quanto a senhora e a Lolla? Como vou me sentir segura se vocês duas não estão?

Franz parecia impaciente com os meus questionamentos. Só que naquele momento era a minha
vida e a da minha família em jogo.
— Sua mãe e irmã estarão seguras em outro local, Ana. O fato de vocês serem separadas é
para a segurança delas... — Então eu era o motivo de elas estarem correndo perigo? O enjoo ficou
cada vez mais forte. — Enzo não quer saber se é a sua mãe ou qualquer outra pessoa. O objetivo dele
é ter você entre os Mazzini, e para isso, ele vai passar por cima de quem quer que seja. E,
provavelmente, você já tem um noivo a sua espera, para continuar a linhagem da família. — Como é?
Eu tinha me tornado uma vaca de raça premiada?
Fiquei ainda mais nervosa. Em um mundo com bilhões de pessoas, logo o Enzo Mazzini tinha

que ser o meu pai? O pior era que eu tinha rezado tanto para que a minha mãe falasse sobre ele, que
agora eu gostaria de voltar no tempo e dar um belo tapa na minha cara para parar de ter desejado
isso. E ainda por cima, ter um casamento arranjado? Nunca! Eu me casaria por amor. Jamais para
“manter a linhagem da família”.
Isso soava tão asqueroso.
Porém, os Castello não se davam bem com os Mazzini. A relação de ódio entre as duas
famílias já vinha há décadas, quando ambas tentavam controlar toda a cidade.
— Nova Iorque é muito óbvio... — disse Franz em um tom pensativo. — A melhor opção será
ir para o Texas. Tenho uma propriedade que é bem vigiada, e enquanto estiver lá, o seu pai não vai
poder quebrar o acordo que tenho com ele... — Antes mesmo que eu o questionasse, ele já foi tirando

o celular do bolso interno do paletó e ligando para alguém para explicar a minha chegada. A pessoa

do outro lado parecia irritada com a novidade. — Não me interessa o que ele esteja fazendo! — Eu
nunca tinha visto nada igual à voz imponente daquele homem. Dava para sentir toda a sua autoridade

e arrogância. Acho que Franz não conseguiria chegar onde chegou se tivesse sido o tipo bonzinho. —
Você tem duas horas para organizar um quarto digno de princesa, Vincenzo!
— Vamos, Ana... Precisamos pegar apenas o necessário. Fechar tudo e partir. — Minha mãe
já foi logo tirando o avental e andando em direção à escrivaninha, abrindo a gaveta e tirando de lá

uma arma. Ela parecia outra mulher, menos a dona Inessa com quem eu convivi durante os meus
quase trinta anos.
— A senhora tinha uma arma aqui todo esse tempo?! — O choque em minha voz era nítido.
— Nem sempre fui boazinha, minha filha. Nem sempre. A arma de uma Delmondes nunca
deve sair de perto. Fui uma tola em achar que conseguiria persuadir seu pai a esquecer esse trato
maluco...
— Agora não temos mais tempo — resmunguei frustrada. — Para onde as levará, Franz?
— Quanto menos você souber, melhor, Ana. Seu pai pode usar sua mãe e irmã para convencê-
la a aceitar o destino que não quer. Enzo é muito bom no que faz.

— E Lolla, como vamos explicar tudo para ela?


— No momento, não temos tempo para explicar mais nada. Se os homens dos Mazzini nos
alcançarem, surgirão complicações. Sua irmã vai ser inteirada depois. Já têm dois carros do lado de
fora esperando, precisa se apressar... — avisou Franz, olhando o relógio em seu pulso.
Capítulo 2

A sensação que eu tinha naquele momento era a de não saber onde estava me metendo. Assim
que desci do carro um calafrio percorreu o meu corpo. Algo me dizia que a minha vida estava sendo

levada mais uma vez para o abismo. O meu sexto sentido queria me falar algo, mas minha mente não
conseguia trabalhar direito. Tentei não ficar pensando muito nisso e observei mais o local: a mansão
dos Castello era de tirar o fôlego. A arquitetura era moderna, com janelas enormes em vidro. O
jardim florido mostrava que os jardineiros tinham bastante trabalho para manter tudo organizado e
vivo. E não poderia deixar de ter observado o nível de segurança do local! De onde eu estava, dava
para contar as câmeras de vigilância. Seguranças nas varandas e em várias partes da casa,
monitorando atentamente. Franz não estava de brincadeira quando falou que me manteria segura ali.
Por um lado, me senti um pouco mais tranquila quando vi que a minha mãe e irmã teriam o mesmo
nível de proteção. O mais difícil estava por vir: ficar longe de dona Inessa. Mas eu estava fazendo

isso pelo nosso bem, e para não ter que seguir um caminho que jamais imaginei para mim. Nunca
pensei que fosse filha de um mafioso e muito menos seguir os passos de um: nasci para ser livre e
fazer minhas escolhas, e nada me impediria.
— Ana, enquanto resolvo a situação com o seu pai, preciso que fique bem aqui. Sinta-se livre
para fazer o que quiser, enquanto estiver aqui dentro. Não saia da fortaleza...
— Fortaleza? — indaguei.
— Nada pode passar por esses portões. Nem mesmo o exército dos Estados Unidos.
— Você tem contatos dentro do exército? — perguntei curiosa.
— A curiosidade matou o gato — rebateu ele, com o olhar sombrio. Se ele achou que iria me
intimidar, tinha conseguido. Eu era atrevida, mas não burra. — Tenho que ir. Meu sobrinho,

Salvatore, cuidará de você...

— Eu não preciso de uma babá aqui — resmunguei frustrada.


— Ótimo! Então não aja como uma criança... Você já tem quase trinta anos. — Essa foi

dolorida. O que há de errado em falar que não precisa de uma babá? Ele tinha sido uma pessoa muito
boa até aquele momento. O que havia de ruim em querer me virar sozinha?
— Não se preocupe. Tenho consciência da minha atual situação. Me chamar a atenção dessa
forma só me faz sentir como uma criança — reclamei — e obrigada por me ajudar. Na verdade, por

ajudar a minha família, quando você simplesmente poderia ter deixado para lá...
— Ana, tudo que envolve a sua mãe sempre será problema meu. Não importa quantos anos
passem, eu vivo e respiro por Inessa.
Aquela tinha sido a declaração mais profunda que eu já havia escutado da boca de um homem
para minha mãe. Sei que ela sentia o mesmo, senão, teria casado com o pai de Lolla depois que saiu
das garras do meu pai.
— Meu tio... — Uma voz rouca e poderosa me chamou atenção. Assim que virei o rosto para
ver quem era, me assustei com a beleza de um homem dentro de um terno azul-marinho e sapatos
pretos de couro. Ele era moreno, cabelos pretos penteados cuidadosamente para que cada fio ficasse

no lugar. O sorriso dele parecia que ia me cegar, de tão branco. Era elegante e sedutor, mas logo
quando abraçou Franz, senti que deveria tomar cuidado com Salvatore.
— Salvatore... — Por um instante achei que Franz sorriria, mas não. Apenas falou de forma
carinhosa com o sobrinho. — Essa é a Ana, nossa convidada de honra. Ficarei uns dias fora, e
preciso que você cuide dela. Se me entendeu...
— Claro, tio. Não se preocupe, vou cuidar muito bem dela... — O olhar de Salvatore para
mim me deixou envergonhada. Parecia que ele tinha acabado de me fazer uma promessa de algo a
mais, bem na frente do seu tio.
— Fique de olho no meu filho. Mesmo ele sendo responsável, tende a fazer coisas sem
pensar. — Franz pediu seriamente.

— Vincenzo anda bem ocupado com o carregamento que vem da Venezuela, meu tio. Não se

preocupe com ele. — Aquelas palavras não suavizaram o semblante de Franz. Pelo contrário...
Ficou ainda mais carregado.

Não vou mentir e falar que não fiquei preocupada, pois fiquei. A forma como Franz falou
indicava que o filho era problemático e que talvez isso fosse um transtorno, com a minha estadia ali.
— Apenas cuide para que tudo ocorra bem, está certo?
— Já disse para que o senhor não se preocupasse... Vou tomar conta de tudo por aqui —

afirmou, tentando dar mais segurança ao tio. Salvatore cuidaria de tudo? Mas ele não era apenas o
sobrinho? Bom, não que entendesse muito, porém, achava que o filho dele era quem mandava nas
coisas por ali, quando o pai não estava. O que me deixou ainda mais nervosa com essa parte da
história.
Franz não falou mais nada, apenas assentiu e entrou em seu carro, partindo para algum lugar.
Duvidava muito que ele conseguiria um novo acordo com o meu pai. Durante os anos, vários acordos
foram feitos entre eles e, pelo que eu tinha entendido, Franz nunca se meteu no trato que a minha mãe
havia feito com o Mazzini. Mas agora seria diferente: desta vez eu estava em jogo, sem falar no fato
de Enzo querer que eu comande sua rede mafiosa. Só de me imaginar comandando algo assim já me

dava calafrios.
— Venha. — Salvatore me chamou, pegando algumas das poucas malas que eu tinha. — Tem
um quarto de princesa esperando por você. O meu primo caprichou nos detalhes...
— Eu falei para o seu tio que não precisava se incomodar. Eu poderia ficar em qualquer
quarto da casa...
— Ana, você é filha da mulher da vida dele. Acha mesmo que ele a deixaria em qualquer
quarto? — questionou enquanto caminhávamos em direção à porta enorme de madeira com detalhes
de mosaico em vidro.
Todos daquela casa sabiam do passado da minha mãe com Franz Castello?
Quando finalmente abriu a porta para que eu entrasse, tive uma noção do tamanho da riqueza

dos Castello. Em toda a minha vida, eu nunca tinha visto nada igual. O luxo tinha passado e ficado

para uma longa temporada ali. A decoração da casa era clássica, porém tinha um leve toque rústico
nos móveis. Ele me conduziu pela enorme sala até chegar à escada que levava ao primeiro andar,

onde ficavam os quartos. Salvatore me levou para cima e parou em frente a umas das portas;
colocando as malas de lado, abriu e se afastou, me dando espaço para passar à frente dele.
— Parece que eu estou entrando em um dos quartos do castelo de Buckingham... — Não
poderia deixar de ficar maravilhada com tudo. A cama no centro do quarto no estilo dossel, com

direito a sofá de canto perto da janela. As cores eram mais no estilo clean, nada de rosa, graças a
Deus.
— Essa era a intenção. — Salvatore sorriu para mim. — Bom, sinta-se à vontade para
explorar o ambiente... Acho que esqueci alguma mala lá em baixo, vou buscar e já volto.
— Obrigada — agradeci mesmo sabendo que eu quase não tinha falado. Eu estava encantada
com tudo. Só tinha um probleminha... Eu estava morrendo de fome. Já que Salvatore tinha me dado
carta branca para explorar, eu faria exatamente isso.
Assim que saí do meu quarto, prestei mais atenção no corredor extenso e com várias pinturas
decorando as paredes. Esculturas davam o charme e deixavam o ambiente mais elegante. Se é que

poderia ficar mais do que já era.


Uma porta do outro lado do corredor me chamou atenção. Eu não deveria ser tão curiosa, mas
estava no meu sangue. Aquela tentação de bisbilhotar, e ao mesmo tempo deixar para lá, não saía da
minha cabeça:
“Ana, você é convidada... A que precisa de ajuda contra o pai controlador e mafioso. Dê
meia volta e desista...”.
Eu poderia ter escutado meu subconsciente e ter voltado, seguindo em direção à escada,
porém, não fiz. Algo me chamava e eu me deixei levar. Antes de chegar perto da porta escutei os
gemidos.
Eu deveria ter me ouvido...

Me aproximei mais um pouco e pude ver pela fresta o motivo dos sons excitantes e

chamativos.
O homem sentado na cadeira de escritório tinha uma mulher entre suas pernas, de joelhos,

chupando o seu pau avidamente. Enquanto isso, ele se mantinha concentrado na outra mulher, que
tinha as pernas apoiadas em seus ombros e as mãos sobre a mesa, e ele chupando sua boceta e
acariciando sua bunda para que ela rebolasse mais firme.
A camisa estava aberta, deixando seu peitoral exposto, assim como as inúmeras tatuagens.

Por um instante, eu queria ser a única mulher que ele tocasse o corpo. Não era amor instantâneo, era
desejo carnal da forma mais visceral que existia. Suas mãos firmes... Eu queria passeando pelo meu
corpo.
— Ana... — Me assustei quando escutei a voz de Salvatore, que estava segurando o resto das
minhas malas, perto do meu quarto. Me apressei em sair dali e voltei para o meu quarto sentindo
fome, mas de outro tipo de comida.
Capítulo 3

Se não fosse por Salvatore, eu teria feito alguma besteira. Eu poderia esquecer onde estava e
entrar no escritório sem ser convidada, assustar os três e morrer de vergonha logo em seguida. Só de

imaginar, meu coração já queria sair pela boca. No que eu estava pensando quando segui a minha
vontade de bisbilhotar os outros?
— Falei para todos lá embaixo que você vai nos agraciar com o seu talento culinário... —
Minha careta deve ter entregado o fato de não gostar muito de cozinhar. — Desculpa... Nem mesmo
perguntei se gostaria de fazer isso... — disse Salvatore, sem graça. Ele era bonito e, com certeza,
aquele sorriso sem graça que ele me mostrou conquistava qualquer mulher, menos a mim.
— Se me mostrar onde é a cozinha, faço o que me pedir. — Minha vontade mesmo era que
alguém fosse cozinhar para mim. No entanto, tentei reverter a situação para não parecer ingrata ou
coisa parecida.

— O que eu pedir? Ah, assim você vai começar a me deixar mal acostumado... — Podia
sentir ele gostando do joguinho, só que eu não estava ali para isso. Talvez até rolasse um sexo, mas
não seria com ele. Naquele momento, senti que ele estava mais para um predador e eu a coitada da
caça. E pelo amor de Deus, eu tinha acabado de chegar ali e já havia tido emoções suficientes para o
resto do ano!
— Não insultando a minha inteligência, pode me pedir para preparar o prato mais
sofisticado. — Sorri me afastando um pouco dele, que ainda estava segurando as malas na entrada do
meu quarto. — Vamos?
— Gostei de você assim que a vi, Ana. Parece ser uma mulher muito especial... — falou
enquanto descíamos a escada.

— Ser especial é algo muito importante. Talvez eu não seja exatamente como pareço, já que

você me conheceu hoje.


— Não me importo com o tempo em que nos conhecemos, mas com o que sinto. E eu sinto

que você é mais do estilo gata selvagem. Você é? — A pergunta dele me deixou um pouco irritada,
porém segui o ritmo.
Sou do tipo que aprecia uma boa conversa, um vinho e, no máximo, duas semanas de
galanteios. As preliminares de uma boa conquista se resumem em como o cara me trata nas primeiras

três horas, e Salvatore estava indo bem até me comparar a uma gata selvagem. Qual o problema dos
homens com o reino animal e as mulheres?
— Quem sabe...? Gatos selvagens não são muito amigáveis.
— Nada vai me tirar da mente que você é selvagem... — brincou enquanto me guiava até a
cozinha.
Não deu tempo de rebater o gracejo de Salvatore. Assim que ele me mostrou a cozinha, fiquei
embasbacada com o quanto era organizada e moderna. Os Castello investiram uma nota preta
naquelas bancadas de mármore. A cozinha, em conceito aberto, parecia aqueles projetos dos Irmãos
à Obra que eu gostava de assistir no meu tempo livre.

— Este é o Atlas Collins, nosso chefe.


O senhor na minha frente deveria ter uns sessenta anos, no máximo. Era bem apresentável e o
bigode dele me fazia lembrar dos desenhos satirizados sobre cozinheiros. Para minha sorte, ele me
recebeu muito bem. Para alguns chefes, eu estar na cozinha dele seria até um insulto. Esperava que o
Atlas me entendesse e não levasse para o lado pessoal.
— Ana me falou que prepararia o que eu pedisse, Atlas. Então vou querer Carpaccio... — O
olhar desafiador de Salvatore me deixou ofendida.
— E eu achando que você me pediria algo mais desafiador... Aí me vem com um aperitivo?
Isso foi um insulto... — O som da minha voz foi debochado ao nível máximo, fazendo todos que
estavam na cozinha rirem alto.

— Ela é muito espirituosa, senhor Salvatore... — ressaltou Atlas, se segurando para não rir

como os outros.
— Ela é sim... — respondeu a Atlas, me olhando com admiração. Eu estava tentando pensar

em algo mais criativo para falar quando Salvatore disse: — Então, me surpreenda. E não insulte
minha inteligência, senhorita Delmondes.
Eu não prepararia nada italiano. Pelo amor de Deus, eu tenho sangue espanhol correndo pelas
minhas veias... E italiano também, mas isso não vinha ao caso: a família da minha mãe em primeiro

lugar. O Tapa espanhol deixaria eles com gosto de quero mais. E não estava falando de qualquer
Tapa, as Delmondes eram as melhores. Depois um belo Pan tumaca com jamón, seguida por Paella e
Rabo de toro... E um belo Syrah; os Castello se lembrariam de mim por um bom tempo.
Antes das dezenove horas tudo estava pronto. Verdade que eu não havia descansado nem por
um segundo, mas há tempos que não me sentia tão bem em uma cozinha. Parecia que os problemas
sumiram durante esse tempo. Não era como se eu tivesse esquecido da minha família ou do que
estava me acontecendo, porque isso eu não faria. No entanto, por um momento, parecia que um pouco
de paz se acomodou dentro do meu coração. Atlas e o pessoal da cozinha foram muito gentis comigo
e com tudo que eu pedia para eles.

Agradeci a todos depois de deixar tudo limpo, mesmo que a equipe tivesse insistido que não
precisavam de mim para aquele serviço. Subi para tomar meu banho e, antes de chegar ao corredor, o
meu coração acelerou. Quem seria aquele homem tatuado que estava com aquelas duas mulheres? E
como seria ser tocada daquele jeito por ele? Passei correndo até o meu quarto sem olhar para trás.
Se eu olhasse, lembraria com mais nitidez da cena. E isso eu não queria... Já me bastava lembrar dos
gemidos.
Coloquei o meu melhor vestido e arrumei o cabelo, passando apenas um batom vermelho para
contrastar com o tom azul do tecido. Nunca gostei muito de me maquiar, apesar de ter vários produtos
cosméticos a minha disposição. Achei que um salto vermelho ficaria interessante, mas eu pareceria
arrumada demais para um jantar na casa dos Castello, então a boa e velha sandália de salto baixo já

me bastava.

Às dezenove e trinta e cinco todos estavam sentados à mesa e tinha duas mulheres, uma estava
sentada ao lado de Salvatore e a outra ao lado de um homem que aparentava ser mais novo que ele. A

cadeira da cabeceira estava sem ninguém, mas eu achava que Salvatore sentaria nela. Me enganei.
Talvez o mais novo fosse o cara da suruba... Se ele estivesse sem camisa, saberia.
— Você está linda... — Salvatore levantou e veio na minha direção como se fosse um
guepardo, com leveza e rapidez. Colocou uma das mãos na minha cintura e fiquei desconfortável.

Parecia que éramos íntimos para quem assistia aquela cena, mas não era bem assim.
— Obrigada, mas não precisa me elogiar assim... — Tentei me afastar dele, porém ele
insistiu em permanecer com a mão na minha cintura.
— Você sabe que é linda, Ana... — Sorriu para mim. — Quero que conheça o Lucca, meu
irmão mais novo. — Lucca imediatamente se levantou e eu me aproximei para cumprimentá-lo.
Diferente do irmão mais velho, ele transmitia uma confiança e uma energia muito boa. Dava para ver
o quanto eles eram opostos, tanto em físico quanto em personalidade. Lucca tinha o cabelo curto com
o tom um pouco acobreado e olhos castanho-claros, sem falar no fato de ser muito alto e bonito. Os
homens Castello não tinham rolas, tinham pincéis...

— Finalmente conheci uma Delmondes! — Não entendi bem o que ele quis dizer com isso,
mas fiquei calada. Lucca dispensou minha mão e me abraçou. Não vou mentir e falar que aquilo não
foi uma surpresa, pois foi. Normalmente a minha família é calorosa, no entanto, os Castello estavam
se mostrando bastante espanhóis nesse quesito de receber bem.
— E quem são suas acompanhantes? — perguntei ao me afastar do abraço de Lucca.
— Conquistas da noite... Achamos que ficaria mais confortável se tivesse mais alguém do
sexo feminino sentado à mesa... Já que somos em quatro na casa — informou Salvatore
simplesmente. Então teríamos mais um? O meu coração começou a acelerar. Lucca não tinha cara de
quem transaria com duas ao mesmo tempo e com a porta do escritório entreaberta. Por isso, só me
restava o Vincenzo, o filho do mafioso.

— Troque de lugar com a nossa convidada, Brittany... — pediu Lucca, me deixando sentar na

ponta. A loira gostosa me olhou feio e eu até teria protestado, mas já tinha uma ideia de quem
sentaria perto de mim.

— Boa noite, senhores e senhoritas... — Ainda bem que eu já estava sentada, caso contrário,
o tombo teria sido dos grandes.
Ele era um pedaço de filé de primeira. O homem alto, forte e elegante parado na entrada da
sala de jantar não era apenas um espetáculo, era um meteoro demolidor da beleza. O olhar dele tinha

um ar de mistério e sedução que eu nunca tinha visto em um homem, e eu já tinha dado bastante para
saber disso.
Capítulo 4

Meus olhos estavam seguindo cada movimento dele e isso já havia afetado o meu corpo. A
única coisa que eu conseguia pensar era: vem pintar a minha tela, vem...

— Então, vamos jantar ou não? — O timbre da voz dele era rouco, mas com um toque
aveludado para os ouvidos. Ele olhou para mim, mas parecia que estava olhando para dentro da
minha alma.
Coisas desse tipo não acontecem todos os dias. Talvez fosse até impressão minha, ou não...
Senti que teria grandes problemas durante a minha estadia na mansão dos Castello. Eu desviei o
olhar primeiro, porém, não por não querer encará-lo ou coisa do tipo... Foi mais pelo fato de não
querer os outros nos olhando como se tivesse rolado alguma química. Dava para sentir essas coisas,
inclusive quando você sabe que o cara é do seu tamanho.
Eu tinha quase certeza que ele media um metro e oitenta e pouco... Talvez um e oitenta e seis.

O cabelo dele era um pouco comprido e preto, porém não no estilo geral de um hipster. Estava mais
para um meio termo entre um superelegante somado com o estilo motoqueiro. Diferente dos seus
primos, que tinham o estilo mais parecido com os mafiosos do filme O Poderoso Chefão. O seu rosto
era de traços fortes e seus lábios carnudos eram rosados a ponto de qualquer mulher querer beijá-lo.
E então ele passou por mim e eu senti o perfume. Um aroma amadeirado com um toque cítrico
que eu não seria capaz de esquecer jamais na minha vida. Por um momento, fiquei presa naquela
sensação de êxtase apenas com o seu aroma. Se eu tivesse fechado meus olhos, poderia me imaginar
arrancando as roupas dele e fazendo daquele homem minha refeição.
— Ana, você está esplêndida. — Lucca me elogiou, me deixando um pouco sem graça.
Agora que eu sabia quem era o homem por trás da bunda daquela mulher, as coisas ficaram

estranhas dentro de mim.

— Vince, ela nos preparou um cardápio italiano. — Salvatore foi logo falando, voltando para
o seu lugar. — Carpaccio... — O tom dele me fez interrompê-lo.

— Na verdade, você disse para te surpreender. Então, vai ser comida espanhola... — Dei de
ombros, me desculpando. Parecia um gesto de inocência meu, mas eu já tinha entendido tudo. Havia,
com toda certeza, uma competição entre Salvatore e Vince, dava para perceber pelos olhares entre
eles.

Eu não ficaria no meio dela nem se me pagassem o dinheiro do mundo inteiro.


— Amo comida espanhola! — interveio Lucca, com o tom animado.
Aquela tática dele funcionaria para diminuir a tensão do olhar que Salvatore me lançou. Não
entendi o motivo dele ter me encarado daquela forma, porém ignorei.
— Eu também amo comida espanhola... — Parecia que Vince tinha acabado de fazer algo
novo quando falou. Todos olharam para ele no mesmo instante.
— Não achei que fosse do tipo que gostasse de variar o cardápio dos Castello. — Salvatore
sorriu ao falar, claramente provocando o primo de uma forma nada agradável.
— Você não lê mentes, Salvatore. Quando isso acontecer, será você a escolher o que se come,

quais contas pagar e em como se manda aqui. — A voz de Vince tinha uma tranquilidade e ao mesmo
tempo um aviso que eu não sabia o que era.
Ora, eu tinha uma irmã mais nova que competia comigo em todos os sentidos, o que me fez
desistir de entender o motivo por trás desse tipo de atitude. Talvez esse fosse o tipo de relação entre
eles: se amam, mas competem. Ou apenas se odiassem mesmo.
As acompanhantes se entreolharam e depois olharam na minha direção. Dava para ver a
inveja delas no semblante. O meu ego inflou tanto que, por pouco, não estourou. Não deveria sentir
isso, mas a adolescente reprimida que havia dentro mim me deixava ter esse momento. Em seguida
veio o pessoal da cozinha nos servir. Vince foi o primeiro e em seguida o restante. O jantar seguiu
com uma falsa tranquilidade, onde a maioria das perguntas eram direcionadas a mim sobre a minha

vida no restaurante ou como eu tinha conseguido deixar tudo tão saboroso.

— Faz muito tempo que não como algo tão incrível! — Lucca elogiou alegremente.
Ele seria o tipo de cara que eu gostaria de ter como amigo naquela casa, e não era pelo fato

de ter elogiado a comida preparada por mim. Lucca parecia ser diferente e eu gostava disso. O
mundo estava precisando de sorrisos genuínos, assim como o dele.
— Estava tudo de muito bom gosto. — Vince falou satisfeito. E novamente, todos pareciam
chocados.

— Isso eu concordo. — Salvatore se pôs na conversa.


— Bom, obrigada. Eu acho... — agradeci, começando a me levantar.
Eu sabia que existiam pessoas para retirar os pratos da mesa, mas que pessoa injusta seria eu
se deixasse isso acontecer, ainda mais depois de tanta ajuda que recebi? Fui pegando o prato de cada
um da mesa e juntando com o meu para levar até a cozinha.
— O que você pensa que está fazendo? — Vincenzo questionou com o olhar sério para mim.
— Exatamente o que você está vendo. Já são quase vinte e duas horas. Seus funcionários
merecem descanso... — respondi de modo atrevido a ele. — E acho que cada um deveria lavar
alguma coisa. A mão não vai cair, não é mesmo?

Todos estavam horrorizados com o que eu estava fazendo. Eu tinha crescido em um ambiente
onde cada um fazia a sua parte. Nunca passei qualquer tipo de necessidade e sempre tive o melhor
que a minha mãe pôde me dar. O mínimo que eu poderia fazer era ser a mulher que ela esperava, e
isso incluía ser responsável e saber valorizar o trabalho dos outros.
— Me recuso a fazer tal coisa! — bradou uma das acompanhantes, a loira. — Passamos a
noite toda escutando o quanto você é perfeita na cozinha e blá, blá, blá...
— Concordo! — disse a outra. Pareciam crianças do jardim de infância que acabaram de
perder o brinquedo favorito.
— Se quiserem ir embora, já sabem qual é a saída... — disse Lucca com o tom de voz sério,
já se levantando e pegando algo da mesa. — Deve ser divertido lavar o prato no qual comeu. —

Sorriu para mim. Eu nunca tinha visto pessoas sumirem tão rápido de um cômodo como elas.

— Já vi que você é o tipo de mulher que gosta de mandar... — resmungou Salvatore ao se


levantar, ajudando também.

— Nasci para isso — brinquei.


Não me senti mal pelas convidadas que foram embora.
— Eu nunca lavei um prato em toda minha vida... — Vincenzo grunhiu, apoiando as mãos
sobre a mesa. — Mas aceito o desafio.

— Isso se tornou uma competição em que momento? — questionei, semicerrando o olhar para
ele.
Claro que eu estava o provocando. Não deveria fazer isso, mas fiz. Foi mais forte que eu,
quando o questionei.
— No momento em que disse que a minha mão não cairia se lavasse o meu prato. —
Vincenzo se levantou do seu lugar, determinado.
Eu teria até debochado, mas, na atual situação, seria errado. Já estava me imaginando nas
manchetes dos jornais por ter feito algo tão hediondo como aquilo: fazer eles lavarem os próprios
pratos!

A melhor parte do meu dia, com certeza, foi aquela: três marmanjos bem-vestidos e de
avental, armados com buchas de lavar louça nas mãos. Nem parecia que eles eram mafiosos
perigosos... Se eu continuasse com esse pensamento, as coisas não seriam tão pesadas na minha
estadia ali.
Lucca foi o primeiro a terminar sua pequena pilha de pratos e estava muito orgulhoso por
isso. E se não fosse por ele, eu nem teria me entrosado mais com o trio. Em questão de minutos,
estávamos rindo e falando baboseiras, menos Vince, que estava concentrado. Em segundo, Salvatore,
que parecia que também não gostava de perder para o irmão mais novo e por último, que ainda
estava lavando seus pratos, Vince.
— Como você é o perdedor, amanhã decido o que vou querer ganhar... — Salvatore informou

todo convencido.

— Eu só quero outro jantar desses... — Lucca olhou para mim, esperançoso.


— E você terá — garanti a ele.

— Acompanho você, Ana, até o quarto... — Salvatore se ofereceu, mas parecia muito injusto.
— Não posso... Sou a fiscal da louça. Vou ficar e me certificar que o seu primo lavou tudo
direitinho.
— Mas eu insisto... — Bem a tempo, Lucca interrompeu o irmão.

— Deixe a nossa convidada em paz, mano. Até parece que ela já não sabe onde fica o quarto.
— Lucca... — resmungou em resposta enquanto Vince parecia absorto à conversa e
concentrado apenas na sua tarefa.
— Salvatore... — desdenhou Lucca, puxando o irmão pelo braço e já saindo da cozinha.
Até parecia que o irmão mais velho era ele, pensei.
— Está muito complexo para você, senhor Castello? — A pergunta foi com o tom mais
debochado possível.
— Consigo gerenciar um negócio que envolve milhões, mas não consigo terminar uma
simples tarefa doméstica? — Vince reclamava mais para si do que para os outros.

— Eu ajudo... — suspirei pesadamente, saindo do conforto da minha cadeira.


Foi tudo tão rápido, que não consegui raciocinar direito. Uma hora eu estava me levantando
da cadeira e na outra eu estava sendo esmagada pelo corpo musculoso de Vince. Com uma das mãos
firmes e úmidas passeando sobre a minha pele e a outra segurando as minhas mãos no alto da cabeça.
— Queria ter comido você desde o instante que te vi... — sussurrou, beijando minha boca em
seguida.
Com a sua mão livre levantou a barra do meu vestido e começou a dançar por cima do tecido
da minha calcinha com os dedos, que já estava sendo puxada para o lado. Foi então que ele
massageou meu clitóris e eu me desmanchei inteira na sua mão. A pressão de seus dedos era
meticulosamente perfeita naquela região. Parecia que ele sabia mesmo o que estava fazendo.

— Vince... — gemi o seu nome, querendo que ele fizesse mais.

Eu queria ser como uma daquelas mulheres que vi com ele. Queria estar sob o seu poder...
Queria ele dentro de mim.

— Era isso que você queria a noite toda... Pensa que não sei que me observou hoje mais
cedo? — Eu não estava ligando a mínima para o que ele achava sobre isso. — A casa tem câmeras
de segurança em todos os lugares, até mesmo nos corredores.
— Fodam-se as câmeras! — falei mais alto do que deveria por causa do prazer imenso que

ele estava me proporcionando, mais um pouco e eu chegaria ao orgasmo.


— Ana, você é uma delícia... — sibilou, voltando a me beijar e intensificando mais os
movimentos.
— Eu quero você dentro de mim. — Sim, implorei entre seus lábios e logo em seguida gozei
de forma miserável em sua mão.
Não pude tocar seu corpo, ele prendeu minhas mãos e isso me deixou frustrada.
— Essa foi a única e última vez que toquei em seu corpo, Ana. — Gelei no mesmo instante.
Bem, tinha acabado de conhecê-lo e não era como se fosse amor à primeira vista, mas eu
sabia que existia algo ali. Afinal, engana-se quem não acredita em paixão logo de cara.

— Finja que nunca aconteceu nada. — Terminou de falar e saiu da minha frente. Eu fiquei lá,
de vestido levantado e calcinha encharcada sem saber de onde tinha vindo o tiro. Com o pouco de
dignidade que tinha, me ajeitei e subi para o meu quarto um pouco desnorteada, e nem me preocupei
com o resto de louça que ainda ficou dentro da pia.
Capítulo 5

Toda mulher tem aquele momento em que repensa a vida enquanto está sentada no vaso
sanitário fazendo o número um ou o dois, ou até mesmo quando está sentada do lado da janela em um

ônibus. O meu momento foi sentada no trono enquanto fazia o número um. Quem ele achava que era?
Vincenzo Castello não sabia em que vespeiro estava se metendo. Em parte, eu sei que tinha pedido
por um pouco de prazer, mas aquilo foi humilhante.
Terminei o que tinha de fazer e tomei meu banho pensando na situação em que me meti. Talvez
existisse uma forma dele pagar pelo que havia feito. E o pior jeito seria se eu o fizesse se apaixonar
perdidamente por mim e o tempo estava a meu favor. Fingir que aquilo não tinha me abalado seria a
primeira coisa. Para colocar meu plano em prática eu teria que flertar descaradamente com um dos
primos ou os dois, mas de modo sutil. Vince parecia ser o tipo de homem que, quando gosta de uma
mulher, se torna dependente.

No dia que eu não conseguisse o que queria, choveria canivete. Ora, sou uma Delmondes de
sangue quente e não uma barata tonta. Já eram oito horas e, apesar de ter acordado mais cedo, não
consegui parar de pensar. Todas as minhas coisas já estavam arrumadas em seus devidos lugares.
Terminei de ler um romance que eu tinha abandonado há semanas e já estava sentindo muita fome. No
instante em que tomei consciência de que uma hora ou outra eu teria que sair do quarto, o plano de
fazer Vince comer na minha mão já não era tão bom assim.
— Você vai lá e mostra que tem dignidade, mesmo que não saiba onde enfiou ela... — disse a
mim mesma em voz alta, terminando de me arrumar.
Meu cabelo ficou um pouco volumoso, mas do jeito que eu queria. Será que tinha alguma
política sobre o tamanho do biquíni que se deve usar na piscina da fortaleza dos Castello? Vesti um

short confortável que eu tinha, uma blusinha transparente e respirei fundo. Veremos se Vince é tão

estúpido a ponto de me ignorar. Eu sabia que a piscina era quase olímpica, então, depois do café,
aproveitaria a manhã nadando. Não era porque eu estava na merda que não iria me divertir.

Respirei fundo mais uma vez e tomei um pouco de coragem, precisando de alguns segundos
antes de entrar na sala para poder tomar meu café da manhã. Sabia que ficaria desconfortável com a
forma com que ele me tratou na noite anterior, mas esse era o preço para uma vingança bem-feita.
Sentei-me à mesa como se nada tivesse acontecido; essa era a única forma de seguir com meu plano.

Percebi os olhares de Salvatore para o meu corpo e, na verdade, não era bem ele que eu queria
olhando daquela forma. Logo tive certeza que Salvatore não poderia fazer parte do meu plano. Só
restou o coitado do Lucca para poder servir de marionete. Por mais simpático que Salvatore
parecesse, para mim, eu não conseguia confiar em um fio de cabelo dele. Ele era um homem bonito,
mas que não inspirava confiança.
— Vejo que alguém acordou disposta a tomar um belo banho de piscina... — disse Salvatore
abrindo um largo sorriso para mim.
— Não pude deixar de notar a piscina enorme que vocês têm. Não poderia desperdiçar esse
momento, não é mesmo? — respondi em um tom bem animado.

— Qual será o nosso castigo de hoje, Ana? — Lucca brincou.


— Ela já está sendo o castigo em pessoa... — Vince resmungou, sem me olhar diretamente.
— Seja mais educado com a nossa convidada, primo. — Salvatore sorriu para ele de uma
forma estranha.
Como se estivesse sabendo de algo. De repente meu coração quase saiu pela boca. E se ele
me viu com Vince no vídeo? Eu não queria que isso acontecesse.
— Não preciso ser educado com ninguém na minha casa — rebateu Vince o encarando.
Ele parecia uma criança mimada falando daquela forma. A pior parte era que eu estava com o
orgulho ferido.
— Você só precisa me aturar por dois meses... — retruquei olhando sério para ele. — Até

que chegue o dia que eu vá embora, você vai ter que me engolir...

Não queria fazer uma cena ou coisa do tipo, mas até a vontade de comer passou. Primeiro, ele
tinha sido um canalha. Segundo, ele conseguia ser ainda pior do que já era. Eu só precisava passar

mais cinquenta e nove dias dentro daquela fortaleza e estaria tudo certo. Arrastando a última gota de
dignidade, segui o meu caminho até a piscina para tomar sol.
Me deitei na espreguiçadeira depois de ter tirado o short e a blusinha, fechando os olhos para
aproveitar a sensação do sol esquentando o meu corpo.

— Você não me parece ser o tipo de mulher que se deixa levar por um homem, Ana... — A
voz de Lucca chegou até meus ouvidos e eu tive que abrir os olhos para encará-lo.
Lucca era realmente de tirar o fôlego, de tão lindo.
— E não me deixo... — respondi a ele com a voz tranquila.
— O Vince não é de se trocar com qualquer pessoa. — Ele revelou esboçando um sorriso. —
E nem de ficar trocando farpas por diversão.
— O que você quer dizer com isso? — Juro que tentei não demonstrar tanto interesse, mas foi
inevitável.
— Só que você não é qualquer pessoa... — Deu de ombros, se acomodando na cadeira ao

lado da minha.
— E quem disse que eu me importo? — A quem eu queria enganar? Estava na cara que eu
tinha gostado de não ser qualquer uma.
Até a vontade de ser uma daquelas mulheres que estavam com ele no escritório passou.
Segundo dia ali e eu já não sabia bem o que sentia, mas sabia que queria ser mais do que uma
lembrança na vida de um homem. Era confuso? Sim, muito. No entanto, à medida que eu ia
analisando a situação, ser mais uma na coleção não seria legal. Claro que sexo casual, mesmo que
sem um sentimento mais forte envolvido, poderia acontecer. Porém, além da vontade, existia o medo.
Mulher, quando se apaixona, é um perigo. E estou falando de paixão avassaladora, do tipo que você
não sabe onde um começa e o outro termina. Naquele momento, eu sabia o que queria com Vince, mas

ao mesmo tempo, não sabia se daria certo ou se existia a possibilidade de algo. A lembrança dele

falando que não me tocaria novamente estava pairando na minha mente e até a ideia idiota de
provocá-lo precisaria ser analisada de um outro ângulo. O Lucca não precisava saber dos meus

sentimentos, ou do fato de eu sentir que Vince não me parecia tão estranho, de que sentia no meu
íntimo que já o conhecia. Apenas me dei conta deste fato quando o seu primo estava conversando
comigo naquele momento.
— Gosto de pessoas iludidas, assim como você. — Sorriu novamente ao terminar de falar.

— Não sou iludida... Sou uma mulher prática.


— Vou deixar você curtir o sol e aproveitar o dia. — Como eu havia pensado, Lucca seria um
bom amigo.
— Eu não sou iludida! — gritei para ele, o vendo ir embora claramente se divertindo.
Minha cabeça estava funcionando em uma velocidade diferente da normal, e eu não
conseguiria ficar ali apenas tomando um banho de sol com tranquilidade.
Talvez fosse somente coisa da minha imaginação, e Vince não desse tanta importância assim
ao que aconteceu na cozinha, ou o fato de eu tê-lo visto de uma forma mais comprometedora. Lucca
me diria isso sem um propósito? Talvez. Não sei. Ah, que confusão!

Os fusíveis do meu cérebro queimaram enquanto eu caminhava de volta para a casa, que nem
me dei conta que entrei do jeito que estava: só de biquíni. Acabei não entrando na piscina, pois tinha
esquecido de pegar uma toalha e eu não queria entrar na casa toda molhada para dar mais trabalho a
quem era responsável pela limpeza. Segui até a escada, com o pensamento focado apenas em uma
pessoa: Vincenzo Castello.
— Você não deveria andar assim dentro da minha casa. — Aquela voz eu conhecia. Na
verdade, o dono dela estava na minha mente desde a noite passada. Encontrar ele parado na porta do
meu quarto foi um verdadeiro choque. Lá estava ele, já abrindo a porta do meu quarto para mim. —
Entre logo na porra desse quarto...
— Não... — Quando pensei em rebater com algo desaforado, Vince já estava perto de mim,

me pegando pelo braço e puxando para dentro, batendo a porta com força.

— Eu sei muito bem o que você está fazendo, e não estou gostando muito. Em menos de dois
dias você me fez quebrar duas promessas... Uma, que eu nunca lavaria a porra de um prato... E a

outra de nunca mais tocar em você.


Ele parecia furioso comigo, no entanto, eu não sabia o que tinha feito para merecer isso. Já
que quem aceitou a lavagem de pratos como um desafio tinha sido ele. E eu não tinha culpa do que
havia acontecido depois disso, a não ser pelo fato de ter implorado de maneira desavergonhada por

mais dele. E ainda tinha a questão da promessa sem fundamento. Talvez tivesse sido a ordem do pai
dele, para não encostar na filha de dona Inessa. Se não tivesse um dedo da minha mãe envolvido
nisso, eu não sabia de mais nada.
— O que você estava falando com o Lucca? — questionou se aproximando mais de mim.
Neste momento, eu me senti tão exposta... Tão nua... Sob o controle dele de novo.
— Nada demais... — Por pouco não gaguejei.
— Não me pareceu nada demais... Parecia que tinha muita coisa ali. — A sua voz era baixa,
mas não menos perigosa.
— Está achando que é meu dono? — retruquei, tomando coragem. — Não tenho que dar

satisfação do que faço para você. Até onde eu sei, estou aqui por causa do seu pai, que achou que
seria mais seguro eu ficar aqui... E em menos de dois dias você já se sente no direito de me tratar
assim.
— Eu não estou achando que sou seu dono. E sei muito bem o porquê de você estar aqui. Só
estou puto com você, por... — Ele respirou fundo, fechando os olhos e passando a mão pelo cabelo
de forma exasperada. Quando os abriu novamente, tinha um fogo diferente em seus olhos, do tipo
combustão espontânea.
— Por?! — Provoquei, sabendo que poderia não acabar muito bem.
— Por você ser tão gostosa, e não ter consciência disso. — Explodiu ao falar.
Eu, gostosa? De onde ele tinha tirado essa ideia que eu não sabia disso? Coitado! Porém, foi

inesperado ouvir, no segundo dia, aquilo da boca dele. O ataque de riso foi a pior parte, e quando dei

por mim, já estava chorando de tanto rir. Eu achando que era coisa da minha cabeça, quando na
verdade, não era.

— Desculpa... — Eu pedia, tentando me controlar.


— Você está rindo de mim? — perguntou, confuso e irritado ao mesmo tempo.
— Você foi mais rápido do que imaginei... — Respirei fundo para me acalmar. — Achei que
ia fazer você sofrer mais um pouco.

— Ana, você não se lembra? — Franziu o semblante.


Do que ele estava falando?
— Achei que se lembraria de mim, mesmo depois de tantos anos... — Vince parecia até
magoado.
— Não estou entendendo... A gente já se conhece? — De repente, minha cabeça começou a
doer com as lembranças vindo.
Eu já conhecia Vince Castello. Puta que pariu, eu o conhecia mesmo.
Capítulo 6

Quinze anos antes…

As lembranças de tudo o que aconteceu naquela tarde, em uma das muitas visitas de Franz

Castello ao restaurante, voltou. Ele, como de costume, entrou no escritório com a minha mãe, mas
naquela visita deixou um rapaz a sua espera, sentado em uma das mesas. Seu olhar estava perdido,
até. Lembrei de como o achei lindo e imaginei os cinco filhos que teríamos juntos. A cor dos seus
olhos era o que mais se destacava com a luz do sol. Um castanho-claro, quase cor de mel, e me
deixou encantada. Sem graça, segui em direção a sua mesa para saber se ele gostaria de beber algo,
sabendo que as conversas de dona Inessa e o senhor Castello eram demoradas.
— Aceita um milkshake de morango? — Minhas mãos suavam de tão nervosa que eu estava.
O garoto que tinha os olhos mais lindos que já vi me encarou sem interesse.
— Não — respondeu de maneira seca.

— Então, que tal um suco de laranja? — sugeri um pouco mais animada.


— Você não vai sossegar enquanto eu não aceitar nada, não é? — suspirou entendendo a
situação: eu venceria ele pelo cansaço. Lembro de ter sorrido de orelha a orelha quando aceitou o
suco.
Ele parecia ter uns dezessete anos, por aí. E, mesmo com a cara fechada, era tão lindo. Corri
para a cozinha, preparei o suco de laranja e ainda coloquei uns biscoitos amanteigados para ele.
— Aqui está! — anunciei com um floreio desnecessário, fazendo ele esboçar um leve sorriso
no canto da boca. E foi o suficiente para eu não me dar conta que estava sentando com ele à mesa
também.
— Você vai esperar eu terminar meu suco? — perguntou intrigado, arqueando a sobrancelha

para mim.

— Ah, me desculpe... — falei sem graça, percebendo a vergonha que eu estava passando.
Porém, foi quando eu estava quase me levantando para sair da cadeira que ele pegou a minha mão.

— Desculpa... Eu prometo não tocar em você novamente sem a sua permissão. Mas, por
favor, fique aqui sentada comigo. — Era dor o que eu tinha sentido ao escutar aquele pedido.
— Tudo bem, eu fico... — Sorri de forma calorosa.
— Qual é o seu nome? — Ele quis saber, bebendo um pouco do seu suco logo em seguida.

— Ana. Ana Delmondes. — Depois que o respondi, ficamos em silêncio por alguns minutos.
Queria quebrar o gelo, quem sabe mostrar a cozinha do restaurante. — Quer conhecer a cozinha?
Posso te ensinar como se lava os pratos... — brinquei, tentando fazer ele me presentear novamente
com aquele sorriso.
— Não fui educado para lavar pratos, Ana. Sou o futuro herdeiro de um grande império. —
Não foi de forma esnobe que ele falou, no entanto, dava para perceber que já tinha tudo decorado em
sua mente. Pensei como deveria ser triste não poder fazer outra coisa... Algo que se ama e nos faz
feliz.
— Não falei... — De repente a porta do escritório se abriu, e logo o rapaz se pôs de pé.

— Gostei de você, Ana. — Ele disse, me olhando de lado. — Um dia você... — No momento
em que ele ia terminar a frase, o senhor Franz se aproximou dele. Dessa vez, ele não falou uma
palavra para mim. Apenas assentiu e caminhou até a porta. O rapaz parecia a sua sombra, o
acompanhando. Depois daquele dia, ele nunca mais apareceu com o senhor Franz no restaurante.
Assim que lembrei de tudo, meus pulmões ardiam tentando puxar o ar. Como eu havia me
esquecido?! Passei um ano esperando pelo garoto dos olhos cor de mel. Todas as vezes que o pai
dele entrava no restaurante, o meu coração quase saía pela boca, tamanha era a expectativa. E ali
estava ele, bem na minha frente.
— Ana... — Escutei a voz de Vince me chamando, fazendo eu despertar para o momento atual
da história.

— Agora lembro... — Estava atônita. Eu busquei uma cadeira para me sentar, ou cairia de

bunda no chão. — Lembro que você ia falar algo, antes de sair com o seu pai... Lembro de você falar
que não iria me tocar sem a minha permissão. De que você não lavava pratos por ser um herdeiro...

Do suco de laranja...
— E acabei quebrando todas as promessas... — O timbre da sua voz era mais calmo, quando
percebeu que eu havia recordado.
— Promessas feitas por um adolescente, Vince... — argumentei, passando as pontas dos

dedos nas têmporas, para tentar aliviar a pressão da dor de cabeça que já estava chegando.
— Um adolescente com muitas responsabilidades, onde a palavra dada deve ser cumprida.
As promessas são algo sério, Ana. Até as que faço em pensamento — explicou, já se aproximando
mais de mim e ficando na minha frente.
— E o que você ia me falar, antes de sair naquela tarde? — O encarei, descansando mais o
corpo na cadeira.
— Que um dia você ia ser minha. — O coração até congelou no instante em que ele terminou
de falar.
— Não. — Foi o que saiu da minha boca. — Não vou ser sua.

— Vai sim... — falou se ajoelhando entre minhas pernas. Se o meu coração já tinha
congelado, naquele momento o Alasca havia se alojado no lugar. Quando dei por mim, suas mãos já
estavam segurando a parte de baixo das minhas coxas, me puxando para a ponta da cadeira, e as
abrindo descaradamente.
— O que você pensa que está fazendo? — Eu não conseguia me mexer ou esboçar qualquer
ação além de fazer aquela pergunta absurda. Abandonando as minhas coxas, Vince subiu as mãos,
deslizando-as pelas laterais, até chegar aos laços do biquíni e os puxou ao mesmo tempo. A parte da
frente ficou pendurada e a minha boceta exposta.
Primeiro, ele se aproximou e cheirou. Depois, quase espremeu o rosto sobre o monte de
Vênus e, por último, pegou minhas pernas, jogou por cima do ombro e lambeu do cu até o clitóris, e

eu gemi. Vince alternava entre lamber e chupar com calma. Parecia que estava saboreando cada

pedacinho, e quando repetia o “cuceta”, ele me fazia chegar ao limite. Era como se estivesse
beijando a minha boca, mas me dando o prazer de ser a de baixo. Quando ele parou de chupar, até

pensei que acabaria ali mesmo. Mas foi só uma breve pausa para ele me fazer segurar os joelhos e
deixar o caminho mais livre para poder fazer o que bem quisesse.
E ele fez. Fez o que ninguém nunca tinha feito em mim na minha vida: chupou meu cu e a
minha boceta como se o mundo fosse acabar. Eu nem estava me importando mais com a vida na

Terra, ou se iam escutar os meus pedidos de ser fodida... Quando já não aguentava mais, gozei na sua
boca enquanto segurava o cabelo dele com força para ele não sair dali nunca mais.
— A boceta mais gostosa que já chupei... — disse quando a minha respiração desacelerou e
eu o libertei. — E ela é minha. O quanto antes você se convencer disso, melhor.
Eu até queria falar, mas o meu cérebro não estava funcionando muito bem. Na verdade, acho
que tinha queimado alguma parte dele e eu estava precisando de um reparo urgente. Vi quando ele se
levantou, me colocou em uma posição considerada decente e amarrou os lados do biquíni.
Porém, antes de ele sair, o pouco de neurônios que eu tinha funcionou e saiu uma pergunta.
— Ouvi seu pai no telefone a primeira vez, quando avisou que eu viria. Por que você não me

queria aqui, sendo que agora diz que vou ser sua?
— Eu não sou um homem bom, Ana. Queria você longe, mas parece que o destino não quer
isso. Então, não vou ser contra. Aqui, eu não sou um príncipe encantado... — disse isso sem olhar
para mim, suspirou e continuou. — Deus sabe que pedi para que você não conhecesse o meu outro
lado. O lado obscuro. — Vince não olhou para trás, apenas saiu e fechou a porta, me deixando sem
saber o que fazer.
Eu não iria me apaixonar por ele. Não mesmo.
Merda...
Capítulo 7

Uma semana já havia se passado desde o acontecido. Vince tinha sumido da mansão e eu
tentava matar o tempo da melhor forma possível, porém, estava sendo um balde de água fria ficar

sem fazer nada. Sair da fortaleza estava fora de questão... Eu até tentei negociar com Lucca, que
agora estava cada dia mais próximo. Conversávamos sobre tudo: sobre as viagens que ele já fez, os
países que ele mais gostou e as namoradas, ou a namorada secreta dele. Conversamos também sobre
a relação dele com o irmão, que a meu ver não era das melhores. Lucca fazia de tudo para que não
houvessem conflitos entre eles. O pai e a mãe sofreram uma emboscada depois de terem se metido
com a Yakuza. O irmão de Franz Castello estava envolvido com o tráfico de mulheres, mas Franz
sempre foi contra isso. Armas, drogas e roubos podiam acontecer... Mas escravizar mulheres e
crianças sexualmente ou de qualquer outra forma? Jamais. E o acordo entre eles, os Castello e a
Yakuza, foram honrados. Nem um dos lados pode interferir nos negócios do outro, isso incluía

negociar debaixo do nariz dos superiores. Laila, mãe de Lucca e Salvatore, foi uma vítima no meio
disso tudo. Estava no local e na hora errada. Tudo culpa da ambição do seu marido, Lazari.
Meu novo amigo não sentia raiva ao falar sobre a sua história... No entanto, notava-se a
tristeza em seus olhos, assim como a saudade que sentia da sua mãe.
— Já atirou em alguma coisa, alguma vez na sua vida? — Ele perguntou entrando no meu
quarto sem ser convidado.
— Você não sabe bater à porta? E se eu estivesse nua?
— Meus olhos já têm dona, e você sabe. Me desculpe, Ana. Você é linda, mas quando um
homem ama mesmo a sua metade... — suspirou, debochando de mim.
— Vá tomar banho... — Ia sair outra coisa, só que eu estava tentando me policiar mais com

os palavrões e ser o mais fina e educada possível.

— Então... Já atirou ou pegou em uma arma? — Sentou na cama, me empurrando para ficar
quase na beirada.

— Não... Não sei nem o que fazer com uma arma. No máximo assisto filmes de ação, e nem
gosto tanto assim... — expliquei tentando tomar mais espaço, mas ele começou a quicar de propósito,
me fazendo dar leves saltinhos.
— Eu vou te ensinar como se faz.

— Lucca! — gritei quando ele me empurrou da cama e eu caí igual merda na água. — VOCÊ
ME PAGA!
— Te espero lá embaixo daqui a dez minutos. Não se atrase... — Olhou de forma cínica para
mim ao se levantar da cama e andar em direção à porta.
— O que deu nele, Senhor? — resmunguei enquanto me levantava do chão.
Como eu não podia ir de short e blusinha de alça, vesti minha calça jeans ultra-mega-power
colada, do tipo que levanta qualquer defunto, e uma blusa vermelha com mangas compridas. Arrumei
meu cabelo preso no topo, em um coque quase organizado, e passei um batom rosa apenas para dar
uma corzinha nos lábios. Caso eu encontrasse Vince em algum momento, não estaria com a cara de

“eu estava esperando por você”, “não parei de pensar no que aconteceu”... E blá, blá, blá. E
perguntar ao Lucca sobre ele era a mesma coisa de assinar uma sentença de interesse. Seria tão bom
se ele falasse sem que eu precisasse me humilhar... Triste fim, pensei terminando de colocar as botas.
Como prometido, lá estava Lucca do lado de fora da casa me esperando. Salvatore, que
conversava com um dos seguranças, parou no mesmo instante e veio em nossa direção com uma cara
preocupada.
— Lucca, você sabe que a Ana não pode sair... — Salvatore falou irritado com o irmão, que
apenas o encarou, esperando ele terminar de falar. — Vince não está aqui...
— Relaxa, Salvatore... Não vou levar a Ana a lugar nenhum. Na verdade, vou sim... Vou
mostrar como se atira. — Até parecia que o tempo havia se fechado naquele exato momento.

Senti um calafrio percorrer a minha espinha e os pelos do meu corpo arrepiarem. Segundos

depois os portões da mansão se abriram e três carros entraram em alta velocidade, freando
bruscamente.

— Merda! — esbravejou Salvatore. — Chame o Alfredo, agora! — Todos da casa estavam


agitados e eu parada, sem saber o que fazer ou o que estava acontecendo. Foi quando olhei
atentamente para os carros, todos furados de balas. Pareciam peneiras de lata. Dois seguranças se
aproximaram do carro do meio, junto com Salvatore, e de lá tiraram um corpo.

Aquele era Vince?


O coração acelerou, meus olhos se arregalaram e a minha respiração ficou pesada.
Deus, que não seja nada grave... Eu pedia, ainda parada como uma estátua.
“Tirem a Ana daqui!” — Um gritava.
“Ela está em choque!” — dizia outro, mas eu só conseguia olhar para o corpo do homem
sendo segurado por eles.
Era o Vince. Merda... Era ele. O meu Vince... O meu Vince?
Depois disso, não me lembro como fui parar no meu quarto. Pisquei os olhos algumas vezes,
para ter mais foco de onde eu estava e as lembranças voltaram. Eu precisava saber o que tinha

acontecido. Ainda me sentindo desorientada, saí em busca de alguém que pudesse me dar qualquer
informação, mas as bocas dos seguranças pareciam que estavam coladas com uma supercola. Então
resolvi ficar parada na porta do quarto dele, até que alguém saísse de lá para eu conseguir uma
resposta.
— O que houve? — perguntei a Salvatore quando ele saiu do quarto. Nas mãos dele tinha
sangue, assim como em boa parte da sua camisa.
— Está tudo bem... — Ele começou a falar, ainda abalado pelo que tinha acontecido. —
Vince tinha indo negociar um carregamento, mas acho que não deu muito certo.
— Como assim? Se o negócio não dá certo, vai cada um para o seu lado... — argumentei
nervosa.

— As coisas não funcionam assim nos nossos negócios, Ana. — Ele respirou fundo e

continuou. — Digamos que a outra parte não gosta muito das regras dos Castello...
— Então, quando não gostam de algo, acontece isso? — Eu estava perplexa. Aquele mundo

era novo para mim e saber, daquela forma, me deixou com medo.
— Isso mesmo. Eu mesmo já tenho tantas marcas que perdi as contas...
— Eu posso só ao menos ver ele? — Era nítida a angústia em minha voz. Talvez ele
percebesse o meu interesse no primo, mas eu não estava ligando para isso. Queria ver Vince e saber

se ele estava bem... Fora de perigo.


— Pode. Não foi grave, mas ele tem que ficar de molho por uns dias. — De fato, Salvatore
parecia intrigado com o meu pedido. — Alfredo já costurou aquele bastardo e está tudo limpinho.
— Aposto que, pelo nome e a forma como falou desse tal Alfredo, ele deve ser o
açougueiro...
— Ele é o cara que a gente chama quando se precisa costurar um pedaço de carne. — Ele
meio que parecia triste, mas preferi seguir em frente e não perguntar nada a ele.
— Obrigada... — Eu agradeci? Mas pelo quê? Por ele estar vivo ou pelo “limpinho”?
— Ana, só tome cuidado. — O jeito como ele me olhou me deixou incomodada. Desde o

início não me sinto à vontade com ele, porém, gosto de Salvatore. Aquele aviso me deu calafrios.
A única coisa que fiz foi assentir para ele, fingindo ter entendido o que me disse. Já que eu
não via motivos para ser alertada sobre nada. Se fosse sobre Vince, eu sabia que ele não valia um
dólar. E não era como se eu fosse me perder loucamente por ele... Isso nunca.
Girei a maçaneta da porta com cuidado e entrei. O quarto dele era bem mais organizado do
que eu tinha imaginado. A mobília era moderna, e por incrível que pareça, ele gostava de ler
romances. Me peguei passando o dedo nas molduras, onde a sua infância era evidente. Corri com os
olhos sobre tudo, até parar na foto do Vince que eu conheci na adolescência. O seu semblante sério
em nada parecia com o de agora. Não que ele não fosse sério, mas agora ele também era mais
sombrio.

— Veio só para ficar bisbilhotando as minhas coisas? — Levei um susto ao escutar a voz

rouca dele.
— Desculpa, não foi minha intenção perturbar você. Só vim ver se está bem... — falei um

pouco deslocada. Eu não sabia para que lado olhar. Se eu o encarasse, algumas emoções ficariam
evidentes.
— Eu estou bem, Ana. Foram só três balas de raspão. Nada muito sério... — disse tentando
se sentar na cama. Eu corri para o ajudar assim que percebi o que ele queria.

— Calma, eu ajudo... — Peguei dois travesseiros e arrumei em suas costas, para ficar mais
confortável, e me afastei da cama, ficando em pé.
— Você seria uma ótima enfermeira — brincou, porém, dava para notar que sentia dor.
— Nada de hospital, não é? — suspirei pesadamente e ele me olhou buscando algo.
— Além de linda, esperta.
— Não que eu não seja isso aí que você falou, mas é a lógica. Tiveram que chamar um
açougueiro para cuidar de você... — Meu tom de voz saiu mais irritado naquele momento. O que não
era bom para minha atual situação.
— Preocupada comigo? Doutor Alfredo ficaria muito chateado com esse seu comentário. —

O filho da puta me deu aquele sorrisinho no estilo Monalisa. Inferno! — Sentiu a minha falta, não é?
— Só nos seus sonhos. Isso aqui... — Gesticulei com o dedo na direção dele e na minha. — É
apenas caridade por você não ter dado um show maior para o seu pai por eu estar aqui.
— Caridade? — Sorriu. O safado sorriu para mim, como se eu fosse única! E não era bem
assim... As duas vadias do escritório que o digam.
— Bom, tudo explicado... Tenho que ir.
— Se você quiser, pode ficar mais. — Vince estava se divertindo às minhas custas. Filho da
puta... Droga, lá se foi a regra de diminuir os palavrões. Tudo culpa dele.
— Tenho mais o que fazer... — desdenhei já seguindo em direção à porta.
— Mais tarde, quero jantar você... — Eu tinha escutado direito? Congelei na saída.

— O quê? — Minha voz saiu esganiçada.

— Quero que você traga o jantar para mim. — Filho da puta! Respirei bem fundo e soltei o ar
devagar para não voltar lá e rasgar os pontos dele. — Eu sei que você quer.

— Por mim, você morre de fome hoje. — Saí do quarto batendo a porta com força.
Eu estava muito ferrada, isso sim.
Capítulo 8

Passei o resto da tarde pensando no que tinha acontecido. As lembranças do ocorrido


começaram a surgir na minha mente como fogos de artifícios no quatro de julho. Eu sabia que não

deveria me meter onde não fui chamada, porém, era mais forte do que eu. Os Castello tinham vários
acordos e regras, segundo o que me falaram. Para um acordo ser quebrado, teria que acontecer algo
parecido com o que houve comigo. São dias de negociação, reuniões com o conselho da máfia de
cada família até que se chegue a um novo acordo. Franz, com certeza, não deixaria o seu único filho
passar por algo assim. Até eu sabia disso... E por que isso tinha acontecido? Eu ainda não
compreendia muito bem as coisas, mas estava mais que disposta a aprender para, quem sabe, um dia
eu precisasse entender melhor como funciona esse novo mundo.
— Senhorita Ana, a carne vai passar do ponto se deixar mais um pouco. — Atlas me chamou
a atenção e, graças a ele, não queimei o bife que estava fazendo.

— Desculpa, Atlas... — Ele me olhava preocupado, mas durante os dias que eu estava ali, ele
nunca falou sobre o que se passava na mansão. Conversávamos sobre culinária e a variedade de
temperos naturais que Vince fazia questão de ter nos alimentos. Nada de temperos artificiais, tudo o
mais natural possível.
— Você não precisa me pedir desculpas... — O vi colocar o purê de batata ao lado da porção
de arroz. — Esse é o prato favorito do senhor Vince. A mãe dele sempre fazia para ele quando não
estava se sentindo bem. Umas mães fazem chá, sopa ou canja... Mas ela fazia purê, arroz e bife.
Ele parou de falar logo depois de me dizer isso. Olhou bem o prato, para ver se tinha algo
fora do lugar, mas estava tudo na mais perfeita harmonia. Pegou a frigideira e, de forma delicada,
colocou o bife ao lado do purê, jogando umas folhas de alecrim por cima.

— Ana, é apenas uma dica. Nunca mais você me verá ultrapassando essa barreira, enquanto

estiver aqui, está bem? — assenti com expectativa.


— Sim. Eu entendo...

— Vince passou por muitas coisas na vida e ele é assim, um pouco sem rumo. Não estou
falando que ele é bonzinho, mas eu nunca o vi interessado por uma mulher da mesma forma que ele
parece estar por você. Então, só dê tempo ao tempo.
Tempo era algo que eu não tinha naquele momento. E Vince estava ligado a mim de uma forma

mais sentimental do que imaginava... Com uma pitada de algo sexual, eu acho. Ou eu estava tentando
me enganar. Explicar isso para Atlas seria complicado.
Explicar isso para qualquer outra pessoa seria complicado.
— Não sei pelo que ele passou, porém, eu não estou aqui para isso. Estou passando por algo
difícil na minha família, e é por isso que estou aqui. Vince pode ter passado por barreiras...
— Eu apenas falei o que penso, senhorita. — Ele se pôs firme na conversa. — Não estou aqui
para me intrometer na vida particular dos meus patrões. Só sei que você é uma mulher muito sensível
e merecia saber disso.
Atlas me deixou parada, com a cara no chão, e foi embora como se nada tivesse acontecido.

Se eu estava confusa, aquela quase conversa tinha me deixado ainda mais. A recordação do
desespero que senti quando o vi daquele jeito, sendo carregado para ser socorrido, me deixou aflita.
Será mesmo que Vince gostava de mim? Porque, sinceramente, não era isso que parecia. Ele
era escroto, apesar de ter sido o melhor beijo e a melhor chupada da minha vida. Eu não podia
pensar com a cabeça do grelo. A Ana que estava ali em nada parecia com a Ana da família
Delmondes.
Peguei a bandeja com o jantar de Vince e levei até seu quarto. Ele ia saltar de alegria
sarcástica quando me visse entrando no seu quarto com o seu jantar. Para minha surpresa, ele estava
dormindo. Por pouco não derrubei a bandeja quando abri a porta. Deixei ao lado da cama, em cima
da mesinha de cabeceira, e o observei dormir. Cada traço do rosto dele era um convite para passar a

ponta do dedo, criando linhas imaginárias que dariam para ser um belo esboço de um desenho. A

boca levemente rosada, os cílios fartos, a barba bem feita, o nariz perfeito, o cabelo preto e
brilhoso... Aquele homem era lindo.

— Vince... — O chamei para poder comer alguma coisa. Desde o ocorrido, ele não tinha
aceitado nada do foi oferecido para ele comer.
— Ana, o que está fazendo aqui? — questionou com a voz sonolenta, se acomodando melhor
para ficar sentado, com as costas apoiadas no encosto da cama.

Vince estava sem camisa, mostrando as inúmeras tatuagens que cobriam a sua pele. No meio
do seu peito tinha um nome: Clara. Devia ser uma pessoa muito importante para ele, já que estava
tatuado no peito esquerdo. No peito direito um dragão chinês, que pegava uma parte do peitoral e das
costelas e várias outras espalhadas pelos seus braços. Naquele momento, eu tive a oportunidade de
observar de perto, já que da primeira vez ele estava bem ocupado.
— Pensei que queria que eu trouxesse a sua comida... — brinquei pegando a bandeja e
colocando sobre suas pernas. — Deve ser um choque emocional me ver servindo você, eu sei.
— Não falei sério quando pedi para trazer o meu jantar. — Ele parecia mais relaxado, eu
acho. O seu semblante parecia tranquilo enquanto me encarava.

— Era isso ou você morrer de fome... — Sorri para ele. Os olhos dele tinham um brilho
diferente. Ou, talvez, fosse apenas impressão minha, já que eu escutei tudo que Atlas havia falado.
— Ana, eu já avisei que não sou um homem bom... — suspirou, fechando os olhos, quebrando
o contato visual que tinha sido estabelecido. — E quando você olha assim para mim, eu me sinto um
bom homem. Mas eu não sou.
— Vince, sei bem que você não é. Na verdade, estou sentindo na pele. Você é um escroto... —
Dei de ombros, mesmo sabendo que ele estava de olhos fechados.
— Mas eu quero você. Não estou falando de paixão... — Foi nesse momento que ele abriu os
olhos para mim, me passando toda intensidade que poderia expressar. — Eu disse que você seria
minha e vai ser. Mas anos longe de você, mesmo que tenha sido uma promessa de adolescente, como

disse, eu não consegui esquecer como foi gentil e tão doce comigo naquele dia...

— Você vai acabar me deixando louca! — gritei olhando para ele. — Uma hora você está
tocando meu corpo, em outra me chupando como se o mundo fosse acabar e depois, seu filho da puta,

diz que não é um homem bom! Vince, eu não tenho estruturas emocionais para aguentar isso.
Minha respiração estava acelerada demais para eu conseguir controlar a minha boca.
— Agora fala que me quer? Você sabe perfeitamente pelo que estou passando, e não está
sendo fácil administrar a ideia que eu sou a herdeira de um grupo mafioso. Droga... — As lágrimas

começaram a sair como cachoeira e tudo ficou embaçado por causa delas.
Não sei como os braços dele estavam ao meu redor, me abraçando enquanto o meu rosto
repousava em seu peito.
— Tudo isso é uma merda mesmo. Porém, eu tinha prometido que você seria minha. Eu sei
tudo sobre você, Ana. Só não queria...
— Que eu visse o seu lado obscuro — completei a frase, fungando e me sentindo
envergonhada por ter chorado daquele jeito. — Mas estou com mais medo de me apaixonar e isso
acabar em uma merda das grandes.
— Podemos tentar... — Em sua voz havia esperança, coisa que eu não tinha muito no

momento. — Eu sei que você também quer. Sei que, no momento em que se recordou daquele dia,
algo mudou dentro de você. Seu olhar não me engana.
— Vince, se tudo der errado com as negociações do seu pai com o meu, eu terei um noivo me
esperando... Entende como tudo isso é estressante? — Afastei minha cabeça do seu peito para poder
olhar o rosto dele. — Não posso me apaixonar por você e nem você deve fazer com que eu o ame.
— A única promessa que não vou quebrar, aja o que houver, será a de desistir que você seja
minha. — De onde tinha saído aquilo? Agora ele parecia uma bomba nuclear perto de mim. — Sei da
minha fama, mas quando falei que seria minha, eu estava querendo dizer que serei apenas seu e de
mais ninguém. Minha devoção será sua, meu corpo, minha alma...
A luta para não me apaixonar por ele estava a cada segundo mais difícil. Ainda mais quando

ele estava se mostrando um Vince diferente. O tipo de homem por quem eu abriria mão de tudo. Ele

segurou meu rosto entre suas mãos e me beijou com calma. Parecia que sugava a minha alma, se
alimentando pouco a pouco. De repente, me vi em um conflito que jamais imaginei passar: ceder ou

não? E os problemas, a minha família e tudo o mais que estava em jogo? Será que tinha espaço para
romance? Eu tinha esse direito, de em meio ao caos, abrir o meu coração para alguém que era tão
perigoso para a minha saúde emocional? Uma coisa é amor de adolescente, e outra totalmente
diferente é o amor que ele estava querendo me oferecer, mesmo que mascarado de um romance

casual, que eu bem sabia que não era.


— Não posso... — falei abruptamente, me afastando dele.
— Ana! — E lá estava aquele olhar triste de novo. O olhar do Vince adolescente, que tinha
tudo, mas parecia não ter nada.
— Não. Por favor, não...
Saí correndo pela segunda vez, naquele dia, do quarto dele. No entanto, dessa vez por puro
medo de sentir algo mais forte. Eu não precisava ter passado por uma grande desilusão amorosa para
saber que coisas ruins poderiam acontecer comigo, caso eu aceitasse um relacionamento com Vince.
Não estava falando isso pelo fato dele ser quem era, mas sim da confusão que estava a minha vida.

Muitas coisas na minha cabeça para processar de uma única vez.


Capítulo 9

Já tinha escurecido quando resolvi sentar na beira da piscina para observar as estrelas. Na
verdade, eu precisava respirar um pouco. Me peguei pensando se tudo não passava de uma

brincadeira do destino. Um dia, o garoto prometeu que eu seria dele, mesmo que não tenha
completado a frase; no íntimo dele a promessa foi selada. No entanto, o garoto tinha se tornado um
homem. Um homem visivelmente mais decidido e direto, mais do que eu poderia imaginar. Vince era
um homem que transpareceu sinceridade em suas palavras, e isso mexeu comigo. O tempo passou e
estava custando a acreditar que aquele sentimento ainda permanecia intacto. Se isso fosse verdade,
que ele sempre nutriu sentimentos por mim, talvez tudo o que ele tinha me falado fosse verdade.
Como eu pude esquecer dele e dos seus olhos cor de mel? Eu estava tão confusa...
— Meu reino por seus pensamentos... — Ao escutar a voz de Salvatore, os pelos do meu
corpo de arrepiaram. — Está com frio? — Ele não me esperou responder, já foi tirando o paletó do

terno e colocando sobre os meus ombros. O perfume dele era delicioso, mas parecia tão errado eu
aceitar aquele gesto.
— Obrigada... — Não o encarei, fiquei apenas balançando minhas pernas dentro da água,
com as mãos apoiadas na borda da piscina. Graças a Deus ela era aquecida.
— Desculpa se eu a assustei quando expliquei... Você sabe... — Vi quando ele tirou os
sapatos, levantou a barra da calça e sentou ao meu lado. Senti a mão dele ao lado da minha; se eu
deixasse a mão perto demais, ele poderia pensar que teria alguma chance, então afastei a mão e
terminei de vestir seu paletó, como se estivesse sentindo muito frio.
— Não precisa pedir desculpas. Eu só tenho que me acostumar com o meu novo mundo. —
Dei de ombros como se tudo fosse se resolver.

— Se fosse outra pessoa, surtaria com tudo isso... — Finalmente o encarei e ele estava

olhando atento para mim.


— Se eu surtar vai mudar alguma coisa? Eu vou deixar de ser filha de Enzo Mazzini? —

Sorri apenas por ser uma pessoa simpática. — Só quero que isso acabe o mais breve possível e eles
decidam logo o meu futuro.
— Você é bem diferente das mulheres que circulam no meu mundo. Talvez por não ter nascido
dentro da máfia. Nunca conheci alguém como você, Ana... — Salvatore suspirou. — Além de ser

linda, claro. — Em outro momento eu teria me deixado levar por aquelas palavras, mas tudo que eu
conseguia pensar era nas palavras de Vince para mim.
Dava para perceber a investida que ele tinha acabado de dar e eu não estava a fim dele. Ele
tinha jeito de homem perigoso, sorrateiro, e nada me tiraria isso da cabeça. Até onde eu sabia,
Salvatore poderia estar em uma competição com o primo para ver quem conseguiria me comer
primeiro, mas a única diferença entre Vince e ele era que eu já conhecia brevemente um deles.
— Bom, eu tenho que ir. O dia foi estressante e me sinto cansada — falei já me afastando
dele e ficando de pé. Tirei o paletó e lhe entreguei. — Obrigada, Salvatore. Boa noite.
— Boa noite, Ana. — Não sei se ele entendeu a forma como me afastei. Só queria que ele

ficasse no canto dele e eu no meu, pois já tinha problemas suficientes para uma vida.
Uma das minhas maiores preocupações era saber como Franz convenceria meu pai, Enzo, a
me liberar da função de sucessora da família. Os dias estavam se passando e ainda não tinha
recebido notícias da minha mãe e irmã. Queria tanto escutar a voz dela e poder pedir conselhos sobre
o que estava acontecendo... E mesmo que não fôssemos melhores irmãs, queria saber como Lolla
estava passando.
Será que Enzo Mazzini não se dava conta do que estava fazendo com a minha família? Eu não
tinha culpa do acordo absurdo deles! Em parte, isso me deixava muito irritada. Saber que eu estava
sendo conduzida o tempo todo para assumir algo que não queria era angustiante. Uma coisa era eu
não gostar de cozinhar, mas, ainda assim, ter o dom e fazer isso com uma gota de vontade. Outra

coisa totalmente diferente era eu administrar os negócios de um pai que nunca foi presente ou se fez

presente na minha vida.


Como eu não tinha jantado, segui direto para a cozinha. O ronco do meu estômago foi

assustador quando peguei a lasanha de carne que Atlas havia guardado na geladeira: um recipiente
etiquetado com data, hora e sabor. Abri a tampa apenas para sentir o cheiro, que estava espetacular.
Coloquei dentro do micro-ondas e liguei o timer. Em um copo botei o suco de uva, enquanto esperava
o tempo passar com paciência...

— No que ele pensou, quando me falou aquelas coisas... — falei para mim, no meu monólogo
existencial. — Ele não pode me fazer isso. Deus, quem ele pensa que é para abalar as minhas
estruturas?
O micro-ondas avisou que o tempo havia terminado e fui retirar o jantar de dentro.
— Eu pensei que você iria me escutar... — Das sombras dos quintos dos infernos surge
Vince, para perturbar a minha paz e o meu jantar. Por pouco não derrubei a lasanha no chão com o
susto.
— Você sempre aparece como satanás, para infernizar meu juízo? — Respirei fundo, botando
o recipiente em cima da bancada, tomando fôlego para poder encará-lo.

— Que eu saiba, é você quem faz isso. Aparece do nada no meu quarto... Faz a boa moça, eu
falo o que se passou no passado e foge logo em seguida. — Vince conseguia ser irônico e ao mesmo
tempo irritante. Um filho da puta presunçoso, mas gostoso.
— Eu escutei sim. Só disse não a tudo... — Olhei para ele, que estava parado na entrada da
cozinha, encostado na porta de braços cruzados. Ele não deveria estar ali. Deveria estar deitado,
repousando. O que Vince tinha passado não era grave, porém precisava de descanso. — O que você
está fazendo aqui?
— Preocupada? — Arqueou a sobrancelha para mim, me desafiando a entrar no jogo dele. Se
eu entrasse, não teria mais volta. No entanto, seria um jogo perigoso para nós dois.
— Eu já disse que é provável eu ter um casamento arranjado, Vince. Se isso for para manter a

minha família segura, não vou pensar duas vezes antes de escolher de que lado vou ficar...

— Não pediria para você escolher entre sua família e eu, Ana... — falou descruzando os
braços, vindo na minha direção. Eu não deveria ter deixado ele se aproximar, porém foi mais forte.

Suas mãos estavam segurando meus braços e ele olhando os meus olhos. Havia tanta
sinceridade neles que a vontade de chorar brotou dentro de mim, mas me segurei para isso não
acontecer.
— Se eu começar a amar você, como vou fazer para esquecer? Não quero passar pelo mesmo

que a minha mãe...


Era isso. O medo que tinha dentro de mim era de que acontecesse o mesmo comigo. Que a
história da minha mãe se repetisse e, no caso, fosse eu o centro de todas as desavenças apenas por
amar um homem e ter que fugir com uma filha, por medo de não poder viver um amor livremente. Eu
queria amar alguém de forma orgânica, natural. Nada de casamento arranjado...
Eu queria ser amada e amar de verdade.
— Você sabe o motivo da sua mãe não ter casado com o meu pai? — perguntou ainda olhando
para mim.
— Vince, isso me parece tão particular deles, que...

— Foi culpa minha.


Como assim culpa dele? Do que ele estava falando?
— Na primeira oportunidade, meu pai amou loucamente a sua mãe. Mas as coisas não iam
bem por causa do conselho da máfia. Inessa estava prometida a Enzo, mas amava outro homem.
— Então, como pode ser culpa sua? Tudo caminhava para que ela obedecesse às regras
impostas.
— Se ele não tivesse aceitado a ordem do conselho e se casado com a minha mãe... Eu não
teria nascido e nem atrapalhado o amor deles.
Que besteira ele estava falando?
— Que pensamento mais absurdo, Vince!

— Depois que a minha mãe faleceu, achei de verdade que eles finalmente ficariam juntos...

Mas Inessa não o quis.


— Talvez tenha sido por causa do acordo entre eles. — Tentei argumentar, tirando suas mãos

dos meus braços e as segurando. — Por isso você tinha aquele jeito sofrido quando nos encontramos
a primeira vez? Por achar que é sua culpa?
— Eu amo o meu pai, Ana. Mas acho que a vida dele já é ruim o suficiente. Me tornei alguém
de quem não me orgulho muito.

— Não diga isso... — Droga... Eu estava amolecendo.


— Sou uma versão dele, só que mais cruel.
— Cruel do tipo que mata gente e palita os dentes com os ossos? — Encolhi os ombros e dei
um sorriso sem graça para ele.
— Do tipo que nem os ossos sobram, Ana. Do tipo que, quando perco o controle, me torno
um monstro. Principalmente quando mexem com as pessoas que amo e os negócios da família.
Engoli no seco.
— Só queria ter você ao meu lado, me mostrando a luz no final do túnel...
— Vince, eu não... — Tentei me afastar dele, mas ele me puxou para ficar próxima ao seu

corpo.
— Temos poucos dias... Vamos aproveitar o tempo que ainda nos resta para ficarmos juntos...
— O calor do seu corpo dominava o meu.
— Vou ter que me preocupar com você e suas atividades extracurriculares, como aquela do
escritório? — Um sorriso largo foi aparecendo em sua boca perfeita.
Eu estava fodida duplamente.
— Enquanto não apareceu a certa, fui me divertindo com as erradas. — Tinha tanta
expectativa em seu olhar que me derreti por completo.
— Mesmo quando não é para ser um babaca, você consegue com frases do tipo...
Se eu o queria, não pensaria na merda que estava fazendo naquele momento. Se eu pensasse

demais, fugiria como fiz mais cedo.

— É um dom. — Ele falou divertindo-se.


— Essa foi a resposta mais ordinária que já escutei na minha vida... — Levei minha mão até

seu rosto e segurei-o.


— Prometo não fazer você escolher nada. Prometo ser somente seu, se assim quiser. Prometo
ser um bom homem, apenas para você. E se alguém se meter no que temos, que Deus tenha piedade
da alma desse pobre coitado... — Não esperei ele terminar de fazer as várias promessas, o puxei

para um beijo demorado, onde tudo pelo que eu estava passando se esvaiu.
Capítulo 10

Talvez, se eu abrisse meus olhos, tudo não passasse de um sonho maluco. Sorri, pensando no
que tinha acontecido entre nós dois. Parecia que o universo estava conspirando para que ficássemos

juntos, não sei... Enquanto pensava no acontecido, levei as pontas dos dedos até a minha boca,
lembrando do beijo que ele tinha me dado antes que eu entrasse no meu quarto. Não que eu não
desejasse fazer mais que isso, mas a coisa estava indo tão bem que ele acabou entendendo a situação,
mesmo que eu não tivesse falado uma palavra sequer. Claro que eu não era mais uma mocinha pura,
afinal, ele já tinha lambido e me chupado de forma única. Mas achei que deveríamos ir devagar
agora e aproveitar cada segundo juntos, e isso incluía nos conhecer um pouco melhor.
Quando finalmente tomei coragem para abrir os olhos, fitei por um longo tempo o teto com as
mãos cruzadas sobre a barriga. Estava me sentindo aquela adolescente de anos atrás, quando o vi
pela primeira vez... Quer dizer, a sensação era melhor. Não diria ser amor, mas era um sentimento

muito bom. E ao mesmo tempo que eu vivia aquele momento, a ideia de que a merda seria jogada no
ventilador em breve também pairava na minha mente.
— Nunca me arrisquei mesmo... — resmunguei para mim, sabendo que ninguém iria me
escutar. — Talvez ele tenha batido a cabeça... Ou caído de cabeça quando era pequeno — comecei a
rir do nada.
O pensamento de Vince ter caído de cabeça e por isso o motivo dele ser assim, tão diferente,
me fez rir. Mas logo uma dor tomou conta do meu peito. Saber que ele sofreu tanto, durante esse
tempo... A ideia da queda não ficou tão engraçada. Ele não era um homem ruim, como dizia. Dava
para ver que tinha amor ali, caso contrário, ele não teria esperado tanto tempo para se declarar. Os
acasos do destino estavam sempre dando aquela forcinha, nem que fosse pela dor.

— Você não vai tomar café? — perguntou uma voz macia e ao mesmo tempo imponente do

outro lado da porta.


O meu sorriso se ampliou mais do que o necessário, por já saber quem era. Me levantei

apressada para abrir a porta para ele entrar.


— Já são nove horas, Ana... — Me censurou em um tom gentil, entrando no quarto e fechando
a porta logo em seguida. — Você é tão linda, sabia? — Segurou a minha cintura com uma das mãos,
me puxando para ficar mais próxima a ele.

— Você não vai me beijar agora. Não escovei os dentes, pelo amor de Deus... — reclamei
colocando a mão na minha boca, dando um jeito de me afastar dele.
— Mas eu não ligo...
— Eca! — resmunguei, correndo para dentro do banheiro e já começando a escovar os
dentes.
— Eu ia falar que não me importo de dar um selinho... — falou chegando por trás e me
abraçando, beijando o meu pescoço.
O reflexo no espelho era de um casal que parecia ter anos de intimidade. Eu com o cabelo
todo bagunçado, de pijama, a boca cheia de espuma da pasta de dente e ele... Bom, ele estava

impecável, prestando mais atenção. O cabelo arrumado e ainda úmido do banho. Camisa preta
dobrada até os cotovelos com um colete cinza por cima e uma calça colada, marcando cada
centímetro das suas pernas bem definidas...
— Já tomou café? — perguntei depois de terminar de escovar os dentes.
— Não. Estava esperando ouvir você sair do quarto.
— Quem é você e o que fez com o Vince Castello que conheci? — O tom debochado da
minha pergunta o fez rir. E Deus, como aquele sorriso derreteu meu coração. O conjunto da obra era
até covardia de tão perfeito.
— Reencontrei a mulher certa para minha vida.
Poxa, não bastava ser lindo, sincero – até demais –, tinha que ser romântico também?

— Preciso tomar banho.

— Quer que eu ajude a passar o sabonete? — E lá estava aquele sorriso novamente, a


derreter o coração e aquecer a alma, mas com um toque extra de safadeza.

— Não quero que você passe apenas o sabonete pelo meu corpo. — Quando se entra em um
tipo de jogo deste nível, você apenas se joga no inferno e abraça o capeta.
— Não? — O timbre da sua voz mudou de macia a perigosamente sensual em segundos. —
Então o que mais?

— Quero suas mãos sobre a minha pele, massageando cada centímetro — falei, já me virando
para ficar de frente para ele.
— Estou vestido demais, não acha?
— Eu resolvo isso.
Olhando em seus olhos, desabotoei o colete e a camisa, jogando-os para longe, no canto do
banheiro. Quando fiz menção de levar as minhas mãos até o cinto, ele as segurou sobre o seu
abdômen. Sua pele era quente e ele tinha um cheiro tão bom. Me vi seguindo as linhas do contorno da
sua musculatura com as pontas dos dedos. A melhor parte foi ver ele arrepiar com o meu toque, a
ponto de fechar os olhos para absorver a sensação.

— Se continuar assim, comerei você em cima da pia... — disse quando voltou a olhar para
mim.
— Então me faça sua.
Sem cerimônia, tirei o meu pijama e o joguei perto das roupas dele, ficando apenas de
calcinha.
— Linda de todas as formas possíveis. Mas, quero mesmo tomar meu primeiro banho com
você e foder gostoso... — explicou tirando a minha calcinha e ele o resto da sua roupa, me levando
até o box.
Vince ligou o chuveiro, umedeceu a minha pele, pegou o sabonete e passou pelo meu corpo.
Quando eu já estava ensaboada o suficiente, me entregou o sabonete para que eu fizesse o mesmo

com ele. Virei Vince de costas para mim e comecei o trabalho árduo. Com as tatuagens mais vivas

com o contato da água sobre sua pele, desliguei o chuveiro e dei início ao tour, tomando cuidado com
os leves ferimentos, que ainda estavam cicatrizando. Quando as costas já estavam limpas o

suficiente, o virei de frente e a minha boca salivou com o que vi. Ele estava totalmente duro e com a
respiração um pouco acelerada.
Depois de passar sabonete pelos seus braços, peito e abdômen, tomei coragem para domar
umas das partes mais importantes do corpo dele: a jiboia. Não fosse enorme, mas era um tamanho

considerado um pouco acima da média e grosso o suficiente para me deixar feliz. Peguei com carinho
entre minhas mãos ensaboadas e alisei para cima e para baixo, fazendo ele respirar fundo.
— Ana... — Ele gemeu meu nome com tanta vontade e desejo, que tive de ligar o chuveiro
para tirar toda a espuma dos nossos corpos.
— Camisinha...? — perguntei apressada, terminando o banho.
— Bolso esquerdo da calça.
Não pensei duas vezes, já estava pegando a sua calça do chão e tateando o bolso para pegar o
segura-espermatozoide.
Vince pegou o envelope da minha mão e rasgou a lateral usando os dentes, segurou a ponta e

desenrolou sobre aquela oitava maravilha do mundo.


— Venha, pule. — Abriu os braços para mim. — Monte em mim. Vou comer você contra a
parede.
Respirei fundo e pulei em cima dele. Ele, como se estivesse segurando uma pena, agarrou por
trás dos meus joelhos, me prensou contra a parede, deu a primeira estocada e parou.
— Posso ser bruto ou posso ser carinhoso, mas nunca serei morno para você, Ana — falou ao
pé do meu ouvido, me deixando louca e arrepiada com o jeito que o tom da sua voz saiu.
E então deu início aos movimentos lentos. Vince entrava e saía de dentro de mim tão
lentamente, que eu estava prestes a explodir. Os beijos que ele me dava, em conjunto com a sua
performance, era diferente de tudo que eu já tivesse experimentado na vida.

— Vince... — Eu implorava por mais dele.

— Agora vou ser um pouco mais bruto... — Quando ele intensificou seus movimentos, dando
estocadas mais profundas, me senti contrair e o meu corpo responder ao chamado do orgasmo. —

Goza, Ana. Goza gemendo pelo meu nome...


— Droga, Vince... — Meu orgasmo tomou proporções jamais sentidas. — Fode minha
boceta...
Em seguida seus lábios estavam sobre os meus, abafando o seu gemido, enquanto eu tentava

recuperar o fôlego.
— Ainda não terminamos isso aqui... — Ele disse saindo de dentro de mim, me colocando de
pé.
— Não? — Agora foi a minha vez de sorrir com malícia para ele.
— Ainda nem comecei. Quero devorar cada pedaço do seu corpo — falou segurando minha
cabeça entre suas mãos, me beijando de leve na boca e se afastou um pouco para olhar nos meus
olhos.
— Pouco tempo? — Me referi ao período que passaríamos juntos.
— Insuficiente. Queria poder passar mais tempo ao seu lado... — Desviou o olhar ao falar

isso, já se afastando em direção ao quarto.


O clima não tinha esfriado, mas algo nele me deixou preocupada e precisava demonstrar que,
por mais que as coisas estivessem complicadas, estaria disposta a prosseguir o que tínhamos ali.
— Vamos fazer valer a pena cada segundo. — O assegurei disso, segurando em seu braço
para que ele parasse de andar e se virasse para me encarar novamente.
— Sim. Cada segundo, cada minuto...
Até o próximo livro.

You might also like