TEPEDINO SCHREIBER. O Extremo Da Vida - Eutanasia, Accanimento Terapeutico e Dignidade Humana

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O extremo da vida’ Eutandsia, accanimento terapeutico e dignidade humana GUSTAVO TEPEDINO E ANDERSON SCHREIBER 1, 0caso Eluana Englaro.e o problema da eutanésia. . Consentimento informado como expresso do direito de autodeterminacSo do paclente. Exegese do art. 15 do Cédigo Civil e hipéteses legals de tratemento compulsério. A suposta indisponibilidade do direito a vida examinada 3 luz da Constituigao. © direito & morte digna. 3. Imperativo constitucional de respeito a recusa do patiante a tratamento médico. Distandsia, ortotariésia e o chamado accanimento terapeutico. A Retolugdo CFM 1.805/2006 e 0 Projeto de Lei 3.002/2008. Testamento biolégico (living will) e os tacos de um formalismo exacerbado no campo existencial. 4. A situacao do paciente incapacitado. Procuragées de saéde (health care proxies). A tutela do melhor interesse do paciente. Sua dafinigho a luz da dignidade da pessoa humana, 1. © CASO ELUANA ENGLARO E © PROBLEMA DA EUTANASIA “Minha filha morreu hé 17 anos.” A declaracao do pai de Eluana Englaro, jovem italiana Que vivia em coma desde 1992, tornou-se manchete nos principais jornais do mundo. A (redativa interrupao do tratamento artificial que conservava suas fung6es vitais foi autori- tada, em definitivo, pela Corte di Cassaziorie em 13 de novembro de 2008, apés uma longa batatha travada entre’seu pai e as autoridades pablicas.? © caso reabriu, por toda parte, as teirradas discusses em torno do direito a uma morte digna. . A Constituicdo brasileira consagra, em seu art. 1°, inciso Il, a cldusula geral de protecso A dignidade da pessoa humana, como fundamento da Republica. O art. 5? do Texto Consti- tuelonal, por sua vez, reconhece, entre os direitos fundamentals, 0 drei & vida, Se é certo, ‘que a protecio a dignidade humana implica a tutela do direito a vida, como seu pressuposto. \epleo, a aparente sintonia se desfaz em situacbes dramticas como a de Eluana Englaro, em ue a preservacdo das fungtes vitais se afigura lesiva a dignidade do paciente. Surgem, af, 1 limiar entre direito e cultura, diversas questbes atinentes @ liberdade’ de escolha do 1‘ Relatorio brasileiro apresentado na Jornada 2009 da Association Henri Capitant des Amis de fa Culture daridique Francaise com 0 titulo Soins et respect de la volonté de la personne en fin de vie. 2 Sentenca n. 27145, de 13.11.2008, disponivel em www.cortedicassazione it. ‘eh RTDC + VOL. 39 + JULISET 2009 paciente ou de seus familiares pela interrup¢ao do tratamento, a resultar, em ditima andlise, ra extingao de uma vida humana No Brasil, debate parece se centrar, ainda, sobre posicoes absolutas, permeadas de argumentos morais e religiosos. Emprega-se, muitas vezes sem genulno interesse no apro- fundamento da questao, o termo genérico “eutanésia”, descuidando-se da multiplicidade de hipdteses que a expresso oculta, As discuss6es restringem-se, freqilentemente, a abor- dagens simplistas que pouca contribuicao trazem ao desenvolvimento de um consenso geral sobre a matéria, Pior: 8 falta de regulagao especitica, a andlise juridica tem se concentrado sobre normas de caréter deontol6gico, como dispositives do Cédigo de Etica Médica e resolugdes do Conselho Federal de Medicina. Os tribunais, por sua vez, mesmo quando chamados a decidir, tem se limitado a chancelar opiniGes médicas em relacao a decis6es cujo contetido se mostra menos técnico, que ético e juridico, Neste cendrio, urge abandonar preconceitos e examinar o tema em sua real complexi- dade, a ser entrentada a luz da Constituigéo da Republica, que traz pardmetros bastante clatos e seguros para a solugio de casos concretos semelhantes aos que tém angustiado a opiniao publica internacional. 2. CONSENTIMENTO INFORMADO COMO EXPRESSAO DO DIREITO DE AUTODETERMINAGAO DO PACIENTE. EXEGESE DO ART. 15 DO CODIGO CIVILE HIPOTESES LEGAIS DE TRATAMENTO COMPULSORIO. A SUPOSTA INDISPONIBILIDADE DO DIREITO A VIDA EXAMINADA A LUZ DA CONSTITUIGAO. © DIREITO A MORTE DIGNA Fruto da reado internacional aos experimentos humanos realizados por médicos nazis- tas, 0 Cédigo de Nuremberg, de 1947, tracou os principios éticos da pesquisa cientifica, declarando expressamente em seu art. 1° que “o consentimento voluntério do ser humano 6 absolutamente essencial”. 0 dispositive destaca, ainda, a necessidade de se fornecer as pessoas informac6es detalhadas acerca do procedimento cientifico, de modo a lhe assegurar “conhecimento suficiente do assunto em estudo para tomarem uma decisso”. © Cédigo de Nuremberg foi revisto, em 1964, na Finlandia, pela 18* Assembléia Médica Mundial, resul- tando na Declaracao de Helsinque, cujo item I-1 determinou expressamente: “Sendo possi- vel, e de acordo com a psicologia do paciente, o médico deve obter o livre consentimento do mesmo, depois de Ihe ter sido dada uma explicagéo completa, Em caso de incapacidade tegal, RTDC + VOL. 39 + JULISET 2009 © consentimento deve ser obtido do responsével legal; em caso de incapacidade fisica, a Autorizaco do responsével legal substitui a do paciente.” A Declaracéo de Helsingue foi objeto de indmeras revisbes que alteraram, significativamente, o texto original, embora preservando sempre a idéia central de protecSo & dignidade do paciente, com a obtencso do ‘$4u consentimento informado antes de qualquer intervenigao médica. Também a Declaragéo Universal sobre Bioéticae Direitos Humianos da UNESCO, de 2005, ressalta 3 necessidade de consentimento informado do paciente, estabelecendo em seu art. 6, item 1, que “qualquer intervencao médica preventiva, diagnéstica e terapéutica s6 deve ser realizada com 0 consentimento prévio, livre e esclarecido do individuo envolvido, baseado (em inforacéo adequada. O consentimento deve, quando apropriado, ser manifesto e poder ser retirado pelo individuo envolvido a qualquer momento e por qualquer razéo, sem acarretar desvantagem ou preconceito”. Na esteira da experiencia internacional, a doutrina brasileira tem dado énfase cada vez ‘maior 20 dever de informar, como condigéo para o livre exercicio do direito de autodetermi- ‘nacio do paciente, componente da sua dignidade humana, Afirma-se, nesta direcéo, que o Consentimento do paciente para com o tratamento médico “deve ser live, voluntatio, fruto txclusivo da vontade do paciente, no sentido da auséncia de qualquer tipo de coerséo fisica, Pslcol6gica, econdmica”.* Deve ele ter sido “suficientemente esclarecido sobre o tratamento 0 procedimentos que Ihes serao aplicados”.> Também a jurisprudéncia brasileira vern acolhendo tais nog6es, jé tendo o Superior Tribunal de Justica decidido que “a despreocupacéo do facultativo em obter do paciente seu Consentimento informado pode significar ~ nos casos mais graves ~ negligéncia no exercicio Profissional."© A auséncia de informacao tem conduzido, em diversos casos, ao reconheci- 3 Aatual redacéo da DeclaracSo de Helsinque pode ser acessada no site da Associagao Médica Mundial (WMA), mais especificamente em www.wma.netlelpolicy/pdt/t7c. pdf. 4 Helotsa Helena Barboze, A autonomia da vontade e a relagdo médico-paciente no Brasil, in Lex Medicinae - Revista Portuguesa de Direito da Satide, Coimbra, v. 1,n. 2, 2004, p. 11. 5 Lydia Neves Bastos Telles Nunes, O consentimento informado na relacéo médico-paciente: respeitando {8 dignidade da pessoa humana, in RTDC — Revista Trimestral de Direito Civil, vol. 28, jan /mar. 2007, pp. 102-103, 16 Superior Tribunal de Justica, Recurso Especial 436.827, 4* Turma, Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, Jhlp. 1.10.2002, Também os tribunais estaduais tém aplicado largamente o principio do consentimento informado. Confira-se, a titulo meramenteiustativo, o acérd8o do Tribunal de Justia do Distrito Federal, RTDC + VOL. 39 + JULISET 2009 mento do dever de indenizar por parte do médico, mesmo quando 05 efeitos lesivos resul- tantes do procedimento clinico escapam & sua esfera de responsabilidade.” A exigéncia de“consentimento informado, como expresso do direito de autodetermi- aco da pessoa humana, vem transformar a relacdo entre médico e paciente, substituindo: © paternalismo de outrora por uma participacao ativa do enfermo nas decisées terapéuticas, especialmente em setores em que a medicina nao oferece uma solucdo consagrada pela pratica médica, mas uma variedade ainda indefinida de tratamentos. 0 medicado deixa, assim, de ser mero paciente para se tornar agente do processo de cura, como expresso do seu diteito de autodeterminagéo no campo biol6gico. Neste contexto, o Cédigo Civil de 2002 veio declarar em seu art. 15: “Art, 15. Ninguém pode ser constrangido a submeter-se, com risco de vida, a trata- mento médico ou a intervencao cirdrgica.” Como jé destacado em outra sede, o dispositivo ha de ser interpretado em consonancia com os principios constitucionais: "nao s6 o constrangimento que induz alguém a se subme- ter a tratamento com risco deve ser vedado, como também a intervencdo médica imposta a paciente que, suficientemente informado, prefere a ela ndo se submeter, por motivos que nao sejam futeis e que se fundem na afirmacao de sua propria dignidade” ® E certo que o direito brasileiro reconhece, como também ocorre na experiéncia estran- geira, algumas hipdteses de tratamento médico que independem da vontade do paciente e ‘que Concluiu: “Diante da premissa atinente a0 consentimento informado, ao profissional médico, ‘especialista, incumbe 0 dever de informagio quanto @ cirurgia, o qual deve ser exaustivo em face da possiblidade de risco ou dano, bem como o assentimento do paciente” (Tribunal de Justica do Distrito Federal, Apelagdo Civel 1990710068930, 5* Turma, Rel Des, Dacio Vieira, julg. 1.3.2004), 7. “Indenizacéo. Danos materiais decorrentes de intervengdo Grirgica. Auséncia de demonstracéo de culpa do médico em relagéo as seqielas sofridas pelo paciente. Responsabilzacao, entretanto, pela falta de adequada cientiticagao do operado, quanto aos efetivos riscos do procedimento operaterio, Teoria do consentimento informado, Dever de indenizar. Sentenca de parcial procedéncia mantida. Recurso desprovido” (Tribunal de Justica de Sao Paulo, Apelacdo Cive! 2960124500, 1" Camara Civel, Rel. Des Santi Ribeiro, julg. 4,11.2008) 8 Gustavo Tepedino et alii, Cédigo Civil Interpretado Conforme a Constituigao da Republica, vol. Rio de Janeiro: Renovar, 2007, 2° ed., pp. 42-43, RTDC + VOL. 39+ JUL/SET 2009 ‘Que podem mesmo ser contrarias a sua manifesta intengdo. Consistem, todavia, emsituacdes absolutamente excepcionais, como a aplicacgo de medida de seguranca em sede criminal? 0U a internacao psiquiatrica por determinacéo do Poder Judiciario,"° situagées voltadas & Fecuperacao do proprio paciente e 8 protegio da coletividade. Doutrina e jurisprudéncia também suscitam a possibilidade de tratamentos compulsbrios diante de grave ameaca a0 interesse social, j4 tendo o ‘Supremo Tribunal Federal afirmado que “por vezes a incolumidade Corporal deve ceder espaco a um interesse preponderante, como no caso da vacinaco, em frome da satide piblica”."? Se 0 risco 6, todavia, exclusivamente individual, a vontade informada do paciente deve Ser respeitada, como imperativo de protecéo a sua autodeterminac3o e a dignidade humana, ‘Aqui, como em nenhum outro campo, o direito deve ser, nas palavras de Stefano Rodota, “sébrio, limitado e respeitador da autonomia pessoal”.'? impoe-se, como destaca também 9 Cédigo Penal, ats, 96-97: “Art, 96, As medidas de seguranca so: | - Interago em hospital de ustodia e tratamento psiquiatrico ou, a falta, em outro estabelecimento adequado; II - sujelggo a lratamento ambulatoral. Parégrafo Gnico, Extinta a punibilidade, nBo se impSe medida de seguranca nem subsiste a que tenha sido imposta. Art. 97. Se o agente for inimputével, 0 juiz determinaré sua \ntermacéo (art, 26). Se, todavia, o fato previsto como crime for punivel com detencSo, poders o juiz submett-io a tratamento ambulatorial.” 10 ALei 10.216, que dispoe sobre a protecso e 0s direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais (edireciona o modelo assistencial em sadide mental, determina em seu art. 6: "Ainternagéo psiquidtrca Somente serd realizada mediante laudo médico circunstanciado que caracterize 0s seus motivos. Paré~ {tafo Unico. S80 considerados os sequintes tipos de internagéo psiquitrica: I - intemnagdo voluntéria: ‘tquela que se d8 com 0 consentimento do usuario; I internagéo involuntéria: aquela que se dé sem o ‘onsentimento do usuério e a pedido de terceiro; e ill ~intenag3o compulséria: aquela determinada pela Justice.” 11 Supremo Tribunal Federal, Habeas Corpus 71373, Pleno, Rel. Min, Francisco Rezek, Rel. p/ Acérd30 Min. Marco Aurélo, ulg. 10.11.1994. & orientacéo ¢ idéntica no campo deontolégico, como se vé do Parecer n° 1345/2001 do Conselho Regional de Medicina do Parand: “€ preciso sempre lembrar que os Priulégios da democracia, incluindo os direitos indviduais, ndo podem ser usufruldos criando riscos a ‘utras pessoas. A imunizaco oferece protecéo contra vérias doencas nao apenas & pessoa imunizada, ‘as para as pessoas com as quais esta entra em contato.” 12 L’eppelio sospetto alla Legge, entrevista com Stefano Rodota, publicada no i! Manifesto, edicao de 33.12.2006, naesteira da comoséo criada pelo caso de Piergiorgio Welby, poeta, pintor e atvista italiano, ue, padecendo de distrofia muscular desde a adolescéncia, ficou, em 1997, impossiblitado de respirar ttm a ajuda de aparelhos. Welby iniciou, a partir de entéo, uma longa campanha pelo seu direito de ‘Morrer. Seu desejo foi finalmente realizado em 2006, mas @ lgreja Catélica, em deciséo bastante TOC + VOL. 39 + JUL/SET 2008 a doutrina brasileira, a “ndo-instrumentalizagio do ser humano, significando que este jamais poderd ser considerado objeto de intervengbes e experiéncias, mas seré sempre sujeito de seu destino e de suas proprias escolhas”.'? ‘Alig&o, que & majoritariamente acompanhada no campo do tratamento médico ordind- rio, ganha opositores acirradas nas situagdes em que a op¢So do paciente gera risca de vida Em tais hipéteses, um sem-ndmero de autores se ergue para declarar que “a indisponibilidade da vida n8o pode ser tolerada como um direito subjetivo, por ser a vida um bem indispont- vel”."4 Invoca-se, com ares de solucéo definitiva, o art. 66 do Cédigo de Etica Médica, segundo o qual “é vedado ao médico: utilizar, em qualquer caso, meios destinados a abreviar a vida do paciente, ainda que a pedido deste ou de seu responsavel legal”. Afirma-se, na esteira da norma deontolégica, que “em situagdes nao raras o principio da autonomnia do paciente pode-se converter num valor contra seus préprios interesses porque aquela mani- festagdo de vontade, antes de representar um bem, repercute como um prejulzo ou um indtil e desnecessério procedimento. Neste particular, a deciso do paciente é desmotivada de um bom resultado e a decisdo do médico em nao atender encontra fundamentos no raciocinio na experigncia profissional (/ex artis)”."® € compreensivel que, diante do contetido inevitavelmente aberto dos principios consti- tucionais, agarre-se o intérprete a regra mais especffca, ainda que de cardter meramente deontolégico. O resultado, todavia, ¢ a evidente inversdo da hierarquia entre as fontes normativas: lé-se a Constituicéo da Republica a luz do art. 66 do Cédigo de Etica Médica. A solugdo do dilema deve ser perquirida, muito ao contrério, no proprio texto constitucional, ‘onde a proteco a dignidade humana é indicada logo no art. 1° como fundamento da Repdblica, enquanto que o direito a vida, sem prejuizo de sua inegavel importancia, figura no art. 5°, entre tantos outros direitos a0s quais a comunidade juridica reconhece cardter telativo, como 0 direito a liberdade individual e o direito a propriedade privada.'® controversa, negou-the direto a um funeral religioso. Uma ceriménia civil foi, entdo, organizada em uma praca pablica de Roma, & qual compareceram centenas de pessoas. 13 Maria Celina Bodin de Moraes, 0 Principio da Dignidade Humana, in Principios. do Direito Civil CContemporéneo, Rio de Janeiro: Renover, 2006, p. 34 14 Maria Helena Diniz, O Estado Atual do Biodireito, S40 Paulo: Saraiva, 2008, p. 395. 15 Genival Veloso Franca, Comentérios ao Cédigo de Etica Médica, Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2006, p. 92. 16 Tal solugéo afigura-se conseqitncia do caréter unitério do ordenamentojuridico. Como jé se afimmou RTDC + VOL. 39 + JUL/SET 2009 Em outras palavras: se algo deve ser tido por indispontvel e absoluto no contexto onstitucional no é a vida (art. 5°), mas a dignidade da pessoa humana (art. 1°, Il). Mesmo lem ndo se reconhecendo, consoante o entendimento majoritério entre os constitucionalistas brasileiros, hierarquia normativa entre os dispositivos do Texto Maior, seguramente ostenta a dignidade humana, fundamento da Repdblica, superioridade axiologica frente a outros interesses reconhecidos pelo Constituinte como merecedores de tutela. € a dignidade huma- na, e nfo a vida, a diretriz suprema da legalidade constitucional Cumpre, assim, reconhecer que toda pessoa humana tem nao apenas um direito 8 vida, mas um direito & vida digna, o que abrange também, e sem qualquer contradicso, um direito a morte digna, entendida como o respeito as suas convicgées pessoais mesmo durante 0 processo de extingSo da sua personalidade. Com efeito, 0s principios juridicos que norteiam ‘ viver no podem ser afastados nos momentos finais daquela que é, ainda e talvez até mais intensamente, a existéncia da pessoa.'7 Neste sentido, o consentimento informado “de regra da vida esté se tornando também regra do morrer, assinalando a passagem do poder do terapeuta 4 responsabilidade do paciente”."® 0 reconhecimento de tutela a autodetermina- em outra sede: “No se pode atribuir ao legislador infraconstitucional, mesmo quando codificador, 2 tarefa de estabelecer o sentido e o alcance dos principios fundamentais do ordenamento, concretizan- do-os livvemente., segundo valoracbes setorais. Em outras palavras, as normas infraconstitucionais, pelo fato de conterem maior densidade analltica, no servem de decfradores ou tradutores dos valores constitucionais, Semelhante entendimento acabaria por subverter a ordem hierérquica do ordenamento, aplicando-se os prindpios fundamentais & luz de regras infraconstitucinais, a autorizar, por vezes, © empalidamento, sendo 0 aniquilamento, das prioridades axiologicas estabelecidas constitucionalmente. Cuida-se de aplicar cada norma infraconstitucional juntamente com os principios fundamentai, de tal rmaneira que estes definam o sentido daquela”. (Gustavo Tepedino, tinerério para um imprescindivel debate metodolégico, in Revista Trimestral de Direito Civil, n. 35, Rio de Janeiro: Padme, jul/set., 2008, pi. 17 “Assim, a dimens3o autondmica da dignidade humana deve estar presente nos momentos finais da vida, © que significa dizer que o paciente deve ser respeitado em suas opcbes terapéuticas conforme sua concepgéo do que & melhor para si" (Livia Haygert Pithan, A dignidade humana como fundamento juridico das ordens de néo-ressuscitagéo, Porto Alegre: EDIPUCRS, 2004, p. 78). 18 Aafirmagéo € de Stefano Rodota em outra entrevista para. ll Manifesto, publicada em 27 desetembro de 2006 sob o titulo La dignita della fine. No original: “La bussola che orienta il diritto @ quella, di un soggetto morale padrone della propria vita e dunque anche, per quanto @ possibile, della propria morte [Non siemo at‘anno zero. II consenso informato — previsto dalla Carta dei dirti del' Unione europea, dalla Convenzione sulla biomedicine, dal Codice di deontologia medica de! 1999 — da regola della vito RIDC + VOL. 39 + JULISET 2009 a0 da pessoa colhe também sua opgio por tratamentos menos invasivos, menos dolorosos ‘ou mesmo sua consciente decisdo de nao receber tratamento algun. 3, IMPERATIVO CONSTITUCIONAL DE RESPEITO A RECUSA DO PACIENTE A TRATAMENTO MEDICO. DISTANASIA, ORTOTANASIA E O CHAMADO, ACCANIMENTO TERAPEUTICO. A RESOLUGAO CEM 1.805/2000 £ © PROIETO DE LEI 3.002/2008, TESTAMENTO BIOLOGICO (LIVING WILL) E OS RISCOS DE FORMALISMO EXACERBADO NO CAMPO EXISTENCIAL Nao pode haver divida, diante do texto constitucional brasileiro, acerca da necessidade de se respeitar a recusa deliberada e consciente da pessoa humana a certo tratamento médico. A escolha pessoal do paciente ndo se sujeita a qualquer tipo de avaliacao do terapeuta ou da sociedade, que nao seja aquela que diz respeito 4 sua plena capacidade de decidir e a sua mais completa informacao acerca das opgdes possiveis e de suas conseqiién- Problema semelhante vive-se em So Paulo, onde a legislacao estadual permite ao paciente “recusar tratamentos dolorosos ou extraordinérios para tentar prolongar a vide” (Lei 10.241/1999), norma cuja validade também € controvertida & luz da competéncia privativa reservada pela Constituigéo 8 Unigo para legislar en matéria criminal 22 Ver, sobre o tema, Renato Lima Charnaux Sert8, A Distanésia ea Dignidade do Paciente, Rio de Janeiro: Renovar, 2008, especialmente pp. 32-33 23 Cédigo Penal: “Art. 121, Homicidio simples. Matar alguém: Pena ~ reclusao, de seis avinte anos. (..) Caso de diminuiggo de pena, § 1° Se o agente comete o crime impelido por motivo de relevante valor socal ou mora, ou sob o dominio de violenta emacéo, logo em seguida a injusta provacacéo da cu juiz pode reduzir a pena de um sexto a um tergo". Registre-se a existencia de projetos de lei no Congreso Nacional voltados tanto & express tpiicacao da eutanésia quanto a sva descriminalzacéo. 24 Em sentido semelhante, 0 Cédigo de ftica dos Hospitals Brasileiros dispbe em seu at. 8 in fine: "O direito do paciente & esperanca pela sua prOpria vida toma iicita — independente de eventuals sancoes legais aplicaveis ~ a interrupgao de terapias que a sustentem, Executam-se, apenas, 05 cas0s suportados or parecer médico, subscrito por comissBo especialmente designada para determinar a ieversibiidade do caso, em doengas terminals, com a aprovacéo, igualmente por escrito, do diretorclnico do hospital ou instituigso” 25 Tribunal Regional Federal-1* Regio, Processo 2007 34.00.014809-3, j. 23.10.2007, 5 RTDC + VOL. 39 + sutiser 2009 Com vistas & definicéo legislativa da controversia, encontra-se atualmente em tramitaggo no Congreso Nacional projeto de lei destinado a regulamentar a ortotandsia (também chamada eutanasia passiva), entendida como “suspenséo de procedimentos ou tratamentos fxtr2ordindrios, que tm por objetivo unicamente a manutencéo artificial da vida de paciente terminal, com enfermidade grave e incuravel (Projeto de Lei 3002/2008, art. 2°). O projeto trige “solcitagdo expressa e por escrito do doente ou seu representante legal” (art, 38) e estabelece um amplo sistema de controle da deciséo com base na atuacéo de junta médica ‘*specializada, do Ministerio Pablico e, eventualmente, do Poder Judiciério (art. 69.25 Embora adotando um conceito restrtivo de ortotandsia limitado & interrupc8o de “procedimentos Ou tratamentos extraordindrios” ”” a disciplina normativa diferenciada evitaré que se conti- ‘ue a inserir, equivocadamente, a ortotandsia no campo do ilcito. Aspecto no abordado no projeto e que tem sido de extrema valia na experiéncia estrangeira 6 0 chamado “testamento biol6gico” ou “testamento vital” (living will), instru- mento por meio do qual a pessoa manifestaria, antecipadamente, sua recusa a certos tratamentos, como propésito de escapar ao drama vivido por pacientes incapazes de exprimir 2 Sua vontade. O instituto € objeto de regulagéo espectfica em alguns palses, como nos Estados Unidos, onde o Estado de Ilinois editou em 1983 0 Living Will Act, ato normativo Que serviu de modelo para outros ordenamentos.2® No Brasil, mesmo a falta de qualquer autoriza¢éo legislativa, a doutrina mais atenta tem defendido o direito de “autodeterminagao do Paciente acerca de futuros tratamentos médi= 25 Outro aspecto de elevada importéncia prtica abordado pelo Projeto de Lei éo das consaqdéncias da Ortotandsa em relacio a seguros de vida e outros negdcios juridicas de cunho patrimonial: “Art. 9° A ‘alidade dos aos urdicos celebrados pelo paciente, tals como planos ou Seguros de sade, seguros de wide ou testamentos, no podera ser questionada em razso da deciséo pela ortotandsia," 27 O que promete ensejar divides, como ocorreem outros pases, acerca da possiblidade de interrupcso de simples alimentacéo e hidrataco por meio de sondas, 28 °0 living wil fo criado nos Estados Unidos da América do Norte. Em 1983, o estado de tlinois (EUA) Scitou 0 Living Will Act, que permit, 8s pessoas capazes, elaborar uma declaracBo com instrugbes 20 médica responsavel pela sua sadide e vida, se esta estver sendo mantida por aparelhos, nos casos de Goenca em fase terminal." Lycia Neves Bastos Teles Nunes, O consentimento informed na relaco imédico-paciente:respeitando a dignidade da pessoa humana, cit. pp. 108-109). Citese, ainda o Patient Sei Determination Act (PSDA), aprovado pelo Congresso do Estados Unidos em 1991, que objetva ‘e9ulr 0 direito dos pacientes de participarem de seu tratamento, inclusive mediante formulacdo de diretrizes antecipadas (advance directive), RTDC + VOL. 39 + JULISET 2009 cos a serem empregados ou no quando a doenca futura nao lhe permita discernir bastante para naquele momento tomar a decisdo a respeito deles.”2 No que tange a sua instrumen- talizacéo, alguns autores tém sustentado que & possivel adotar, em rela¢do ao testamento vital, “os requisitos exigidos para 0 testamento tradicional”. 0 entendimento nao parece, todavia, o mais adequado, devendo-se evitar, neste campo, “pracedimentos rigidas demais: © testamento biologico deve ser informal e revogével a qualquer momento. € justo, de outro lado, prever a possibilidade de desrespeitd-lo sempre que entre o momento de sua emissio 0 momento da deciséo final tenham surgido novidades terapéuticas relevantes."37 © reconhecimento do testamento biolégico néo pode, de fato, implicar qualquer limi- tago a manifestagso de vontade da pessoa humana, Nao se pode correr o risco de converter tal instrumento em uma condiggo indispensavel para a plena realizacéo da dignidade do Paciente. Mesmo sem um ato formal, & possivel reconstruir a inteng8o presumida do indivi- duo, & luz da sua personalidade, de modo a autorizar a interrupcdo de tratamentos artficais, que ele nao teria desejado. A experiéncia internacional demonstra que as situacdes mais. delicadas surgem exatamente naquelas hipSteses em que inexiste expressa manifestacdo do paciente, o que no pode, de modo algum, servir como obstéculo a tutela da sua dignidade. 4. A SITUAGAO DO PACIENTE INCAPACITADO. PROCURAGOES DE SAUDE (HEALTH CARE PROXIES). A TUTELA DO MELHOR INTERESSE DO PACIENTE. SUA DEFINIGAO A LUZ DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA Nancy Cruzan viveu sua vida normalmente até os 25 anos, quando, vitima de acidente automobilstico, foi ressuscitada por paramédicos, recuperando suas funcées vitais mas 20 preco de ingressar no que se denomina tecni Sua familia iniciou, entdo, longa cruzada para obter o direito de retirar 0 tubo que a alimentava, deixando-a morrer. A autoriza¢o judicial, sem a qual os médicos se recusavam mente de “estado vegetativo permanente”. 29 Rose Melo Vencelau Meireles, A autonomia privad nas situac6es juridicas subjetivas existenciais: uma andlise qualitativa em face das situaces patrimoniais,tese de doutorado defendida na Universidade do Estado do Rio de Janeiro, 2007, pp. 157-158, 30 Lydia Neves Bastos Telles Nunes, O Consentimento informado na relacéo médico-paciente: respeitan- do a dignidade da pessoa humana, cit, p. 109. 31 Stefano Rodota, La dignita della fine, ct. RIDE + vo 39 © JULISET 2009 @# tomar qualquer atitude, fol inicialmente negada pela Suprema Corte dos Estados Unidos 0 argumento de que nao havia provas suficientes de que teria sido sua intencao dar fim a0 ‘watamento.*? A batalha legal da familia Cruzan, que dividiu a opinido pliblica norte-ameri- ana, encerrou-se em 1990, quando 0 caso foi reapresentado a Corte do Missouri e, final- ‘mante, acolhido com base em novas provas de que Nancy manifestara, ao longo da vida, seu (etejo de nao ser mantida viva em estado vegetative, Em dezembro daquele ano, Nancy foi (enterrada no cemitério de Carterville, sua cidade-natal, sob uma lépide em que se lé: “Nascida (@m 20 de julho de 1957. Partiv em 11 de janeiro de 1983. Em paz em 26 de dezembro de 1990,"23 Ainexistencia de uma manifestacao prévia e formal do paciente acerca da deciséo a ser tomada 6 0 traco comum entre os casos de Nancy Cruzan e Eluana Englaro. A doutrina tem dacutido, também no Brasil, quem teria, nestas hipéteses, 0 poder de decidir acerca do astino do paciente, ou mesmo se alguém poderia fazé-lo. Afirma-se, neste sentido, que “se © doente ests impossibilitado de manifestar-se, a familia, em geral considerada guardia do entero, tem assumido tal responsabilidade”.4 Nio raro, todavia, ha divergéncia entre parentes, cOnjuges, companheiros, destacando ‘melhor doutrina que “mais do que as pessoas que sejam vinculadas pelo sangue ou pelo ‘Matrimonio a0 doente, aqueles que tenham vivenciado de fato a realidade do enfermo, Conhecam-no em profundidade, e ainda, mantenham com eles lacos afetivos verdadeiros, (@8tard0 mais habilitadas a vislumbrar a integridade do seu perfil, de modo a melhor interpre- tarem os seus designios mais verazes.*?® A imperativa preferencia pelo critério afetivo e Concreto, em desfavor de uma andlise biolégica e abstrata, no logra, todavia, afastar Preocupacées freqiientemente suscitadas em relacdo a interesses patrimoniais que pessoas 41 Pela primeira vez, contudo, a Corte Suprema reconhecia, pela maioria dos seus integrantes, um direito ‘onatituciona a interrupcao do tratamento que mantém tecnicamente vivas pessoas em estado vegeta- {Wo permanente (Supreme Court of the United States, 497 U.S. 261, decisio de 25.6.1990). 89 Confira-se, sobre a longa jornada da familia Cruzan, a materia de Andrew H. Malcolm inttulada Nency (Qutan: End to Long Goodbye, publicada em 29 de dezembro de 1990, e mantida ainda hoje no site do emal The New York Times. ‘M Heloisa Helena Barboza, Poder familiar em face des préticas médicas, in Revista do Advogado, n. 76, Innho de 2007, p. 40. 1 Renato Lima Charnaux Serta, A Distandsia e a Dignidade do Paciente, Rio de Janeiro: Renovar, 2005, oie. RTDC + VOL. 39 + JULISET 2009 préximas ao paciente podem, eventualmente, ostentar, influenciando a decisao final a ser adotada. ‘A fim de escapar a0 complexo embate, defende-se a possibilidade de que a propria pessoa indique, antecipadamente, um “procurador” para assuntos desta natureza, As cha- madas “procuracdes de saude” (health care proxies) s8o objeto de regulacao especifica nos Estados Unidos e na Inglaterra, entre outros paises. Como nas hipéteses tradicionals de representaco, o representante indicado voluntariamente é obrigado a atuar no interesse do paciente, respeitando critérios por ele previamente estabelecidos. As procuragées de satide atraem questdes semelhantes aquelas jé suscitadas em relacdo ao testamento biolégico, do qual podem ser parte integrante, Também aqui ha que se evitar, a todo custo, a analogia com a disciplina de instrumentos de cunho essencialmente patrimonial, como 0 contrato de mandato, cuja funcéo se distancia, imensamente, do escopo existencial das procuracdes de sade. A rigor, as atengées ndo devem se concentrar sobre quem tem o poder de decidir, mas sobre 0s critérios que devem ser seguidos na decisso. Como nas hipoteses legais de repre- sentacdo (menores, pessoas com desenvolvimento mental incompleto etc,), a atuagso do representante deve se pautar sempre pelo melhor interesse do representado. Em outras palavras: deve-se perquirir o melhor interesse do paciente, ndo de acordo com as convicgées pessoais de quem toma a deciséo em seu lugar, mas em consonancia com a personalidade do proprio incapacitado.*® $6 o respeito as suas concepcées de vida pode conduzir a uma deciséo que represente, genuinamente, a realizacao da sua dignidade humana Foi 0 que reconheceu, expressamente, o Poder Judicidrio italiano na corajosa decisao ‘emitida no caso Eluana Englaro. Apés analisar-se a situacdo da jovem a luz da sua propria concepcao de vida, decidiu-se pela possibilidade de interrup¢ao do tratamento “levando em consideragao seja a extraordinaria duragao do estado vegetative permanente (e, portanto, irreversivel) de Eluana, seje a igualmente extraordinaria tensdo do seu carater rumo a liber dade, bem como a impossit lidade de concliagao da sua concepcao sobre dignidade da vida com a perda total e irrecupersvel das proprias faculdades motoras e psiquicas ¢ com a sobrevivencia somente biol6gica do seu corpo em um estado de absoluta sujeicdo a vontade 136 Registre-se que, também no caso de menores, pessoas com desenvolvimento mental incompleto, brios habituais e outros sujeitos considerados legalmente incapazes, a atuacgo do representante pode fe deve atender & personalidade do representado, que, ndo obstante impedido de praticar atos da vide iil, possul convicgbes pessoais que n3o podem ser desconsideradas, RTDC + VOL. 39 + JULISET 2009 theta, todos fatores que aparecem, na espécie, como prevalentes sobre uma necessidade de tulela da vida biologica em si e por si considerada.”?” © paradigmatico julgado ressalta a importancia de se analisar 0 caso & luz da concepcao vida digna do paciente, inconcilidvel, naquele caso concreto, com a prolongada perma- rnéncia em estado meramente vegetativo. ‘Nao se trata de negar relevancia a outros interesses que circundam a decis4o, como os dnteresses de familiares, aplacados por continuado e desgastante sofrimento, ou os interesses a sociedade como um todo, afetada, embora de modo menos evidente, pelo custo social ‘que # manutencéo de pacientes em estado vegetativo provoca para o sistema piblico de sdude. Sob o prisma constitucional, contudo, a legitimidade da dramatica decisdo, em cada caso concreto, depende, exclusivamente, da concepcao de vida digna que o proprio paciente ‘Ostentava. E preciso “reconstruir através dos estilos de vida e da personalidade do paciente"3® te equela que seria a sua vontade. Somente assim é possivel tutelar a sua dignidade humana também naqueles instantes de extrema fragilidade, a serem vistos n8o como esgotamento, ‘negacdo ou antitese, mas como simples extremo da vida. GUSTAVO TEPEDINO Professor Titular de Direito Civil da Faculdade de Direito da Universidade do Estado do Rio de Janeiro — UERI. ANDERSON SCHREIBER Professor da PUC-Rio. Doutor em Direito Privado Comparado pela Universita degli studi del Molise Italia). Mestre em Direito Civil pela UERI. Procurador do Estado do Rio de Janeiro 37 Trecho do Acérdéo 27.145, de 13.11.2008, em que a Cassazione, acolhendo os fundamentos o Imbunal 2 quo, negou provimento ao recurso interposto pela Procura di Milano contra decis8o que f@utorizou a interrupsdo do tratamento de Eluana Englaro. M8 Aexpressio é, mais uma vez, de Stefano Rodota, A/centro la persona e/a sua idea di dignita, publicado 1.0 Manifesto em 17.10.2007.

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