Download as pdf
Download as pdf
You are on page 1of 9
Uae EDO ADOLESCENT GUILNERME FREIRE DE MELO BARROS Conforme leis 12.955/14, 12.962/14, 13.010/14 e 13.046/14 | | EDITORA jsPODIVM ie Das aes Mukono * Analise da Lei n° 12.594/2012 (Lei do Sinase) Capitulo | Licdes preliminares Sumario + 1. Introdugéo - 2. Protegdo integral e absoluta prioridade - 3. Criancas e adoles- centes $20 sujeitos de direito - 4. Conceito de crianga ¢ de adolescente - 5. Aplicaco do Estatuto a quem j4 completou a maioridade - 6. Interpretacéo do Estatuto - 7. Competéncia legislativa. 1. INTRODUCAO Na esteira do movimento constitucionalista moderno, denomina- do de pés-positivismo, o estudo sobre qualquer tema juridico deve ter inicio pela observacéo de seu regramento a partir da Consti- tuicéo da Repiiblica. Em relacao ao direito da crianga e do adoles- cente, nao é diferente. 0 artigo 227 da nossa Lei Maior estabelece como “dever da familia, da sociedade e do Estado assegurar 4 crianca, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito a vida, d satide, & alimentacdo, @ educacéo, ao lazer, 4 profissionalizacao, 4 cultura, 4 dignidade, ao respeito, a liberdade e 4 convivéncia familiar e comunitdria, além de colocd-los a salvo de toda forma de negiigéncia, discriminacao, exploracdo, violéncia, crueldade e opressao” Aexpressao-chave da previsao constitucional é a absoluta priori- dade que deve ser dada 4 crianca e ao adolescente - e também ao jovem. A Lei ne 8.069/90, conhecida como Estatuto da Crianca e do Adolescente, materializa 0 comando constitucional ao disciplinar largamente os direitos e deveres infanto-juvenis. 0 Estatuto substituiu 0 antigo Cédigo de Menores, Lei ne 6.697/79, cuja incidéncia era voltada precipuamente ao menor em situagdo de irregular. Criangas e adolescentes eram vistos como objeto de tutela @ luz daquele regramento. “Durante todo este periodo a cultura da 2 Gonaeeme Fee of Meto Baszos internacdo, para carentes ou delinquentes foi a t6nica. A segregacao era vista, na maioria dos casos, como a unica solucdo”.* Antes mesmo da promulgacéo da Constituicgéo cidada e da promulgacao da Lei ne 8.069/90, j se falava na comunidade interna- cional sobre a necessidade de prote¢ao especial ao ser humano nas primeiras etapas de sua vida, infancia e juventude. € o que indica Munir Cury: Ainspiracdo de reconhecer protecdo especial para a crianca eo adolescente nao é nova. J4 a Declaracdo de Genebra de 1924 determinava “a necessidade de proporcionar a crianca uma protecao especial"; da mesma forma que a Declaracgao Universal dos Direitos Humanos das Nacdes Unidas (Paris, 1948) apelava ao “direito a cuidados e assisténcia especiais”; na mesma orientacdo, a Convencio Americana sobre os Direitos Humanos (Pacto de Sao José, 1969) alinhavava, em seu art. 19: “Toda crianca tem direito as medidas de protecao que na condu¢ao de menor requer, por parte da familia, da sociedade e do Estado”? Percebe-se que o Cédigo de Menores de ha muito ja estava em dissonancia com a compreensdo juridica e social sobre a forma de tratamento da peculiar situacdo de criancas e adolescentes. A Consti- tuigdo da Repiblica claramente trilha novo rumo ao mencionar que a infancia e a juventude tém de ser tratadas com absoluta prioridade. A mudanca de paradigma da nova Constituicdo j4 importava, por si s6, a impossibilidade de se recepcionar boa parte das regras do Cédigo de Menores. Nesse contexto moderno, foi necessario editar novo diploma legal no plano infraconstitucional, o Estatuto da Crianca e do Adolescente. Com visio mais humana, a Lei ne 8.069/90 estabe- lece ja em seu artigo 1°: “Esta Lei dispde sobre a protecdo integral a crianga e ao adolescente”. 1. AMIN, Andréa Rodrigues. In: MACIEL, Katia Regina Ferreira Lobo Andrade. (coord.) Curso de direito da crianga e do adolescente: aspectos tedricos e praticos. 4+ ed, rev. e atual. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010, p. 7. 2. CURY, Munir (coord.). Estatuto da crianca ¢ do adolescente comentado: comenta- rios juridicos e sociais. 10* edi¢ao. Sao Paulo: Malheiros, 2010, p. 18. 4 LUcbes preunanancs Assim, sempre com base forte nos principios constitucionais, 0 Estatuto da Crianca e do Adolescente é o principal diploma legal no que se refere a tutela dos direitos infanto-juvenis. Criancas e adoles- cente hoje sao sujeitos de direito. Sobre a nomeacao da Lei ne 8.069/90 como Estatuto da Crianca e do Adolescente, Andrea Rodrigues Amin explica: 0 termo “estatuto” foi de todo proprio, porque traduz o conjunto de direitos fundamentais indispensaveis a forma- cao integral de criancas e adolescentes, mas longe esta de ser apenas uma lei que se limita a enunciar regras de direito material. Trata-se de um verdadeiro microssistema que cuida de todo o arcabouco necessario para se efetivar o ditame constitucional de ampla tutela do piblico infanto-juveril. £ norma especial com extenso campo de abrangéncia, enume- rando regras processuais, instituindo tipos penais, estabele- cendo normas de direito administrativo, principios de inter- pretacao, politica legislativa, em suma, todo o instrumental necessario e indispensdvel para efetivar a norma constitu- cional.s 2. PROTECAO INTEGRAL E ABSOLUTA PRIORIDADE © Estatuto da Crianca e do Adolescente é formado por um conjunto de principios e regras que regem diversos aspectos da vida, desde o nascimento até a maioridade. Toda sua sistematica se ampara no principio da protecdo integral (art. 1°). A Lei tem o objetivo de tutelar a crianca e o adolescente de forma ampla, nao se limitando apenas a tratar de medidas repres- sivas contra seus atos infracionais. Pelo contrario, o Estatuto dispde sobre direitos infanto-juvenis, formas de auxiliar sua familia, ti cacao de crimes praticados contra criangas e adolescentes, infra- G6es administrativas, tutela coletiva etc. Enfim, por protecdo integral deve-se compreender 0 conjunto amplo de mecanismos juridicos voltados a tutela da crianga e do adolescente. 3. AMIN, Andrea Rodrigues. In: MACIEL, Katia Regina Ferreira Lobo Andrade. op. cit., p.9. 35 Guunerwe Feeine o€ Meto Banzos Por isso, o Estatuto deve ser interpretado e aplicado com os olhos voltados para os fins sociais a que se dirige, com observancia de que criancas e adolescente sao pessoas em desenvolvimento, a quem deve ser dado tratamento especial (art. 6°). A doutrina da protecao integral guarda ligacao com o principio do melhor interesse da crianca e do adolescente. Esse postulado traduz a ideia de que, na analise do caso concreto, os aplicadores do direito - advogado, defensor piblico, promotor de justica e juiz - devem buscar a solucao que proporcione o maior beneficio possivel para a crianca ou adolescente. No estudo da colocacao em familia substituta, o principio do melhor interesse se faz presente de forma marcante. Leet conj mos ee 4 tutela da crianca € do adolescente 0 caput do artigo 4° do Estatuto é cépia da primeira parte do artigo 227 da Constituicdo da Reptiblica, em sua redacao original, antes das alteracées implementadas pela EC no 65/2010. Tanto 1a, como aqui, sao enumerados alguns dos direitos que cabem a crian- cas e adolescentes, de modo meramente exemplificativo. A expres- sdo-chave desse dispositivo é a absoluta prioridade. Trata-se de dever que recai sobre a familia e o Poder Publico de priorizar o atendimento dos direitos de criancas e adolescentes, Inclusive, o paragrafo unico do artigo 4° destrincha o conceito de prioridade no ambito do Estatuto. De acordo com esse dispositivo, a garantia de prioridade compreende: @ primazia de receber socorro; Gi) precedéncia de atendimento nos servicos piiblicos ou de relevancia publica; (ii) preferéncia na formulacao e execucao de politicas piblicas; e (iv)destinacao privilegiada de recursos publicos. Estatuto da Crianca DCs e do Adolescente € protecao integral | 26 Licoes maeunamanes » Como esse assunto foi cobrado em concurso? (Magistratura-AC - 2022 - Cespe) No que tange aos principios gerais orientadores do ECA, assinale a opcao correta. a) 0 principio da prioridade absoluta nao pode ser interpretado de forma isolada, devendo ser interpretado de forma integrada aos demais sistemas de defesa da sociedade. Dessa forma, a decisao do adminis- trador pblico entre a construcdo de uma creche e a de um abrigo para idosos, ambos necessdrios, deverd recair sobre a segunda, dada a prevaléncia da lei mais recente, no caso, 0 Estatuto do Idoso. b) Buscando efetivar o principio da prioridade absoluta, o legislador incluiu no ECA um rol taxativo de preceitos a serem seguidos. Gabarito: os itens esto errados. » QUESTAO DISCURSIVA (MP-PR - 2008) (maximo de 25 linhas). Discorra sobre a doutrina da protecao integral. Fundamentos para resposta: as ligdes trazidas ao longo deste item dao bom suporte ao candidato para elaboracdo da resposta. (MP-PR - 2008) (maximo de 25 linhas). Discorra sobre 0 principio da prioridade absoluta a favor da infancia e juventude. Fundamentos para resposta: as ligdes trazidas ao longo deste item dao bom suporte ao candidato para elaboracdo da resposta. 3. CRIANCAS E ADOLESCENTES SAO SUJEITOS DE DIREITO 0 artigo 5° do Estatuto estabelece que: “Nenhuma crianca ou adoles- cente serd objeto de qualquer forma de negligéncia, discriminagdo, explo- racio, violéncia, crueldade e opressdo, punido na forma da lei qualquer atentado, por acdo ou omissdo, aos seus direitos fundamentais.” 0 dispositivo guarda relacdo com a parte final do artigo 227 da Constituicdo da Republica. Tais comportamentos proibidos nao se referem apenas aos pais, mas a quaisquer pessoas que tenham contato com a crianca ou o adolescente. A conduta negligente, por exemplo, pode ser praticada por um guardiao ou alguém que tenha a crianca ou adolescente sob seus cuidados em determinada situacdo. A discriminacao pode ter por alvo motivos de cor, religido, origem 7 Guneeme Freie pt Meio Barros etc. 0 artigo 5° busca enumerar de forma ampla qualquer conduta que possa violar os direitos da crianca e do adolescente, sendo certo que o Estatuto prevé sancdes de natureza civil (ex: suspensao € perda do poder familiar), penal e administrativa - 0 Titulo VII, do Livro Il dispde sobre crimes e infracdes administrativas relacionadas a criancas e adolescentes. O Cédigo de Menores tratava criancas e adolescentes como objeto de protecdo. A doutrina moderna da outra conotacao para a questao e passa a se referir 4 crianca e ao adolescente como sujei- tos de direito. 0 objetivo é realmente deixar claro que ha direitos a respeitar e que toda a sociedade - pais, responsaveis e Poder Ptiblico - deve zelar por eles. CS ask Rik eased Tutelava apenas o menor em situagao irregular Da ampla protecao a crianga € ao adoles- cente © menor era visto como objeto de tutela Crianga e adolescente so sujeitos de direitos 4. CONCEITO DE CRIANCA E DE ADOLESCENTE 0 Estatuto estabelece no art. 2° uma importante divisdo concei- tual, com implicacdes praticas relevantes. Considera-se crianga a pessoa com até 12 (doze) anos incompletos, ou seja, aquele que ainda nao completou seus doze anos. Por sua vez, adolescente é aquele que conta 12 (doze) anos completos e 18 anos incompletos. Ao completar 18 anos, a pessoa deixa de ser considerada adoles- cente e alcanca a maioridade civil (art. 5° do Codigo Civil). 0 crité- tio adotado pelo legislador € puramente cronolégico, sem adentrar em distingdes biolégicas ou psicolégicas acerca do atingimento da puberdade ou do amadurecimento da pessoa. A distingao entre crianca e adolescente tem importancia, por exemplo, no que tange as medidas aplicaveis 4 pratica de ato infra- cional. A crianca somente pode ser aplicada medida de protecao (art. 105), endo medida socioeducativa - estas aplicaveis aos adolescentes. iz Nomen turis De oa 12 anos incompletos Crianga De 12 completas e 18 anos incompletos Adolescente A partir de 18 anos completos Maior 8B Lice preuimnanes 5. APLICAGAO DO ESTATUTO A QUEM JA COMPLETOU A MAIORIDADE Dispde o paragrafo tinico do art. 2° que o Estatuto é aplicavel excepcionalmente as pessoas entre 18 e 21 anos de idade. Isso se verifica tanto no campo infracional, quanto na area civel. Na apuracdo de ato infracional, por exemplo, ainda que o adolescente tenha alcancado a maioridade, o processo judicial se desenvolve no ambito da Justica da Infancia e Juventude. vale dizer, aquele que j4 completou 18 anos ainda esta sujeito 4 imposicao de medidas socioeducativas e de protecao. A aplicagao do Estatuto somente cessa quando o jovem completa 21 anos (art. 121, § 5°). No Ambito civel, verifica-se que a adocao pode ser pleiteada no 4mbito da Justica da Infancia e Juventude, mesmo que o adotando ja tenha completado 18 anos, nos casos em que ja se encontre sob a guarda ou a tutela dos adotantes (art. 40). Portanto, deve ficar claro que o Estatuto fixa os conceitos de criancga e adolescente e tem por objetivo tutela-los, mas é possivel sua aplicacdo em situagdes nas quais o adolescente ja tenha atingido a maioridade civil. 0 paragrafo nico do artigo 2° continua, pois, em vigor. 6. INTERPRETAGAO DO ESTATUTO 0 artigo 6° estabelece que: “Na interpretacdo desta Lei levar- -se-Gio em conta os fins sociais a que ela se dirige, as exigéncias do bem comum, os direitos € deveres individuais e coletivos, e a condicgao peculiar da crianca e do adolescente como pessoas em desenvolvimen- to.” A previsao de que a interpretacdo do Estatuto deve levar em conta os fins sociais esta em perfeita harmonia com o artigo 59 da Lei de Introducdo ao Codigo Civil. Luis Roberto Barros explica: “As normas devem ser aplicadas atendendo, fundamentalmente, ao seu espirito e 4 sua finalidade. Chama-se teleoldgico o método interpretativo que procura revelar o fim da norma, o valor ou bem juridico visado pelo ordenamento com a edicdo de dado preceito.”* 4. BARROSO, Lufs Roberto. Interpretacao € aplicacao da Constituicao. sao Paulo: Saraiva, 2003, p. 138. 29 Guuneeme Freie of Meio Baasos De fato, o aplicador do direito deve sempre se pautar pelo objetivo maior de tutela da norma juridica. No caso do Estatuto da Crianga e do Adolescente, por dbvio, quer-se tutelar os direitos infanto-juvenis, de modo que o juiz, o promotor de justica, o defen- sor ptiblico, o advogado etc., enfim, todos devem extrair da norma o maior contetido protetivo possivel para a crianca e o adolescente. A parte final do dispositivo traz uma expressdo-chave que € a de que a criancga ou 0 adolescente é pessoa em desenvolvimen- to, 0 que significa dizer que a aplicacao de seu contetido deve ser diferente daquela ordinaria prevista para adultos. € que a infancia e a adolescéncia sao os periodos de maiores transformacdes do ser humano, é 0 momento em que se forma seu carater, se da a educa- ao basica, a alfabetizacdo; é o periodo em que a satide é mais fragil (notadamente a da crianca). € dizer, esse periodo inicial da vida é 0 que permitira a formacao de um adulto saudavel, educado e ético, a permitir a estruturacdo de uma sociedade mais justa e humana. —m suma, a diretriz a ser seguida na interpretacao do Estatuto deve levar em conta os fins sociais ligados 4 protecao integral de criancas e adolescentes, que sao seres humanos com caracteristicas especiais, sdo pessoas em desenvolvimento. 7. COMPETENCIA LEGISLATIVA —m relacado a protecdo a infancia e juventude, a competéncia legislativa é concorrente e recai sobre a Unido, os Estados e 0 Distri- to Federal, conforme determina o art. 24, inciso XV, da Constituicao da Republica. » Como esse assunto foi cobrado em concurso? (Magistratura-AC ~ 2022 ~ Cespe) No que tange aos principios gerais orientadores do ECA, assinale a opcao correta. d) De acordo como principio da centralizacdo, inovacio promovida pelo ECA, a Unido tem competéncia para criar normas gerais e especificas de atendimento a criancas e adolescentes para sanar omissao dos governos estaduais e municipais. Cabarito: 0 item estd errado. 30

You might also like