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DEBATES - F E MI NIS MO e ANALISE DO COMPORTAMENTO 2 Organizadoras Renata Pinheiro i; Tahcita Mizael © institutop ar Scanned with CamScanner Debates sobre o Feminismo e Anilise do Comportamento 2 © 2023 Bditora Paradigma Dados Internacionais de Catalogagdo na Publicagio (CIP) ira do Livro, SP, Brasil) Debates sobre feminismo ¢ anélise do comportamento : 2/ organizagio Renata Pinheiro, Tahcita Mizael. Sao Paulo, SP : Instituto Par Ciencias e Tecnologia do Comportamento, 2023. Varios autores. Bibliografia. ISBN 978-65-992016-8-4 1, Comportamento (Psicologia) 2, Feminismo - Aspectos sociais 3, Mulheres - Aspectos sociolégicos 4, Mulheres - Comportamento I. Pinheiro, Renata. TL Mizael, Tahcita. 23-158575 CDD-155.333 Indices para catalogo sistematico: 1. Mulheres : Comportamento : Psicologia aplicada 155.333 Tabata Alves da Silva - Bibliotecaria - CRB-8/9253 Coordenagao Editorial: Roberta Kovac Editor: Editora Paradigma - Instituto PAR Educacio Preparacao e revisio: Joana Figueiredo Capa, projeto grifico e diagramacio: Mila Santoro Este livro segue as regras da Nova Ortografia da Lingua Portuguesa Todos os direitos desta edigdo reservados. Instituto Par Ciéncias e Tecnologia do Comportamento Rua Bartira, 1294 - Perdizes, Sao Paulo - SP, 05009-000 Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida por qualquer forma ou quaisquer mcios eletronico ou mecdnico, incluindo fotocépias e gravagdo) ou arquivada em qualquer sistema ou banco de dados sem permissio escrita Impresso no Brasil 1impressio Julho? 2023 Scanned with CamScanner 01 02 03 04 05 06 07 Sumirio Autoras e Autores Preficio Por uma feminizagio da Anilise do Comportamento Carolina Laurenti papel das mulheres na produsio de conhecimento em anilise do comportamento Francisca Naiara de Aratijo Pereira & Natalia Santos Marques Anélise do comportamento e feminismo em revistas norte-americanas influentes: Revisio de publicagdes no periodo de 1970-2022 Fernanda S. Oda Viés de sexo na andlise experimental do comportamento: Uma revisio sistemética Daianny Silva Fernandes, Sofia Azevédo de Araijo, Francisco Edimar Nascimento Jiinior & Daniely Ildegardes Brito Tatmatsu O contracontrole politico feminista como enfrentamento a nocio individualista de resistencia Denisse Brust Lopez, Jordana Fontana & Carolina Laurenti Subjetividade negra e genero: Um olhar pela anilise do comportamento Lanussy Lira & Elisa Sanabio-Heck Questoes de género no atendimento de mulheres autistas adultas de 11 de suporte ‘Tahcita Medrado Mizael & Mariana Ribeiro de Castro 07 13 37 31 95 121 137 157 Scanned with CamScanner 08 09 10 _, Dislogos entre o modelo social da deficiéncia e os principios da Ang do Comportamento com enfoque no desbalango de poder e seus ie tos sobre mulheres com deficiéncia bs Laureane Marilia de Lima Costa & Lais de Godoy Nicolodi Estupro marital e coergio: Um estudo introdutério Patricia Albuquerque de H. L. Martins & Daniely Brito Tatmatsu 1 Por que mulheres permanecem em relacionamentos abusivost Um levantamento de literatura analitico-comportamental m Marcia Kellen Tavares Gomes & Natdlia Santos Marques Scanned with CamScanner Autoras e Autores Carolina Laurenti Possui gradugio em Psicologia (Bacharelado, Licenciatura Plena e Formagio de Psicélogo) pela Universidade Estadual de Londrina (2002) e mestrado (2004) e doutorado em Filosofia pela Universidade Federal de Sao Carlos (2009). Foi professora adjunta no Departamento de Fundamentos da Educacio de 2011 a 2012, na area de Metodologia e Técnicas de Pesquisa Atualmente, é professora adjunta do Departamento de Psicologia na Universidade Estadual de Maringé na érea de Fundamentos da Psicologia e est credenciada no Programa de Pés- Graduagao em Anilise do Comportamento da Universidade Estadual de Londrina. ‘Tem experiéncia na area de Psicologia, com énfase em Histéria e Epistemologia da Psicologia, e Pesquisa conceitual em Comportamentalismo Radical. Atua principalmente nos seguintes temas de pesquisa: epistemologia da psicologia comportamentalista (pragmatismo; determi- rnismo; indeterminismo; liberdade); interpretagao relacional de fendmenos sociais contem- porineos (género, dominagio masculina); interface entre anélise do comportamento e outras ciéncias, e com o feminismo. Daianny Silva Fernandes Psicéloga graduada pela Universidade Federal do Ceara (UFC). Daniely Ildegardes Brito Tatmatsu Possui graduacdo (Licenciatura e Formagio) em Psicologia pela Universidade Federal do Ceara (1999), mestrado em Ciéncias da Satide pela Universidade Federal do Maranhao (2004) e doutorado em Psicologia pela Universidade Federal de S40 Carlos (2016). Atualmente é Professora Adjunta da Universidade Federal do Cears. Tem experiéncia na drea de Psicologia, com énfase em Anélise do Comportamento, atuando principalmente nos seguintes temas: uso de drogas e habilidades sociais. Denisse Brust Lépez Possui graduaco em Psicologia pela Universidade Estadual de Maringé (2017). Atualmente 6 discente no programa de mestrado em Anilise do Comportamento da Universidade Estadual de Londrina (UEL). Scanned with CamScanner Francisca Naiara de Araijo Pereira Psicéloga graduada pela Universidade Federal do Ceara (UFC). Francisco Edimar Nascimento Jinior Possui graduagio em Psicologia pela Universidade Federal do Cearé (UFC). Tem expe- rigncia na area de Psicologia, com énfase em Psicologia Experimental e Psicologia Social. Atualmente, participa como pesquisador colaborador do Laboratério de Andlise Experimental do Comportamento do Ceara (LACCE). Trabalha principalmente com os seguintes ternas: Anilise do Comportamento; preconceito racial; questées raciais; fatores psicossociais relati- vos 20 comportamento criminal; resolucao de problemas. Jordana Fontana Possui graduacao em Psicologia pela Universidade Paranaense (UNIPAR), atualmentte cur- sa Mestrado em Anilise do Comportamento na Universidade Estadual de Londrina (UEL). Lais de Godoy Nicolodi Mestranda no programa no departamento de Psicologia Experimental no Instituto de Psicologia na Universidade de Séo Paulo, com énfase na area de Anilise do Comportamento ‘equesties sobre o Feminismo. Inicio em 2017 com previsio de conclusdo em 2019. Psicdloga sgraduada com Bacharelado pelo Instituto de Psicologia da Universidade de S40 Paulo no final de 2016, Ex-estigiaria no Escritério USP Mulheres vinculado a ONU Mulheres - Programa HeforShe durante 2016. Membra do Coletivo Feminista Marias e Amélias de Mulheres ‘Analistas do Comportamento. Iniciagio cientifica sendo bolsista em projeto PIBIC sobre “Consumo de Agua em Sistemas Fechados realizados com sujeitos experimentais” -na area de Economia Comportamental de agosto de 2013 até agosto de 2014 no Laboratorio de Andlise ‘BioComportamental da USP. Laureane Marilia de Lima Costa Psicéloga,especialsta em Psicoterapia Analitico-Comportamental pelo Instituto Goiano de ‘Anélise do Comportamento (IGAC), mestra em Educacio pelo Programa de Pés-Graduacao ‘em Educagio da Universidade Federal de Jatai (PPGE/UF)), integrante do grupo de estudos do Niicleo de Estudos sobre Deficiéncia da Universidade Federal de Santa Catarina (NED/ UFSC) e do grupo de estudos do Laboratério de Educacio Inclusiva da Universidade do Estado de Santa Catarina (LEdI/UDESC), pesquisa a interlocugio dos campos da Educagao Sexual Emancipatéria e dos Estudos Feministas da Deficiéncia. Atua principalmente em: psicoterapia analitico-comportamental para adultos/as; supervisio clinica; orientagao para pais € responsiveis; projetos de prevengio 0 sexismo, ao heterossexismo, a0 capacitismo € prevengio de violencia sexual para escolas com Ensino Fundamental II e Ensino Médio; 8 AUTORES Scanned with CamScanner consultoria em satide e educagao sexual; formagao de profissionais da Satide e da Educacio para uma atuagio anticapacitista. Marcia Kellen Tavares Gomes Psicéloga (CRP 11/13454) graduada pela Universidade Federal do Cearé, atualmen- te cursando Pés-Graduagio em Psicopedagogia Institucional e Clinica pela FAVENI. Na Universidade, foi membro do Centro Académico, extensionista do Laboratério de Anilise do Comportamento (LANAC), bolsista do Projeto ACearacast - Um podcast cearense so- bre Anélise do Comportamento, monitora no Programa de Iniciagao a Docéncia no setor de Psicologia do Desenvolvimento. Estagiou em Psicologia Clinica no Servigo de Psicologia Aplicada da UFC e em Psicologia escolar na Escola José da Matta e Silva, com énfase em Educagao Inclusiva e Anélise do Comportamento, Tem experiéncia na area de Psicologia Social como técnica no CREAS do municipio de Ibiapina, Estuda temas relacionados a educa- 0, desenvolvimento humano, direitos humanos, violéncia doméstica, abuso sexual, dentre outros. Atualmente atua na Psicologia Clinica como terapeuta e na Psicologia Juridica como Assistente Técnico e é palestrante com temas relacionados 4 Violéncia, principalmente a pre- vengio de Abuso Sexual na Infancia. Natilia Santos Marques Doutora em Psicologia Experimental pela Universidade de Sao Paulo - USP. Mestre em ‘Teoria e Pesquisa do Comportamento pela Universidade Federal do Para - UFPA. Graduada em Psicologia pela Universidade Federal do Ceara - UFC. Atualmente, é professora de Anilise do Comportamento da Universidade Federal do Ceara (campus de Sobral-CE) e professora do mestrado em Psicologia e Politicas Publicas da mesma universidade. Atua principalmente nos seguintes temas: behaviorismo radical, andlise experimental do comportamento; andlise comportamental da cultura; comportamento socials cooperacio; supersti¢ao; comportamen- to supersticioso. Patricia Albuquerque de H. L. Martins Psic6loga graduada pela Universidade Federal do Ceara (UFC). Sofia Azevédo de Araiijo Bacharel em Psicologia pela Universidade Federal do Ceara (2019). Mestranda em Psicologia Experimental pelo Instituto de Psicologia da Universidade de Sio Paulo. Membro no Laboratério de Analise Biocomportamental (LABC/USP) e do Nuicleo de Divulgagao Cientifica do Programa de Psicologia Experimental (USP). DEBATES SOBRE FEMINISMO E ANALISE DO COMPORTAMENTO VOLUME 2 9 Scanned with CamScanner Renata da Conceigdo da Silva Pinheiro Graduada em Psicologia pela Universidade Federal do Maranhdo (2013) e mestra em Psicologia (Teoria e Pesquisa do Comportamento) pela Universidade Federal do Par (2016). Doutora em Psicologia Clinica pela Universidade de Sio Paulo (USP), com Doutorado Sanduiche no Exterior pela Universitat Autonoma de Barcelona (Espanha). Tihcita Medrado Mizael Psicdloga, Mestra e Doutora em Psicologia pela Universidade Federal de S40 Carlos. Especialista em Género e Sexualidade pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UER)). ‘Atualmente & pesquisadora de pés-doutorado na Universidade de Sao Paulo (USP). Possui experiéncia na érea de Psicologia, com énfase em Psicologia Experimental e Psicologia Social. Trabalha principalmente com os seguintes temas: preconceito racial, questoes raciais, equiva léncia de estimulos, género e sexualidade, Teoria das Molduras Relacionais (RFT), autismo, AUTORES Scanned with CamScanner Prefacio Em 2017, comegamos a conversar sobre a ideia de organizar um livro que agregasse as discussdes sobre feminismo e anilise do comportamento que viamos anualmente no con- sgresso da Associagao Brasileira de Medicina e Psicologia Comportamental. Dois anos depois, © primeiro volume do livro Debates sobre feminismo e andlise do comportamento foi lancado. As diversas mensagens que recebemios até hoje sobre como 0 livro ajudou diversas alunas e fato de ele ter se esgotado sao indicios de que essa publicacao foi bem-sucedida. Como é bom saber que um anseio de duas sonhadoras se tornaria algo concreto e frutifero! Agora, seis anos depois da nossa primeira conversa em 2017, com uma pandemia no meio que desestabilizou nossos planos e tornou todo 0 processo de organizagao do livro mais difi- cil de ser conciliado com a vida, o trabalho e outras demandas, estamos muito felizes de ver um segundo volume sendo langado. Nesse percurso, conseguimos experimentar algo sobre © qual falamos constantemente: como é importante mulheres servirem de apoio para outras mulheres. Pudemos contar uma com a outra para alternar esse processo de encabecamento da organizagao deste livro, mas também com as autoras, com as amigas e principalmente com as leitoras, que, por meio de conversas, mensagens, e-mails, redes sociais ou das rodas de con- versa, instigaram e compartilharam percepGdes e experiéncias das tematicas aqui discutidas. Voces serviram de motivadoras para continuarmos nesta empreitada. Obrigada por isso! Neste volume, tentamos dar um pequeno passo nao apenas para discutir assuntos relacio- nados as questdes de género e feminismos com a anilise do comportamento, mas também para incluir trabalhos de autoras que nao estéo no nosso circulo mais intimo de contatos. Abrimos uma chamada para selecionar dois capitulos, incluindo entre os critérios de selecio, pontuagao diferencial a depender da regio do pais de onde as autoras eram filiadas, uma ten- tativa de aumentar a probabilidade de recebermos textos de fora da regiio Sudeste. No final, trés capitulos foram selecionados, dois com autoras do Ceara e um com autoras do Parana. Este segundo volume conta com dez capitulos. Neste volume, os assuntos passam por temas como a necessidade de valorizarmos o fe- minino, a importancia das mulheres para a andlise do comportamento como area de estudo € pesquisa, uma revisio sobre anélise do comportamento e feminismo em revistas norte-a- mericanas influentes, discussdes sobre o uso de machos e fémeas nas pesquisas experimen- tais da area, a proposigao de um contracontrole politico feminista, estupro marital, fatores relacionados & permanéncia de mulheres em relacionamentos abusivos, subjetividade negra n Scanned with CamScanner ¢ questdes de género, compatibilidades entre 0 modelo social da deficiéncia ¢ a andlise do comportamento e questes de géneroenvolvidas no atendimento de mulheres autistas adultas com nivel 1 de suport. Esperamos que a leitura este livro seja nao somente prazerosa, mas, especialmente, que instgue cada uma de vocés a pensar em novas perguntas de pesquisa, novos insights e melho- rias da produgio que ja existe nessa intersecgao entre a andlise do comportamento e a area de géneroe feminismos. Com carinho. Renata e Téhcita 2 PREEKCIO Scanned with CamScanner O papel das mulheres na produgao de conhecimento em andlise do comportamento 0 2 Francisca Naiara de Araijo Pereira Natélia Santos Marques Segundo Skinner (1953), a ciéncia é, antes de tudo, o comportamento do cientista. Partindo de tal concepgao, entende-se que a compreensio da producio cientifica requer nao apenas considerar o tipo de contetido que tem sido produzido, mas também que variveis tém defini- do quem est conseguindo produzir nos contextos em que se encontram. Dentre as varidveis que mais fortemente determinam os processos ¢ produtos culturais (dos quais a producao de conhecimento cientifico) na sociedade moderna, aponta-se as hie- rarquias sociais de raga, género ¢ classe social (Davis, 2016). Especificamente em relagio as questdes de género envolvidas na producao cientifica brasileira, diversas discusses tém sido realizadas a esse respeito nos iiltimos anos, envolvendo temas como: que tipo de contetido as mulheres esto produzindo (p. ex., Camargo, 2011; Santos, 2016); areas de conhecimento em que hd uma maior/menor producéo das mulheres (p. ex., Bandeira, 2008; Furlin, 2015); ¢ quais variveis determinam o processo de produgao de conhecimento de cientistas mulheres (psex., Ceci & Williams, 2011; Santos, 2016). Segundo Ceci e Williams (2011), a compreensao da sub-representagao de mulheres nas ncias exatas, tecnologias, engenharias e profiss6es vinculadas a matemética requer o foco nos determinantes atuais, mais do que nos determinantes histéricos desse fendmeno, Com base em uma revisio de 20 anos de dados publicados sobre tal sub-representagao, os autores concluiram que as mulheres tendem a ocupar cargos que oferecem menos recursos, mas isso nio se deve a questdes como discriminagGes de género em processos seletivos, na concessio de financiamentos ou em processos de publicagées (tépicos comuns ao falar-se sobre género e desigualdade), e sim a fatores relacionados & formacio da familia e criacio dos filhos, ex- pectativas de género, escolhas de estilo de vida e preferéncias de carreira. Tais escolhas podem ser feitas livremente, mas hd uma grande parcela de restrigio vinda da sociedade, colocando a mulher em um lugar de cuidadora, ou retirando do homem a responsabilidade de criagao dos filhos, deixando para as mulheres esse papel. Para os autores, intervir nessa sub-representacao requer ages no ambito da educagio (informagies sobre carreiras e modelos de comporta- mento que influenciem as escolhas femininas) e em mudangas politicas que podem tornar as instituigées sensiveis as questées de género. Embora apontem para a relevante tarefa de identificar determinantes atuais das diferen- gas de género no mundo das ciéncias, Ceci e Williams (2011) dao pouca atengio ao fato de que, em sociedades sexistas e patriarcais, o género ¢ fator estruturante dos processos de 7 Scanned with CamScanner socializagio, produzindo diferentes scripts e expectativas sobre 0 que é ser uma pessoa, em fungio do sexo (Zanello, 2018). A discussio de fatores como a formagio da familia, a criacao dos filhos, as expectativas de género, as violéncias sofridas e as escolhas de estilo de vida preferéncias de carreira de modo descontextualizado dos determinantes histéricos que pro- duziram tais fatores - como a exploragio do potencial sexual e reprodutivo de corpos femini- nos, a divisao sexual do trabalho (Lerner, 2019) e os dispositivos amoroso ¢ materno (Zanello, 2018) ~ consiste em uma pritica verbal que naturaliza diferengas de poder socialmente con- solidadas. A esse tipo de estrutura de poder politico disfargado de sistema de diferenga na- tural, Dimen (1997) nomeou de “patriarcado”, Aos fatores culturais que fortalecem praticas patriarcais, configurando, mantendo e reafirmando caminhos privilegiados de subjetivag3o cnologias de género” em fungao do género, Lauretis (1984) deu o nome de “ Em atengio aos determinantes histéricos da insergio feminina em determinadas ciéncias ¢ profissdes, Perkoski (2019) discutiu a participagio de mulheres na computacao, Conforme revisado pela autora, entre o fim do século XIX até meados dos anos 1980, a participagao fe- rminina nas éreas das ciéncias naturais e tecnoldgicas era frequente ¢ em grande escala, tendo diminuido a partir da criagdo dos computadores pessoais, cujas propagandas ¢ estratégias de vvendas foram voltadas ao piblico masculino. De acordo com a autora, os efeitos da midia, com as promissoras perspectivas de careiras em teenologias, produziram diferengas na ex- Pposicio a tecnologia em fungio do género. Seja enfatizando determinantes atuais ou histéricos, as discussdes empreendidas por Ceci ¢ Williams (2011) e Perkoski (2019) destacam o papel de fatores ambientais, como modelos de comportamento e produtos midiéticos e seus efeitos na insergao de mulheres nas dife- rentes éreas acaclémicas/cientificas. Tratam, portanto, do papel das tecnologias de género na escolha profissional de mulheres. Outro aspecto relevante a essa discusséo sio as préticas de silenciamento e invisibilizacso 4 quais as mulheres estdo sujeitas na nossa cultura. Segundo Da Silva (2015), 0 silenciamento pode ser entendido como uma forma de negligtncia na qual os discursos sio construidos de modo que a participacio do outro seja totalmente ausente, indireta ou desconsiderada. processo de invisibilizacio, por sua vez, inclu priticas de negligéncia mais genéricas, tais ‘como: tratar 0 outro como inconveniente ou socialmente indesejado, ignori-lo, desconsiderar suas contribuigdes. Com base nas concepgées de Da Silva (2015), Silva e Arantes (2019) discutiram praiticas de silenciamento ¢ invisibilizagio de mulheres no campo cientifico, tais como: a frequente auséncia de espagos em eventos cientificos para amamentagao ou para permanéncia de crian- «2s pequenas; regras no explictas acerca do menor potencial de produtividade académica cde mulheres, em fungio de possivel gravidea; a associagéo automitica que leitores(as) fazem entre referéncias apresentadas em textos académicos e o género masculino, mesmo em areas predominantemente femininas; ea recorréncia de mansplaining (tipo de violéncia psicoldgices 8 captTuLo2 Scanned with CamScanner que consiste em falas didditicas direcionadas a mulheres por parte ile homens, como se elas nao tivessem a capacidade de compreender ou executar determinada tarefa, mesmo que seja um tema de sua competéncia) em contextos académicos; e (Silva & Arantes, 2019). As discussées sobre silenciamento e invisibilizagio na ciéncia destacam que apenas a maior insergio de mulheres na cigncia nao resolve o problema da sub-representacao, visto que existem diversos mecanismos que dificultam seu reconhecimento como cientistas e profissionais durante seus percursos académicos. Santos (2016) discutiu fatores que dificultam a inserao de mulheres na produgio de co- nhecimento cientifico e tecnolégico em universidades piblicas federais da regiio Nordeste do Brasil, Participaram da pesquisa oito professoras e pesquisadoras da Universidade Federal do Ceara- (UFC) e da Universidade Federal de Pernambuco- (UFPE), vinculadas aos se- guintes departamentos: Ciéncias Sociais, Fisica e Engenharia de Pesca (n=3); Antropologia e Museologia (n=2); Ciéncia Politica (n=1); e Servigo Social (n=2). As participantes da pesquisa foram entrevistadas e biografadas quanto aos impedimentos para a vida profissional, além de questdes acerca do ambiente e priticas profissionais. Dentre os temas mais citados pelas parti- cipantes, destacam-se: tempo dividido entre familia e trabalho; ser mulher e produtiva; acesso desigual aos recursos que sao direcionados as pesquisas; segregacao sexual territorial ¢ hie- rarquica; diferengas de fazeres entre “humanidades” e “exatas”. Os resultados de Santos (2016) apontam para a preocupante relacao entre menor tempo para as ciéncias e menor acesso de mulheres a recursos da politica de fomento a pesquisa. Adicionalmente, 0 estudo destaca a presenga de barreiras relacionadas a territ6rio e hierarquia, ainda dentro dos departamentos de “humanidades’, mais equilibrados quanto ao género. As pesquisas de Ceci e Williams (2011) e Santos (2016) nos mostram que as diferencas entre as carreiras de mulheres e homens também acontecem em outros paises. Portanto, é uma cultura que extrapola o Brasil e que se estende por anos. Um dos principais pontos em comum entre os artigos foi a responsabilidade que recai sobre a mulher como cuidadora da familia, interferindo tanto na escolha profissional (optar por areas que demandam menos tempo) quanto na prépria vida profissional (conseguir produzir menos). Na anélise do comportamento (AC) brasileira, é reconhecida uma marcante contribuigéo feminina quando se fala dos primeiros anos de sua consolidagao no pais, representada pelos trabalhos de Carolina Bori. Todorov ¢ Hanna (2010) lembram que Carolina Bori comandou diretamente o primeiro centro de AC, na Universidade de Brasilia (UnB), € 0 maior centro de formagao em AC, na Universidade de Sao Paulo (USP). Ainda, entre 1970 até os anos 1990, Carolina Bori influenciou direta ou indiretamente a consolidagao de centros universitarios que ajudaram a consolidar a AC no Brasil, como 0s cursos da Pontificia Universidade Catélica de Sao Paulo (PUC-SP), da Universidade Federal de Sio Carlos (UFSCar), da Universidade Federal do Para (UFPA), da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e da Universidade Estadual de Londrina (UEL). DEBATES SOBRE FEMINISMO E ANALISE DO COMPORTAMENTO. VOLUME 2 39 Scanned with CamScanner Segundo Todorov ¢ Hanna (2010), a contribuigao de mulheres na AC seguiu, além dos tra itros académicos, com a criagio de revistas cientificas na area, balhos em universidades e c¢ como a Revista Brasileira de Terapia Comportamental e Cognitiva, criada por Rachel Kerbauy, em 1999, ea Acta Comportamentalia, periddico internacional do qual Maria Amélia Matos foi «primeira editora de lingua portuguesa, ‘Todavia, apesar da marcante contribuigio feminina em sua consolidacao nacional, apenas recentemente a AC brasileira vem produzindo mais discusses acerca desse tema (Couto & Dittrich, 2017; Couto, 2017; Gallo et al; Rosendo & Nogueira, 2020), de modo que é possivel supor que processos de silenciamento e invisibilizagao em relacdo a mulheres e temas de seu interesse direto estejam ocorrendo também nesse campo, como discutido por Silva e Arantes (2019). Considerando-se a relevincia da visibilizagao do papel das mulheres na produgo de co- nhecimento cientifico, o estudo apresentado neste capitulo analisou a produgao cientifica na- cional em AC elaborada por mulheres no decorrer de um periodo de dez anos. Entende-se que analises como as conduzidas aqui podem evidenciar possiveis desigualdades e, com isso, Nor tear estratégias de promogao de igualdade de género no ambito da ciéncia do comportamento. Método Este estudo consiste em uma anilise bibliométrica das publicagdes cientificas elaboradas por mulheres no campo da AC no decorrer de dez anos: entre janeiro de 2010 e dezembro de 2019. Tal andlise foi realizada através do levantamento de artigos em revistas cientificas brasileiras de AC e classficadas nas duas principais categorias do sistema Qualis da Capes (A eB), Foram elas: Revista Brasileira de Terapia Comportamental e Cognitiva (RBTCC); Revista Perspectivas em Andlise do Comportamento; e Revista Brasileira de Andlise do Comportamento (REBAC). Adicionalmente, foram analisadas as publicagdes da colecio Comportamento em ‘foco, em virtude de essa publicagao reunir textos provenientes de apresentagdes cientificas realizadas no maior evento cientifico brasileiro de AC, o Encontro Brasileiro de Psicologia e Medicina Comportamental, realizado anualmente pela Associagao Brasileira de Psicologia e Medicina Comportamental (ABPMC). Para a anilise dos dados foi quantificado quantos textos foram publicados nesse periodo, nas fontes de dados mencionadas. Posteriormente, foram identificadas quais dessas publica- ‘Goes incluiam mulheres entre seus autores. Com base nisso, esses artigos foram distribuidos em diferentes categorias de anélise, de modo a evidenciar como as mulheres tém participado da producao de conhecimento analitico-comportamental no Brasil. As categorias de andlise utilizadas para a sistematizagao dos dados levantados foram: a) artigos que incluem mulheres como autores; b) artigos em que mulheres figuram como primeiras autoras; c) artigos em que niimero de autoras mulheres é igual ou superior ao niimero de autores homens; e d) tipo de estudo que inclui autoras mulheres (tedrico/conceitual; experimental/empirico; ou aplicado). 0 caPtTuLo2 Scanned with CamScanner A categorizacio dos textos em relagio a participacao de autoras mulheres foi realizada com base nos nomes dos autores, Para estudos nos quais nao foi possivel identificar o genero do(a) autor(a) a partir da leitura dos seus nomes (nomes neutros), foi consultada a apresentagao do(a) pesquisador(a) no resumo de seu curriculo lattes. Portanto, faz-se necessario destacar que a classificagao de género utilizada se pautou na atribuigdo cultural de género dada aos nomes dos autores e autoras das publicagdes, nio sendo avaliada a possibilidade de uso de nome social Resultados e discussao A Tabela 1 apresenta o total de textos publicados entre janeiro de 2010 e dezembro de 2019 em cada uma das fontes consultadas e quantas dessas publicagdes incluem mulheres como autores. Conforme pode ser observado na Tabela 1, de um total de 739 textos analisados, 587 (79,43%) incluiram mulheres entre os autores e 427 (57,78%) tiveram mulheres como primei- ras autoras, indicando forte participacao feminina na composigao e lideranga da producio de conhecimento em AC, TABELA 1 Total de textos analisados ¢ total de textos que incluem autoras mulheres, por fonte consultada, ‘Total de textos Mulheres como Fontes consultadas Incluem mulheres publicados primeiras autoras Perspectivas em AC 136 92 (67,64%) 65 (47,79%) REBAC 156 96 (61,53%) 58 (37,17%) RBICC 225 190 (84,44%) 150 (66,665) Comportamento em Foco 222 191 (86,03%) 154 (69,36) Geral 739 569 (76,99%) 427 (57,78%) Na Figura 1, é possivel observar a variagdo, a0 longo dos anos, do total de textos publicados nas fontes consultadas, a variagdo do total de textos que incluem mulheres na autoria ¢ 0 total em que mulheres figuram como primeiras autoras. Nota-se que a participagao de mulheres nessas produgées foi bastante consistente ao longo dos anos, com excegao de 2017, em que houve um total de 105 textos publicados, dos quais apenas 70 possuiam mulheres como auto- ras, Desses 70 textos, incluindo mulheres, 48 tinham mulheres como primeiras autoras. DEBATES SOBRE FEMINISMO E ANALISE DOCOMPORTAMENTO VOLUME 2 4 Scanned with CamScanner FIGURA I articipagao de mulheres e ordem de autoria ao longo dos anos + Total ———— Incluem mulheres 1 autoras Total de textos, 20 o4- r r r 2010 2011-2012, 2013-2014. 2015-2016 201720182019 Ano de publicagao A Figura 2 apresenta um painel contendo o ntimero de produgoes que incluiram mulheres ¢ produgies de mulheres como primeiras autoras, assim como 0 total de produgdes de cada fonte consultada, ao longo dos anos. Até 0 momento da realizagao da pesquisa (marco de 2020), a revista REBAC havia publicado somente um volume em 2019, contendo um total de cinco artigos, o que explica a queda abrupta no grifico, em 2019. A colecao de livro eletrinico Comportamento em foco, por sua vez, nao foi publicada em 2011, 2015 e 2016. Porém, em termos gerais, a quantidade total de publicagdes se equiparou 4s demais fontes analisadas. A Figura 2 permite identificar que a colegio Comportamento em foco apresentow a maior € mais consistente participagao de mulheres em suas produgées, proporcionalmente ao nii- mero de textos publicados. £ importante levar em consideracio a natureza dos tipos de pu- blicagdes desse recorte. Os capitulos so resultados de apresentacdes realizadas no Encontrc Brasileiro de Psicologia e Medicina Comportamental (ABPMC). Isso pode ser evidenciade pela proximidade das linhas do grafico a0 longo dos anos analisados, indicando que quas: todos os textos publicados por ano incluiam_ mulheres e em muitos deles elas figuravam com» primeiras autoras, Embora nao seja possivel confirmar isso com os dados analisados, ess resultado pode indicar maior participaao de mulheres que de homens nas apresentagoes d palestras, mesas-redondas, simpésios, sess6es coordenadas, minicursos e primeiros pass nos Encontros Brasileiros de Psicologia ¢ Medicina Comportamental. 2 CAPITULO 2 Scanned with CamScanner No entanto, como pode ser observado na Figura 2, a REBAC apresentou os piores indices de participagao feminina, de tal modo que em 2013, quando a revista publicow 15 artigos, 0 niimero de publicagdes com autoras mulheres caiu para zero. Ainda, em 2017, de um total de 22 publicagdes, apenas seis incluiram mulheres e dessas somente em duas as mulheres sio primeiras autoras. Curiosamente, as publicagdes da REBAC de 2013 consistiram em dois niimeros de uma edigao especial intitulada “O que é comportamento?’. A editora convidada sobre os autores: para organizagao desses volumes apresenta em seu texto uma explica Dada a sua importincia, considerei que esses debates deveriam ser trazidos a pablico, possibilitando que muitos pudessem se beneficiar das anilises que estavam sendo fei tas. Nesse contexto, propus 4 REBAC a publicacdo de um volume especial totalmente voltado ao tema, ficando encarregada de, na condigao de Editora Convidada, coordenar a sua execugio. Para isso, propus a cinco analistas do comportamento que vinham se dedicando ao refinamento do conceito ~ Kester Carrara, Silvio Botomé, Filipe Lazzeri, Francois Tonneau e Joo Cliudio Todorov - que respondessem d questio “O que écom- 1013, p. 2) portamento?”: (Hunziker, FIGURA 2 Participagao de mulheres e ordem de autoria ao longo dos anos, por fonte consultada Perspectiva em Anélise do Comportamento =] seeeees Total 20 —— Inclucm mulheres é —— Mautoras & Es) 3 Zo ee sl 54 | 0+ : - 2010 2011 2012. 2013. 2014 20152016 2017 2018 2019 ‘Ano de publicacio DEBATES SOBRE FEMINISMO E ANALISE DO COMPORTAMENTO VOLUME? 43 Scanned with CamScanner Continaagio da Figura 2 ‘Total de textos ‘Total de textos Total de textos Revista Brasileira de Anilise de Comportamento - REBAC ++ Total —— Incluem mutheres —— rantoras 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018 2019 Ano de publicagio Total 1 ——— Incluem mutheres ——= 1 autoras o+ —+——+ 2010 2011 | 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018 2019 Ano de publicagao, Comportamento em foco @ seeeeseee Total iI ——— ncluem matheres ——— Mantras 40 304 no| | 10 | a e+ -—_, 2010 201) 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018 2019 Ano de publicagio CAPITULO 2 Scanned with CamScanner Na Figura 3, é possivel avaliar a participagio de mulheres nas produgies consultadas le- vando-se em consideracao a quantidade de autores por texto publicado e quantos desses tex- tos possuiam um numero total de autoras mulheres igual ou superior ao total de autores homens. De modo geral, pode-se afirmar que tem havido expressiva participaao de mulheres nas fontes consultadas, com excegio da REBAC, que teve maior ou igual participacao femini- na em apenas 54 de 156 textos publicados (34,61%). Esse resultado se deve especialmente aos anos de 2013 ¢ 2017, quando houve menor participago feminina nas publicacdes da revista, Confrontando os dados apresentados na Figura 3 com os previamente discutidos, pode- -se constatar que de um total de 739 artigos analisados, 458 sio compostos de textos com uma quantidade de autoras mulheres igual ou superior & quantidade de autores homens. Comparando-se com os dados previamente apresentados, pode-se constatar que das 569 pu- blicagdes que incluem mulheres, 111 (19,50%) si compostas em sua maioria de homens, Ainda, do total de 739, apenas 170 (15,02%) envolvem apenas homens, enquanto um total de 248 (33,55%) foram de autoria exclusivamente feminina. Esse dado indica maior articu- lacdo das mulheres na produgio de conhecimento em AC. Todavia, embora as anilises aqui empreendidas nao permitam afirmar esse dado, faz-se relevante refletir se tal articulagao nao consistiria em uma estratégia de contracontrole frente a priticas de silenciamento e invisibili- zagio nas academias. Para avaliar tal hipétese, contudo, outras pesquisas seriam necessarias. Ainda, observa-se que, para quase todas as fontes, o ntimero de textos com quantidade de autoras mulheres igual ou maior a quantidade de autores homens correspondeu a mais de 50% do total de publicagdes. A excecdo ¢ a REBAC, cuja porcentagem de textos com nimero de autoras igual ou superior ao mimero de autores corresponde a apenas 34,6% (54) do total. Das 156 publicacées da revista nesse intervalo de tempo, 60 tiveram somente homens como autores, 0 que significa que em quase 40% das publicacées da revista, ao longo desses dez ‘anos, as mulheres nao participaram. Quanto ao tipo de estudos em que mulheres aparecem como primeiras autoras (tedrico; experimental; aplicado; ou ainda teérico/experimental; te6rico/aplicado ou experimental/ aplicado), os dados apresentados na Figura 4 indicam que, do total, 35% (148) sao de cardter te6rico, 23% (97) de cardter experimental, 18% (76) sio estudos tedrico/aplicados, um total de 10% (44) sao clasificados de tedrico/experimental, 8% (35) de carter tedrico/aplicados €, por fim, os 5% (23) restantes sio artigos voltados para aplicagao. Esses resultados indicam maior participagao feminina como primeiras autoras em trabalhos tedricos e menor parti- cipacdo em estudos aplicados. Todavia, faz-se relevante estudos que comparem esses dados com as tendéncias nacionais gerais, nas produces cientificas em AC. DEBATES SOBRE FEMINISMO E ANALISE DO COMPORTAMENTO — VOLUME2 45 Scanned with CamScanner FIGURA 3 Perspectivas em AC 76 (55,88%) REBAC g 54 (34,61%) 3 2 RBTCC 4 160 (71,11%) ‘Comp. em Foco +} aan 168 75,678) 0 2 FIGURA4 Tipo de estudos em que mulheres aparecem como primeira autoras Exp/Aplic ‘Te6r/Aplic. a ‘Teor /Exp, i% Aplin 46 capiruLoa _P Scanned with CamScanner Um estudo feito com base no material publicado em algumas revistas internacionais mostrou que os padrées de publicacdes diferem dos dados apresentados anteriormente. McSweeney, Donahoe e Swindell (2000) utilizaram como base a revista Journal of Applied Behavior Analysis (JABA) para verificar a participagao de mulheres na AC aplicada, por ser considerado um periddico carro-chefe da area. As publicacées nessa revista foram compa- radas com outras, também de AC, demonstrando que “a participaao de mulheres como au- toras na JABA geralmente igualou ou excedeu a participacao nas revistas de comparacio” (McSweeney et al., 2000, p. 271). Tal pesquisa enfatiza a importancia de entender a cultura do pais como fator determinante da participacao das mulheres em publicaces. Consideragdes finais A desigualdade de género est presente em todas as praticas de culturas patriarcais, in- cluindo a ciéncia, que envolve tais desigualdades nos processos de produgio e publicagao de conhecimento cientifico, Dentre as praticas que produzem tais desigualdades, podem-se apontar o silenciamento e invisibilizacao de mulheres cientistas, os quais geram discrepancias de oportunidades entre homens e mulheres cientistas, bem como o reconhecimento das pro- dugées masculinas e femininas. Embora a AC tenha sido consolidada no pais eminentemente por mulheres (pelo trabalho de pesquisadoras como Carolina Bori, Maria Amélia Matos e Deisy das Gragas de Souza), processos de invisibilizagao de mulheres cientistas também podem ser observados na AC brasileira, jé que apenas recentemente vem-se produzindo maiores discussdes acerca da con- tribuigao maciga de mulheres para o desenvolvimento da AC no pais (Couto & Dittrich, 2017; Couto, 2017; Gallo et al.; Rosendo & Nogueira, 2020). Considerando a relevancia dessas discussées, este capitulo teve como objetivo analisar o papel das mulheres na producao de conhecimento em AC no Brasil, no decorrer de dez anos, em algumas das principais fontes de publicagio da area. Os resultados indicaram que a parti- cipacio feminina nas produgées, de modo geral, ¢ frequente e consistente, indicando o crucial Papel feminino na produgao de conhecimentos em AC. De um total de 739 producées elegi- veis, $69 (77%), possuem mulheres na autoria e 427 (57,8%) tem mulheres como primeiras autoras. Producdes de autoria exclusivamente feminina se mostraram frequentes (total de 248, ou seja, 33,55% do total), quando comparadas & quantidade de produces exclusivamen- te masculinas (170, ou seja, 15,02% do total). Os dados aqui apresentados resumem-se exclusivamente as questoes de publicagdes de artigos. Ainda hé um grande caminho a percorrer quando se fala em mulheres na ciéncia de forma geral. Aspectos como a comparacao entre quantidade de mulheres em graduagio e pés-graduacao com a quantidade de mulheres em cargos de chefia; quantidade de mulheres em editoriais de revista; ou ainda em relagio a docéncia no ensino superior, precisam ser DEBATES SOBRE FEMINISMO E ANALISEDOCOMPORTAMENTO VOLUME 2 47 Scanned with CamScanner levados em consideragao para concluirmos que a participacao feminina na ciéncia tem rex, mente crescido e se solidificado, e que representa (ou nao) uma redugio na disparidade ¢, género, Segundo Laurenti et al. (2019), que se verificou é que @ proporgio de participagao de mulheres nessas atividades diminui com o aumento da seletividade da posigio na hierarquia ciemtifia, Esse dado coincide com os achados analitico-comportamentaisinternacionais, especialmente com respeito a menor proporao de mulheres na editoria cientifica;e também com o quadro da evolugao cientifica nacional, no tocante docéncia no ensino superior, em que @ Pparticipagdo feminina é minoria, a despeito de integrarem a maioria do contingente discente na graduagio e na pos-graduagio. (p. 262). Investigacées posteriores podem analisar 0 quanto tais publicagdes esto, de fato, sends reconhecidas. Tal anélise pode ser realizada através do levantamento no nimero de citacées dos artigos produzidos por mulheres, em relagio ao total de artigos e ao nimero de artigos produzidos por homens. Outra avaliagio possivel de reconhecimento pode ser realizada por pesquisas acerca do niimero de textos brasileiros de autoriafeminina, comparados ao ntimero de textos brasileiros de autoria masculina, que vém sendo utilizados nos programas de disci- plinas de AC das universidades. Este estudo teve como recorte a andlise de revistas com enfoque em temas relacionados & AC, o que pode ser de grande importancia para o entendimento da contribuicio de mulheres no desenvolvimento das revistas comportamentais, mas ainda deixa um espago para uma possivel andlise de como esta sendo a produgao cientifica de mulheres analistas do comporta- mento em revistas mais generalistas. Outra questio importante a ser avaliada sfo os fators relacionados & maior participagio de mulheres analistas do comportamento na produgao de conhecimentos de carter teérico. Por fim, outra possbilidade de futuras investigagdes ¢ a andlise das elagGes entre a participa-

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