Princípio da livre concorrência - em matéria tributária

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Principio da livre concorréncia em matéria tributaria Conceito e aplicagao Paulo Caliendo” Resumo: 0 presente astuco tam por objetivo verfcar a importance mites do principio da livre concorténcia para 0 Duseito Tvibuténio, bem como a sua ligagso com © principio da neutralidada fiscal. Palavras-chave: Lute concomténcia, Tubutagto. Nevtilidad fiscal. Twatamento diseriinaterio. Introdugao O presente estudo pretende afirmar que: 0 prinelpio da livre concorréncia deve orientar as relagdes do Direito Tributarto com os principios da ordem econdmica. Desse modo, pretende-se afirmar que: (i) 0 principio da livre concorréncia € 0 mais importante principio a orientar as relagdes entre o Sistema Tributario Nacional e Ordem Consiitucional Econémica; (ii) 0 principio da neutrelidade fiscal deve ser rolido a luz da interpretagao da necessaria concorréncia leal em um mercado im- perfelto ¢ com objetivo constitucional de fundar a justiga econdmica e social; (il) todos os demais subprincipios tributarios devem ser reinterpretados para adquirit ‘uma nova compreensao (nao cumulatividade, uniformidade geografica, redugéo das desigualdades, etc.) 1 Da supera¢o do principio da neutralidade fiscal pelo principio da livre concorréncia no Estado Democratico de Direito ‘A Importéncia do tema é foi relatada em outros estudos @ é indiscutivel a sua televancia em termos praticos e tedricos. Somos conhecedores do fato de que a tributagao apresenta efeitos fiscais e extrafiscals na sociedade. Estes efeltos po dem ser intencionais, tal como na concesséo de beneficias fiscais ou na tributacéo Moste em Dito des Negocios eda inesracdo ~UFRGS. Doutor em Ditto Dibutio- PUC-SP Professor ‘do Mostra e Dourorado da PUCRS. Revista da FESO Porto Alege a7 [p.116-192] janvjon. 2017 ecolégica, ou podem set nao-intencionais, visio que todo o tibuto em si possui uma carga de eficcia extrafiscal. De qualquer sorte ¢ indisoutivel que o aumento de um percentual na aliquota de um tributo ou a criagéo de uma nova obrigacao tributaria ou de uma forma de adimplemento de uma obrigacéo acesséria (tal como na antecipagao do prezo de recolhimento de um tributo} age sobre a conduta e as ‘expectativas de agao de agentes econémicos, hem como na promogao de direitos fundamentals. O tibuto, somos sabedouros, néo apenas implica em uma forma de arrecadacéo de recursos privados para a sustentabilidade de poiiticas piiblicas; ‘mas também ele age sobre a forma que iremos nos comportar tornando mais cara aquisigao de certos bens (punindo economicamente) ou tornar mais barata @ aqui- sigdo de outros (premiando). Existe uma compreenséo uniforme na teoria econdmica desde os econo- mistes neoclassicos de que a tributacdo deveria ser neutra, néo se constituindo ‘em um fator perturbacor ou desviante das leis de mercado. Pare esta teorla a tributagdo € sempre um “peso morto” (deadweight Joss) a ser cartegado pela sociedade, equivalente aos monopélios ineficientes, as barreiras alfandegarias @ as tegulacdes irracionais. Em teoria econdmica este entendimento fol expresso no chamado “triéngulo de Harberger's”, em que 6 demonstrado graficamente que fem um mercado perfeito a curva da oferta sempre esté em sintonia com a curva da demanda, mas quando a tributacéo incide ala distorce a percepeao dos pregos pelo consumldor gerando ume perda social. Assim, por exemplo, se houver uma ineidéncia de tributos sobre 0 vinho maior do que sobre a cerveja 0 consumidor ird substituir o primeiro item pelo segundo, mesmo que néo seja 0 seu produto de preferéncia, de tal modo que 6 teduzida a satisfago do consumidor, Para a teoria neocléssica, portanto, a tributagao sempre gera ineficiéncia, visto que os produtos sero escolhidos néo com base nas preferSncias dos consumidores e do mercado, ‘mas em intervengdes pollticas Fara a teoria neocidssica o objetivo geral das finangas pablicas esté em limitar a0 maximo a intervengdo fiscal de modo a diminuir também ao maximo as perdas socials. Cabe perguntar, contudo, esta em acordo este prinofpio com a CP/88 e ‘8 fundamentos do Estado Democrético de Direito, da promocéo de uma justiga social e econdmica? Cremos que n&o, o texto constitucional exige certo nivel de intervengéo estatal, que seria considerada necesséria e mesmo benéfica, Devemos atentar, contudo, pata o alerta de que 0 uso desconttolado pelo poder de tributagéo come melo de intervengao estatal pode significar o uso abusivo de um poder que pode destruir riquezes, prosperldade e no fundo impedir 0 surgimento da justiga Social, visto que a auséncia de um sistema claro de titularidade e de protegéo da ptopriedade gera o inverso do persequido: miséria, ineficiéncia econémica ¢ dest gualdades. Assim, 0 texto constitucional exige ponderagao de valores conflitantes por ‘melo da protogao de propriedade privada, da livre iniciativa, da liberdade de estabe- Jocimento © ao mesmo tempo da busca da justiga social e da promo dos direitos sociais. A protegao da livre concorréncia pode ser o ponto de equilibrio entre a 116 Revie da FESDT.n.7 © PauoCatendo brotegao da liberdade e a busca da promogéo da igualdade e talvez sejao meio de aprofundar a busca solicitada por John Maynard Keynes de que “o problema politico Ga humanidade 6 combinar trés coisas: eliciénoia econdmica, justica sociale liber- Gade individual’.* Claramente nos afastamos do entendimento simplista de optar ou pela intervencao maxima do Estado ou pela intervengéo minima e defencemos imervencao eficiente deste (principio constitucional da eficiéncia da administragao publica). As relagdes entre a tributagao e a economia politica séo estudadas durante séculos © podemos citar os estudes de David Ricardo sobre o deficit publico (1817); de Cournot (1838) sobre a incidéncia da tibutagao nos mercados imperfeitos; de Edgeworth (1825) sobre os efeitos da tributaggo nas firmas ¢ em Pareto (1909) nos ‘Sundamentos des decisoes sociais.* ‘Todos os autores partiram da constatagéo de que praticamente certo em termos econémicos que nenhuma economia pode operar sem a existéncia de uma ase minima de organizagao institucional e que, por sua vez, esta base requer ser financiada ("...Jaws cannot be policed free of gosts").’ Deve existir um Batada que organize 0 poder, contudo, o tamanho do Estado (Minimo, Maximo, Suporta vel, Regulador, etc.) é fruto ainda de acalorado debate. Portanto, desse fato duas ordens de preocupagies tém sido desenvolvidas na teoria econdmica: equidade e eficiéncia, Para a teorla neocléssica o Rstado deve implementar suas politicas com o minimo de efeitos para a sociedade ("minimum joss io society”). Minimizar seus efeitos é uma das exigéncias da eficiéncia econdmica. Por outro lado, o Estado deve gir para obter a mais equitativa distribuiggo de bens na sociedade, especialmente, erante 0 fato de vivermos em uma sociedade em que o mercado ¢ imperfeito ¢ *° Noorignat: "The pote! problem of mancnd eto combine he things: esonomie eliency, sod ustice ‘nd indvsua!tberty The fst needs etc, precaution. ated technical koowiedge: he second, ar uns ‘sh and enthsiatic ait, whic loves tho orcinary man the Une, eran, bread, abpeetation ote cvoolssies of vasoty and independoscs, which pers, ave eeryenng, to go unhindered oppecunity ‘o the xo=psionn and wo mie isso, The second ingteaent 1 sh bee: passin ofthe grat party of Prloanal, Bue fisted thin ete the qualia ofthe pty whieh, by ts taiione and eneton ye Dates. nas been te home of ZoonomiaInvsuatiom and Sac Laherty vo a. KAWNES, John Maynor “Leralism a Labour. (Rayon Peraein, Nev Yst/Loncon; W. W. Noon, 1089, p 384-340 O texto 9 fee ao pronunciamenio spoach) realizado no Manchester Refer Cub, Feb vay 8. 1826 * Ver, eobr 9 accu, MYLES, Gareth D, Public Boonomics.Cantenige: Carnie Pres, 202, p02. Con forme SALANTE a cra da nidenceunbutaia # suas mloacnes no urn eral coments fre surge ‘wan ge esis Fines em 1S07; von HARBERGER, A, Th ineidnae ete carport fox ude at Potica Seon. 70.1982. 215-240. Reta atirmagso nd desta dofto do aur aferar qu dasde ‘iam Smith @ Davi Riardo a tribatagto tisha aide ttada de medio basanle cpofundeda, ntudo He lado da ofr analyte vne base con supply); ver in SALAMIE. op cD 10 (Ct, Myles, ap. ct. 05. Assim. no Gaede Olver Holmes: “anus arm what we pay or envied society ‘at Justis Oliver Wendel Holmes in Cornpania General de Tana de Alipas x, Collector of Internal ‘Revenne. 275 US. 100, (1927 etsonting). No misma genta expesson de modo servant Rca Lio ‘Tete em sun obra “A idea de liberéde no Estado Patriot! @ no Betado Fis. ao afar setem ‘rutas 0 “prego de tberdade”, ca letur pofrimos fazer come sens a “cantibuisio & manstencdo de uma exer pica ebro iguanas i Pineisioga ire cnconéncaemmatiratutira 117 existem motivagdes decorrentes de vontade de promogao de politicas publicas de ‘bem-estar social ("welfare-motivated policies"), Este pode se considerado o aspecto da equidade nas politicas de financas publicas, ‘A moderna teoria econdmica demonstrou, contudo, que o mercado nao é per- feito e apresenta, de modo geral, dues grandes falhas: (i) bens publicos exclusivos (ndo rivais), visto que um agente pode consumir sem reduzir 0 consumo de outros agentes e (1) presenga de efeitos externas ("presence of external effects"), dado que ‘0 mercado nao pode alcangar sozinho 0 seu nivel étimo. Basta pensar no problema do financiamento das politicas piblicas em matéria de satide que iremos compreen det 0 problema de bens piblicos exclusives, visto que 0 fornecimento de remédios raros pode implicar em auséncia de recursos para outros remédios. De outra parte, 4 idela dle que 0 mercado sozinho néo pode gerar 0 maximo de eficiéncta parte do pressuposto de que existem limitagées ¢ felhas de mercado, tal como exemplo a impossibilidade de se pensar em uma privatizagdo da defesa nacional e mesmo da ‘moeda, como sendo algo eficiente. Dessa forma, tm sido propostos os “tributos cometives” (“corrective taxes") ‘como formas de corrigir falhas de mercado ("market failure’) * Mesmo Adam Smith Cconsiderava que os tributes sfo "pregos” a serem pagos para o fornecimento de ‘ués categorias de bens piiblicos para seus siiditos: defesa, justiga e bens publicos sujeitos a externalidades (p.ex.: educagao primaria). Alguns autores iréo defender ardorosamente asta tese (Pigou) e outios iro questionar a eflciéncia do Estado ma- nipular tributos para corrigir 0 mercado (Coase e Hayek). Cabe ressaltar o importan- te alerta destes autores de que a intervengdo estatal podera causar mais danos do que beneticios, visto que o Estado pode ser menipulado por lobbies, oportunistas € burocratas que buscam privatizar o bem publico para si em uma nova espécie de patrimonialismo e retitar renda de todos para si, usando belas bandelras sociais (rent seeking) Torna-se claro que equidade e eficiéncia entrem geralmente em oonfiito em termes econdmicos.* O principio da noutralidade fiscal representava no ambito Ju- dlco esta tentativa de ponderar estes dois interesses distintos dentro da compre: ensfo anterior. Nessa visio a economia apresenta um equilibrio goral (“gonoral ‘equilibrium economy") a de quo o uso de determinadas politicas pode significar a procura de um diferente equilfbrio para a economia. Nesse caso, se estuda as im: plicagdes que indugdes podem provocar no sistema do progos ("induced changes in ‘he prioas of goods"), especialmente a tributagao. Tlie o assum vex SALAM, emnad. The economics of wxation. Oumbxdge/Landon: MET Prose, 2009; [HETTICH, W.e¢ WINER, 5. The politcal econemnical of waxsion im MUBLLER, D, Perspeines on Public (Choign. Cartsidgo: Cambricgo Press, 1997, MUSGRAVE. R. Theory of Pubic Finance, New Yank: otra Bil, 1959, NOZIE,R. Anazehy, Sete anc URopn.Sasic Honk, 1974; STEINMO. S.Taacion sn Dermacacy Yale University Fess, 1990 © SALANTE, Boat, The mleroesmimies of Market Falures. Cambxldgo: MIT Pras, 20 ‘Assim, conforme Myles: “Due to thei distinct nature, ts neva thatthe aims of equ and efficiency regula confet; ver n Mes, Gareth D. Public Heonomics. Cambie: Carbrige Press, 2002, p. 07. 118 Reva da FESOT.n.7 » PauloCalendo Desse modo, a busca da neutrelidade fiscal pretende ser uma forma de manu- tengo geral do equilfbrio da economia, ou dito de outra forma, da menor aferagao ossvel que a tributagéo possa realizar em uma economia imperteita Tendo estes pressupostos a teoria econdmica orlentava a politica fiscal a pro- ‘curar a assungdo de trés objetivos: (i) financiar as despesas publicas; (i) controlar @ economia ¢ (ii) orgenizar 0 comportamento das agentes econémicos.* @ 0 financiamento do Rstaco ‘A quesitio central das finangas publicas, em qualquer nagdo, é qual o tamanho apropriado do Estado?” Ou melhor, dizendo: quais as tarefas publicas que o Estado dovera desenvolver? Quais e como ira proceder a promocéio dos direitos fundamen- tals? A disorepancia entre as tarefas puiblicas e os encargos produz um eonflito inso- luvel entre 0 Estado e 0 seu financiamento pala sociedade, Por outto lado, as ques- ‘Bos relativas ao orgamento e seu método envolvem questées da maior relevancia, Gado que 0 Estado possut objetivos de longa prazo que devem ser considerados na equagio entre 0 financtamento e seus encargos e, portanto, consideragdes anuals S80 ‘ncapazes de prever, tais coma previdéncia social, obras de infraestrutura e mesmo educagao, (texto constitucional respondeu esta questo de modo claro ao afirmar que: Art. 170, A ordem econdmica, fundada na valorizagio do trabalho humano e na live Iniciativa, tem por fim essegurar @ todos existéncia digna, conforme os ditames da {ustiga social, observados os seguintes principio: Desse modo, a Orde Constitucional Beonémica esta fundada na ideia de jus- tiga social, de tal modo que 0 capitulo econdmico, fiscal e social devem ser lidos ‘ntegradamente e com base em principios comuns. Nao é possivel entender que o texto de 1988 dosejo um Estado Minimo quando garante a satide, a educacéo © a Sequridade Social como melos de realizagao do tuma oxistencta aigna, Dosse modo, a defesa da concorréncia bode ser considerada como um ponto de fencontio e equllibro entre os principios da lterdade fiscal e da promogdo da igual- Gade material no Estado Domocrétion de Diteito, de tnl forma que nem se defenda absurdaments @ neutralidade fiscal ei pro! de ume livre inteiative sera freios @ nem lum intervencionismo fiscal exagerado em prol da promogo da Igualdade social (8) © controle da economia Ha uma visao garal, dentio do ponsamonto keyneaiano, de que 6 uso de medi- das fiscais, tal como a manipulacti de teceitas lespesas piiblicas pode influanciar ‘Ness sentido, Musgrave sio tts a fangbes do gota: "aocaton, to pride public goods and remedy ‘markt nue", weston” "stabliaton. a= pursing 19 macceconemic interventions (nciading !amomao sails ver in MUSGRAVE, R. Theory of Public Finanes. New York: McGaw}, 1858 \Ver BELDSTRIN, Marin. How Big Should Government Be? 60, Navional Tat Journal, 197, 197.197 Pino ure concorca om matéra wouira 119 outros agregados econémicos relevantes, tais como: o emprego, a renda, a inflaedo, o crescimento, entre outros." Dessa forme, diversas medidas foram implementadas em periodos de crise para incentivar uma tecuperagao econdmica, o que foi denominado de medidas contracilicas ("counter eyalical economic stimulus"), Autores diversos, dentre eles © mais importante foi Milton Friedman, questionaram a validade desses procedi- rmentos, alegando que 0 equllibrio econdmico no obedece direramente a aplicagso de medidas fiscals e que mesmo elas podem permitir o aumento da inflagdo © a manutengao do desemprego ao mesmo tempo (estagflacao), Existem, contudo, diversos modos de aplicagao de medidas contra-ciclicas ain- da em vigor, fais como 0 uso generalizado nos paises do mundo de um imposto de renda progressive como forma de estabilizecZo da renda nos ciclos econdmicos,tri- >buvando mais em periods de elevagéo da renda e menos nos periodos de depresso.* ‘Apesar destes ditames 0 texto constitucional brasileiro dialoga tanto com a ideia de um planejamento econémico normative, regulador e de uma intervengdo limitada em alguns setores sociais. Nesse sentido determina o art. 174 do texto cconstitueional que ‘Art, 174, Como agente normativo @ regulador da atividade econdmica, o Estado exercerd, na forma da lei, as fungdes de fiscalizacio, incentivo e planejamento, sen- do este determinante para 0 setor publico e indicativo para o setor privado. (i) Organizar 0 comportamento das agentes econdmicos Este aspecto esta relacionado promogao de politicas mediante a utilizacao de medidas fiscais. Assim, podem ser consideradas como exemplos: 0 incentivo & poupenga, ao investimento, distribulgao de renda ou a moradia.® Outro nimero significative de elementos poderia ser citado, néo apenas na ordem econdmica, mas igualmente ne orem social, tal como: a promogéo de um sistema acondmico autos- sustentével (verde), da familia, da cultura, entre outros, Inoxistom, contudo, cortezas sobre a capacidade da politica fiscal produair re sultados setisfatdrios na organizagao do comportamento dos agentes econdmicos, Entendeu-ce que tanto as saidas neocléssicas, quanto keynesianas foram insuficien- ‘tes para responder aos desaflog atuais. Connido, toma-se claro que a viebilidade do mervado capitalista depende da realizagdo simulténea da equisigéo de niveis 20 ‘poupanga ¢ jormagao de capital compatives com o crescimanto acondmico e o plano emprego sem inflagao". A tributagao do capital e da renda cumpre um papel fund ‘mantal na formagao de expectativas dos agentes economicos nao apenas no longo pprazo, mos iqualmente no curto prazo, indicando as melhores saidas para momentos e dificuldade economica, tal camo na recesséo. Gr OLIVER, Philip D. Tax Poy: readings and murals, New Verk: Foundations PressThompoon West 2004, p18. 3 Ct idem, p27 Of idem ibid, ® GE OLIVER, op. ot, n. 98 120 RovsiadaFESOT, a7 * PauoCalereo Diversas quesiées iro ocupar a agenda sobre os temas envolvendo tributagao e financas piblicas, tals como: 0 federalismo fiscal, a questo dos Incentivos fiscais, da evasio fiscal e dos tributos em espécie e a sua influéncia em uma economia Competitiva (tributo sobre a renda, capital, propriedade ¢ consumo) Todas estas observagdes, contudo, partem da observagao que para financiar © fornevimento de bens piiblicos (“public goods"), redistribuir renda ov controlar a economia; o Estado faz uso de transferéncias de riqueea privada (“nnon-Jump-sum wansters"”) para 0 setor publico que se fundamentam em decisbes econdmicas dos agentes privados, especialmente, devido ao fato de que a tributagdo contemporanea funda-se em uma incidéncia sobre fatos econdmicos.® Novamente 0 texto constitucional admite a extraflscalidade como forma de con tole na economia, por mofo do IPI, 1OF, Ife IE, bem como no caso do IR, IGMS e todos 95 demais tributos Estas questées foram respondidas pelo texto constitucional de 1988 ¢ a tesposta induz ao entendimento de que ndo é possivel continuar defendendo a primazia do brinoipio da neutralidade fiscal no sistema constitucional brasileiro ¢ este deve ser superado pelo principio da livre concorréncia, Dessa forma somente se pode interpretar da impossibilidade de defender uma ‘dela de neutralidade fiscal como sendo o principio norteador das relagdes entre Sistema Tributarlo Nacional e a Orem Econdmica e Financeira. Devemos, portanto, ‘encontrar outro principio que possa orientar esta telagéo. Em nosso entender este Principio € 0 da defesa da concorréncia leal, inscrito no art. 170, ino. IV Give concor- réncia), (© principio da livre concorréncia encontra-se estabelecide no texto constitucio. hal ¢ na Let 8.84/90, que determina em geu artigo 20 as condutas que consideram como atentatérias da livre concorréncia: limitar, falsear ou de qualquer forma proju Gicar a livre concorréncia, bom come dominar mercado relevante de bens e servicas, umenter arbitrariamente as luctos, exercer posigao abusiva,* A livre concorréncia posgui diversos significados sendo seu significado como ‘condigdoe Ieais de compericao, em que vs malhores agentes aeonbiticos serd0 pro- ‘muados por sua eficténota e nao por condigies artifciais ou maliciosas do ganhos bperante os demais competidores. Esto entondimento se extrai da leitura do dispos- to no art: 20, § 19 da Lei 6,684/90 que dispde que as posigéos am mercado de vem ser alcangadas unicamenta pelo uso eficionte des estruturas empresariais (0 1° “A conquista de mercado resultante de processo natural fundado na maior eficiéncia de agente ecandmico am ralapso a cous competidores néo caractetiza o ilcito previsio no ingteo UI"), 5 Asin. “ump gum transfor", on sa, arctan ite de pagamenins maxes @perocoos, 3 CL SALANIE, emard. The econnmics of taxation. Cambridge/London: MIT Press, 203. C9 "6 "Ast. 20. Consituam info da order eeonémioe,independonteente de culpa, eb cs sob qualcuer forma maniestedes, ue tenham por abjta au possam produ o¢eeuintas eftos.ninda que nfo seam Acancadts: 1 ~ limita, fasear ou de qualquer forma preucier «le concaenca ou a no ntoats ~ domminar mercado relevante de Dens cu servigas: I~ aumentarebtaamente og futes IV ~exeoet do forma sbueivaposigto dominate” SSS Princ dae concontnaia om mara rbwtara 121 ‘A importancia da tributagéo para garantir um regime de concorréncia efeti- va esta prevista no art. 146-A do texto constitucional, acrescentado pela Emenda Constitucional 42, de 19 de dezembro de 2003, Conforme este dispositivo’ ‘Att, 146-A, Lei complementar podera estabelecer crtérios especiais de tributacto, ‘com 0 objetivo de prevenir dasequilibrios da concorténcia, sem prejuizo da compe: ‘tBncia de a Unido, por lel, estabelecer normas de igual objetivo. ‘Desse modo, reconhece-se claramente @ importéncia da tributagio para que exista um regime de concorréncia que nao seja afetado pela tributacao. Dois exem plos importantes de utilizagao do principio da livre concorréncia em matézla tributéria podem ser citados: 0 caso dos beneticios fiscais e das sangées politicas. (© tema dos incentivos fiscais foi tratado polo CADE no Proceso Adminis- luative 028/99, em uma decisao relevante sobre o assunto, apresentado pelo PNBE (Pensamento Nacional das Bases Smpresariais). Nesse caso, 0 Plenério do CADE apreciou uma consulta acerca da adequacéo dos incentives fiscais concedicos pelos Estados-Membros 8s empresas, pratica conhecida como "Guerra Fiscal", a legisla cdo de defesa da livre concorréncia. Segundo a consulta “guerta fiscal pode levar a situagdes de alocagdo ineficiente de recursos na economia e a condigées que permitam a uma empresa deter ‘dominio do mereado’." Um exemplo cltado na Consulta refere-se a0 caso pelo qual a desoneragao, tribuvéria (incentives fiscais ou financeiro-fiscais) resulta em um efeito sobre o custo de funcionamento das empresas beneficiadas sobre os mercados em que estas atuam. Assim, como estudo de caso levantou-se 0 impacto da reduco do ICMS no lucto das empresas do setor de sabonetes: ‘Aliquotas do TCMS | Lucco/Paturamento | Variaéo do IMS | Variagao do Lucro 16% 270% 0% % 12% 620% 233% 128% 2% B54 om De 0% 13,21% = 100% 388% Oregime de protegfio da concorréncia no Brasil & determinado pela Lei 8.864/04, que determina que as intragdee 4 orem econdmica (abuso de poder dominant, cartelizagéo ou monopolizagao) deverdo ser investicades, julandas e punidas pelos Scgdos que compée o Sistema Brasileiro de Defosa da Convorténcia: CADE (Conselha “Acministrativo de Defesa Roonémica) e SDE Gecretatia de Diteito Reanémico), com a ppossivel participagdo da SEAR (Secretaria de Acompanhamento Eoonomiod} Pola importancia das conclusdes cabe aqui citar o entendimento alcancado na Consulta n® 038/99: 122 Ravsade FESDT,n.7 * Paulo Calndo @) Retira o estimulo ao aumento constante do nivel geral de eticiéneia da eceno- ‘mia, permitindo uso menos aficiente de recursos e afetando negativamente a capacidade de geragdo de riquezas do pais. 1b) Protege as empresas incentivadas da concorténeia, mascarando seu desempe- ‘nho, permitindo que mantenham préticas ineficientes e desastimulando melho ras na produgdo ou inovacéo. ©} Permite que empresas incentivadas, ainda que aulerindo luctes, possam “pre- datoriamente" eliminar do mercado suas concorrentes nao favorecidas, mesmo ‘Tuo estas soja mais eficientes e inovadoras, em fungdo do enorme colehao brotetor de que dispar, 6) Projudioa as demais empresas que, independentemente de sua capacidade, ‘ero maiores dificuldades ne luta pelo mercado, gerando com isso mais destin centivo & molhoria de eficiéncia e inovacéo. ©) Gera incerteza e inseguranga para o planejamento ¢ tomada de deciséo em- breserial, dado que qualquer cilculo feito pode ser drasticamente alterado ~ @ ‘qualquer inverso realizada pode ser drasticamente inviabilizada com a con- cessio de um novo incenttvo. 1) Desestimula, por tudo isso, a realizagio de investimentos tanto novos quanto a expansdo de atividade em andamento. No presente caso decidiu o Plendrio do CADE em 22 de margo de 2000, por una. nimidade, nos termos do voto do Relator, determinando o encaminhamento de copia 4o relatério, voto e acérdio & Comisséo Especial de Reforma Tributéria da Cémara dos Deputados, ao Supremo ‘Tribunal Federal e ao Conselho Nacional de Politica Fa- zendria - CONFAZ, Entendemos, contudo, que o presente caso ainda néo enoentou ‘a questo visto quo a edigéo da Emende Constitucional que incorporou o art. 146-A exige que exista uma harmonizagdo entre o sistema de protegao da concorréncia © © ‘Sistema Nacional Tributério, Outto caso relevante fol Julgado na questo envolvendo @ American Virainia, om que entendeu o STP que o inadimplemento sistemétion e isolado da obrigagao de ‘pagar Imposto sobre Produtos Industrialtzadoe ~ IP resulta em comportamento ofen- sivo a livre concorréncia. Em que pese a singularldade do mercado © do caso man- {eve a Corte a interdieso do estabelocimento ¢ canoslamento do registro especial de fomecimento de cigaros, visto que esta industria do cigartoa datvava sistemetica @ 'soladamente da recolnor 0 Imposto sobre Produtos Industrializados. com consequen- te redugéo do prego de venda da mercadoria e ofensa & Tivre concorrénia, No caso, onderando a corte sobre a protegéo do diteito fundamental de estabelecimento e a defesa da concorréncia, entendet de modo exeopetonal afasrar a tendénoia da Corte © promover a punigéo da empresa. Diversos sé0 os questionamentos que devem eoguir em questées tao relevantes Como; Incentives fiscais, planejamentos tributérios, parcelamentos especials, rogi mes especials de tributapdo, reducéo das desigualdades regionais, etc. Acreditamos, Contudo, que 0 uso do instrumental da live concorréncia trara resultados praticos & ‘e6ricos mais fecundos que a velha tese de neutrelidade fiscal Pino cate conconénsa em matératrouara 123 A tributagdo entre empresas deve ser realizada em condigdes isondmicas de compotigao © nao em condigies neutras, visto que este conceito d neulialidade carece de sentido em nosso sistema, 2 das relagdes entre a ordem tributaria e a ordem econémica As escollas que implicam em tornar @ aquisigao, manutengéo ou circulagao de doterminados bens mais aceasivels ou mais dificeis sAo eacolhas que devem ser orlentadas pot critérias de justica © eficiéncia.® Assim, por exernplo, 8¢ o5 produtos essenciais (cesta bésica) sotterem uma tributagdo elevada 0 proprio sis tema sera injusto por onerar mais gravosamente as camadas de baixa renda da sociedade. Por outro lado, a concessao de incentivos fiscais para uma industria nascente e importante como a de biotecnologia ou nanotecnologia deve ser orien tada no apenss por critérios de justiga, mas também por critérios de eficiéncia econdmica, vista que toda a tributacéo deve realizar-se sobre fatos econémicos. Nem sempre, contudo, os critérios de justica ¢ eficiéncia produzem solugdes har ménicas, existindo casos de antinomias entre eles, o que implica a necessidade de uma avaliagao intersistémica do modo de (res)estabelecer um equilibrio entre justica ¢ eficigncia, © principio de defesa da concorréncia se telaciona dire:amente com a pro: tegdo da igualdade e da vedacdo do tratamento discriminatério. O principio da igualdade possui um sentido bastante ligado nocao instrumental de garantia da eficiéncia de mercado, da protegao das condigdes de concorréncia efetiva livre circulagto de bens, Possui, assim, uma semelhanca o sentido presente nas logislagées nacionais que entendem o principio como uma forma de “limitacdo da competéneta® 9 “prategdo contra 0 arbitrio" © é considerado um diratto funda ‘mental O tratamento discriminatério foi objeto de variada jurisprudéncia europeia que catactertzon a dlisctiminagao como “tratamento diferenciado para situagdes compa- réveis” (dissimilar treatment of comparable situations), no caso Société des Fonde- ries de Pont-&-Mousson, 1969. Por sua vez, no caso Klockner (1962) considerou esta ‘como sendo a difetenciacio injustificada nela inexisténcia de diferencas objetivas {without euch differentiation being justified by the existence of subetantial abjective differences). Contudo, desde, o caso Ruckceschel (1977) tem sido adotada a férmu- Ja-de que 0 principio da igualdade do tratamento “requer que situagdes similares nao devem ser tratadas diferentomente, salvo se a dferonotagao tor objetivamanta justificada’ (requires that similar situations shall notbe treated differently unless ‘differentiation is objectively justified). GL Tipe: “Rlctg versanden konnen Steuergerecioghen und dkonomsene Eien oder Newusbat au haus Yonforme Zick sein’; vr in Tink, Klaus, Die Sveuerecaoranung. 2. Av, KOM: Dr. Ovo Schmi, 2003, p 8. 124 Rovista da FEBOT.n.7 © PauoCalendo Esta caracterizagaa formal do principio da igualdade de tratamento foi gra- Jativamente sendo superada por um conceito substantivo (Italian Refrigerators Case -1963). Nesse caso entendeu-se que o "tratamento diferenciado de situagdes nGo-comparaveis nao implica automaticamente a conalusao de que houve dis- criminagéo” (the different treatment of non-comparable situations does not lead automatically to the conclusion that there is discrimination). Assim, uma aparente Giscriminagao pode na verdade apresentar uma substantiva auséncia de discrimi naggo. Historicamente a neutralidade econémica da tributagéo foi entendida como uma forma do Estado implementar suas politicas com 0 minimo de efeitos para a sociedade ("mintmum loss to society"), bern coma a sua influéncia sobre as deci sdes ooondmicas dos agentes privados deve ser realizada de modo a infiuencier 0 minim possivel sobre o sistema de formagao de pregas. A ofensa a estas premissas implica na ineficiéncia goral do sistema econémico. Outta forma de refletir sobre a relagao entre a tributaggo e a concorréncia esté no fato que os tributes influenciam a percep¢aa dos pregos em mercado, de tal mado ue os agentes néo possuem as melhores condigdes de escolher sabre determinada Gecisto econdmica. Para entendermos molfior este principio torna-se necessaria a andlise da influéncia que exerce a tributag4o no equilibrio geral do sistema, ou seja, sobte as decises dos agentes ¢ na farmacdo de pregos, A percepcao dos agentes Gera distorgdes na coordenagao eficiente dos agentes, assim, por exemplo, a3 con sumidores percebem os pregos apés a incidéncia da tributagéo ("after-tax prices”) enquanto que o8 produtores os percebem antes da tributapao ("before-tex pricas") Nao hd como ocorrer uma ago coordenada, visto que os agentes percebem diferen- temente os sinais enviados pelo mercado. 2.1 Os efeitos gerais da tributagao Os efeitos gerais da tributagéo podem dividicios da sequinte forma quanto aos ‘ributos sobre: () @ renda: (1) consume e (ji) folha de pagamentos, 0b cfeitos gerals da tritutarao @ renda das pesenas fisieae A tributagao da renda afeta a oferta de méo de obra, em um primeira sentido diminuindo a renda 8, em consequéncia, implicando em uma diminuigao da deman- 4a por tempo livre ("leisure") ¢ implica em uma oferta maior de orga de trabalho ‘A redducao Ge salarios, pelo aumento da oferta de forga de teabalha, nor sun ver. iminai novamonte a renda ¢, por conseguinte tornando monoe trative a oferta de Uuabalho, incentivando 0 suprimento de atividades no setor informal da economia, em tempo integral ou parcial, dado que este 6 um setor néo tributado.” Chien ps tiem. aa a Principia da ire oncorénca em matéraibuiia 125 A leitura tradicional deste aspecto nos diz que a tributacao, nesse sentido, deve agir de modo a influenciar o minimo possivel a oferta de trabalho, sem asti- muler 0 mercado informal, reduzindo o minimo & renda pessoal. Poderiamos reler este caso dizendo que a tributagdio néo pode gerar condigées desleais de competi- ‘edo entre setores diferentes do mercado de trabalho, salvo se existir uma condigao importante para superar este principio, tal como um incentivo a determinado setor ‘econdmica ou regional A propria livre concorréncia pode ser afastada no modelo europeu e brasi- leiro de protego da concorréncia em casos que outros valores mais importantes estdo em choque com a liberdade comercial, tais como a vida, a satide publica, etc, Assim determina o texto constitucional politicas de combate aos desequili- brios regionals Att, 151, 8 vedado & Unido: 1 institu tibuto que nao seja uniforme em todo o territério nacional ou que im- plique distingao ou preferéncia em relagao a Estado, ao Distrito Federal ou @ Munici- ppio, em detrimento de outro, adimitida 2 concessdo de incentives fiscals destinados 2 promover 0 equilibto do desenvolvimento socioecondmica entre as diferentes rogibes do Pats (..] (Ou politicas de incentivo as micro e pequenas empresas: ‘Art, 179, A Unido, 06 Bstados, 0 Distrito Federal e os Municipios dispensarao as Inoroempresas e as empresas de pequeno porte, assim definides em le, tratamento jutidioo difetenciado, visando @ incentivs-las pela simplifeago de suas obrigagdes administretvas, 1ibuvaras, previdenciéras e crediticias, ou pela eliminagdo ou re dugio destas por melo de Cabe ressaltar que esta intervengao deverd ocorrer om caréter excepcional ¢ Jimitado ¢ sempre minimizando os danos & livre concorréncla, visto que os incen tivos fiscals mal utilizados podem produzir o efeito contrério de reduir @ miséria @ as desigualdades ¢ ser um ponto de manutengéo de privilégios e monopolios privadios 8 afeitae garato da tributagao © consumo Os efeitos da tuibutagdo sobre o consumo dependem de capacidade de reali- zarem escolnas econémicss © mudangas do comportamonto (olastieidads). Doce ‘modo, quanto menor for a possibilidade de alterar minhas escolhias e mudar meu comportamento menor soré a elasticidade desta situagéo, Deosa forma: (a) ¢0 ado manda possuir maior elasticidade do que @ oferta, entao tributagao sobre a consi- mo influenciaré pouco o prego ao consumidor e, portanto, os produtores carregargo todo 0 peso da tributagao.* Wh dem, p18 126 Rovsinda FESOT.n.7 ¢ Paulo Cardo Se por outro lado, (b) @ oferta possuir maior elasticidade do que a demanda, entéo o peso da tributagéo sobre o consumo sera transferido diretamente para 0 consumidor. A reqra paderia ser explicada da seguinte forma: a parte do ciclo eco- :némico (produeo ou consumo) que possuir menor flexibilidade para alterar 0 seu comportamento econémico e nao puder realizar escolhas alternatives rd suportar a ‘maior parte do peso da tributacao. Imagine-se a tributagdo sobre produtos essen- ciais da cesta bésica, nao ha como os impostos sobre estes produtos nao afetarem as classes mais desfavorecidas, por outto lado, a tributago sobre bens supérfluos no implicam em grande dano & dignidade da pessoa humana. O grande proble- ma esté em categorizar o que ¢ supérfiuo e 0 que é egsencial, assim poderiamos erguntar: 0 lazer ¢ supérflue? E os bens culturais? Nao se trata de uma questo simples de responder de imediato ¢ depende da situagaa econémica e social de ‘cada nagao, Cabe novamente perguntar aqui se existe ou se deve existir uma neutralidade fiscal nos tributes sobre o consumo? Nao podemos afirmar existir um modelo geral de neutralidade, mas podemos corroborar a afiimagao de que @ tributagdo deve evitar gerar ineficiéncias no sistema, melhor dizendo, é vedado constitucionalmente toda acéo econdmica que vise falsear, limitar ou prejudicar a livre concorréncia de ‘mercado. Esta tese tein por objetivo permitir um equilibrio entre 0 lado da oferta (produc) ou do consumidor, o que em longo prazo propde em evitar sérias distor- (Q6es no sistema produtivo ou na tenda geral da sociedade Os efeitos gerais da tributagaio a folha de pagamentos Neste caso torna-se mais clara a inexisténcia de uma neutralidade fiscal do sistema, visto que ele é alamente protetivo de setores mais carentes da sociedade, dado que 6 melhor deixar de retirar a renda da sociedade do que retiré-la para 1e- distribui-la, visto que existem custos administrativos de controle (burocracia social) que acabam sugando a renda quo davoria ser recistribuida. Entende-se gue é mais eficiente permitir que os setores mais necessitados se desenvolvam sem enfraque- cor a classe mécia ¢ o9 setores essaleriados mais bem pagos. ‘Na maioria dos paises a seguridade social ¢ financiada pela tributacdo sobre a folha de pagamento (“payroll taxes base on wage") e, muitas voxoe, hd uma 10- artigo de énus entre empregados © empregadores. Tal distincdo, contudo, ¢ vida Dor iriséria, visto que o impacto na oferta da wabalno @ no emprego sera 0 mesmo. Novamente, 0 impacto da tributacéo deverd ser medido ela elasticidade, ou seja, flexibilidade em encontrar solugoos alternatives perante 0 aumento ou diminui- fo da demanda e oferta de forga de trabalho, Tomemos os seguintes exemplos:* ~ wabalhadores menos qualificados, geralmente, possuem menores possibili- dades de competioéo no mercado, estando mais sujeitos a0 aumento de carga na folha de pagamentos, visto que esto mais sujeitos as redugdes de produgdo ou lucratividade; Cr SALANIE, op ot, p. 1818 Priepo da ie ancora em mata bua 127 = trabalhadores mais qualificados, goralmente, esto menos sujeitos ao de semprego por possultem uma maior empregabilidade e escassez. e, portanto, a de manda por parte destes profissionais tende a ser menos elastica; = sexo: as tabslhadores mulheres tendem a possulr uma maior elasticidade, podendo optar por dedicarem-se (total ou parcielmente) ao culdado dos filhos & deixar o trabelhador masculino com a tarefa pelo sustento. Dessa forma, traba Ihadores do sexo masculino e menos qualificados possuem um pequena grau de elasticidade, estando mais sujeitos aos efeitos do aumento da tributagao da folha de pagamentos, A tributagdo, dessa forma, deve se preocupar com 03 seus efeitos sobre 0 mercado de trabalho, tentando evitar que se torne em um fator de desemprego ou Gesabastecimento do mercado de profissionais qualificados. Desse modo, dispde Claramente o art. 195, § 9° da CFV68 que determina que: § 9° As contribulgdes socials previstas no inciso I do caput deste artigo poderdo ter aliquotas ou bases de célculo diferenciades, em razio da atividade econdmica, da utilizagao intensiva de mao de obre, do porte da empresa ou da condigao estrutural do mercado de trabalho. A protecéo da concorréncia leal deve ser combinade com a protego do trabalho a busca constitucional do pleno emprego (att. 170, inc, VII CE/88) 22 Do contetido do principio da defesa da concorréncia em matéria tributaria O principio da defesa da concorréncia em matéria tributéria estabelece um valor ou fim, qual seja diminuir legitimamente os efeitos da tributagao sobre a decisdo dos agentes econdmicos, evitando distorcBes € consequentes ineficién~ fas no sistoma oconémico quo impliquom om rostriedo, faloamento ou projuizo da competicéo leal em mercado.” A busca de um sistema tribuldrio dtimo, ow scja, que realize as suas fungées de financiamento de politicas publicas, pro ‘Mogo dos direitos fundamentals, evitanda ao maximo um tratamento ant-iso- nomioo ¢ ineficiente nas decisées econdmicas ¢ o grande desiderato do Direito Tributario. Cabe novar que o sistema nao propugna uma protegao absoluta da livre concorréncia, mas de uma defesa da concorréncia efetiva em um contexto constitucional de valorizagao do trabalho, dos direitos sociais, do contribuinte e dos consumidores, “Assan enlende SALANIE que: "nthe eoonamic ward an eccnamic action, an insti, mew, donot ge ‘ete oly one eect but a whole series of eiects. Oy theft eet is ovcus. is simultaneously with ‘tg cause it can be seen. The cers only une n sucoeesen. They cannot be een; we are lcky if we ean redi. then vet ip SALANIE. op ct, 15 128 RavsiadaFESDT,n 7 * Paulo Caliendo 2.2.1 Dos sentidos do principio da livre concorréncia Os prinoipios para um alcangar um sistema tributdrio étimo, segundo Adam Smith, stio:” () equidade: a tributagdo deve estar relacionada a capacidade contri- Dbutiva do contribuinte (‘abiity to pay’) i) clareza: os tributos deve ser clares e ndo arbitrérios; (i) razoabilidade: os tributos devem ser arrecadados no modo menos ‘oneroso possivel ("be collected in a reazonably painless way"); e (iv) deve produzir 0 ‘menor custo posstvel: tanto em termes artecadatérios, quanto nas ineficiéncias que provocem no ambiente econdmico. Adicionam os autores modemos o papel de esta- bilizedor fiscal, ou seja, a capacidade de adaptar-se aos ciclos econdmices e as suas flutuagoes © sentido da protegéo da livre concorréncia em metéria trlbutéria esté na nogao de que a tributagéo tem essenclalmente um sentido cidadio de eatabelecer a correta contribuigao & manutengio da esfera publica, impedinda que as intervengées fiscais sejem instrumentos discriminatérlos de protegéo econdmica tlegitima, pera mono: PPlios, grupos privados e amigos do poder. A tributaogo deve ser o mais eficiente Dossivel, cu seja, néo deve se constituir em um elemento ilegitima de deciséo do agents econémico nas suas escothas de Investimento, Desse modo, a tributagéo no pode se constituir em um elemento de distorgao do sistema econémico, de dimins (fo getal da eficiéncia @ obstaculo eo desenvolvimento, Nao se pode mais acreditar na possibilidede da tributagio ser 0 mais neutra possivl, visto que o préprio sistema onstitucional nao é neutr, ‘Avutilizapéo da fungao extratiscal do direito tributério deve, contuda, continuer a ser entendida como sendo residual, motivada e, se possivel, temporéria. © tributo néo pode ser entendido como elemento fundamental de diregéo econémica, mas tao somente como meio de tegulagao excepcional,limitado e justitcado 2.3 Da aplicagdo do principio livre concorréncia em matéria tributaria O principio da livre concorréncia om matéria tributéria deve em sua aplicacdo tentar alcangar os preceltos de eficiéncia e menor oneroeldade @ influencia possivel nas decisées dos agentes econdmicos, de modo a impedir as condutas que visem falsear, restringir ou prejudicar a liberdade econdmica © conceito de livre concorréncia em matérie tibutéria pode ser entendido em dols aspectos principais: intarno e externo. Em sentido interno, a neutralidade fiscel significa que produtas em condigdes similares devem estar submetides a mesma ‘carga fiscal, ecb pena de protegio indevida de um determinado setor ou empresario. A livre concorrencia em materia tributaria em sentido extemo relaciona-se com & ‘dia do que a tributagdo deve combinar dois elementos aparentemente contradlto- Tos: a protegao da livre iniciativa e a promogao de direitos sociais. A livre concorrén- la deve ser utilizada como forma de solugao de contlitos aos casos de concessao de ‘inoentivos e beneticios fiscals e outras formas de proteyo social, verificando quando estes na verdade prejudicam a ordem econdmica e social Gr SALANE, ap at, p69, Pricpo die conconénca em maiatrbuéra 129 2.3.1 Da livre concorréncia nos tributos sobre a renda A neuttalidade fiscal sempre foi utilizada nos tributos sobre @ renda para exigit que a tributagdo evitasse a distoreo na alocagdo de capital, renda, trabalho, investi- ‘mento e ne poupanga privada, Especialtnente podemos destacar os elementos que vi- sam evitar a dupia tributagao da renda, a no tributagao dos dividendos, entre outros. Trata-se inclusive de um conceito consagrado na literatura tributéria internacional @ que deve ser relida com @ nogo de protegao da concorréncia leal entre empresas nacionais @ multinacionais, bem como entre os proprios paises, de modo a eviter a “querza fiscal" ou a competigéo fiscal denosa (tax harmful competition) 2.3.2 Da livre concorréncia nos tributos sobre o consumo Historicamente @ neutvalidade fiscal nos tributos eobre o consumo procura pre servar a néo-cumulatividade dos tributos sobre a formagao dos pregos finais ao con- sumidor. A experiéncia mais relevante sobre 0 essunto encontra-se nos “impastos sobre 0 valor adicionado” (VAT), os quais podem variar em fungao de sua extensdo vertical ® Os “imposias sobre 0 valor adicionado” (VAT) podem variar, também, quanto a0 tipo, sendo possivel assumirem as aeguintes formas: (a) sobre o consumo (*comsuption type"); (b) sobre o rendimento (‘income type") e () sobre o produto (‘product type" Os "impostas sobre 0 valar adicionado” sobre 0 consumo (‘comsuption type" so aqueles nos quais todas as compras para uso na produgao sao decutivels do cal- culo do valor final do valor adicionado, sendo parte da base de cilculo tdo somente ‘es impostos utilizados no consumo privado. As classes de impostos sobre o valor adicionado, tomando por base 0 rendimento (“income type"), consideram como in- edutiveis no VAT o prego de compra dos bens de capital durdveis no momento de compra. No tipo “produto” (“product type"), s4o indedutiveis o VAT pago na compra do equipamentos.” ‘Acreditamos que 0 principio da live concorréncia em matéria teibutéria adquire uina importancia fmpar na estruturagao da tributagao sobre 0 consumo em paises quo tom miltiplas jurisdicdes fiscais, como o Brasil, 20 ledo da nogo de trl- Dutagdo eficiente. Como exemplo poderiamos a legislagéo sobre 0 IVA na Unido Eu- ropoia. Cabe ressaltar quo @ Jegislagao e doutrina, nacional e estrangeira, continua a listar o principio da neutralidace fiscal como um dos mais importantes a orienta atx- Dutagio sobre o consumo. Em naseo, entender, este prinepio deve ger reinterpretado 20 lado do principio da live concorénci, da vedagéo de condutas discriminatérias & dda protegéo extatiscal de setores soci 5 Asm “when ie veraes) emwerage Inward om manuctsring extends though the cea! leve encom ‘pascng altars, VAT, can bo dassied as anal stage non-cumalaive tax. Won the ax extends om Tanuisturing trough te est whose wansertin the VAT maf be Cassie as éul-stage non cumulative tx. When the vale ecded prin is used within the manufacturing section only, with tax apnying 10 seach manufaciurer on his value added Dut nt to wholesalers ot retainers (oxcop oa limi degree, VAT may be cassfodas 2 anco-cage non-curmlaive tax, erin TaraEalus, Som, p. 23 2 Ye, sobee 0 assume in Tera! Kaj, sem, p. 3. 130 Revise da FESOT,n.7 ¢ Pao Calon Consideragses finais O presente artigo apresenta como principais conclus6es sobre principio de live concorréneia em matéria iributarta 1. O principio da livre concorréncia ¢ 0 mais importante principio a orientar as relagdos entre o Sistema Tributério Nacional e Ordem Constitucional Koondmi ca, devendo superar o principio da neutralidade fiscal como principio fundamental na leitura dos demas subprincipios tributarios (no cummulatividade, untformidade geogrifica, reducdo das desigualdades, etc.) 2. O principio da livre concorréncia deve ser lido como capaz. de harmonizar ‘08 valores constitucionais da liberdade e da igualdade, possibilttando que eventuais conflltos sejem resolvides, superando a tensao entre a Ordem Econémica, que trata da produgdo e distribuigéo de bens om regime de livre iniciativa e e Ordem Social ‘que exige a redistribuigéo de bens. 3. O principio da livre concorzéncia em matéria tributéria deve ser relido a luz da intempretagio da necessérla concorréncia leal em urn mercado imperfeito e com objetivo constitucional de fundar a justice econémica e sociel, nos termos do art. 170 da P/E; 4. Toma-s¢ claro que equidade e eficiéncia entrem geralmente em confito em termos economicos. O principio da livre concorréncia em matéria tributdria supera 0 sentido da neutralidade fiscal, como meio de ponderacao entre estes dois interesses dlistintos. 6, O principio da livre concorréncia em materia tributaria estabelece um valor ‘ou fim, qual seja permitir que as competigdes entre agentes econdmicos, na produ: G40 € distribuicao de bens e servigos, sejam motivados por critérios de eficiéncia, evitando distorgées € consequente ineficiéncias no sistema econdmico, bem como toda e qualquer conduta que limite, restrinja ow falseie a concorréncia, 8. A buscs de um sistema tributario dtimo, ou seja, que realize as suas fun- Ges de financiamento de politicas publicas, promogéo dos direitos fundamentas, snoentivando um sistema econdmico fundado na livee concorréncia entre os agentes econémicos, passa a ser o grande desiderato do Direito Tributério. 7, 0 proprio principio da neutralidade fiscal deve ser substitutdo pelos princi. pios da livre concorréncie, da prolbigéo de tratamento discriminatério, da protegao exttafiscal de valores sociais constitucionats e da eficiéncia fiscal (art, 37 da CF/88). Bibliogratia AUERBACH, Alan J; HINES JR.. James R. Taxation and Keonomic Efficiency. National Bureau, of Heonomic Research Werking Paper Serie, Working Paper n. B181, Mar, 2001, Disponivel em: , CALIENDO, Paulo, Dizeto Tributéio ¢ andise econdmica do Dieito. Sto Paulo: Flsevier, 2009, ENGLISCH, Joachim. Wettbewerbsoleichheit im grenztibersobreitonden Handel. mit Schtussolge- rungen fir indireite Steuer. Mohr Siebeck bingan. 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